ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO

GABINETE CONSELHEIRO LUIZ ROBERTO HERBST

Processo nº REC- 03/04726605
Unidade Gestora Companhia de Habitação do Estado de Santa Catarina

COHAB/SC

Recorrente JOSÉ LUIZ CUNHA
Assunto Recurso (Reconsideração- art. 77 da LC 202/2000) do processo nº AOR-00/05411688)

RELATÓRIO N. : GC – LRH/2008/512

Recurso de Reconsideração. Contrato habitacional. Correção monetária. Periodicidade de incidência.

A Lei 9.069/95, que dispôs sobre o Plano Real, proibiu a cláusula de correção monetária com periodicidade inferior a um ano, estabelecendo, como regra, a incidência anual da atualização para os contratos celebrados ou convertidos em Real. Imputação de Débito.

Não havendo repasses financeiros para o cumprimento do cronograma físico-financeiro de obra, deve o responsável proceder à rescisão unilateral do contrato, por motivo de interesse público. Caso contrário, assume pessoalmente o risco pela não realização de repasses e, conseqüentemente, pelo descumprimento do contrato. Aplicação de multa.

Conhecer e dar provimento parcial.

Tratam os autos a Recurso de Reconsideração, interposto pelo Sr. José Luiz Cunha, Diretor-Presidente da Companhia de Habitação do Estado de Santa Catarina - COHAB, com o objetivo de ver modificado o Acórdão n. 326/2003, na forma a seguir transcrita:

(...)

6.1. Julgar irregular, com imputação de débito, com fundamento no art. 18, III, alínea "c", da Lei Complementar n. 202/2000, os dispêndios com reajustes mensais das medições dos serviços realizados pela contratada para construção do Conjunto Habitacional Bela Vista, no montante de R$ 104.892,97 (cento e quatro mil oitocentos e noventa e dois reais e noventa e sete centavos), por contrariar a Lei Federal n. 0969/95 (item V.1.1 do Relatório DCO), e condenar o Responsável – Sr. José Luiz Cunha - ex-Diretor-Presidente da COHAB/SC, ao pagamento desta quantia, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar, perante este Tribunal, o recolhimento do valor do débito aos cofres da COHAB/SC, atualizado monetariamente e acrescido dos juros legais (arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), calculados a partir de 04 de setembro de 1995, ou interpor recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, inc. II, da Lei Complementar n. 202/2000).

A Consultoria Geral deste Tribunal de Contas elaborou os pareceres COG n. 062/2006 (fls. 09/20), n. 799/2007 (fls. 63/68) e n. 553/2008 (fls. 74/88) constatando, preliminarmente, que o recorrente possui legitimidade para apresentar o presente Recurso, sendo este tempestivo e revestido das formalidades exigidas por esta Corte.

Quanto ao mérito, sugeriu a Consultoria dar provimento ao recurso para o fim de cancelar-se uma das multas aplicadas, mantendo-se contudo os demais termos da decisão ora combatida.

DISCUSSÃO

A fim de propiciar melhor conhecimento quanto ao ocorrido no presente, entendo necessária breve retrospectiva dos fatos:

1. 17/06/2003 - interposição do recurso no Tribunal de Contas;

2. 22/02/2006 - parecer 062/2006 da Consultoria Geral - COG que sugere o cancelamento da multa constante no item 6.2.1 da decisão;

3. 30/06/2006 - juntada de novos documentos e justificativas pelo recorrente;

4. 04/02/2007 - remessa dos autos à Diretoria de Controle de Obras por determinação do Exmo. Sr. Conselheiro Relator à época;

5. 08/10/2007 - remessa dos autos à COG para reanálise;

6. 18/10/2007- parecer 799/2007 da COG que ratifica o parecer anterior (062/2006), ou seja, opinando pelo cancelamento da multa constante do item 6.2.1;

7. 01/07/2008 - remessa à COG para reanálise no tocante ao item 6.1 da decisão (débito);

8. 29/07/2008 - parecer 553/2008 da COG que sugere o não provimento do recurso, sem se reportar à multa constante do item 6.2.1;

Passo a analisar os itens combatidos pelo recorrente.

A Consultoria Geral, no parecer 553/2008 (fls. 74/88) assim se posicionou:

Contudo, a Lei 9.069/95, que dispõe sobre o Plano Real, proscreveu a cláusula de correção monetária com periodicidade inferior a um ano, estabelecendo - como regra - a incidência anual da atualização para os contratos celebrados ou convertidos em Real, com cláusula de correção monetária por índices de preço. (...)

Em síntese, não se enquadrando na definição de contrato habitacional e, conseqüentemente, na hipótese de reajuste mensal (art. 28, § 4º, Lei 9.069/95), o Contrato nº 31/95 deveria ter sido alterado, nos termos da Lei 8.666/93, para adequação ao art. 28, § 1º, da Lei 9.069/95, o que não foi feito.

Por fim, vale destacar que não há nos autos prova da inexistência de prejuízo à Companhia, que, de fato, custeou os pagamentos realizados a maior. É o que assenta, com muita propriedade, o Relatório de Auditoria nº 97/2000, à fl. 266 dos autos da AOR nº 00/05411688: (...)

Sendo assim, é o presente parecer pela manutenção do débito.

Contudo, muito embora assista razão à Consultoria quanto aos fatos relatados, entendo que não há elementos nos autos que justifiquem a imputação de débito ao responsável.

Explico:

Em 04/09/1995 foi formalizado o Contrato nº 31/95 (fls. 122/134 dos autos AOR nº 00/05411688) entre a Companhia de Habitação do Estado de Santa Catarina COHAB e a Construtora Almeidamaral Ltda., para a execução das obras relativas à construção do Conjunto Habitacional Alto Bela Vista, no Município de São José, consistente em 128 apartamentos de 2 quartos e 128 apartamentos de 3 quartos, com infra-estrutura, sistema de esgoto sanitário, sistema de abastecimento de água, rede de distribuição de energia elétrica, centro comunitário, creche e churrasqueira.

O Contrato firmado originou-se da Concorrência nº 21/95 (fls. 8/16 da AOR nº 00/05411688).

O débito de R$ 104.892,97 (cento e quatro mil, oitocentos e noventa e dois reais e noventa e sete centavos) imputado na decisão ora combatida é referente ao pagamento dos reajustes mensais relativos a medições dos serviços executados e dos materiais empregados na obra do acima referido Conjunto Habitacional, em desacordo com a Lei nº 9.069/95, que dispõe sobre o Plano Real.

A controvérsia está centrada na periodicidade dos reajustes de correção monetária aplicados ao Contrato nº 31/95, custeado pela COHAB. O Contrato nº 31/95 estabeleceu, como padrão de reajustamento das parcelas, o Índice Nacional de Custo da Construção (INCC) de aferição mensal (fls. 125-126 da AOR nº 00/05411688).

A Lei 9.069/95, que dispõe sobre o Plano Real, proibiu a cláusula de correção monetária com periodicidade inferior a um ano, estabelecendo a incidência anual da atualização para os contratos celebrados ou convertidos em Real.

No entanto, destaco que a Lei 9.069/95, que modificou o Sistema Monetário Nacional e estabeleceu regras gerais para acomodar ao novo sistema as obrigações contraídas na antiga moeda, foi editada em 29/06/1995 e o contrato formalizado pela COHAB o foi já em 04/09/1995.

Desta feita, entendo que o ajuste foi firmado justamente na fase de implantação da Lei, tendo vivenciado a transição para o novo Sistema Monetário, com as previsíveis polêmicas que certamente surgiram em relação à interpretação dos artigos da nova norma.

À época, inclusive, considerava o recorrente que, por pertencer a COHAB ao Sistema Financeiro Habitacional, não se sujeitava à proibição de reajustamento mensal aos seus contratos habitacionais.

Porém, no presente caso, embora a COHAB efetivamente pertença ao Sistema Financeiro, não agiu como instituição financiadora do crédito habitacional. Firmou com a Construtora Almeidamaral espécie de contrato administrativo.

Não obstante, a obra realizada visou acolher os apelos da comunidade, atendendo, pois, ao interesse público. Ademais, não se pode afirmar que houve prejuízo para a Companhia, pois segundo informa o recorrente, "todos os custos despendidos na obra integraram o valor unitário de venda das unidades construídas", as quais, relembro, se constituíram em "128 apartamentos de 2 quartos e 128 apartamentos de 3 quartos", com infra-estrutura, sistema de esgoto sanitário, sistema de abastecimento de água, rede de distribuição de energia elétrica, centro comunitário, creche e churrasqueira.

De outra parte, o pagamento dos combatidos reajustes deu-se em função do cumprimento de um contrato, obrigação legal do administrador, o que se não ocorresse, daí adviriam outras conseqüências muitíssimo mais danosas à Companhia, como a execução judicial da avença, pagamento de honorários e outras.

Assim ocorrendo, pelas razões acima expostas, proponho voto pelo cancelamento do débito imputado.

O parecer COG 062/2006 (fls. 09/20), no que se refere à multa constante do item 6.2.1 da decisão conclui que:

Item 6.2.2 - multa em face da execução da obra em percentual abaixo do previsto no cronograma físico-financeiro, sem justificativa, em descumprimento ao disposto no parágrafo único do art. 8º da Lei Federal n. 8.666/93

Consta do parecer COG - 553/2008 (fls. 74/88):

(...)

Por outro lado, no que concerne à multa aplicada em face da execução da obra em percentual abaixo do previsto no cronograma físico-financeiro, sem justificativa, argúi o recorrente que o descumprimento se deu em função da suspensão dos repasses à COHAB. Afirma não ter havido a rescisão do Contrato, porque havia promessa do Governo em repassar recursos, cujo descumprimento resultou na paralisação das obras. Alega que o ordenador primário não pode responder por ato que não praticou.

Igualmente, não assiste razão ao recorrente, que se limita a repetir os argumentos já aduzidos por ocasião da defesa preliminar, e rechaçados, em sua integralidade, pelo Relatório de Reinstrução nº 17/2002 (fl. 371 dos autos da AOR 00/05411688) e pelo voto de fls. 137-140 dos autos da TCE nº 02/06709900.

De acordo com o item II.2.5 do Relatório de Reinstrução nº 17/2002 (fl. 371 dos autos da AOR 00/05411688):

Com efeito, houve descumprimento do cronograma físico-financeiro, previsto na Cláusula Quarta do Contrato nº 31/95 (fl. 125 dos autos da AOR nº 00/05411688), conforme indica a papeleta de medição de fl. 211 (autos da AOR nº 00/05411688). Tal ocorrência, por si só, já é capaz de justificar a aplicação da presente sanção.

Quanto à alegação de que o descumprimento se deu em função da suspensão dos repasses à COHAB, não assiste razão ao recorrente.

O responsável, diante de eventual ausência de repasses financeiros, deveria ter procedido à rescisão unilateral do contrato, por motivo de interesse público, nos termos do art. 78, XII, da Lei 8.666/93, que contempla hipótese de cláusula exorbitante. (...)

Não agindo dessa maneira, o responsável assumiu pessoalmente o risco pela não realização de repasses e, conseqüentemente, pelo descumprimento do contrato. É o que se depreende das próprias razões recursais de fl. 30:

Como se vê, o recorrente, em suas razões, admite expressamente a ocorrência de atrasos na construção e de descumprimento do contrato, sem contudo, apresentar justificativa razoável.

Nesses termos, deve o recorrente ser responsabilizado pela restrição e pelo pagamento da penalidade pecuniária.

VOTO

1 O conhecimento do presente Recurso de Reconsideração, nos termos do art. 77 da Lei Complementar Estadual nº 202/00, interposto em face do Acórdão nº 326/2003 (fls. 141-143), proferido nos autos da Tomada de Contas Especial nº 02/06709900, para, no mérito, dar provimento parcial para:

1.1 cancelar o débito constante do item 6.1 e a multa constante do item 6.2.1;

1.2 ratificar os demais itens do acórdão recorrido;

2 Dar ciência do decisum, parecer e voto e pareceres COG n. 062/2006 e n. 553/2008 ao Sr. José Luiz Cunha, ex-Diretor-Presidente da Companhia de Habitação do Estado de Santa Catarina (COHAB) e à Companhia de Habitação do Estado de Santa Catarina (COHAB).

LUIZ ROBERTO HERBST

Conselheiro Relator