TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO

GABINETE DA VICE-PRESIDÊNCIA

CONSELHEIRO JOSÉ CARLOS PACHECO

PROCESSO Nº   PCA 03/00748515
     
   
    UG/CLIENTE
  CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO JOÃO BATISTA - SC
     
   
    INTERESSADO
  SR. ELIAS GERMANO MAFEÇOLI - PRESIDENTE DA CÂMARA
    RESPONSÁVEL
  SR. ADERBAL MANOEL DOS SANTOS - PRESIDENTE DA CÂMARA NO EXERCÍCIO 2002
     
   
    ASSUNTO
  PRESTAÇÃO DE CONTAS DO ADMINISTRADOR REFERENTE AO EXERCÍCIO DE 2002

RELATÓRIO

Tratam os presentes autos das contas do exercício de 2002 da CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO JOÃO BATISTA - SC, gestão do Sr. ADERBAL MANOEL DOS SANTOS, sujeito ao regime de fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial deste Tribunal de Contas, conforme determina a legislação vigente (Constituição Federal, art. 31; Constituição Estadual, art. 113; Lei Complementar Estadual nº 31, de 27/09/90, arts. 64 a 67 e arts. 23, 25 e 26 da Resolução nº TC 16/94, de 21/12/94).

Da análise desenvolvida através das documentações apresentadas pela Unidade Gestora acima identificada, a Diretoria de Controle dos Municípios - DMU elaborou o Relatório de Instrução nº 267/2004 (fls. 30 a 32), sugerindo que fosse procedida a Citação do responsável para apresentar alegações de defesa, em observância ao princípio do contraditório e da ampla defesa, acerca da aquisição de 14 (quatorze) coroas de flores no montante de R$ 942,00 (novecentos e quarenta e dois reais), consideradas irregulares, por serem relativas a manutenção de serviços estranhos à Câmara Municipal e por não traduzirem caráter público ou filantrópico, estando em desacordo com o disposto no artigo 12, § 1º, da Lei 4.320/64.

O responsável foi citado (fls. 34 a 36), apresentando suas considerações às fls. 38 e 39 e 44 e 45.

O Corpo Instrutivo desta Casa, através da Diretoria de Controle Municipal - DMU, procedeu a análise final da matéria, elaborando o Relatório DMU nº 977/2004, de fls. 52 a 56, concluindo por julgar irregulares as presentes contas, sugerindo imputação de débito ao Sr. ADERBAL MANOEL DOS SANTOS - Presidente da Câmara no exercício de 2002.

A Douta Procuradoria junto ao Tribunal de Contas, através do Parecer MPTC nº 1571/2004, fls. 58 a 60 acompanhou o entendimento do Corpo Técnico.

Seguiram os autos à apreciação Plenária em data de 11 de agosto de 2004. Após a leitura do Relatório, foi concedida a palavra ao Sr. Izaías Joaquim Gonzaga, procurador do Sr. Aderbal Manoel dos Santos, diante do que dispõe o artigo 212, caput, combinado com o § 10, do artigo 148, ambos do Regimento Interno deste Tribunal (Resolução N-TC 06/2001).

Finda a manifestação por parte do responsável, este Relator solicitou à Presidência que adiasse o julgamento dos autos, diante das considerações apresentadas e em face do apartes feitos pelo Conselheiro Moacir Bertoli e pelo Sr. Procurador Geral junto a este Tribunal.

Na oportunidade, pelo fato de não terem sido apresentados memoriais pelo patrono do responsável, foi solicitado à Secretaria Geral que procedesse a transcrição do Julgamento, na parte referente a presente discussão, o que se verificou, conforme documentação anexa às fls. 66 a 68.

Os autos retornaram à apreciação Plenária em data de 17 de novembro 2004, quando o ensigne Conselheiro Otávio Gilson dos Santos defendeu a regularidade da despesa ora questionada por esta Relatoria – a aquisição de coroas de flores para homenagear cidadãos da municipalidade – em razão de que este Tribunal de Contas já se pronunciara no sentido da regularidade da mesma em processos análogos.

Este Conselheiro Relator, ciente das decisões a que se referiu o Conselheiro Gilson dos Santos 1 – inclusive, fiz menção às mesmas em meu Voto apresentado naquela oportunidade, vide fls. 70 a 77 – esclareceu aos julgadores presentes que o caso em tela não se amoldava à excepcionalidade definida pelo Tribunal Pleno nos referidos Acórdãos.

Porém, no intento de promover uma discussão serena da matéria, solicitei a retirada dos autos daquela pauta de julgamento e determinei a remessa dos autos a douta Consultoria Geral para que se manifestasse nos presentes autos, trazendo à baila as suas considerações acerca do assunto.

A COG, através do Parecer COG n. 018/05, da lavra do Auditor Fiscal de Controle Externo, Dr. Hamilton Hobus Hoemke, trouxe minudentes esclarecimentos sobre a questão, levando em consideração as mencionadas decisões deste Tribunal de Contas e a análise do que prescrevem as normas constitucionais e legais, como também aspectos doutrinários atinentes às Funções do Estado e do Poder Legislativo, concluindo, por derradeiro, pela irregularidade da despesa em tela.

Retornando os autos à manifestação Ministerial, esta sugeriu, através do Parecer MPTC nº 285/2005, fls. 96 a 99, que se julgasse irregulares, com imputação de débito ao seu responsável, as contas do exercício de 2002 da Câmara Municipal de São João Batista, ante as despesas estranhas a sua competência assinaladas pelo órgão instrutivo da Diretoria de Controle dos Municípios.

É o necessário relatório.

VOTO

Senhores Conselheiros,

Conforme já manifestado, a irregularidade apontada pelo órgão instrutivo deste Tribunal refere-se à discussão do caráter público da despesa de R$942,00 (novecentos e quarenta e dois reais), contraída pela Câmara de São João Batista, para a aquisição de coroas de flores, com a finalidade de homenagear pessoas falecidas do Município.

Das assertivas apresentadas pelo Sr. Aderbal Manoel dos Santos, Presidente da Câmara Municipal no exercício de 2002, junto às fls. 38, 39, 44 e 45, bem como da sustentação oral feita por seu procurador na Sessão Plenária do dia 11 de agosto de 2004, tem-se que a defesa centra a sua tese em três pontos específicos: o primeiro invocou as tradições locais em enviar condolências às famílias enlutadas do Município, por intermédio de coroas de flores (vide fl. 38); o segundo refere-se ao princípio da isonomia, insculpido no art. 5º, caput, da CF/88; e, o terceiro, ao princípio da coisa julgada, definido no mesmo art. 5º, inciso XXXVI da CF/88.

Quanto a alegada tradição local – apesar de ter o seu caráter louvável, ao homenagear os cidadãos do Município – esta foge ao espírito que deve nortear o gestor da coisa pública, qual seja, o respeito à legalidade e ao interesse público.

O direito consuetudinário invocado pelo responsável não pode contrapor-se à ordem jurídica vigente, que não admite tal fonte de direito (tradições) se seus preceitos não estiverem devidamente materializados em norma escrita.

Tocante ao segundo tópico da defesa, que suscita a não observância por este Tribunal de Contas acerca do princípio da isonomia, o responsável sustentou que "...pode parecer que um simples lavrador, que seja um líder comunitário na sua comunidade, possa não ser uma personalidade de notoriedade para esse Egrégio Tribunal, mas para a localidade, para o Município, ele pode ter a sua notoriedade".

A defesa do Sr. Aderbal Manoel dos Santos refuta o fato deste Tribunal de Contas admitir homenagens póstumas, mediante gastos realizados pelas Câmaras de Vereadores somente a pessoas de notoriedade no Município, que tenham tido importância para o mesmo (ex vi Prejulgado n. 04912).

Neste diapasão, é mister esclarecer que o entendimento deste Tribunal remete à excepcionalidade de despesas desta ordem, levando-se em consideração a conveniência e oportunidade do ato, bem como a supremacia do interesse público, conforme já asseverou o egrégio Plenário desta Casa, quando da apreciação dos autos de Consulta n. 01/008271953, da Câmara Municipal de Guaramirim (grifos).

É fato que existem certos atos que remetem ao espírito discricionário do Administrador para definir a viabilidade ou não de certas despesas.

Contudo, este poder administrativo ungido ao gestor da coisa pública, quando não houver norma legal expressa regulando a matéria, lhe impõe a observância, como dito, dos princípios já enunciados, quais sejam: a oportunidade, conveniência e, fundamentalmente, o interesse público, respeitando-se, in casu, certos limites.

Acerca disso de se impor limites a certas despesas ressalto o aparte feito pelo ilustre Conselheiro Moacir Bertoli na referida Sessão Plenária do dia 11 de agosto que, com propriedade, assinalou:

" Saiba V.Exa. que o Tribunal de Contas, pelos seus técnicos, tem a preocupação, e todos os que aqui se encontram têm, e acredito que Vossas Exas. também, de que esse tipo de aplicação do dinheiro público tem que ter um certo regramento para que isto não extrapole.

Lembro, no decorrer de sua manifestação, que V.Exa. relatou acerca de uma oportunidade em que tivemos que nos pronunciar sobre um procedimento praticado em um Município, onde o Prefeito Municipal achava por bem que toda a criança nascida no hospital da cidade deveria receber uma flor. É legal ou não é legal? Tem dotação orçamentária?

Tem, mas no espírito do gasto público, o senhor imagina se nos 5.600 municípios do Brasil todos os prefeitos inventassem de homenagear as mães, que não devem só ser homenageadas com um buquê, mas com muito mais.

Imagine V.Exa. se os 5.600 Presidentes de Câmaras do Brasil, ou os de Santa Catarina, usassem como norma o uso de se homenagear um cidadão, que V.Exa. muito bem colocou que todos são iguais perante a lei, mas nem todos têm o curriculum que levou em determinado momento ao Chefe do Poder Executivo, do Poder Legislativo, seja estadual ou municipal, ou do Poder Judiciário a homenagear certo cidadão."

Ora, é justamente neste limite de responsabilidades a que se referiu o Conselheiro Moacir Bertoli que este Tribunal tem proferido o seu entedimento acerca destas despesas, não se contrapondo, de forma alguma, ao princípio isonômico do art. 5º, caput, da Constituição Federal da República.

Neste mesmo sentido, destaco ainda a manifestação do Sr. Procurador Geral desta Casa, Dr. Cesar Filomeno Fontes, que na oportunidade assim se manifestou:

" V.Exa. invocou o dispositivo Constitucional do art. 5°, princípio da igualdade, que todos são iguais perante a lei. Não resta dúvida que todos somos iguais perante a lei, mas eu não conheço nenhuma lei que autorize ao Presidente de Câmara encaminhar coroas de flores no caso de falecimento de cidadãos dos municípios. Ocorreu, sim, que o Tribunal tenha aprovado excepcionalmente, mas eu não gostaria que isto se tornasse regra, (...)

A lei não permite que o servidor público encaminhe por conta do erário uma coroa de flores para o cidadão que venha a falecer. Temos aberto uma exceção quando se trata de pessoa que tenha prestado relevantes serviços àquela cidade, um ex-Vereador, um ex-Prefeito, um grande líder comunitário."

Vê-se que o entendimento deste Relator não se mostra dissociado daqueles que compõem este egrégio Plenário, pois verifico que o que esta Casa tem admitido, por seus Prejulgados, é a excepcionalidade de despesas desta natureza.

Diante do que se observa dos autos, ficou evidenciado que a Câmara Municipal de São João Batista procedia a aquisição de coroas de flores para homenagear os munícipes falecidos daquele Município sem fazer qualquer referência ou distinção, o que denota a generalidade e não a excepcionalidade da despesa pública, contrapondo-se, portanto, ao definido por este egrégio Plenário, diante do que dispõe o mencionado Prejulgado n. 0491, razão pela qual mantenho o meu entender restritivo quanto a despesa em questão.

Por fim, com relação ao terceiro tópico da defesa, que suscitou o princípio da coisa julgada, argumentando que esta Casa já teria comunicado à Câmara de São João Batista de que as contas de 2002 foram tidas e havidas como regulares, observo um equívoco da parte do nobre patrono do responsável.

As mencionadas contas relativas ao exercício de 2002, da Câmara de Vereadores de São João Batista, aprovadas por este Tribunal de Contas, são relativas a análise da Gestão Fiscal dos 1º e 2º Semestres do ano de 2002, autuadas em processo específico (Processo LRF 03/06197774 - vide docs. de fls. 44 a 50), tendo como objeto somente dados e informações relacionados ao controle da gestão fiscal instituído pela Lei de Responsabilidade Fiscal, não tendo sido analisadas as despesas ora em exame, razão pela qual são infundadas as assertivas feitas pelo Sr. Aderbal Manoel dos Santos.

Diante de todo o exposto, considerando que o Responsável foi devidamente citado, conforme consta às fls. 34 a 36 dos presentes autos;

considerando que as alegações de defesa e os documentos apresentados são insuficientes para elidir a irregularidade apontada pelo Órgão Instrutivo, constantes dos Relatórios DMU nº 267/2003 e 977/2004;

considerando o exposto e tudo o mais que dos autos consta, proponho o seguinte VOTO:

2 Dar ciência desta decisão com remessa de cópia do Relatório de DMU nº 977/2004 e do voto que a fundamentou ao responsável - Sr. ADERBAL MANOEL DOS SANTOS - Presidente da Câmara Municipal de São João Batista, no exercício de 2002.

    GCJCP, em 9 de março de 2005.

José Carlos Pacheco

Conselheiro Relator


1 Prejulgados n. 0491 e 0990

2 Prejulgado 0491

É facultado à Câmara de Vereadores, observado o disposto na Lei Orgânica do Município, cumpridas as normas prescritas na Lei Federal nº 8.666/93 e atendidos os pressupostos da despesa pública:

(...)

d) realizar despesa com coroas de flores, para fins de prestar homenagem póstuma a autoridade e pessoas ilustres;
Processo:
CON-TC0201009/73 Parecer: COG- 290/97 Origem: Câmara Municipal de Capivari de Baixo Relator: Auditor Evângelo Spyros Diamantaras Data da Sessão: 27/10/1997

3 Prejulgado 0990

É regular a despesa realizada com auxílio financeiro, doação de troféus e aquisição de coroa de flores, desde que observada a conveniência e oportunidade do ato, bem como a supremacia do interesse público, conforme os termos do parecer.

Processo: CON-01/00827195 Parecer: COG - 091/01 Decisão: 842/2001 Origem: Câmara Municipal de Guaramirim Relator: Altair Debona Castelan Data da Sessão: 21/05/2001 Data do Diário Oficial: 06/07/2001