TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
GABINETE DO AUDITOR GERSON DOS SANTOS SICCA
PROCESSO N.º: REC - 02/00051059
UNIDADE GESTORA: COMPANHIA DE HABITAÇÃO DO ESTADO DE SC -COHAB-
RESPONSÁVEL: CELSO JOSÉ PEREIRA
ASSUNTO: RECURSO DE RECONSIDERAÇÃO (ART. 77 DA LC Nº 202/2000) DA DECISÃO EXARADA NO PROCESSO BLA 0263309/89
RELATÓRIO
O presente processo trata de Recurso de Reconsideração (artigo 77 da LC nº 202/00) interposto pelo Sr. Celso José Pereira, ex-Presidente da Cohab, a respeito do Acórdão nº 0552/2001, oriundo do Processo BLA 0263309/89, que tratava da análise do Balanço Geral da Companhia relativo ao exercício de 1997, através do qual o recorrente requereu que o recurso fosse conhecido e julgado provido, com a anulação da pena imposta e aprovação das contas (fls. 13).
Eis o conteúdo parcial do Acórdão impugnado:
A Consultoria Geral analisou os autos através do Parecer COG - 567/2006 (fls. 45 a 55) e concluiu por conhecer o Recurso de Reconsideração e, no mérito, dar-lhe provimento para cancelar os débitos constantes dos itens 6.1.2 "a" e "b" do acórdão recorrido e ratificar os demais itens da Decisão nº 522/2001.
O MPTC, através do Parecer nº 63/2008 (fls. 56 a 61), manifestou-se "...pelo CONHECIMENTO do recurso interposto e pelo seu PROVIMENTO PARCIAL, para cancelar os débitos previstos nos itens 6.1.1, letra "b" e 6.1.2 letra "b" do Acórdão nº 522/2001", estendendo a decisão também ao Sr. José Luiz da Cunha.
A seguir traço um paralelo entre os apontamentos da Diretoria Técnica, que dão base às irregularidades ensejadoras das imputações de débito, as alegações constantes do recurso apresentado pelo Sr. Celso José Pereira e a manifestação do MPTC, e apresento ao final as conclusões que julgo pertinentes.
DISCUSSÃO e VOTO
Quanto ao pagamento, sem amparo legal, de Curso MBA para o Sr. Carlos Henrique Monguilhott, funcionário oriundo da ALESC e à disposição da Cohab, de acordo com a DCE foi um ato de liberalidade do Administrador, que infringiu o art. 154, § 2º, "a", da Lei nº 6.404/76 e feriu o Princípio da Legalidade insculpido no artigo 37, caput, da Constituição Federal:
De acordo com a DCE o pagamento criou um privilégio ao servidor beneficiado em relação aos demais empregados da Cohab, feriu os objetivos estatutários e não gerou retorno ou outro benefício à empresa, pois o Sr. Carlos Henrique Monguilhott retornou para a ALESC apenas 5 meses após a conclusão do curso.
A defesa que consta dos autos principais funda-se basicamente na suposição de que o Decreto Estadual nº 850/91 "autoriza o titular da entidade a conceder o benefício pecuniário, desde que plenamente caracterizada a necessidade de participação" e ainda no fato de que a atualização do quadro funcional era uma necessidade da empresa para manter-se no mercado e prestar bons serviços.
A DCE concluiu que não ficou caracterizada a real necessidade de participação do funcionário no curso de especialização promovido pela ESAG, que foi concedido um privilégio ao servidor da ALESC cedido à Cohab, e que, de acordo com o Princípio da Isonomia, o aperfeiçoamento profissional deveria ter se estendido a toda empresa, principalmente aos empregados pertencentes ao seu quadro, que poderiam dar um retorno do investimento por um prazo maior.
No recurso constam como razões, em suma, que:
a) quando o Sr. Celso José Pereira assumiu a presidência da Cohab (julho/1997) o benefício já estava sendo pago e sua interrupção traria prejuízos ao funcionário e à Administração;
b) todos os funcionários da Cohab tiveram oportunidade de ingressar no curso, desde que atendessem aos requisitos do edital de especialização; e
c) o Sr. Celso José Pereira não agiu com base em critérios personalíssimos ou excêntricos.
Registre-se que o Sr. Celso José Pereira não juntou nenhum documento que fizesse prova de seus argumentos.
Analisando a matéria, a Consultoria Geral considerou que o recorrente não infringiu o Princípio da Legalidade posto que a possibilidade de proporcionar aos funcionários a participação em curso de pós-graduação encontrava-se normatizada pelo Decreto Estadual nº 850/91.
Considerou também que não ficou caracterizado privilégio do funcionário Carlos Henrique Monguilhott em relação aos demais já que ele não foi o único a ter oportunidade, uma vez que outros funcionários vinculados à Cohab também participaram de cursos e outros eventos.
A COG considerou ainda que a necessidade de participação no curso ficou caracterizada na argumentação do recorrente de que havia muito tempo que os funcionários da Cohab não se reciclavam e que esta era uma necessidade para que a empresa se mantivesse no mercado e realizasse uma boa prestação de serviços.
Destaca-se ainda do parecer da COG:
O MPTC ressaltou que a imputação de débito teve como fundamento a violação do princípio da legalidade, já que não havia norma autorizativa, e que o Decreto Estadual nº 850/91, a despeito de trazer parâmetros mínimos a serem respeitados na edição de atos que autorizam o afastamento de servidores públicos para freqüentar cursos, seminários etc., não autoriza diretamente nenhum servidor a se afastar para participar e muito menos a realização de despesas para tal fim.
Acrescentou que não foram juntados documentos que demonstrem que a oportunidade foi concedida a todos os servidores e ainda que diante do tempo que o servidor ficou à disposição da Cohab após concluído o curso (5 meses e não 2 anos como asseverou erroneamente a Consultoria Geral) não se pode inferir que houve algum tipo de benefício à Unidade Gestora.
Por fim, de acordo com o MPTC, o fato do recorrente não ter autorizado inicialmente o afastamento do servidor para freqüentar o curso de especialização não afasta sua responsabilidade como ordenador primário dos pagamentos a ela relativos e ainda que diante da ausência de critérios mínimos para a concessão do benefício não há como considerar regular a realização das despesas em comento.
Com efeito, o Decreto nº 850/91 somente disciplina a edição de atos que autorizam o afastamento do servidor público para freqüentar cursos e/ou eventos congêneres, porém não autoriza diretamente a participação de nenhum servidor em curso.
Além disso, não constam dos autos quaisquer documentos que comprovem que dita autorização foi expedida, o que viola o Princípio da Legalidade, como asseverou a DCE, ou ainda que demonstrem os critérios para seleção do servidor participante ou que comprovem que outros servidores tiveram oportunidade semelhante, o que fere também o Princípio da Isonomia.
O fato do benefício já estar sendo pago quando o Sr. Celso José Pereira assumiu a presidência da Cohab não o isenta da responsabilidade pelos pagamentos efetuados, pois como ordenador primário à época era sua a responsabilidade de verificar a legalidade de seus atos.
Tendo em vista ainda que o Sr. Carlos Henrique Manguilhott permaneceu à disposição da Cohab somente 5 meses após a conclusão do curso, restou demonstrado que os pagamentos não se deram em prol do interesse público e sim para beneficiar diretamente o servidor em questão, que naquele momento assessorava o Presidente da empresa, restando caracterizada então a prática de ato de liberalidade às custas da companhia, que é vedada pelo artigo 154 da Lei nº 6.404/76.
Diante de tais evidências considero pertinente a imputação de débito aos responsáveis pelo pagamento irregular, conforme consta do item 6.2.1 "a" do acórdão nº 0550/2005, que deve ser mantido na íntegra.
Quanto ao pagamento de diferença de salário a dirigente da Cohab, este foi considerado irregular pela DCE por constituir agregação de diferença salarial e contrariar ao disposto no art. 37, XIV, da Constituição Federal. A Diretoria Técnica acrescentou ainda que os diretores não se encontravam no efetivo exercício de seus empregos de origem e nem eram submetidos a um único empregador, e que o procedimento impossibilitava a verificação da remuneração de acordo com o teto máximo fixado pelo Conselho de Política Financeira, o que, a princípio, configuraria excesso remuneratório.
No recurso apresentado o Sr Celso José Pereira reforça o entendimento, que já constava dos autos originais, de que o procedimento adotado estava de acordo com o artigo 13 da Resolução do Conselho de Política Financeira nº 006/81, vigente à época, e que pode ter ocorrido apenas um erro no código que identificava o referido pagamento.
A Consultoria Geral posicionou-se pelo cancelamento do débito imputado no Acórdão nº 552/2001 e acrescentou:
A COG acrescentou que não houve ofensa ao artigo 37, XIV, da CF, já que o que a Constituição Federal veda, nesse inciso, é que uma mesma vantagem seja repetitivamente computada sobre as demais vantagens. O legislador pretendeu tornar mais clara a norma proibitiva de cumulação de acréscimos pecuniários. Constata-se claramente não se tratar do caso ora em análise.
O MPTC constatou que o pagamento estava amparado no artigo 13 da Resolução do Conselho de Política Financeira nº 006/81, não se tratando da vedação imposta pelo artigo 37, XIV, da CF, que proíbe a incidência recíproca de adicionais ou vantagens pessoais em cascata, o que afasta a imputação de débito imposta ao recorrente.
Verifico que as razões apresentadas pelo recorrente podem ser acatadas, pois o artigo 13 da Resolução nº 006/81 previa expressamente a hipótese de complementação salarial, que foi paga na forma prevista.
De acordo com as alegações constantes do recurso, a complementação da remuneração era composta pelas verbas relativas a honorários + representação, que eram acrescidas das remunerações dos servidores em seus cargos originais (fl. 44).
Não se configura, portanto, infração ao disposto no artigo 37, XIV, da CF, já que, como bem assevera a representante do Órgão Ministerial, o dispositivo "(...) proíbe a incidência recíproca de adicionais ou vantagens pessoais em cascata, o que afasta a imputação de débito imposta ao ora recorrente".
Portanto, deve ser cancelado o débito imposto ao recorrente (item 6.1.2 "b" do Acórdão nº 0550/2005) e também ao Sr. José Luiz da Cunha, já que a motivação apresentada não se restringe à atuação pessoal do primeiro e pode ser aproveitada em favor do segundo (item 6.1.1 "b" do Acórdão nº 0550/2005).
Estando os autos instruídos na forma regimental, acolho a manifestação consignada no parecer do Órgão Ministerial, para sugerir ao Egrégio Plenário a seguinte proposta de Voto:
1. Conhecer do presente Recurso de Reconsideração, nos termos do art. 77 da Lei Complementar nº 202/00, interposto contra o Acórdão nº 0552/2001, exarado na Sessão Ordinária de 31/10/2001, nos autos da análise do Balanço Anual apresentado pela Cohab relativo ao exercício de 1997 - processo BLA 0263309/89 - e, no mérito, dar-lhe provimento parcial, cancelando os itens 6.1.1 "b" e 6.1.2 "b" da decisão recorrida.
2. Dar ciência deste Acórdão, do relatório e voto que o fundamentam, bem como dos Pareceres COG nºs 567/2006 e MPTC 63/2008, aos Srs. Celso José Pereira e José Luiz Cunha ex-Diretores-Presidentes da Cohab.
Gabinete do Relator, 06 de março de 2008.
Gerson dos Santos Sicca
Auditor