Processo:

PRP-10/00032733

Unidade Gestora:

Prefeitura Municipal de Iomerê

Responsável:

Laercio Vicente Lazzari

Assunto:

Prefeito - Art. 55 da Lei Complementar n. 202/2000 e Art. 93, I Resolução N. TC-06/2001 PCP-09/00118725 Referente ao exercício de 2008

Relatório e Voto:

GAC/CFF - 30/2011

 

                                                                                                                               

Rejeição de contas. Déficit orçamentário. Receita prevista em contrato. Não repasse. Reformulação do parecer prévio.

O gestor público teve suas contas rejeitadas em função de “despesas figurativas” que, embora com previsão de realização, não chegaram a se efetivar, por conta da falta de cumprimento de contrato que previa o repasse de recursos financeiros. Essa situação, por si só não caracteriza a emissão de empenhos sem critérios por parte do responsável e consequentemente desequilíbrio orçamentário, haja vista que as despesas não liquidadas e inscritas em Restos a Pagar não Processados foram canceladas em exercício posterior face a ausência de realização da expectativa de receita, por falta de cumprimento de contrado por parte do Governo do Estado.

 

 

1. INTRODUÇÃO

 

Tratam os autos de pedido de Reapreciação das contas do exercício de 2008, relativo ao processo PCP-09/00118725, apresentado pelo ex-Prefeito de Iomerê, com base no art. 55 da Lei Complementar n. 202/2000 e art. 93, I Resolução N. TC-06/200.

 

O Tribunal Pleno, na sessão realizada em 16/12/2009, decidiu recomendar à Câmara Municipal de Iomerê a REJEIÇÃO das contas do Prefeito, em decorrência das restrições anotadas pelo Corpo Técnico da DMU/TCE, Relatório n. 4867/2009, em especial quanto à ocorrência de:

 

Déficit de execução orçamentária do Município (Consolidado) da ordem R$ 1.007.607,03, representando 11,51% da receita arrecadada do Município no exercício em exame, o que equivale a 1,38 arrecadação mensal - média mensal do exercício, em desacordo ao artigo 48, “b” da Lei nº 4.320/64 e artigo 1º, § 1º, da Lei Complementar nº 101/2000 – LRF, parcialmente absorvido pelo superávit financeiro do exercício anterior - R$ 578.576,94, e em parte decorrente de valores empenhados por conta do Contrato de Apoio Financeiro com o Governo do Estado, porém não repassados ao município no exercício, no valor de R$ 1.190.000,00.

 

O Ex-Prefeito Municipal, em data de 21/01/2010, protocolizou pedido de reapreciação das contas, no qual apresentou defesa e juntou documentos, conforme registro às fls. 04 a 58. Posteriormente foram juntados outros documentos solicitados pela parte Técnica, sendo estes encaminhados pelo Prefeito Municipal, Sr. Antoninho Baldissera, fls. 61 a 93.

 

A reapreciação das contas pela equipe Técnica deu origem ao Relatório n. 1665/2010, fls. 57 a 153, no qual restaram mantidas as restrições relativas ao déficit orçamentário e financeiro, bem como as demais registradas nos itens 6.2.1, 6.2.2, 6.2.3, 6.2.4 e 6.3, conforme Parecer Prévio n. 0277/2009.

 

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado manifestou-se nos autos por meio do Parecer MPTC n. 157/2011, fls. 155 a 161, dando provimento à reapreciação e concluindo por recomendar à Câmara Municipal a APROVAÇÃO das contas do exercício de 2008 da Prefeitura Municipal de Iomerê, com fundamento nos artigos 53 e 54 da Lei Complementar n. 202/2000.

Em seguida, vieram-me os autos na forma regimental para manifestação.

 

 

 

 

2. DISCUSSÃO

 

2.1. Déficit de execução orçamentária do Município (Consolidado) da ordem R$ 1.007.607,03, representando 11,51% da receita arrecadada do Município no exercício em exame, o que equivale a 1,38 arrecadação mensal - média mensal do exercício, em desacordo ao artigo 48, “b” da Lei nº 4.320/64 e artigo 1º, § 1º, da Lei Complementar nº 101/2000 – LRF, parcialmente absorvido pelo superávit financeiro do exercício anterior - R$ 578.576,94, e em parte decorrente de valores empenhados por conta do Contrato de Apoio Financeiro com o Governo do Estado, porém não repassados ao município no exercício, no valor de R$ 1.190.000,00 (item B.1 da Conclusão do Relatório n. 1665/2010)

 

Registrou a parte Técnica, no relatório n. 4867/2009 de Prestação de Contas do Prefeito (PCP n. 09/00118725), referente ao ano de 2008, a existência de déficit de execução orçamentária do Município (consolidado) da ordem de R$ 1.007.607,03, o que representou 11,51% da receita arredada no exercício em exame.

 

A defesa apresentada pelo responsável, quando da reinstrução da contas, indicou que a situação deficitária era decorrente de recursos de convênio cujos valores seriam repassados em exercícios futuros.

 

Apesar do justificado, concluiu o Corpo Técnico por manter a restrição, sob o fundamento de que o déficit em questão deu-se em decorrência direta do desequilíbrio do empenho de despesas em montante superior às receitas arrecadadas no exercício. Ainda acrescentou que a análise das contas teve por observância o disposto no art. 35 da Lei n. 4.320/64.

 

De sua parte, o responsável com fundamento no art. 55 da Lei Complementar n. 202/2000 e art. 93, inciso I da Resolução n. TC-06/2001, protocolou, em data de 21/01/2010, pedido de Reapreciação de Contas.

 

Na oportunidade juntou cópia da Minuta de Contrato de Apoio Financeiro da Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte – Seitec – vinculado ao projeto PTEC n. 2799/081 do Funturismo, celebrando entre esta Secretaria e o Município de Iomerê. Ressaltou que o acordo firmado previa o repasse de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais) para obras de infra-estrutura turística, acesso Iomerê a Treze Tílias, sendo que parte deste, na importância de R$ 810.000,00 (oitocentos e dez mil reais) foi repassado no exercício de 2008. A diferença pendente de recebimento, no valor de R$ 1.190.000.00 (um milhão e cento e noventa mil), por orientação deste Tribunal, segundo alega o responsável, foi lançada como créditos a receber, no Ativo Permanente, em contrapartida da despesa não realizada e inscrita em Restos a Pagar não Processados.

 

Destacou também a defesa, que a rodovia fazia parte da Malha Rodoviária Estadual e foi o próprio Governo Estadual quem solicitou à Prefeitura, por meio de “Convênio”, que executasse parte da obra. Como era também de interesse do Município foi aceita a proposta. Contudo, os recursos não ingressaram em sua totalidade, apesar disso as despesas foram empenhadas, sendo parte delas não liquidadas, o que resultou na inscrição de Restos a Pagar não Processados.

 

Na reanálise efetuada pela Diretoria de Controle dos Municípios restou confirmado que o montante de R$ 1.190.000,00 (um milhão e cento e noventa mil reais), lançado em Restos a Pagar não Processados, não foi repassado pelo governo do Estado, por meio do SEITEC, bem como que tal valor não ingressou nos cofres da Prefeitura no exercício de 2009, de modo que o seu registro foi cancelado no mesmo ano. Igualmente, realizou-se o estorno da importância escriturada em Créditos a Receber, conforme informações extraídas do Sistema e-Sfinge, fls. 61 a 89 dos autos.

 

Verifico que defesa apresentada não foi suficiente pare elidir a restrição, de forma que o Corpo Técnico a manteve sob a alegação de:

 

(...) que para efeito de apuração do resultado orçamentário do exercício, a contabilização da Receita a Receber – no Balanço Patrimonial - e a realização desta no exercício seguinte (2009) não podem ser considerados, pois de acordo com a Lei com a Lei 4.320/64, art. 35, pertencem ao exercício financeiro as receitas nele arrecadas e as despesas nele legalmente empenhadas. Portanto, são receitas do exercício de 2008 somente aquelas efetivamente ingressadas nos cofres da municipalidade naquele exercício.

 

Acrescentou-se, também, que a mera expectativa de receita, representada pela contabilização de “Créditos” (R$ 1.190.000.00) no Balanço Patrimonial, não afetaria o resultado orçamentário e financeiro.  A esse respeito, ressaltou a Instrução que este Tribunal de Contas discorda da forma de contabilização de direitos a receber, nos moldes apresentados pela Unidade, e que tal posição encontra amparo na Portaria STN/SOF n. 03/2008.

 

De minha parte, observo que a Prefeitura registrou no Comparativo da Receita Orçada com a Arrecada – Anexo 10 da lei 4.320/64, apenas a receita de transferida pelo do Estado, por conta do objeto acordado, na importância de R$ 810.000,00, o que demonstra que do ponto de vista orçamentário a receita foi reconhecida pelo regime de caixa (art. 35 da Lei 4.320/64), da mesma forma para despesa oriunda do contrato foi aplicado o regime de competência, tanto que o resultado foi deficitário ao final do exercício (R$ 1.007.607,03).

 

Entende a parte Técnica haver restrição quanto ao lançamento no Ativo Permanente do Balanço Patrimonial, na conta “Créditos”, da importância não repassada durante o exercício de 2008. Contudo, creio que do ponto de vista do Município, a inscrição foi uma forma de demonstrar a “possível” existência de garantia financeira para a inscrição de Restos a Pagar não Processados inerentes a despesas empenhadas e não liquidadas, por conta da continuidade da realização da obra de infra-estrutura turística, conforme Edital de Concorrência Pública n. 01/2008 de 05/05/2008, fls. 14 a 28. Nesse sentido, não vejo como o incorreto o procedimento contábil realizado, até porque não se evitou o déficit orçamentário e financeiro.

 

Sobre o que se apresenta, convém destacar que o art. 35 da Lei n. 4.320/64 refere-se ao regime orçamentário e não ao regime contábil (patrimonial). Este último é tratado em título específico da citada lei, no qual se determina que as variações patrimoniais devam ser evidenciadas, sejam elas independentes ou resultantes da execução orçamentária, a saber:

 

Título IX – Da Contabilidade

[...]

Art. 85. Os serviços de contabilidade serão organizados de forma a permitirem o acompanhamento da execução orçamentária, o conhecimento da composição patrimonial, a determinação dos custos dos serviços industriais, o levantamento dos balanços gerais, a análise e a interpretação dos resultados econômicos e financeiros.

[...]

Art. 89. A contabilidade evidenciará os fatos ligados à administração orçamentária, financeira, patrimonial e industrial.

[...]

Art. 100. As alterações da situação líquida patrimonial, que abrangem os resultados da execução orçamentária, bem como as variações independentes dessa execução e as superveniências e insubsistências ativas e passivas, constituirão elementos da conta patrimonial.

[...] 33

Art. 104. A Demonstração das Variações Patrimoniais evidenciará as alterações verificadas no patrimônio, resultantes ou independentes da execução orçamentária, e indicará o resultado patrimonial do exercício.”(Grifo não consta no original)

 

Inclusive, esse é o entendimento da atual Contabilidade Púbica, conforme se verifica no Manual de Contabilidade Aplicado ao Setor Público, válido para o exercício de 2011, conforme a Portaria Conjunta STN/SOF n. 4, de 30 de novembro de 2101:

 

Observa-se que, além do registro dos fatos ligados à execução orçamentária, deve-se a evidenciação dos fatos ligados à administração financeira e patrimonial, de maneira que os fatos modificativos sejam levados à conta de resultado e que as informações contábeis permitam o conhecimento da composição patrimonial e dos resultados econômicos e financeiros de determinado exercício.

Nesse sentido, a contabilidade deve evidenciar, tempestivamente, os fatos ligados à administração orçamentária, financeira e patrimonial, gerando informações que permitam o conhecimento da composição patrimonial e dos resultados econômicos e financeiros.

Portanto, com o objetivo de evidenciar o impacto no patrimônio, deve haver o registro da variação patrimonial aumentativa, independentemente da execução orçamentária, em função do fato gerador, observando-se os princípios contábeis da competência e da oportunidade.

 

 

Superada esta parte, passo a análise dos fatos que deram origem ao déficit orçamentário, qual seja um “Contrato de apoio financeiro vinculado a um projeto a ser financiado pelo Governo do Estado, por meio do Funturismo, o qual não veio a se efetivar nos moldes acordados pelas partes. O resultado foi o registro de uma expectativa de receita e a inscrição de Restos a Pagar não processados, ambos no Balanço Patrimonial do exercício.

 

As evidenciações contábeis citada fizeram sentido na oportunidade, pois assinado em 04 de junho de 2008, o contrato previa em sua cláusula décima quarta a vigência de 12 meses, o que representaria a possibilidade de repasse dos recursos até o exercício de 2009. Ainda, considerando o princípio da anualidade orçamentária e a existência de dotação para realização da despesa, já aprovada pelo Legislativo, por si só justificariam o registro contábil no ano de 2008. Essa situação não é argumento suficiente para se concluir que o gestor público deixou de observar o princípio do equilíbrio orçamentário, como entende a parte Técnica, até porque as “obrigações de despesas”, incorporadas ao Patrimônio municipal, em essência, não se configuram como tal. O que se criou foi a possibilidade de compromissos futuros, ou seja, não se efetuou nenhum pagamento por conta do recebimento de bens e serviços no exercício de emissão do empenho, o mesmo se deu no período seguinte (2009), o que levou a administração municipal a  anulação dos Restos a Pagar não Processados.

  

Com base nesse raciocínio, verifico que o gestor público está tendo suas contas rejeitas em função de “despesas figurativas” que, embora com previsão de realização, não chegaram a se efetivar, por conta da falta de cumprimento do contrato que previa o repasse de recursos financeiros. Essa situação, conforme se apresenta, não caracteriza a emissão de empenhos sem critérios por parte do gestor público. Em realidade as despesas empenhadas e não liquidadas estavam amparadas em expectativa de receita e passaram pelo devido processo licitatório.

 

Também não vejo como adequado punir o gestor pela falta de cancelado das despesas empenhadas e não liquidadas ao final do exercício de 2008, pois conforme afirmação da área Técnica, a Unidade não teria incidido em déficit orçamentário se assim procedesse, :

 

É verdade que se o Município seguisse as orientações repassadas pela Diretoria de Municípios, por meio do ofício 19.033/2008, as despesas empenhadas e não liquidadas sem cobertura financeira seriam canceladas e o déficit orçamentário não existiria.

 

 Observo que opção do gestor municipal foi pela observância do regime de competência para despesa e de caixa para a receita, porém, visando compensar a não correspondência imediata de receita no Patrimônio, estrategicamente, optou por incluí-las como “Créditos” em conta do Balanço Patrimonial – Anexo 14 da Lei n. 4.320/64, o que do ponto de vista orçamentário não alterou o resultado do exercício, apenas trouxe mais transparência para contabilidade do Ente, o que é admissível.

 

O que não considero justo é o ex-prefeito Municipal ser prejudicado na análise de suas contas por observar a norma contábil legal (art. 35 da Lei 4.320/64), a qual é superior à orientação da Diretoria de Controle dos Municípios, dada pelo Ofício n. 19.033/2008. Em realidade o Município possuía todo o contexto para aplicar a orientação técnica, haja vista cumprir com o requisito de ter despesa empenhada e não liquidada ao final de 2008.

 

Assim, caso deva ser aplicada punição ao gestor que esta seja em função deste não ter seguido a orientação técnica da DMU, que previa a possibilidade do cancelamento das despesas não liquidadas, e não pelo desequilíbrio entre despesa e receita orçamentária, decorrente do Contrato de Apoio Financeiro com o Governo do Estado que gerou uma expeditiva financeira não concretizada.

 

Ademais dos aspectos técnicos e legais ora tratados, é pertinente destacar o histórico do responsável, no que concerne a sua gestão orçamentária, relativa ao período de 2005 a 2007, em que não se verificou restrição quanto ao desequilíbrio orçamentário. 

 

Em minha opinião, o mais importante a ser verificado na situação sob exame seria a continuidade da obra, apesar da ausência de repasse dos recursos pelo Governo do Estado. Ainda, quais os prejuízos advindos de uma possível paralisação e as providências tomadas para viabilizar a completa realização da obra em termos financeiros e técnicos.

 

Diante do exposto considero justificável o déficit orçamentário, uma  vez que as despesas que lhe deram origem não caracterizam uma gestão irresponsável, mas compromissos assumidos que não se cumpriram por motivos justificáveis. Assim sendo, discordo do parecer técnico e acompanho o posicionamento do Procurador pela reformulação do Parecer Prévio n. 277/2009, que recomendou a rejeição das contas do Município de Imoerê relativas ao exercício de 2008.

 

Registro que as considerações anteriormente tecidas se aplicam ao déficit financeiro do Município (consolidado), até porque o responsável justificou-se nos mesmos termos já apresentados.

 

Em relação às demais restrições, que mereceram ressalvas e recomendações quando da apreciação das contas pelo Egrégio Tribunal Pleno, após análise técnica restaram mantidas. A esse respeito, creio que não cabem mais considerações de minha parte, tendo em vista que a defesa apresentada não trouxe fatos novos que pudessem elidir as irregularidades formuladas, de forma que neste caso acompanho o posicionamento da parte Técnica deste Tribunal.

3. VOTO

 

 

Diante do exposto, proponho ao Egrégio Tribunal Pleno a adoção da seguinte deliberação.

 

3.1. Conhecer do Pedido de Reapreciação do Sr. Laercio Vicente Lazzari, nos termos dos arts. 55 da Lei Complementar n. 202/2000 e 93, inciso I, do Regimento Interno (Resolução nº TC-06, de 28 de dezembro de 2001), interposto contra o Parecer Prévio nº 0277/2009, exarado na Sessão Ordinária de 16/12/2009, e, no mérito, dar-lhe provimento parcial, modificando referido parecer prévio, para:

 

3.1.1. Recomendar à Egrégia Câmara Municipal de Iomerê, a aprovação das contas do exercício de 2008, dada Prefeitura Municipal de Iomerê.

 

3.1.2. Manter os demais termos da Deliberação Recorrida, itens 6.2.1, 6.2.2, 6.2.3, 6.2.4 e 6.3.

 

3.2. Dar ciência dada Decisão, Relatório e Voto do Relator, Parecer do MPTC e Parecer da Consultoria Geral ao Sr. Laercio Vicente Lazzari e à Prefeitura Municipal de Iomerê.

 

 

Florianópolis, em 15 de fevereiro de 2011.

 

 

CÉSAR FILOMENO FONTES

CONSELHEIRO RELATOR