ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO

Gabinete do Conselheiro Adircélio de Moraes Ferreira Junior

PROCESSO Nº

TCE TC000520182

UNIDADE

Câmara Municipal de Cocal do Sul

INTERESSADO

Sr. José Ivanor Zanette

ASSUNTO

Tomada de Contas Especial

VOTO Nº

GC/AMFJ/2010/278

 

 

 

TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. DIÁRIAS.

Os gastos efetuados a título de diárias devem observar os valores fixados e o tempo de permanência fora da sede, com consequente comprovação regular da despesa.

RESPONSÁVEL. FALECIMENTO. CITAÇÃO. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. HERDEIROS. ARQUIVAMENTO.

Verificada a ausência de citação do responsável falecido, a citação tardia dos herdeiros, quando já passados mais de dez anos da ocorrência dos fatos tidos como irregulares, inviabiliza o exercício do contraditório e torna imperativo o arquivamento do processo por falta de pressuposto de desenvolvimento válido.

 

 

 

RELATÓRIO

 

 Tratam os autos de Tomada de Contas Especial derivada da conversão do processo DEN TC0005201/82, denúncia encaminhada por José Ivanor Zanette, à época Vereador da Câmara Municipal de Cocal do Sul.

Os termos da denúncia[1] deram ciência ao Tribunal de Contas das possíveis irregularidades relacionadas a seguir:

·        à demissão indevida de servidores públicos e posterior contratação de empresas prestadoras de serviço, inclusive Cooperativa de Trabalho, Cooprorec – Cooperativa dos Profissionais da Região Carbonífera Ltda., terceirizando os cargos vagos;

·        locação de máquinas com a empresa Búrigo Comércio de Implementos Rodoviários Ltda., cujo contrato estabecera que as despesas com operador, abastecimento, trocas de óleo, filtros e pequenos reparos são por conta da Prefeitura[2];

·        despesas com viagens e diárias, totalizando nos nove primeiros meses um gasto de R$ 27.992,59.

 

Para corroborar os fatos acima elencados o denunciante fez a juntada de 12 Anexos[3].

Acompanhando proposta da Diretoria Especial de Auditoria e Serviços - DEA, expressa na Informação nº 035/98[4], esposada pelo Ministério Público junto ao Tribunal de Contas[5], o Tribunal Pleno decidiu:

1) Acolher a denúncia, determinando à Diretoria Especial de Auditoria – DEA a realização de auditoria especial na Prefeitura Municipal de Cocal do Sul, para apuração dos fatos denunciados, exceto no que tange aos contratos pertinentes às Cartas Convites nºs 64 66/97.

2) Dar ciência da decisão aos denunciantes[6].

 

No Relatório de Auditoria nº 040/98[7], a Diretoria de Auditorias Especiais conclui:

 - que a contratação das empresas Global Conservação e Limpeza Ltda., Centro Educacional Criciumense, G A Top Engenharia Ltda. e da Cooperativa dos Profissionais da Região Carbonífera Ltda. – COOPROREC foi realizada para dar continuidade aos serviços públicos até então exercidos por servidores municipais[8];

- pela realização de gastos indevidos com diárias pagas a maior, no valor de R$ 2.316,00[9];

 - pela afronta ao artigo 60 da lei nº 4.320/64, por ausência de prévio empenho[10];

- pela realização de despesas no montante de R$ 18.379,77 sem comprovação documental hábil[11];

- pela responsabilização do Sr. Jarvis Gaidizinski, ordenador de despesa à época[12].

Conforme Ofício TCE/DEA nº 12.796/98[13], o Relatório nº 040/98 fora encaminhado em diligência ao responsável.

Os termos do Relatório de Auditoria, bem como do próprio Ofício TCE/DEA nº 12.796/98, querem, equivocadamente, conferir à diligência características de uma citação.

Veja-se o que expressa a conclusão do Relatório de Auditoria nº 40/98:

De todo o exposto, sugere-se, nos termos dos artigos 109 a 113 do Regimento Interno deste Tribunal, que a autoridade municipal, retro-identificada, se manifeste a respeito, no prazo regimental, sob pena de confissão dos atos e fatos descritos, devidamente fundamentados e consubstanciados no presente Relatório.

 

Passando para o teor da diligência também se constata certo desvio de finalidade no seu manejo, como se verifica abaixo:

De acordo com o que prescreve a Lei Complementar nº 31 de 27/09/90, e o Regimento Interno desta Casa, arts. 100, 109 e 110, V. Sa. Tem o prazo de 30 (trinta) dias para apresentar a este Tribunal as informações, esclarecimentos e argumentações de defesa quanto ao apontado no citado Relatório, ou providências com vistas ao saneamento das restrições apuradas, a contar do recebimento do presente.

 

Não há como se conceber que o procedimento adotado, apesar de reclamar a defesa do responsável, tenha a validade de uma citação, sobretudo considerando as disposições regimentais referenciadas:

Art. 100 - Caso o funcionário incumbido de informar entender que o processo necessite de algum dado ou providência preliminar, indispensável à sua conveniente instrução, comunicará ao chefe ou titular do órgão ao qual estiver subordinado, que decidirá sobre o assunto, determinando providências, se for o caso, para a efetuação da respectiva diligência.

Art. 109 - O Tribunal ordenará as diligências que se fizerem necessárias, com vistas à adoção de providências em processo em exame, para sanear divergências e irregularidades ou solicitar documentos e informações complementares e indispensáveis à sua instrução.

Art. 110 - As diligências poderão ser feitas por despacho do Relator, por decisão da Câmara ou do Tribunal Pleno ou por iniciativa do próprio órgão instrutivo.

 

É flagrante, frente aos termos dos dispositivos regimentais, que a diligência não se presta para a satisfação do contraditório e da ampla defesa, para tanto, deveria ser utilizada a citação prevista no artigo 38 da LC 31/90 e no artigo 230 da Res. TC-11/91, cujas dicções são idênticas e assim redigidas:

Art. 38- Verificada irregularidade nas contas, o Relator ou o Tribunal:

I - definirá a responsabilidade individual ou solidária pelo ato de gestão inquinado;

II - se houver débito, ordenará a citação do responsável para, no prazo estabelecido, apresentar defesa ou recolher a quantia devida;

 

A distinção no presente caso é fundamental para deixar evidente que antes da ocorrência do falecimento do responsável, Sr. Jarvis Gaidzinski, não se efetivara a citação.

Resposta à diligência fora recepcionada nesta Corte em Contas em 22 de dezembro de 1998, conforme documentos protocolados sob n. 031714[14], cuja síntese se circunstancia nos seguintes termos:

- há que se diferir governo e administração, para afastar a responsabilidade do Prefeito Municipal de Cocal do Sul por ter cumprido o seu dever de agente político;

- as ações perpetradas pelo Prefeito, concernentes à gestão de pessoal, tiveram amparo nas Leis n. 268/97 e n. 269/97;

- a extinção dos cargos declarados era uma situação jurídica agenciada pelo Governo Municipal, cumpria-lhe, simplesmente a sua execução;

- o disposto nas leis vincula o poder do Prefeito e a implementação da nova política dá a ele o poder discricionário para a prática de atos que atendam a finalidade da nova filosofia;

- a exoneração dos servidores se deu com as amarras de um ato vinculado;

- a denúncia pretende tratar servidores em estágio probatório como se estabilizados fossem;

- a Súmula 22 do STF estabelece que “O estágio probatório não protege o funcionário contra a extinção de cargo”;

- a inconstitucionalidade das leis deve ser tratada no foro próprio, não sendo papel do Poder Executivo;

- é indevido considerar que o agente político esteja praticando imoralidade ou ilegalidade ao executar uma lei;

- o apontamento de que a terceirização dos serviços não proporcionou economia para o erário municipal está calcada simplesmente no aumento de despesa, sem levar em consideração os resultados obtidos;

- a economicidade se deduz de uma análise dos gastos dos serviços em relação a seus resultados;

- o agente político jamais iria promover uma inovação política administrativa se não fosse com o espírito de economicidade, como sempre fez em sua vida particular;

- há um vínculo entre a lei e o agente político, não há meio termo, ou executa ou incorre em infração à lei;

- a contratação com cooperativa só ocorreu frente a cargos inexistentes, em razão da extinção, e teve como fundamento a política de substituição de vínculo.

Ao final, o ex-Prefeito Jarvis Gaidzinski, por meio de seu procurador, requereu a este Tribunal de Contas que considerasse o seguinte:

- a falta de pressuposto para a constituição valida e regular da denúncia, considerando que os atos praticados são imposição do governo (Poder Executivo e Poder Legislativo);

- o não cumprimento das leis importaria em infração ao ordenamento jurídico municipal;

- a denúncia tem o condão de estimular o agente político ao descumprimento de sua função de executar a lei, que, enquanto vigente, é imperativa;

- a política de substituição de vínculo não é ato instituído pelo agente político, mas pelo governo (Executivo e Legislativo).

Diante das informações prestadas houve nova manifestação da Diretoria de Auditorias Especiais – DEA, por meio do Relatório de Instrução n. 004/99[15], no qual conclui:

Tendo em vista que tramita nesta Casa outro Processo, DEN-269501/73[16], que enfoca a questão da extinção de cargos públicos e a consequente exoneração dos servidores que os ocupavam, em razão de ilegal e indevida política de terceirização de atividades administrativas, as recomendações correlatas deverão constar da Conclusão do Relatório pertinente àqueles autos. Do exposto e consubstanciado no exame in loco, entende a Diretoria Especial de Auditorias e Serviços –DEA que possa este Tribunal conhecer o presente Relatório propugnando-se pelas seguintes recomendações:

A)     CONHECER E ANOTAR o Relatório de Auditoria Especial realizada na Prefeitura Municipal de Cocal do Sul, com abrangência ao exercício de 1997;

B)      JULGAR IRREGULARES os Atos Administrativos de responsabilidade do Sr. Jarvis Gaidzinski, Prefeito Municipal:

b.1) Contrato n. 017/97, firmado com a COOPROREC – Cooperativa dos Profissionais da Região Carbonífera Ltda., relativo à ilegal e indevida terceirização de serviços públicos que constituam atividade fim da administração, por afronta ao artigo 37, II da Lex Fundamentalis. (Item 1.1.2 do presente relatório.);

c) JULGAR IRREGULARES, com imputação de débito, os Atos Administrativos de responsabilidade do SR. Jarvis Gaidzinski, Prefeito Municipal:

c.1) despesas com pagamento de diárias, efetuadas a maior em relação aos valores previstos pelo Decreto Executivo Municipal n. 43/96, importando em 2.542,8195 UFIRs (R$2.316,00). (Item 2.1.1);

c.2) despesas sem comprovação, afetas a diárias, da ordem de 20.179,8088 UFIRs (R$18.379,77), resultando no descumprimento aos artigos 57 e seguintes da Resolução n. TC 16/94. (Item 2.1.3);

d) APLICAR MULTA ao Sr. Jarvis Gaidzinski, Prefeito Municipal de Cocal do Sul, conforme artigo 77, III da Lei Complementar n. 31/90, em razão da prática de atos administrativos com grave infração a normas legais ou regulamentares, de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, em especial, desrespeitando o conjunto dos princípios constitucionais:

d.1) pela utilização de instrumento indevido para demitir funcionários concursados, em razão da adoção de política de terceirização de serviços públicos constitutivos da atividade-fim da administração pública, contrário ao dispositivo perfilado no artigo 37, caput da Constituição Federal. (Itens 1.1.1 e 1.1.2);

d.2) pela existência de cargos técnicos, de provimento efetivo, contemplados como de comissão, na organização administrativa da Prefeitura. (Item 1.1.4);

d.3) pela realização de despesas sem prévio empenho – afronta ao artigo 60 da Lei Federal n. 4.320/64. (Item 2.1.2);

e) DETERMINAR:

e.1) ao Poder Executivo, a imediata anulação dos atos administrativos contratuais, por afronta aos dispositivos constitucionais contidos no art. 37, caput e inciso II;

e.2) ao Poder Legislativo Municipal que fiscalize a aplicação da determinação inserta no item anterior, comunicando a este Tribunal;

 

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, conforme Parecer PG n. 105/99[17], da lavra do então Procurador César Filomeno Fontes, acompanhou os termos do parecer do órgão instrutivo.

Em cumprimento à determinação do Relator à época, Conselheiro Dib Cherem[18], os autos foram encaminhados à Consultoria Geral, considerando a superveniência da morte do responsável, Senhor Jarvis Gaidzinski.

A Consultoria Geral, por meio do parecer de n. 250/2003[19], propôs o seguinte encaminhamento:

1. Determinar que a Diretoria de Denúncias e Representações – DDR, apure a responsabilidade individual e ou solidária dos valores referentes ao pagamento de diárias a maior, especificadas no quadro de fls. 457, do processo de Denúncia DEN. TC.0005201/82.

2. Determinar, após apuradas as responsabilidades, a conversão do processo de Denúncia em Tomada de Contas Especial, a teor do disposto no art. 98 e seus parágrafos, do Regimento Interno, Resolução TC 06/2001, tomando as providências necessárias para reparação dos danos causados.

 

Após a manifestação do órgão consultivo mais uma vez o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas se manifestara nos autos, opinando no Parecer n. 0944/2003[20] pelo arquivamento dos autos, haja vista a impossibilidade de responsabilizar o Sr. Jarvis Gaidzinski, dado o seu falecimento. Aduz, ainda, em favor do arquivamento o tempo de paralisação do processo e o lapso temporal que decorre dos fatos denunciados e sua apuração.

Em razão das manifestações da Consultoria Geral e do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, bem como, considerando o disposto no artigo 10 da LC n. 202/00, o Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall, funcionando como Relator nos autos, determinou que a Diretoria de Denúncias e Representações – DDR procedesse à apuração da responsabilidade relacionada aos pagamentos de diárias e a conversão dos autos em Tomada de contas Especial[21].

A Juíza de Direito Ana Lia Barbosa Moura V. L. Carneiro, em atenção ao Ofício TCE/DDR n. 09.085/03[22] informou por meio do ofício 02000/2003[23] que o inventariante nos autos de n. 020.02.020757-3 é o Senhor Jarvis Gaidzinski Filho.

Em razão da reestruturação administrativa a Diretoria de Denúncias e Representações – DDR fora extinta, cabendo a instrução dos autos da denúncia à Diretoria de Controle de Municípios.

Por meio do Relatório n. 2.686/2007[24], a DMU manifesta-se no sentido de que se promova a conversão dos autos de denúncia em Tomada de Contas Especial com posterior citação de ex-Secretários Municipais, e ex-Chefe de Gabinete, bem como dos herdeiros do Sr. Jarvis Gaidzinski, o que foi acolhido e determinado pelo Relator Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall[25].

O Senhor José dos Passos Demos apresenta sua defesa[26], assim como o Senhor Jorge Bernardini Serafim[27], alegando este último, dificuldades na obtenção de documentos junto à Prefeitura Municipal de Cocal do Sul.

No Relatório de número 4.514/2007[28] a DMU propugna pela citação do Sr. Alexandre Gaidzinski e da Sra. Greice Carneiro Menezes Gaidzinski e, no Relatório n. 2.122/2008[29] a citação do inventariante, Sr. Jarvis Gaidzinski Filho, todas autorizadas pelo Relator[30].

Devidamente citado, o Senhor Zenor Calegari Fragnani faz prova do pagamento ao Município de Cocal do Sul da importância recebida a maior, no valor de R$ 320,00[31].

Cumpre anotar que a citação dirigida ao espólio, na pessoa do Sr. Jarvis Gaidzinski Filho referiu a despesas efetuadas com pagamentos de diárias, efetuadas a maior em relação aos valores previstos pelo Decreto Executivo Municipal n. 43/96, importando em R$ 1.238,00.

A defesa apresentada pelo Sr. Jarvis Gaidzinski Filho cingiu-se na afirmação de que as despesas são legítimas porque pertinentes ao normal e regular exercício da função executiva local.

Em novo Relatório, esse de número 6.531/2008[32], A Diretoria de Controle de Municípios, com base em dados constantes no Sistema de Auditoria em Contas Públicas – ACP, apresenta um elenco de despesas que entende afetas a diárias, da ordem de R$ 18.379,77, razão pela qual sugere a citação do espólio para que comprove a regularidade da despesa, razão pela qual se faz a citação da inventariante Karina Gaidzinski.

No Relatório derradeiro, de número 4.605/2009, conclui a DMU pelo seguinte encaminhamento:

1. Conhecer do presente Relatório de Reinstrução, decorrente dos Relatórios n. 2.686/2007 e n. 6.531/2008, resultante da inspeção in loco realizada na Prefeitura Municipal de Cocal do Sul, para, no mérito:

2. Julgar irregulares;

2.1 com débito, na forma do artigo 18, inciso III, alínea “c” c/c o artigo 21 caput da Lei Complementar n. 202/2000, as contas referentes à presente Tomada de Contas Especial e condenar os Responsáveis, abaixo relacionados, ao pagamentos das quantias indicadas, fixando-lhes o prazo de 30 (trinta) dias a contar da publicação do acórdão no Diário Oficial do Estado para comprovarem, perante este Tribunal, o recolhimento dos valores dos débitos aos cofres públicos municipais, atualizados monetariamente e acrescidos dos juros legais (artigos 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), calculados a partir da data da ocorrência até a data do recolhimento sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (artigo 43, II da Lei Complementar n. 202/2000):

Espólio do Sr. Jarvis Gaidzinski na pessoa da Inventariante Sra. Karina Gaidzinski, CPF 582.895.009-63, residente a Rua Haddoc Lobo, n. 337, 7º andar, Edifício Apolo I, São Paulo, CEP 01414-001, referente a restrição contida nos itens 2.1.1 e 2.1.2, abaixo:

2.1.1 Despesas com pagamentos de diárias, efetuadas a maior em relação aos valores previstos pelo Decreto Executivo Municipal n. 43/96, importando em R$1.238,00 (item 1.1.1.1, deste Relatório);

2.1.2 Despesas sem comprovação, afetas a diárias, da ordem de R$ 18.379,77, resultando no descumprimento aos artigos 62 e 63 da Lei n. 4.320/64 c/c os artigos 57, 58 e 62 da Resolução n. TC 16/94 (item 1.1.2.1).

Jorge Bernardini Serafin – Secretário Municipal de Cocal do Sul no exercício de 1997, CPF 341.450.959-87, residente à Avenida Antônio Nunes de Souza, 208, Bairro Belo Horizonte, Cocal do Sul – SC, CEP 88845-000, referente a restrição contida no item 2.1.3, abaixo:

2.1.3 Despesas com pagamentos de diárias, efetuadas a maior em relação aos valores previstos pelo Decreto Executivo n. 43/96, importando em R$895,00 (item 1.1.1.2);

José dos Passos Demos – Chefe de Gabinete da Prefeitura de Cocal de Sul no exercício de 1997, CPF 245.023.919-72, residente à Rodovia Lino Zanoli, 488, Içara – SC, CEP 88820-000, referente a restrição contida no item 2.1.4, abaixo:

2.1.4 Despesas com pagamentos de diárias, efetuadas a maior em relação aos valores previstos pelo Decreto Executivo Municipal n. 43/96, importando em R$ 61,00 (item 1.1.1.3).

3. Dar ciência da decisão aos Denunciados: Sra. Karina Gaidzinski, Sr. Jorge Bernardini Serafin, Sr. Zenor Calegari Fragnani e Sr. José dos Passos Demos e ao Denunciante Sr. Ivanor Zanette.

 

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, em parecer da lavra do Procurador-Geral Adjunto, Marcio de Souza Rosa, de número MPTC 0471/2010[33], acompanha os termos do Relatório da área técnica.

Este o estado do processo.

 

FUNDAMENTAÇÃO

 

O processo em exame reporta a dispêndios realizados no ano de 1997, cuja atuação desta Corte de Contas se deu em razão de denúncia formalizada no início do ano de 1998.

Da ocorrência dos fatos à deliberação final decorrem mais de doze anos, sem olvidar do falecimento de um dos responsabilizados nos autos, o Senhor Jarvis Gaidzinski, em 2002.

Assim, entendo necessário discutir-se, preliminarmente, se no caso vertente, no que tange ao Senhor Jarvis Gaidzinski, há condições de desenvolvimento válido e regular do processo.

O tema em debate foi apresentado no XI Ciclo de Estudos de Controle Público da Administração Municipal, em 2009, de cuja livro se extrai o seguinte:

O Professor e ex-Conselheiro do TCDF Jorge Ulisses Jacoby Fernandes faz as seguintes considerações em decorrência do falecimento do responsável:

1) não isenta o interesse dos sucessores de promover a defesa de mérito; 2) isenta os sucessores do dever de pagar multa, em face do caráter personalíssimo de que este se reveste; 3) não inibe o dever de recompor o erário quando já comprovada a irregularidade, até o limite da herança; 4) deve ser documentado, com a juntada, à defesa, da respectiva certidão de óbito; 5) não podem os sucessores procrastinar a abertura do inventário para evitar o pagamento; 6) se anterior à citação, poderá implicar em arquivamento do processo, por ausência do pressuposto de desenvolvimento válido e regular. O tema, na forma como hoje se apresenta na jurisprudência, ainda não encontrou seguro equacionamento. Aliás, pouco servem as noções de direito civil e penal, nesse ponto, à esfera do controle, mas é possível assentar que: I - em relação às penalidades, é regra que as mesmas não passam da pessoa do condenado; II - em relação ao dever de reparar o dano, o mesmo estende-se aos herdeiros e sucessores apenas até o limite das forças da herança, se: - o falecimento ocorre após garantida a ampla defesa e o contraditório; - houve apropriação indébita[34].

Em outras palavras, o Professor Jacoby Fernandes sustenta o arquivamento do processo se o direito ao contraditório e à ampla defesa não se deram pelo administrador ou responsável falecido, tendo por premissa que não há no caso, possibilidade de se estabelecer uma relação processual valida, já que malferidos os indigitados princípios do contraditório e da ampla defesa, maculando irremediavelmente o processo.

Além dessa corrente doutrinária, há outra defendida pelo Auditor do TCU Augusto Sherman Cavalcanti[35].

A base da tese defendida por Cavalcanti está centrada na tridimensionalidade do processo de contas, que ele subdivide nas dimensões política, sancionatória e indenizatória. Em síntese, à primeira atribui a primazia de informar à sociedade quanto à gestão dos recursos públicos, se estão sendo bem ou mal utilizados os recursos financeiros compostos em sua maioria pela arrecadação de tributos. Na segunda dimensão prevalece o caráter punitivo a inferir sobre o gestor faltoso, sanção esta de caráter personalíssimo e, por fim, à terceira, dimensão indenizatória, centra-se a persecução do ressarcimento do dano ao erário.

Considerando as três vertentes inerentes ao julgamento de contas, Cavalcanti faz incidir exclusivamente na sancionatória a impossibilidade, via de regra, de se dar prosseguimento ao processo ou à sua execução conforme a fase em que o mesmo se encontra.

Nas dimensões política e indenizatória sustenta como devido o curso do processo de julgamento de contas frente ao falecimento do administrador ou responsável. Na dimensão política em razão de o destinatário principal do resultado do julgamento ser a coletividade, que é ciosa da ciência quanto à gestão boa ou má dos recursos que lhe pertencem. Quanto à dimensão indenizatória sustenta que “por força de edito constitucional, a responsabilidade patrimonial de reparar eventual dano causado ao erário transfere-se do gestor falecido aos sucessores, na medida do patrimônio recebido. Dessa maneira, é de mister que, mesmo após a morte do gestor, o processo prossiga seu curso a fim de que também essa dimensão se concretize.”

Merece destaque o comentário feito por Cavalcanti acerca da hipótese atinente à má gestão com a ocorrência de dano:

De pronto, esclareça-se que, nessa hipótese, a defesa e o contraditório, em tese, não ficam prejudicados com a morte do gestor e o processo pode prosseguir sem obstáculos, uma vez que os sucessores podem ser chamados a integrar o pólo passivo da relação processual, tendo em vista que a eles se estende a responsabilidade de reparar o dano, na medida do patrimônio recebido. Ressalve-se que, em situações específicas, pode ficar demonstrada a impossibilidade fática de os sucessores se defenderem, inviabilizando o contraditório. Os Tribunais de Contas, nesses casos excepcionais, poderão arquivar o processo, sem julgamento, por falta de pressuposto de desenvolvimento válido[36].

Nota-se a escolha pela prudência no trato das questões pertinentes ao julgamento de contas e a morte do administrador ou demais responsáveis. É flagrante a ponderação entre os deveres constitucionalmente postos de bem gerir e de prestar contas que recaem sobre os gestores de recursos públicos, e os princípios do contraditório e da ampla defesa, imprescindíveis para assegurar o desenvolvimento válido do processo.

Diante disso, a solução passa necessariamente pelo minucioso exame do caso específico, afastando-se a criação de regra geral a determinar o arquivamento de todos os julgamentos de contas em que o evento morte do administrador ou demais responsáveis se apresente ao Tribunal de Contas antes da resposta à citação, contrariamente ao defendido por Jacoby Fernandes.

De acordo com manifestação plenária do Decano Salomão Ribas Junior, Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, a Corte de Contas Catarinense em distintas ocasiões se manifestara ora em um sentido, ora em outro, para sustentar a viabilidade de trazer os herdeiros do administrador falecido, na condição de jurisdicionados, para a relação processual de julgamento contas, conforme os processos nº REC 05/00828768[37] e REC 05/04196766[38].

 

Do exame do contexto dos autos verifica-se que não houve a citação ao Senhor Jarvis Gaidzinski antes do seu falecimento, com o agravo de que a citação inicial feita ao inventariante ocorreu quando passados mais de dez anos da ocorrência dos fatos, e a última, que traz inovação ao exigir comprovantes de despesas afetas a diárias, levantadas com base no Sistema de Auditoria em Contas Públicas – ACP, realizou-se em fevereiro de 2009, portanto, quando já transcorridos treze anos da prática dos fatos.

Frente ao histórico do processo, dada à distância temporal que separa a oferta do contraditório e ampla defesa e a realização das despesas concebidas como irregulares, concluo restar prejudicado o processo no que pertine à responsabilização dos herdeiros do Senhor Jarvis Gaidzinski.

As despesas apontadas como irregulares pagas ao Senhor Jorge Bernardini Serafin, por sua vez, estão centradas nos empenhos números 66, 103, 429, 1623, 1803, 2284, 2663 e 3635, devido ao pagamento de pernoite sem a devida comprovação.

As alegações de defesa apresentadas e os documentos juntados não apresentam pertinência com a restrição feita, pois se tratam de um Diploma referente ao XXVI Programa Brasília/Miami de Política, Administração Pública, Educação e Saúde, realizado em Miami; um ato de nomeação para o cargo de Secretário Municipal; um certificado de visita expedido pelo Metropolitan Dade County, na Florida; e outra cópia de Certificado de Participação Programa Brasília/Miami de Política, Administração Pública, Educação e Saúde, cuja data se encontra ilegível.

Verificada a impertinência dos comprovantes e alegações de defesa com as irregularidades apuradas, mantém-se o débito.

Quanto à responsabilidade do Senhor José dos Passos Demos, que monta R$ 61,00, referente à diferença a maior no pagamento de cinco diárias, o próprio responsabilizado anui com o pagamento do valor, conforme solicitação feita para viabilizar a recomposição do erário.

Por entender inoportuna a indicação do modo operacional para o pagamento do débito nesta fase processual, cabe dar seguimento ao julgamento dos autos, cuja deliberação firmará prazo para recolhimento do valor aos cofres municipais, bem como, constituirá título executivo extrajudicial, o que propicia ao responsabilizado o pagamento do débito.

 

 

PROPOSTA DE DECISÃO

 

 

VISTOS, relatados e discutidos estes autos, relativos à Tomada de Contas Especial pertinente a irregularidades praticadas no âmbito do Município de Cocal do Sul, no exercício de 1997.

Considerando que os Responsáveis foram devidamente citados, conforme consta nas fs. 508 e 509 dos presentes autos;

Considerando que não houve a citação em vida do Senhor Jarvis Gaidzinski e o decurso do tempo decorrido entre a ocorrência dos fatos e a citação dos herdeiros;

Considerando que as alegações de defesa e os documentos apresentados pelos Senhores Jorge Bernardini Serafin e José dos Passos Demos são insuficientes para elidir as irregularidades apontadas pelo Órgão Instrutivo, constantes do Relatório n. 4.605/2009, da Diretoria de Controle de Municípios;

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:

1. Julgar irregulares, com imputação de débito, com fundamento no art. 18, inciso III, alínea “c”, c/c o art. 21, caput, da Lei Complementar n. 202/2000, as contas pertinentes à presente Tomada de Contas Especial, que trata de irregularidades constatadas quando da auditoria realizada no Município de Cocal do Sul, com abrangência sobre despesas com diárias referentes ao exercício de 1997, em decorrência de Denúncia formulada a este Tribunal de Contas, e condenar os Responsáveis a seguir discriminados ao pagamento de débitos de sua responsabilidade, fixando-lhes o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovarem, perante este Tribunal, o recolhimento dos valores dos débitos aos cofres do Município atualizados monetariamente e acrescidos dos juros legais (arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), calculados a partir das datas de ocorrência dos fatos geradores dos débitos, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, II, da Lei Complementar n. 202/2000):

1.1. De responsabilidade do Sr. Jorge Bernardini Serafin, ex-Secretário Municipal de Cocal do Sul, CPF n. 341.450.959-87, o montante de R$ 895,00, referente a despesas com pagamento de diárias a maior, em descumprimento ao estabelecido no Decreto Municipal n. 43/96, (item 1.1.1.2 do Relatório DMU);

1.2. De responsabilidade do Sr. José dos Passos Demos, ex-Chefe de Gabinete da Prefeitura de Cocal do Sul, CPF n. 245.023.919-72, o montante de R$ 61,00, referente a despesas com pagamento de diárias a maior, em descumprimento ao estabelecido no Decreto Municipal n. 43/96, (item 1.1.1.3 do Relatório DMU);

2. Afastar a responsabilidade dos herdeiros do Senhor Jarvis Gaidzinski, dada à impossibilidade fática de seus sucessores se defenderem, inviabilizando o contraditório, o que prejudica o desenvolvimento válido e regular do processo.

3. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Relatório n. 4.605/2009 da DMU ao Denunciante no Processo n. DEN-TC0005201/82, ao Sr. Jorge Bernardini Serafin, ex-Secretário Municipal de Cocal do Sul, ao Sr. José dos Passos Demos, ex-Chefe de Gabinete da Prefeitura de Cocal do Sul, aos herdeiros do Senhor Jarvis Gaidzinski, e ao Prefeito Municipal de Cocal do Sul.

4. Determinar o arquivamento dos autos.

 

Gabinete, em 14 de setembro de 2010.

 

 

 

Adircélio de Moraes Ferreira Junior

Conselheiro Relator

 



[1] Fls. O2 - 05.

[2] Fl. 219, Cláusula Quarta do contrato nº 019/97.

[3] Fls. 07 – 323.

[4] Fls. 324 – 328.

[5] Conforme Parecer PG nº 257/98, fl. 330.

[6] Fl. 332.

[7] Fls. 335 – 389.

[8] Fls. 364 a 367.

[9] Fls. 384 – 385.

[10] Fls. 385 – 386.

[11] Fls. 386 – 387.

[12] Fl. 387.

[13] Fls. 390.

[14] Fls. 392 – 402.

[15] Fls. 403 – 462.

[16] Decisão n. 2305/2003 - O TRIBUNAL PLENO, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1° da Lei Complementar n. 202/2000, decide: 6.1. Determinar o arquivamento dos presentes autos tendo em vista o falecimento do Responsável pela restrição apontada pelo Órgão Instrutivo e o caráter personalíssimo da multa a que estaria sujeito o infrator, na forma do art. 5º, XLV, da Constituição Federal.

6.2. Dar ciência desta Decisão, do Relatório e Voto do Relator que a fundamentam, bem como do Parecer COG n. 249/2003, ao Denunciante e ao espólio do Denunciado.

[17] Fls. 464 – 465.

[18] Fl. 466.

[19] FL. 467 – 470.

[20] FLs. 471 – 472.

[21] FL. 473.

[22] Fl. 475.

[23] Fl. 477.

[24] FLs. 488-496.

[25] Fls. 498-499.

[26] Fl. 513.

[27] Fls. 514-518.

[28] Fls. 520-528.

[29] Fls. 553-560.

[30] Fls. 530 e 562.

[31] 544 e 545.

[32] 573-582.

[33] Fls. 603-605.

[34]Fernandes, 2005, p. 558.

[35]CAVALCANTI, Augusto Sherman. Aspectos da Competência Julgadora dos Tribunais de Contas. Disponível em: http://www.tc.df.gov.br/MpjTcdf/imagens/sherman/sherman.PDF. Acesso em 21/03/09.

[36] Op. cit., p. 09.

[37]Acórdão n. 1081/2006, de 19/04/2006.

[38]Acórdão n. 2425/2006, de 22/11/2006.