TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA

Gabinete do Auditor Altair Debona Castelan

PROCESSO N° CON 0303350946
O R I G E M: FUNDAÇÃO DO MEIO AMBIENTE - FATMA
INTERESSADO: SÉRGIO JOSÉ GRANDO
A S S U N T O: CONSULTA

Tratam de Consulta subscrita pelo Exmo. Sr. Presidente da Fundação de Amparo ao Meio Ambiente - FATMA, a respeito da legalidade da contratação de sonsultores para análise dos projetos de empreendimentos que necessitam de Estudos de Impacto Ambiental - EIA da emissão de parecer elaborado dos Relatórios de Impacto Ambiental - RIMA.

O expediente foi autuado passando a constituir o Processo CON-303350946, sendo instituído através do Parecer n. COG 369/03, com a seguinte conclusão:

"2.1 - A contratação para desempenharem atividades finalísticas e permanentes da Fundação do Meio Ambiente - FATMA, não encontra amparo na Constituição Federal, quer para tais atividades exige a existência de quadro de Cargos efetivos, providos após prévio concurso público, nos termos do art. 37,II, da CF.

2.2 - Compete à Administração promover a capacitação dos servidores a fim de que possam estes desempenharem adequadamente suas tarefas, contribuindo, assim para um serviço sério, eficiente e de acordo com os objetivos do órgão."

Pautado para sessão de 13 de agosto de 2003, o processo foi avocado pelo Exmo. Sr. Presidente e, na forma regimental ( art. 115, I e § 4º), devolvido a COG para maiores estudos em face da complexibilidade da matéria, do interesse público envolvido e da orientação firmada por esta Corte de Contas para situações semelhantes no âmbito Municipal.

Posteriormente, em 18 de março de 2004 e em 01 de abril do corrente ano, foram protocolizados nesta Corte de Contas, dois outros expedientes do Exmo. Sr. Presidente da FATMA. No primeiro, após apresentar dados estatísticos sobre os projetos em andamento naquela Fundação no aguardo do licenciamento ambiental, solicita autorização para " realizar licitação para contratar empresas especializadas, para elaborar Parecer Técnico, com o objetivo de agilizar os licenciamentos, contribuindo para os empreendimentos possam ser licenciados ou não sempre respeitando a conservação ou não sempre respeitando a conservação ambiental."

No segundo, indaga a possibilidade daquela Fundação " buscar consultoria especializada, mediante contratação direta, em caráter emergencial, por um período de vinte e quatro meses, de fundações brasileiras, sem fins lucrativos, que atuem como instituição de apoio às universidades que operem no Estado de Santa Catarina, a fim de que se possa dar resposta em tempo rápido, como requerem os desafios do mundo moderno, às solicitações tramitantes nesta Fundação do Meio Ambiente.

O Consulente anexa ao expediente uma listagem contendo 66 projetos de grande repercussão para o crescimento do Estado, que estão aguardando o licenciamento ambiental, esclarecendo, em síntese que a FATMA " não dispõe no seu quadro de pessoal permanente força de trabalho suficiente para atender, ao mínimo, às solicitações demandadas, além de que um exame para a concessão do licenciamento ambiental que poderia ser concluído em 90 ou 120 dias, hoje está requerendo prazo de três vezes superior ao indicado, levando os empreendedores a migrar para outras unidades da federação.

A Consultoria Geral emitiu o Parecer nº 179/04, de fls.26 a 41 dos autos nos seguintes termos:

"ANÁLISE

A vista dos motivos que ensejaram a devolução dos autos a esta Consultoria Geral, a matéria será reexaminada quanto os seguintes aspectos:

1. Terceirização de atividades afetas ao poder de polícia administrativa da FATMA

Preliminarmente, cabe esclarecer que na primeira consulta dirigida a esta Corte de Contas1 o consulente indaga sobre a possibilidade de contratar "consultores para análise dos projetos de empreendimentos que necessitam de Estudos de Impacto Ambiental - EIA da emissão de parecer para elaboração dos Relatórios de Impacto Ambiental - RIMA"

Ante a demonstração de que o objetivo da FATMA seria contratar consultores para atuarem diretamente nos processos de licenciamento ambiental, entendeu o Analista de Controle Externo desta Consultoria que se tratava de terceirização da licençca ambiental, opinando, então, pela inviabilidade da contratação, notadamente porque as atividades do órgão estadual do meio ambiente (licenças, fiscalização e sanção) constituem poder de polícia administrativa e, portanto, indelegáveis. Nessa linha de raciocínio, entende também que a contratação pretendida implicaria na terceirização das atividades finalísticas e permanentes daquela Fundação, ofensiva às regras constitucionais do concurso público.

Entretanto, nos expediente encaminhados posteriormente, esclarece o consulente que a contratação pretendida tem por finalidade suprir, temporariamente, a carência de pessoal no quadro permanente daquela Fundação, de modo a vencer a demanda dos projetos que lhe são apresentados, salientando que no momento encontram-se em análise cerca de 36 (trinta e cinco) estudos para implantação de várias atividades vitais para o Estado, que devem ser feitas em conformidade com o Programa de Avaliação de Impacto Ambiental.

Esclarece, também, que a contratação perduraria por um período de vinte e quatro meses, durante o qual aquela Fundação adotaria providências com vistas à criação de cargos necessários ao cumprimento de seus objetivos legais, bem como a abertura de concurso público para o provimento dos respectivos cargos.

Como se vê, não é intenção do Presidente da FATMA terceirizar o licenciamento ambiental,2 procedimento administrativo que tem como finalidade a emissão do ato administrativo consistente na licença ambiental.3

Busca aquela Fundação uma alternativa transitória, temporária, para a contratação de profissionais legalmente habilitados, até que se promova a abertura de concurso público, evitando-se, assim, a demora excessiva nos procedimentos de licenciamento ambiental, fato que pode inviabilizar a implantação não só de projetos de interesse do Estado e dos Municípios, quanto os de natureza privada, culminando com a migração de projetos importantes do setor privado ao desenvolvimento econômico do Estado para outras unidades da federação, em prejuízo do interesse coletivo.

Destarte, a licença ambiental, que estabelece condições, restrições e medidas de controle ambiental de observância obrigatória pelo empreendedor, como ato administrativo expressivo do poder de polícia administrativa, de exclusiva responsabilidade da FATMA, não poderia ser delegada a particulares ou por eles praticados, consoante os ensinamentos de Celso Antônio Bandeira de Mello citados no Parecer n° COG- 369/03 acostado às fls. 3-12, destes autos, para quem "A restrição à atribuição de atos de polícia a particulares funda-se no corretíssimo entendimento de que não se lhes pode, ao menos em princípio, cometer o encargo de praticar atos que envolvem o exercício de misteres tipicamente públicos quando em causa a liberdade e propriedade, porque ofenderiam o equilíbio entre os particulares em geral, ensejando que uns oficialmente exercessem supremacia sobre outros."

Nesse sentido já se manifestara esta Corte de Contas na apreciação do Processo REP -103711686, em sessão plenária de 23/06/2003. Decisão nº 1951, publicada no Diário Oficial do Estado de 05/08/03.

Resta, contudo, analisar se as atividades que a FATMA pretende repassar a pessoas estranhas ao seu corpo funcional realmente constituem parcela do poder de polícia do órgão ambiental e, portanto, atividade essencial do Estado, ou se referidas atividades podem ser caracterizadas como instrumentais do Estado.

Observa-se que as licenças ambientais devem ser expedidas pelo Poder Público, no exercício do controle do meio ambiente e por intermédio do órgão ambiental, constituindo, portanto, atividade essencial do Estado expressiva do poder de polícia administrativa.

De todo o exposto, verifica-se que a morosidade da análise e concessão de licenças ambientais é um problema nacional, que tem como principal causa o reduzido número de técnicos nos quadros funcionais dos órgãosincumbidos da execução das políticas públicas do meio ambiente.

O Estado do Rio de Janeiro é um dos pioneiros no encaminhamento de proposta de terceirização dos procedimentos de licenciamento ambiental, conforme se depreende do projeto de lei n° 591/2003, de autoria do Deputado Aurélio Marques, que "autoriza a contratação de empresas ou profissionais de notória especialização para a emissão de laudos ou pareceres necessários aos procedimentos relativos ao sistema de licenciamento de atividades poluidoras - SLAP."7

Contudo, referido projeto recebeu parecer pela inconstitucionalidade na Comissão de Justiça da Assembléia Legislativa do Estado, estando no aguardo da manifestação da Comissão de Defesa do Meio Ambiente.

Cumpre esclarecer que a locação de mão de obra no âmbito do Estado de Santa Catarina foi incialmente disciplinada pelo art. 26 da Lei nº 6.772, de 12 de junho de 1986, que assim dispõe:

Posteriormente, foi editada a Lei nº 8.815, de 06 de outubro de 1992, que dando nova redação ao art. 26 da Lei nº 6.772, permitiu apenas a contratação de vigilante, telefonista, office boy, marceneiro, recepcionista, servente, copeiro, jardineiro, cozinheiro, garçom, merendeira, zelador, padeiro, ascensorista, agente de guarda de menores, digitar e mecânico, Atualmente, a Lei Complementar nº 243, de 29 de janeiro de 2003, que dispõe sobre a reforma administrativa, inclui também a locação de mão de obra de motorista, patroleiro e tratorista (art. 138, § 1º). Essa, contudo, parece não ser a hipótese aventada na presente consulta.

2. O entendimento do Tribunal de Contas sobre a contratação, via licitação, de pessoa física ou jurídica para executar atividades de caráter permanente, próprias de cargos ou empregos públicos

Em inúmeras oportunidades, o Tribunal de Contas pronunciou-se pela ilegalidade da criação de cargos em comissão com atribuições de natureza permanente; sobre a irrecusável observância dos aspectos constitucionais limitadores da contratação por tempo determinado (transitoriedade da contratação e excepcional interesse público do serviço a ser desempenhado pelo agente contratado neste regime), bem como sobre a contratação de terceiros, pessoas físicas ou jurídicas, precedida de licitatação, para a realização de atividades de natureza permanente, próprias de cargos ou empregos públicos. A orientação deste Tribunal pode ser constatada nos prejulgados abaixo:

Finalmente, cabe trazer à colação o entendimento do Tribunal de Contas quanto à contratação de fundações brasileiras, com dispensa de licitação, firmado nos seguintes prejulgados:

Diante do entendimento já firmado por este Tribunal de Contas, entende-se que a contratação de fundações brasileiras que atuem como instituições de apoio às universidades que operam no Estado de Santa Catarina, não poderia ser efetivada com dispensa de licitação fundada no art. 24, inciso XIII da Lei nº 8.666/93, já que o objeto da contratação pretendida pela FATMA não teria vinculação com atividade de ensino, pesquisa ou desenvolvimento institucional desenvolvidas pelas referidas instituições.

De todo modo, as questões trazidas pelo Presidente da FATMA guardam similitude com outras já enfrentadas pelos Municípios catarinenses, assim como por entidades da administração indireta do Estado, cuja orientação deste Tribunal de Contas tem sido no sentido de admitir, em caráter excepcional, a contratação de pessoa física ou jurídica, por tempo determinado, com prazo de duração previamente fixado, para atender a uma necessidade premente do órgão, ainda que as atividades a serem desempenhadas pelo contratado tenham caráter permanente, próprias de cargos públicos, devendo, ato contínuo, serem criados e providos por via do concurso público os respectivos cargos efetivos indispensáveis ao desempenho das atividades administrativas de caráter permanente.

No caso de deficiência temporária de contador e de assessor jurídico no quadro funcional de Prefeituras ou Câmaras de Vereadoes, entende esta Corte que as contratações destes profissionais podem ocorrer, em caráter excepcional, mediante processo licitatório.

De outro lado, este Tribunal de Contas já admitiu a possibilidade da contratação temporária de advogados para suprir deficiência destes profissionais nos quadros de empresa de economia mista, com fundamento no inciso IX do artigo 37 da Constituição Federal, desde que existente norma estadual autorizativa definindo os casos de excepcional interesse público, a forma de seleção dos profissionais, a forma de pagamento e o prazo do contrato.

A contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público no âmbito do Estado de Santa Catarina encontra-se disciplinada pela Lei nº 260, de 22 de janeiro de 2004, que nos arts. 1º e 2º assim dispõe:

Como a medida demandaria tempo em face dos procedimentos administrativos indispensáveis ao desencadeamento do processo legislativo (elaboração, encaminhamento e aprovação de projeto de lei dispondo sobre a criação dos cargos permanentes), assim como aqueles atinenetes à abertura de concurso público, poder-se-ia aplicar ao caso sob exame o entendimento firmado por esta Corte de Contas para as hipóteses de contratação de contador e assessor jurídico na esfera municipal, precedida de licitação, ou mediante contratação temporário fundada no art. 37, inciso XI, da Constituição Federal, disciplinada pela Lei n° 260, de 22 de janeiro de 2004.

Ante o exposto, superadas as preliminares de admissibilidade da Consulta, sugere-se ao Relator destes autos que em seu voto propugne ao egrégio Plenário:

A douta Procuradoria, ao analisar o questionamento apresentado pelo Diretor Geral da Fundação de Amparo ao Meio Ambiente - FATMA, Sr. Sérgio Grando, a respeito da viabilidade de contratação de consultores, por vinte e quatro meses, com a finalidade de suprir, temporariamente, a carência de pessoal no quadro permanente daquela Fundação, de modo a vencer a demanda dos projetos que lhe são apresentados, acompanha a manifestação da Consultoria Geral em conhecer da consulta, em face do preenchimento dos pressupostos de admissibilidade da Carta Magna Estadual e do Regimento Interno dessa Corte Fiscalizadora, e quanto ao mérito, responder como o acima transcrito.

É o Relatório

Este Relator, considerando que o Consulente detém legitimidade para o encaminhamento de consultas a esta Corte de Contas - art. 103, I e 104, III, da res. TC06/2001;

Outrossim, considerando que a Consultoria Geral, ao examinar a Consulta, buscou a melhor solução possível, sempre dentro dos limites legais, inicialmente citando decisão do Plenário desta Corte, no Proc. Rep. 103711686 ( Sessão de 23.06.003), mais tarde disposições da Resolução CONAMA N. 237 de 17/12/97 e legislação estadual pertinente ( Lei n. 8815/92 e Lei Complementar n. 243 de 29.01.03, em especial).

Alem disso foram apreciados Pré-julgados, desta Casa referentes a Contratação, via licitação, de pessoa física ou jurídica para o exercício de atividades de caráter permanente, próprios de cargos ou empregos públicos.

Finalmente, entendo que a proposta apresentada, quanto ao mérito, me parece a mais adequada aos princípios legais vigentes.

A concordância do Ministério Público, com a proposta formulada pela Consultoria Geral dá segurança à formulação que julgamento que ora faço, ao Egrégio Plenário, no sentido de :

Gabinete de Auditor, em 17 de maio de 2004.

Altair Debona Castelan

Auditor Relator


1 Of. GABS N. 001727, de 05 de junho de 2003.

2 procedimento administrativo pertinente à licença para localização, instalação, ampliação e operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, conforme dispõe o art. 1º, inciso I, da Resolução CONAMA Nº 237, de 19 de dezembro de 1997.

3 ato administrativo pelo qual o órgão ambiental competente estabelece as condições, restrições e medidas de controle ambiental que deverão ser obedecidas pelo empreendedor, pessoa física ou jurídica, para localizar, instalar, ampliar e operar empreendimentos ou atividades utilizadoras dos recursos ambientais consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou aquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, nos termos do inciso II, do art. 1º da referida Resolução.

4 SUNDFELD, Carlos Ari. Fundamentos de direito público.São Paulo: Malheiros. 1992, p.79-81

5 www.semarh.df.gov.br

6 http://www.ecoagência.com.br. Acesso em 19 mar. 2004.

7 Http://www.alerj.rj.gov.br. Acesso em 03 mai. 2004.