ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
GABINETE DO CONSELHEIRO WILSON ROGÉRIO WAN-DALL

 

Processo nº:

REC-02/04808650

Unidade Gestora:

Secretaria de Estado da Administração

Responsável:

Sr. Octávio René Lebarbenchon Neto

Assunto:

Recurso de Reexame (art. 80 da LC 202/2000) – APE-9495502/90

Parecer nº:

GC/WRW/2008/323/ES

 

Cargo técnico. Definição.

A Constituição da República não estabeleceu o conceito de cargo técnico ou científico, deixando tal tarefa aos cuidados do intérprete e do aplicador da lei.

 A jurisprudência já tem se posicionado por considerar como técnico não apenas os cargos de nível superior, mas também os de nível médio, com a condição de que se exija habilitação específica, em consonância com as atribuições do cargo, não bastando, portanto, apenas a conclusão do curso de 2º Grau.

Importa esclarecer que a nomenclatura do cargo não deve ser o principal critério definidor acerca do seu caráter técnico, devendo-se atentar para as funções que lhes são correspondentes, as quais estão descritas na legislação pertinente.

Cargo. Acumulação. Professor e Agente em Atividades de Saúde.

O cargo de Agente em Atividades de Saúde II, inserido no Anexo II, da Lei Complementar nº 81/93, pela Lei Complementar nº 93/93, exige habilitação específica para o exercício da função de Auxiliar de Enfermagem, cujas atribuições, estabelecidas pela lei estadual, evidenciam a necessidade de conhecimentos especializados pelo servidor, razão pela qual possui nítido caráter técnico, admitindo-se, por isso a sua acumulação com o cargo de professor, desde que haja compatibilidade de horários.

 

 

 

1.   RELATÓRIO

 

Cuidam os autos de Recurso de Reexame interposto pelo Sr. Octávio René Lebarbenchon Neto, à época Secretário de Estado da Administração, em face da Decisão n. 2.063/2001, proferida nos autos n. APE-9495502/90, que denegou o registro do ato de aposentadoria de servidora estadual, em virtude de a mesma acumular os cargos de Agente em Atividades de Saúde I e Professor.

 

A peça recursal foi examinada pela Consultoria-Geral, que, mediante o Parecer n. COG-381/06, entendeu que a intempestividade verificada poderia ser superada para que o recurso fosse conhecido. No que tange ao mérito, propôs que lhe fosse dado provimento.[1]

 

O Ministério Público, por sua vez, divergiu do órgão consultivo, propugnando o não-conhecimento do recurso, sob o argumento de o mesmo ser intempestivo.[2]

 

Este o breve relatório.

 

Conclusos os autos, passo à minha manifestação.

 

Com efeito, a decisão recorrida possui o seguinte teor:

 

“[...] O TRIBUNAL PLENO, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no artigo 59 da Constituição Estadual, no artigo 1° da Lei Complementar n° 202/2000, decide:

6.1. Denegar o registro, nos termos do art. 34, inciso II, c/c o art. 36, § 2º, "b", da Lei Complementar n° 202/2000, do ato aposentatório de Maria da Graça Rosa, servidora da Secretaria de Estado da Saúde, no cargo de Agente em Atividades de Saúde II, matrícula 240.181-9-01, nível ONO-II-10-A, PIS/PASEP nº (-), consubstanciado na Portaria n° 3574/1998, considerado ilegal conforme pareceres emitidos nos autos, por acumular os cargos de Agente em Atividades de Saúde II e Professor, contrariando o disposto no art. 37, inciso XVI da Constituição Federal, e no art. 24 da Constituição Estadual.

6.2. Determinar à Diretoria de Controle da Administração Estadual – DCE deste Tribunal que, após transitada em julgado a decisão, inclua na programação de Auditoria in loco na Secretaria de Estado da Administração, a averiguação dos procedimentos adotados decorrentes da denegação de registro de que trata o item 6.1 desta decisão.

6.3. Dar ciência desta decisão à Secretaria de Estado da Administração e à Secretaria de Estado da Saúde.”[3] Grifo nosso

Registro, de início, que acolho o entendimento do órgão consultivo para superar a intempestividade do presente recurso, de modo a viabilizar o seu conhecimento pelo Plenário deste Tribunal.

Concernente à matéria de fundo, o pronunciamento da Consultoria abordou com propriedade o tema debatido nos autos, qual seja, a possibilidade ou não de acumulação do cargo de Agente em Atividades de Saúde II com o de Professor.

Assim, adoto o entendimento da Consultoria como fundamento de minha manifestação, transcrevendo, a seguir o seguinte excerto do mencionado parecer:

“[...] Colhe-se da bem assentada razão recursal apresentada pelo recorrente, a síntese da posição firmada pela instrução do processo de registro do ato aposentatório, a qual ora reportamos:

 

a) Reporta-se ao seu Relatório n. 390/99 e afirma que não é técnica a natureza do cargo de Agente de Atividades de Saúde II, alegando que “A bem da melhor doutrina e do entendimento celebrado pelos nossos Tribunais, restringe este corpo instrutivo a interpretação dada ao dispositivo constitucional, celebrando que cargo técnico é aquele exercido por pessoa com conhecimento especializados de natureza técnica, científica ou artística, não sendo o Agente em Atividades de Saúde II detentor dessa qualificação”;

 

b) Insurge-se contra a tese de que a servidora está resguardada pelo direito adquirido “para acumular os cargos públicos”, assinalando que “É assente, dentre a doutrina predominante, bem como do entendimento jurisprudencial de nossa corte Constitucional, que contra norma de interesse coletivo - de ordem pública, não há o que se alegar direito adquirido”.

 

E arremata o corpo Instrutivo: “Ora, se a então Constituição Federal da República - Emenda Constitucional nº 1, de 17.10.69 não vedava a acumulação de cargos/empregos públicos prestados no âmbito da Administração direta e fundacional, entendeu a Constituição Cidadã de 05.10.88, por interesse coletivo, vedar expressamente tais acumulações de cargos, valendo-se neste caso, a regra da supremacia da nova ordem constitucional - norma de aplicação imediata”.

 

Em suas razões de recurso o recorrente busca distinguir a diferença existente entre o entendimento da instrução no tocante a consideração do cargo exercido pelo servidor, buscando esclarecer as funções desempenhas, a qual leva a considerar o cargo como sendo técnico na justa definição buscada pelo dispositivo constitucional apontado.

 

Neste sentido ressalta o recorrente que:

 

Diferentemente, o cargo de Agente de Atividades em Saúde II, assim denominado pela Lei Complementar nº 093, de 06 de Agosto de 1993, que alterou a Lei Complementar nº 81, de 1993, possui especificações constituídas de verdadeiros pressupostos para o provimento do cargo.

 

A habilitação profissional é especificada. Não basta ter concluído o 2º Grau. Para ser ocupante do cargo o servidor deve preencher requisitos indispensável, qual seja: formação na área de atuação.

 

Não existe cargo genérico de Agente de Atividades em Saúde II (como é o caso de Técnico em Atividades Administrativas). O provimento do cargo somente é legalmente admissível se o servidor estiver habilitado para exercer uma das seguintes atividades especificadas: (grifo do original).

 

[...]

 

Para exercer a atividade e, por conseqüência, para prover o cargo, o servidor deve comprovar:

 

A) Conclusão de Curso de 2º de formação na área de atuação , ou

B) Conclusão de Curso de 2º e curso de formação na área de atuação.

 

Trata-se na hipótese de condicionante para o exercício do cargo que embora possua uma designação genérica, em seu âmago exige o cumprimento de requisito, na hipótese, de profissão regulamentada.

 

Portanto, em se tratando do cargo de Agente em Atividades de Saúde II, configurado está o seu caráter, técnico, porque os eu provimento não é genérico, acessível por quaisquer indivíduos que comprovem a conclusão de curso de 2º (atual ensino Médio); ou é curso de 2º Grau Profissionalizante na área de atuação ou é curso de 2º Grau, complementado com curso de formação na área de atuação; não qualquer curso de formação mas curso reconhecido e pertinente à área em que desenvolverá suas atividades, segundo as hipóteses listadas, e não outras.

 

Essa exigência dá a nota discrepante. Caracteriza tratar-se de cargo técnico.

 

Verifica-se no relatório de auditoria que deu início a instrução do processo aposentatório, (fls. 20), análise do Anexo III da Lei Complementar Estadual 93/93, que trata da descrição e especificação do cargo de agente em atividades de saúde II, onde o Corpo Instrutivo transcreve o consignado em lei, relativo as funções inerentes a atividade de Auxiliar de Enfermagem correlata ao exercício da servidora em questão.

 

Referida Lei Complementar descreve as atividades desenvolvidas da seguinte forma:

 

DESCRIÇÃO SUMÁRIA: desenvolve atividades auxiliares na área dos serviços de saúde ligados à área técnica, laboratorial, sanitária e hospitalar, em geral no apoio aos técnicos de saúde.

 

A função de “auxiliar de enfermagem”, conforme bem colocado pelo recorrente em suas razões recursais, está ao abrigo da Lei Federal nº 7.498, de 25 de junho de 1986, que dispõe sobre a regulamentação do exercício da enfermagem, enquadrando como função técnica específica a função do enfermeiro, do técnico de enfermagem, e do auxiliar de enfermagem, funções regulamentadas que exigem conhecimento técnico específico em distintos níveis de instrução.

 

De sorte que, não se pode considerar a função desempenhada pela servidora aposentada como sendo mera função burocrática, uma vez que presente em sua habilitação (fls. 48), a exigência de conhecimentos específicos na área de atuação, reconhecida e regulamentada por lei federal.

 

Esta Consultoria Geral, mais recentemente teve a oportunidade de manifestar-se sobre o tema em resposta a consulta formulada pela Prefeitura Municipal de Catanduvas, Processo CON 05.00559414, emitindo o Parecer COG 167/2005, de onde se destaca:

 

Prejulgado 1644

 

A Constituição Federal em seu art. 37, inciso XVI, admite no máximo, havendo compatibilidade de horário, a acumulação remunerada de dois cargos, assim combinados: dois cargos de professor; um cargo de professor com outro técnico ou científico; dois cargos privados de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas.

 

Fere o permissivo Constitucional a acumulação de três cargos, exemplificadamente: dois cargos de professor e outro técnico ou científico.

 

A carga horária dos cargos acumulados, além de compatíveis, não deve ser superior a doze horas diárias ou sessenta horas semanais.

 

Na aferição quanto ao cargo ser técnico ou científico, despreza-se a sua nomenclatura e a forma de investidura, atentando-se para o aspecto inerente às suas atribuições, o qual, requerendo para o seu desempenho conhecimento específico na área de atuação do profissional, assumirá tal status. (grifamos).

 

A inviabilidade de acumulação envolvendo cargo de provimento comissionado com caráter técnico ou científico deverá se render à compatibilidade de horário, considerando, sobretudo, se as atribuições e responsabilidades do cargo permitem ao titular o afastamento dos afazeres que lhe são próprios para autuar concomitantemente no magistério.

 

O teto remuneratório é relativo ao respectivo ente federado e ao Poder ao qual se vincula, pois busca ajustar, no ente federativo e no respectivo Poder, uma racionalidade e um equilíbrio remuneratório, consentâneo com as atribuições e responsabilidades do cargo, emprego ou função, bem como se alia à capacidade arrecadatória do ente, que serve de parâmetro para estabelecer o seu poder remuneratório.[4]  

 

Baliza o entendimento adotado pelo parecer COG mencionado, decisões proferidas pelo STJ, que integram o corpo do mencionado parecer, das quais ora destaca-se:

 

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL ACUMULAÇÃO DE CARGOS. CARGO TÉCNICO. CONCEITUAÇÃO. AUSÊNCIA DE PROVAS. PRECEDENTES JURISPRUDÊNCIAS.

 

A despeito de o impetrante realmente não ter logrado demonstrar que o cargo por ele ocupado no respectivo instituto (Assistente de Administração) teria natureza técnica para os fins de acumulação com o cargo de professor por ele também exercido, a jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de que “cargo técnico” “...requer familiaridade com a metodologia empregada no exercício do mister, a fim de demonstrar conhecimento específico em uma área artística ou do saber...” (RMS 7570/PB, DJ 22.11.99, Rel. Min. Gilson Dipp). Nesse contexto, é inconstitucional a acumulação entre um cargo de natureza burocrática com outro de professos. Recurso desprovido.

Processo RMS 15660 / MT; Recurso Ordinário em Mandado de Segurança 2002/0159627-6. Relator: Ministro José Arnaldo da Fonseca.

 

Portanto, assim considerando, o cargo exercido pela servidora aposentada, cuja a função vem descrita na Lei Complementar 93/93, constituindo-se como atribuições regulamentadas pela Lei Federal nº 7.498, de 25 de junho de 1986, exige para seu desempenho formação técnica específica empregada no exercício da função desempenhada, enquadrável desta forma, como cargo técnico, tornando-se passível de acumulação com outro cargo de magistério, conforme permissivo Constitucional, estabelecido no artigo 37, inciso XVI, "b", da Lei Maior.

 

A adoção de tal entendimento, para o deslinde da questão é suficiente para rever a decisão atacada, tornando-se desnecessária nesta oportunidade a análise no tocante a questão periférica do Direito Adquirido.

 

Assim sugere-se que conheça do Recurso de Reexame proposto, para decidir por dar provimento, alterando a decisão enfrentada. [...]”[5]

Anoto, por oportuno, que este Tribunal, ao apreciar os autos n. REC-02/10606657 (Decisão n. 1078, de 23/05/2005), examinou situação idêntica e acolheu os termos do Parecer n. COG-30/05, que, em síntese, consignou o seguinte:

“[...] O texto constitucional em seu art. 37, inciso XVI, traz o balizamento para a análise da situação em tela, ao prescrever que:

Art. 37. Omissis.

[...]

XVI - é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o disposto no inciso XI:

a) a de dois cargos de professor;

b) a de um cargo de professor com outro, técnico ou científico;

c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas;

 

A redação do preceptivo transcrito permite inferir que os requisitos para a acumulação remunerada de cargos, especificamente no caso da servidora aposentada, seria a compatibilidade de horários e o caráter técnico ou científico do cargo de Agente em Atividades de Saúde.

 

O exame dos autos demonstra que a servidora se aposentou no cargo de Agente de Atividades de Saúde II (Portaria nº 3.558, de 26/11/98), sendo que concomitantemente ocupava o cargo de Professor III (Portaria nº 4.847/81/SE, de 14/12/81), cujo ingresso se deu mediante concurso público.

 

A ficha funcional da aposentada informa que a mesma exercia suas funções em regime de 40 horas semanais[6]. De outro lado, a Instrução afirma que a servidora também ocupa o cargo de Professor - nível MAG-08-E, com carga horária de 30 horas semanais[7], não sendo evidenciada nenhuma restrição em relação à incompatibilidade de horários, presumindo-se, dessa forma, que o Corpo Técnico desta Corte não suscitou controvérsia no tocante à essa questão, devido à regularidade da situação examinada.

 

Como dito, o cerne de toda a discussão centra-se no caráter técnico ou não do cargo de Agente em Atividade de Saúde II, ocupado pela servidora Maria Ivonete Dutra da Silva.

É sabido que o texto constitucional não fornece o conceito de cargo técnico ou científico, razão pela qual tal definição necessariamente há de ser buscada junto à doutrina e à jurisprudência.

 

No magistério de Hely Lopes Meirelles,

Cargo técnico é o que exige conhecimentos profissionais especializados para o seu desempenho, dada a natureza científica ou artística das funções que encerra. Nesta acepção é que o art. 37, XVI, b, da CF o emprega, sinonimizando-o com cargo científico, para efeito de homologação.[8]

Este é o entendimento sustentado na jurisprudência dos Tribunais Superiores:

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONSTITUCIONAL. ACUMULAÇÃO DE CARGOS PÚBLICOS. PROFESSOR E TÉCNICO JUDICIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE.

1. A Constituição Federal vedou expressamente a acumulação de cargos públicos, admitindo-a apenas quando houver compatibilidade de horários, nas hipóteses de dois cargos de professor; de um cargo de professor e outro técnico ou científico; e de dois cargos privativos de profissionais da saúde.

2. E, para fins de acumulação, resta assentado no constructo doutrinário-jurisprudencial que cargo técnico é o que requer conhecimento específico na área de atuação do profissional. [...] (STJ, RMS 14456/AM - Relator: Min. Hamilton Carvalhido - Órgão Julgador: Sexta Turma - Publicação no DJU: 02/02/2004).

 

Ao relatar o Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 11.342/DF, o Ministro Fontes de Alencar, do Superior Tribunal de Justiça, consignou o seguinte em seu voto:

 

O Decreto nº 2.038/63 assim define o cargo técnico, científico ou de magistério:

Art. 3º - Cargo Técnico ou Científico é aquele para cujo exercício seja indispensável e predominante a aplicação de conhecimentos científicos ou artísticos de nível superior de ensino.

Parágrafo único. Considera-se também técnico ou científico:

a) o cargo para cujo exercício seja exigida habilitação em curso legalmente classificado como técnico, de grau ou nível superior de ensino;

 b) o cargo de direção privativo de membro do magistério, ou de ocupante de cargo técnico ou científico.

O Decreto Federal nº 35.956/54 admitiu como sendo cargo técnico, o seguinte:

Art. 3º - Cargo técnico ou científico é aquele para cujo exercício seja indispensável e predominante a aplicação de conhecimentos científicos ou artísticos de nível superior de ensino.

A Suprema Corte, no entanto, amenizando os rigores da referida definição, admitiu a possibilidade de se reconhecer como técnico e científico, o cargo de nível médio de escolaridade, no julgamento do RE 87.881-5/RJ, em acórdão assim ementado:

ACUMULAÇÃO. CARGO TÉCNICO (ESCOLARIDADE). PROFESSOR DE NÍVEL MÉDIO DE MATEMÁTICA. O CARGO DE AUXILIAR-TÉCNICO DE MANUTENÇÃO, DE NÍVEL MÉDIO, EXERCIDO PELO IMPETRANTE, E CARGO TÉCNICO PARA O EFEITO DA ACUMULAÇÃO PREVISTA NO ART. 99, III, DA CONSTITUIÇÃO. INFRINGE O PRECEITO CONSTITUCIONAL A DECISÃO QUE NEGA A CONDIÇÃO DE TÉCNICO DE NÍVEL MÉDIO ESSA APTIDÃO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (1ª Turma, Rel. Min. Rafael Mayer, DJ de 05/11/79).

Assim, pode-se dizer que, cargo técnico, para efeito de incidência da exceção prevista no dispositivo constitucional em questão, é aquele para cujo exercício seja predominante a aplicação de conhecimentos científicos ou artísticos, sem que, necessariamente, reclame a habilitação em curso de nível superior.[9] Grifo nosso

 

Vê-se, portanto, que o cargo técnico não deve ser necessariamente o de nível superior, podendo ser o de nível médio, desde que se exija uma habilitação profissional específica e não apenas a conclusão segundo grau.  Nesse sentido:

 

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. ACUMULAÇÃO. CARGOS. MAGISTERIO.FISCAL DE OBRAS. ART. 37, XVII - CF. LEI ESTADUAL N. 5.573/93.

1 - A Constituição Federal em seu art. 37, inciso XVI permite a acumulação de um cargo de professor e outro técnico científico, para cujo provimento e exigida a habilitação profissional.

2 - Na espécie, o Edital do Concurso para o provimento do cargo de fiscal de obras prevê que o candidato necessita apenas de 2º grau completo, não restando configurada a hipótese de habilitação técnica.

3 - Recurso Improvido. (RMS 9536/DF ; Recurso Ordinário em Mandado de Segurança - Relator(a) Ministro Fernando Gonçalves - Órgão Julgador: Sexta Turma - Data do Julgamento 26/05/1998 Data da Publicação/Fonte DJ 22.06.1998 p. 182).

 

Não se pode olvidar, ainda, que a nomenclatura do cargo não se erige em critério decisivo para aferir se um cargo é ou não técnico, devendo-se atentar para a função desempenhada pelo servidor, a qual deve ser estabelecida em lei.

 

O ato aposentatório de Maria Ivonete Dutra da Silva informa que a mesma passou para a inatividade no cargo de Agente em Atividades de Saúde II, código 457, ONO II, referência B.

 

Através da Lei Complementar nº 93/93, o mencionado cargo foi inserido no Anexo II (ocupações de nível administrativo e operacional II- ONO II) da Lei Complementar nº 81/93, que trata do Plano de Cargos e Venciomentos do Pessoal Civil da Administração Direta, Autarquias e Fundações do Poder Executivo.

 

A Lei Complementar nº 81/93, ao tratar dos grupos ocupacionais, esclarece em seu art. 7º, inciso III, o seguinte:

Art. 7º - Os cargos de provimento efetivo estão inseridos e classificados nos seguintes grupos ocupacionais:

[...]

III - Ocupações de Nível Administrativo e Operacional II - ONO II - cargos de provimento efetivo, que exijam escolaridade de 2º grau, ou cujas atividades estejam relacionadas a serviços operacionais em suas várias modalidades e que exijam qualificação profissional na área de atuação. Grifo nosso

 

Consoante o mencionado diploma legal, as atribuições do cargo de Agente de Atividades de Saúde II, podem ser descritas sumariamente da seguinte forma:

 

Desenvolve atividades auxiliares na área dos serviços de saúde ligados à área técnica, laboratorial, sanitária e hospitalar em geral no apoio aos técnicos de saúde.

 

De acordo com os preceitos legais, dito cargo pode ser exercido na função de Auxiliar de Laboratório ou de Auxiliar de Enfermagem. Nesta última, caberá ao servidor:

 

1 - atender aos internados e pacientes em geral;

2 - Executar ações de controle e avaliação das condições pondo-estaturais e vitais do indíviduo;

3 - Lavar, acondicionar e esterilizar material, segundo técnicas adequadas;

4 - Fazer atendimento de enfermagem;

5 - Administrar medicamentos sob prescrição médica;

6 - Desenvolver atividades de orientação aos pacientes, bem como a coleta de materiais para exame mediante solicitação;

7 - Fazer registros e anotações das condições dos pacientes; e

8 - Executar outras atividades compatíveis com a função.[10]

 

Relevante ressaltar que, para o provimento do cargo de Agente em Atividades de Saúde II, exige-se como requisito a conclusão do Curso de 2º Grau e de formação na área de atuação.

 

In casu, o Recorrente juntou cópia do certificado de conclusão técnico-profissional, em nível de 2º Grau, de Auxiliar de Enfermagem e do registro no Conselho Federal de Enfermagem, da servidora aposentada[11], provando, dessa forma, que a mesma detinha a habilitação técnica para o exercício do cargo no qual se aposentou.

 

De igual modo, o Recorrente acostou aos autos cópia da Lei nº 7.498/86, que dispõe sobre a regulamentação do exercício de enfermagem. O art. 2º, do citado diploma legal, elenca o auxiliar de enfermagem entre os profissionais que exercem a enfermagem, in verbis:

Art. 2º - A Enfermagem e suas atividades auxiliares somente podem ser exercidas por pessoas legalmente habilitadas e inscritas no Conselho Regional de Enfermagem com jurisdição na área onde ocorre o exercício.

Parágrafo único. A enfermagem é exercida privativamente pelo Enfermeiro, pelo Técnico de Enfermagem, pelo Auxiliar de Enfermagem e pela Parteira, respeitados os respectivos graus de habilitação.

 

 No referido diploma legal o enfermeiro possui uma preparação técnica mais aprimorada e abrangente, ao passo que as atividades dos técnicos e auxiliares de enfermagem são tidas como subsidiárias ou, de acordo com a lei, “de acompanhamento do trabalho de enfermagem em grau auxiliar, no que concerne aos técnicos (art. 12) ou “de natureza repetitiva, envolvendo serviços auxiliares de enfermagem sob supervisão, no tocante aos auxiliares (art. 13).

 

Forçoso reconhecer, no entanto, que, malgrado a diferenciação existente entre as funções exercidas pelo enfermeiro e pelo técnico e auxiliar de enfermagem, devido à habilitação de cada um, os três profissionais devem ser considerados como ocupantes de cargos técnicos, pois todos, segundo a lei, exercem a enfermagem, que segundo o léxico, consiste na “arte ou função de cuidar de enfermos, acidentados, idosos, etc., dispensando cuidados especializados, ministrando medicamentos e tratamentos”.

 

Na situação em exame, deve-se atentar para as atribuições da função de auxiliar de enfermagem, executadas pela servidora aposentada - dentre as quais se destacam a realização do controle e avaliação das condições vitais do paciente, bem como a esterelização de materiais, de acordo com as técnicas adequadas, o atendimento de enfermagem, a administração de medicamentos, a coleta de materiais para exame - apontando, sem sombra de dúvidas, para a necessidade de conhecimento técnico especializado que habilite o profissional para tanto.

 

Com amparo nessa linha de raciocínio e firmando-se o entendimento de que, no caso em tela, o cargo de Agente em Atividades de Saúde II possui caráter técnico, torna-se desnecessário discutir se a servidora detinha ou não o direito adquirido à acumulação dos dois cargos que ocupava. [...]”

 

No caso destes autos, conforme informou o Recorrente, “a servidora aposentada apresenta habilitação como Auxiliar de Enfermagem e com atuação nessa área específica ocupou o cargo de Agente de Atividades de Saúde II.”[12]

 

 Desta feita, com amparo no entendimento da Consultoria-Geral e em precedente firmado por este Tribunal, consubstanciado na Decisão n. 1078/2005, proferida nos autos n. REC- 02/10606657, posiciono-me por conhecer do presente recurso e lhe dar provimento.

 

 

2.   PROPOSTA DE DECISÃO

 

CONSIDERANDO o que mais dos autos consta, em conformidade com o parecer da Consultoria-Geral, submeto à apreciação deste Tribunal a seguinte proposta de decisão:

 

6.1. Conhecer do Recurso de Reexame, nos termos do art. 80 da Lei Complementar n. 202/2000, interposto contra a Decisão n. 2.063/2001, exarada na Sessão Ordinária de 08/10/2001, nos autos do Processo n. APE-9495502/90, para, no mérito, dar-lhe provimento para alterar decisão recorrida, que passa a ter a seguinte redação:

“6.1. Ordenar o registro, nos termos do art. 34, inciso II, c/c o art. 36, § 2º, "b", da Lei Complementar n° 202/2000, do ato aposentatório de Maria da Graça Rosa, servidora da Secretaria de Estado da Saúde, no cargo de Agente em Atividades de Saúde II, matrícula 240.181-9-01, nível ONO-II-10-A, PIS/PASEP nº (-), consubstanciado na Portaria n° 3574/1998, considerado legal.”

6.2. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Parecer COG n. 381/06 ao Sr. Antônio Marcos GavazzoniSecretário de Estado da Administração.

 

 

             Gabinete do Conselheiro, em 17 de junho de 2008.

 

 
WILSON ROGÉRIO  WAN-DALL

                                                       Conselheiro Relator

 

 

 



 



[1] Fls. 37/46 dos autos do Processo n. REC-02/04808650.

[2] Fls. 4749 dos autos do Processo n. REC-02/04808650.

[3] Fl. 189 dos autos do Processo n. APE-9495502/90.

[4]Processo CON - -05/00559414. Parecer COG 167/05 - Decisão 809/2005- Origem Prefeitura Municipal de Catanduvas - Relator Auditor Altair Debona Castelan. Sessão: 25/04/2005. D.O.E 21/06/2005.

[5] Fls. 41/45 dos autos do Processo n. REC-02/04808650.

[6] Fls. 27 a 32 dos autos do Processo nº APE-94956/02-95.

[7] Fl. 03 dos autos do Processo nº APE-94956/02-95.

[8] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 20. ed. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 362.

[9]Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 11.342/DF. Superior Tribunal de Justiça. Relator Ministro Fontes de Alencar. Data do Julgamento 20/05/03.

[10] Conforme o Anexo III, da Lei Complementar nº 93/93, inserido nos Anexos I e II da Lei Complementar nº 81/93.

[11] Fls. 19 a 21 dos autos do Processo nº REC-02/10606657.

[12] Fl. 08 dos autos do Processo n. REC-02/04808650.