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ESTADO DE SANTA CATARINATRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADOGabinete do Auditor Gerson dos Santos Sicca | ||
PROCESSO N. | REC 03/07359719 | ||
UG/CLIENTE | DEPARTAMENTO DE ESTRADAS DE RODAGEM | ||
INTERESSADO | EDGAR ANTÔNIO ROMAN | ||
ASSUNTO | RECURSO DE REEXAME CONTRA DECISÃO DO PROCESSO AOR 01/04763264 |
É o relato.
PROPOSTA DE VOTO
I-PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE
O recurso é tempestivo e há interesse do recorrente. Além disso, a modalidade recursal ulilizada é adequada, nos termos do art. 80 da Lei Complementar nº 202/2000.
II- PRELIMINARES
II.1- INCOMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DE CONTAS PARA JULGAR ATOS JURÍDICOS
Alega o recorrente estar o Tribunal de Contas adstrito ao julgamento de contas e que o "Acórdão nº 1389/2003 não se refere a parecer prévio, nem trata de julgamento de contas públicas e, muito menos, de apreciação, para fins de registro, da legalidade de ato de admissão de pessoal ou de concessão de aposentadoria, reforma ou pensão."(fl.04) Diz que a Corte deliberou sobre responsabilidade de pessoa, não tendo julgado conta pública.
Para que se possa indagar sobre o fundamento das razões do recorrente é importante analisar as normas pertinentes à matéria. Quanto à competência do Tribunal de Contas, dispõe a Constituição do Estado de Santa Catarina:
A Lei Complementar nº 202/2000, por sua vez, ao disciplinar a competência do Tribunal de Contas de Santa Catarina, dispõe que:
A simples leitura dos dispositivos demonstra a ausência de qualquer incongruência entre a Constituição Estadual e a Lei Complementar nº 202/2000, de modo que análise da irresignação resume-se à suposta impossibilidade de "julgamento de atos" pelo Tribunal de Contas, na expressão utilizada pelo recorrente.
Não lhe assiste razão, entretanto. Como é possível verificar tanto na Constituição Estadual quanto na Lei Complementar nº 202/2000, a Corte de Contas tem expressa competência para "(...)aplicar aos responsáveis, em caso de ilegalidade de despesa", as sanções previstas em Lei." Por via de conseqüência, o raciocínio desenvolvido pelo recorrente é frontalmente contrário às disposições legais e constitucionais incidentes à espécie, o que afasta a sua pretensão de ver reconhecida a incompetência do Tribunal de Contas para aplicar sanções aos responsáveis por atos ilegais.
A fim de espancar quaisquer dúvidas, importante referir decisão do E. Supremo Tribunal Federal em que foi reconhecida a possibilidade do Tribunal de Contas de Santa Catarina aplicar multas previstas em Lei. O julgado enfrentava a alegação de inconstitucionalidade dos arts. 76 e 77 da Lei Complementar nº 31/90, já revogada, e que dispunham o seguinte:
Embora o texto do art. 77 tenha sofrido alterações ao longo da vigência da Lei Complementar nº 31/90, a essência dos comandos normativos sempre permaneceu a mesma, qual seja, a possibilidade de impor sanções por atos ilegais. E o Supremo Tribunal Federal, em julgado esclarecedor, decidiu o seguinte, no que se refere à competência do Tribunal de Contas de Santa Catarina:
Rejeito, portanto, a preliminar suscitada pelo recorrente, tendo em vista o firme posicionamento do Supremo Tribunal Federal, no sentido de reconhecer a competência do Tribunal de Contas para fixar sanções por atos que contrariem as normas legais.
II.2.) IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DE MULTA, POR NÃO SE TRATAR DE JULGAMENTO DE CONTAS;
Os argumentos apresentados na análise da primeira preliminar e principalmente o julgado oriundo do E. Supremo Tribunal Federal, referente ao Recurso Extraordinário nº 191985/SC, são suficientes para a rejeição da alegação de que o Tribunal de Contas não teria competência para punir com multa atos ilegais, o que somente seria possível em julgamento de contas.
Assim, afasto a preliminar.
II.3) INEXISTÊNCIA DE INSTAURAÇÃO DE TOMADA DE CONTAS ESPECIAL;
A preliminar argüida foi suficientemente rebatida pelo Parecer COG-274/07(fls.43-92), que demonstrou ser necessária a instauração de Tomada de Contas Especial apenas quando houver ato ilegal, ilegítimo ou antieconômico de que resulte prejuízo ao Erário, nos termos dos arts. 10, 32 e 65 da Lei Complementar nº 202/2000. Em vista disso, superada está a preliminar.
II.4) IDENTIFICAÇÃO INCORRETA DO RESPONSÁVEL;
O recorrente alega que "o fato do Titular ser a pessoa competente para cometer o ato final, não implica que ele, por isto e a priori, assume responsabilidade por todos os atos intermediários praticados pelos diversos órgãos e agentes administrativos encarregados de instruir e trazer à autoridade maior o ato pronto e acabado, para a sua assinatura(fl.10).
Sem razão.
O recorrente não comprova nos autos a alegada ausência de responsabilidade ou existência de qualquer delegação de competência. Apenas lança mão de argumentos que não encontram suporte probatório nos autos e mostram-se inaptos para um juízo favorável à sua pretensão.
Ademais, ainda que se tratasse de delegação de competência, subsistiria a responsabilidade do delegante, como se vê no Acórdão nº 292/2001, do Plenário do E. Tribunal de Contas da União, referente ao processo nº 007.312/2000-0, julgado em 14/11/2001 e publicado no Diário Oficial da União em 22/01/2002. Consta na decisão:
Rejeitada, portanto, a preliminar.
II.5) NECESSIDADE DE REGULAMENTAÇÃO DO ART. 70, II, DA LEI COMPLEMENTAR Nº 202/2000, A FIM DE QUE SE DEFINA O CONCEITO DE "GRAVE INFRAÇÃO"
Aduz o recorrente ser impossível a aplicação do art. 70, II, da Lei Complementar nº 202/2000, sem que haja a definição do conceito de "grave infração", o que deveria ser feito mediante resolução.
Sem fundamento a pretensão.
O conceito de "auto-aplicabilidade", originário da teoria constitucional e pertinente à classificação das normas constitucionais, serve para designar as situações em que o legislador constituinte, já no texto constitucional, apresenta os elementos necessários à aplicação do comando normativo no mundo dos fatos. Pelo contrário, quando o preceito remete ao legislador ordinário a regulamentação ou inexiste no texto legal elementos que possam indicar uma regra de conduta estar-se-á diante de norma sem auto-aplicabilidade.
No caso em questão, não se trata de preceito constitucional dirigido ao legislador ordinário e sim de expressa previsão legal que prevê sanção por violação de lei. O fato do legislador ordinário agregar o adjetivo "grave" ao conceito de "infração legal" não retira sua normatividade e a conseqüente capacidade de aplicação imediata. A interpretação dos conceitos legais, independentemente de sua imprecisão, é tarefa do operador do direito, que definirá, diante das circunstâncias relevantes para o caso concreto, os elementos conceituais que devem ser tomados em consideração.
A utilização de expressões vagas é corrente no direito, inclusive no direito penal, sem que se possa falar de uma violação ao princípio da legalidade. O conceito de "grave ingração" é colocado na lei justamente para distinguir os atos que merecem um sancionamento daqueles que configuram meras irregularidades. Sem essa nota conceitual, todos os atos dotados de algum vício, por mais irrelevante que fosse, gerariam uma sanção ao responsável, o que atentaria contra o princípio da proporcionalidade.
Por outro lado, a regulamentação pretendida pelo recorrente, ao invés de homenagear o princípio da legalidade seria totalmente contrária a este, pois a intenção do legislador, ao estabelecer um conceito com um certo grau de elasticidade foi justamente conferir ao aplicador elementos para uma justa ponderação do caso concreto, o que permite a busca de uma solução equilibrada. Com uma eventual regulamentação, o Tribunal estaria restringindo a atribuição para valorar claramente conferida pela lei ao aplicador do direito.
Também neste ponto, não merece acolhimento a preliminar.Passo a apreciar o mérito.
III- NO MÉRITO
O recorrente aduz não ter o Tribunal de Contas competência para sancionar ilícito penal. Neste ponto, correta a ponderação, de maneira que não pode subsistir a indicação do art. 299 do Código Penal no item 6.2.1.
A exclusão da tipificação, no entanto, não significa o afastamento total da irregularidade, já que há outros dispositivos legais apontados como fundamento legal da restrição. Resta saber, assim, se a irregularidade mantém-se mesmo com os demais argumentos apresentados pelo recorrente.
O recorrente ratifica as explicações apresentadas no processo AOR 01/04763264, tendo afirmado que nos anos 90 houve muitas demandas judiciais cujo objeto era a condenação do Departamento de Estradas de Rodagem ao pagamento de horas extras. De acordo com o recorrente, "Até os primeiros anos da década de noventa, o DER não estabelecia limite de horário para registro de ponto. Isto permitiu que muitos servidores registrassem horário de chegada e saída antes e após respectivamente o horário de expediente; isto mesmo sem trabalhar nos horários a mais"(fl.401 do processo originário).
Afirma o recorrente que a situação de abuso foi coibida com a determinação de horários certos para o registro de ponto.
Obviamente, a assinatura do ponto com a indicação de horários que não correspondem com o período trabalhado é totalmente inadequada, sendo prática que, se realizada pelos servidores, constitui grave infração que deve ser investigada e punida, principalmente se realizada com o intento de obter vantagens pecuniárias indevidas. No entanto, a simples obrigação dos servidores de assinar o ponto em horários certos não cumpre com a obrigação de existência de controle de horário, já que pode estar ocorrendo desvirtuamento das declarações com o período efetivamente trabalhado.
A auditoria constatou in loco(fls. 23-24 do processo originário) a ausência de um controle efetivo de horário, sendo que parte dos servidores atuam em equipes de trabalho que se deslocam para realizar suas atividades. Além disso, o próprio responsável, ao defender-se com o argumento de que a fixação de horários rígidos para o ponto serviria para afastar as horas extras, está reconhecendo ausência do controle efetivo, tanto que a medida foi adotada justamente porque não havia qualquer verificação adequada da entrada e saída dos servidores. Para coibir as falsidades criou-se outra ficção.
Portanto, a constatação da auditoria deve ser privilegiada, ao ter verificado no local que os servidores, muitos com atividades em locais distantes da repartição, apresentavam sempre os mesmos horários de entrada e saída. As normas do Estatuto dos Servidores, utilizadas para identificar a irregularidade, obrigam o administrador a manter um controle efetivo de freqüência, sendo inadequado que crie conduta que burle o sentido dos preceitos legais, especialmente o disposto no art.25 da Lei n. 6745/85.
Por fim, deve-se dizer que não pode haver o cancelamento da multa por uma suposta penalização dupla. Cada auditoria realizada analisa um conjunto de fatos específico, sendo indiferente que todos os locais analisados pertençam a uma mesma autarquia. Logo, em cada setor auditado deve-se imputar responsabilidade pelos fatos ali verificados.
Diante dos argumentos expostos, não acolho a sugestão da COG, por entender que a mera retirada da referência ao art. 299 do Código Penal não desautoriza a manutenção do restante da fundamentação legal, e mantenho a multa, dando provimento ao recurso apenas para alterar a redação do item 6.2.1, que passa a ser a seguinte:
Passo à análise do próximo item.
Quanto a este item, o recorrente reconheceu o desvio de função e afirmou ser situação normal no serviço público. Embora seja certo que a impropriedade não seja única do órgão, é situação que deve ser refutada pela Administração e pelos órgãos de controle, razão pela qual se mantém a multa aplicada.
Enntende a Consultoria Geral que a multa deve ser afastada porque o apontamento é próprio de auditoria operacional, de modo que não poderia o Tribunal, nessa hipótese, aplicar multa. Conquanto reconheça a substância do argumento, não posso concordar com a afirmação.
A restrição que motivou a multa é relativa ao fato de que a autarquia não tinha qualquer controle da freqüência dos vigias noturnos terceirizados, já que a folha-ponto era controlada apenas pela empresa contratada. Por esse motivo, o DER estaria efetuando pagamentos à empresa sem a verificação do direito do credor com base em títulos e documentos comprobatórios do crédito, nos termos do art. 63 da Lei nº 4.320/64, ou seja, sem saber que o serviço havia sido prestado.
A auditoria constatou que o DER não possuía um acompanhamento do cumprimento dos serviços, por meio de cópia das folhas-ponto dos servidores, o que representa uma irregularidade. Contudo, ainda que a autarquia devesse adotar a melhor forma de verificação da realização do objeto do contrato de prestação de serviços de vigilância, a inexistência de elementos que indicassem eventuais falhas no serviço, o que não pode ser comprovado com a simples afirmação da falta de cópia das folhas-ponto, indicam que a sanção deve ser afastada, diante da inexistência de grave infração à norma legal.
Diante do exposto, entendo que a multa contida no item 6.2.3 deve ser cancelada.
O recorrente alega não ser irregular o procedimento adotado, qual seja, pagar por determinada quantidade de combustíveis e abastecer conforme as necessidades da autarquia. O que ocorreu, em síntese, foi um pagamento antecipado pelo combustível, com retirada a posteriori. Para o recorrente, haveria uma desconfianças dos donos de postos em vender combustíveis ao Estado, em razão do atraso nos pagamentos.
Deve ser mantida a multa. O processo de despesa pública, para que seja concluído regularmente, deve passar pela liquidação, que, de acordo com o art. 63 da Lei nº 4.320/64, "consiste na verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito". Por via de conseqüência, o administrador somente pode pagar pelo objeto entregue, sendo inadmissível que adiante o pagamento sem a entrega do produto, o que poderia gerar graves danos ao erário, na hipótese em que os contratados não viessem a cumprir com suas obrigações.
De outra parte, se há falta de confiança em relação ao Estado, essa é uma situação que somente pode ser superada com uma atitude correta dos administradores públicos diante da satisfação dos créditos, procurando não gastar mais do que os recursos arrecadados. Caso seja verdadeira a hipótese suscitada pelo recorrente, de que o Estado demora a pagar, há indício fundado de que a Lei de Responsabilidade Fiscal não está sendo respeitada em sua integralidade, situação que não poderia ser apurada no presente momento.
Mantém-se, portanto, a multa aplicada, como sugerido pela Consultoria Geral.
A Diretoria de Controle da Administração Estadual, na reinstrução do processo originário(fl.414-415), fundamentou a restrição da seguinte maneira:
Havia, portanto, deficiência no controle de entrada e saída dos materiais, irregularidade que, inclusive, motivou a adoção de providências pela Unidade para a sua correção , como informou o responsável em suas justificativas no processo originário(fl.353), comprovando a afirmação com os documentos de fls. 361-366.
As medidas posteriores para sanar irregularidades não justificam, por si só, o afastamento de penalidade. Para verificar o enquadramento normativo da infração deve-se verificar o disposto no art. 15, VI, do Regimento Interno do DER, aprovado pelo Decreto n. 1.164/96, referido na decisão recorrida, cujo teor é o que segue:
Discordo da posição apresentada pela Consultoria Geral neste ponto, tendo em vista que o art. 15, VI, típica norma atributiva de competência, traz subjacente o dever de realizar o efetivo controle de estoque e de utilização dos materiais. Assim, como a auditoria constatou a deficiência no controle, correta a referência ao Decreto n. 1.164/96, devendo ser mantida a multa aplicada.
Quanto a este item o responsável afirma que à época da auditoria havia veículos, equipamentos e peças/carroçarias estacionados no pátio do 20º Distrito Rodoviário, enviados para o local em dezembro de 2002, e que não houve grave infração à norma legal.
A Consultoria Geral, por seu turno, sugere o cancelamento da multa porque a Instrução Normativa não teria a característica de norma regulamentar, para efeito do art. 70, inciso II, da Lei Complementar nº 202/2000, expressão que designaria tão-somente o decreto.
Feita essa afirmação pela COG, é essencial que se esclareça o sentido da expressão "norma regulamentar".
De acordo com Celso Antônio Bandeira de Mello2, regulamento é o "ato geral e(de regra) abstrato, de competência privativa do Chefe do Poder Executivo, expedido com a estrita finalidade de produzir as disposições operacionais uniformizadoras necessárias à execução de lei cuja aplicação demande atuação da Administração Pública". Já as resoluções, instruções e portarias "na pirâmide jurídica, alojam-se em nível inferior ao próprio regulamento"3.
Conclui-se, portanto, que está correta a Consultoria Geral ao excluir do sentido da expressão "norma regulamentar" as instruções normativas, e isso porque o regulamento é aquele editado pelo chefe do Poder Executivo para o fiel cumprimento da Lei, sendo figura diversa dos atos expedidos por autoridades inferiores no escalão administrativo e cujo objetivo é a expedição de ordens destinadas à organização interna do serviço.
Dessa maneira, tendo a multa sido fundamentada em Instrução Normativa, instrumento que não se enquadra no conceito de "norma regulamentar", sem qualquer referência a Lei ou Decreto, impõe-se o cancelamento da multa, salientando-se que o cumprimento de atos de eficácia meramente interna deve ser garantido pelas próprias autoridades que os expediram.
Alega o responsável que nenhum dos artigos citados pela Instrução determina que os bens emprestados pela Administração Pública devam ser escriturados no Sistema de Compensação. Diz, ainda, que o DER sempre manteve o controle dos bens cedidos a Prefeituras.
A Consultoria Geral, por seu turno, entendeu que "a ausência de registro na contabilidade constitui falha formal, não se configurando entretanto em uma transgressão aos ditames dos artigos mencionados como vulnerados pela instrução"(fl.81).
O DER emprestou equipamentos(carregadeira de pneus, monotoniveladora, rolo vibratório, trator de esteira, basculante) às Prefeituras Municipais de Nova Veneza e Içara, mediante os contratos de cessão de uso nºs 098 e 099/2001. Conforme a Instrução do processo originário, os aludidos bens deveriam estar registrados no Sistema de Compensação, de maneira que o procedimento adotado não estaria em conformidade com os arts. 83 a 87 da Lei nº 4.320/64.
A questão está em saber se os dispositivos mencionados impunham ao administrador o registro no sistema de compensação/balanço patrimonial dos bens em poder de terceiros, por força de contrato de cessão de uso.
À partida, ressalto que o art. 83 da Lei nº 4.320/64 é claro ao dispor que "A contabilidade evidenciará perante a Fazenda Pública a situação de todos quantos, de qualquer modo, arrecadem receitas, efetuem despesas, administrem ou guardem bens a ela pertencentes ou confiados". O art. 85, por sua vez, dispõe o seguinte:
Já o art. 87 estabelece que "Haverá controle contábil dos direitos e obrigações oriundos de ajustes ou contratos em que a Administração for parte".
Nota-se que há determinação legal para que a contabilidade pública abranja todos os bens, direitos e obrigações da Administração, a fim de que reflita com a maior exatidão posição a posição orçamentária, financeira e patrimonial do Ente Público. Por via de conseqüência, os bens cedidos devem constar nos registros contábeis.
Não obstante, ainda que fosse necessário o devido registro dos bens objeto de cessão de uso, observo que, no caso concreto, a restrição é de pouca relevância. Além disso, a cessão ocorreu para Prefeituras Municipais, que também executam importantes tarefas atinentes à manutenção de estradas. Dessa maneira, em razão da pouca magnitude da infração, concluo pelo afastamento da multa.
A Consultoria Geral, quanto a este item, manifestou-se nos seguintes termos(fl.82):
A Instrução, no processo originário, constatou que "com relação ao controle dos veículos, verifica-se uma situação de verdadeira morosidade do Estado em tomar as devidas providências, visto que os veículos chegam a permanecer no pátio dos postos por períodos longos,meses, anos e, em alguns casos, décadas"(fl.421).
O responsável, ao responder a audiência no processo que gerou a decisão recorrida, informou que "a Direção Geral do DER/SC, está providenciando o equacionamento dos leilões dos veículos apreendidos pelas PREs nas rodovias estaduais, tendo já designado uma comissão, para viabilizar o leilão dos referidos veículos."(fl.355).Não juntou documentos que demonstrassem a situação dos bens apreendidos e a constituição da comissão de avaliação da situação. No recurso, inovou nas alegações, tendo afirmado que nem todos os veículos estariam em condições de ser leiloados, além do que não teria havido grave infração à norma legal ou regulamentar de caráter contábil, orçamentário, financeiro, operacional ou patrimonial.
Não acompanho, com a devida venia, a posição sustentada pela Consultoria Geral. Para tanto, fundamento meu entendimento na disposição contida no art. 328 do Código de Trânsito Brasileiro(Lei nº 9503/97), verbis:
Está correta a Consultoria Geral quando afirma que o prazo de noventa dias não é para a Administração Pública. Todavia, o art. 328 é claro ao estabelecer que os veículos apreendidos ou removidos a qualquer título e não reclamados devem ser levados à hasta pública, de forma que o preceito claramente constitui uma obrigação ao administrador público. Assim, aquele que deixa veículos ao relento, como no caso concreto, e não adota as devidas providências, está agindo em desconformidade com os mandamentos de correta observância do interesse público, de maneira que há evidente grave infração à norma legal. Não mereceria reparos, portanto, a decisão recorrida.
Por outro lado, o argumento apresentado apenas no recurso de que nem todos os veículos estariam em condições de ser levados a hasta pública não pode ser acolhido, já que não foi juntada qualquer documentação comprobatória do alegado.
Entretanto, ainda que este Relator entenda restar configurada a grave infração à norma legal, não se pode desconsiderar o fato de que, em recente julgado, referente ao processo nº 03/07360059(Decisão nº 1896/2007), de 03/10/2007, o Plenário acolheu proposta de voto da Auditora Sabrina Nunes Yocken, que acolheu a sugestão da Consultoria Geral e afastou a multa. Cito o trecho que segue, da referente proposta de voto:
Sendo assim, a fim de evitar disparidade decisória, o que seria inadequado, afasto a multa, não obstante entenda que está o administrador público obrigado a levar a hasta pública os bens apreendidos e não reclamados.
A multa foi aplicada porque o DER estaria utilizando trabalhadores para a realização de atividades finalísticas da autarquia, o que caracterizaria violação à regra do concurso público, prevista no art. 37, II, da Constituição Federal. De acordo com o responsável, os empregados da SETEP atuaram junto ao pessoal do DER na conservação de estradas, sem subordinação, no entanto.
A Consultoria Geral, por seu turno, entendeu que a terceirização de atividade materiais que não são típicas de Estado não é vedada.
Acolho o entendimento da Consultoria Geral. A conservação de estradas, ainda que seja estabelecida por lei como atribuição da autarquia, é uma atividade de cunho eminentemente material que não requer o exercício de nenhuma das prerrogativas específicas do poder administrativo. Assim como o DEINFRA, atualmente, pode contratar uma empresa para a construção de uma rodovia, nada impede que a manutenção seja viabilizada da mesma maneira, atentando-se apenas para o fato de que a terceirização não será admitida quando as funções estejam previstas no plano de cargos do órgão,sendo elucidativa a lição de Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, verbis:
Note-se, aliás, que o intento de desoneração da Administração quanto à realização material de atividades meramente executivas, no âmbito da Administração Federal, veio prevista já no Decreto-Lei nº 200/67, no seu artigo 10, abaixo citado:
No caso em questão, a auditoria realizada não comprovou que a contratação da empresa SETEP-Topografia e Construções Ltda. serviu para realizar funções previstas para cargos existentes na autarquia, havendo apenas uma afirmação ampla de que "O contrato está sendo utilizado basicamente para complementação do pessoal do DER/SC", sem maiores esclarecimentos, essenciais para a apreciação da matéria.
Portanto, diante da ausência de outros elementos que indicassem a irregularidade da terceirização realizada, situação que deveria ser analisada na auditoria com maior detalhamento, afasto a multa aplicada.
Ante o exposto, proponho ao E. Plenário o seguinte voto:
6.2.7. R$ 200,00 (duzentos reais), em face da não-contabilização, no Sistema de Compensação/Balanço Patrimonial, na conta Valores em Poder de Terceiros, pela administração, dos equipamentos emprestados à Prefeituras Municipais, em descumprimento aos arts. 83 a 87 da Lei Federal n. 4.320/64 (item 9 do Relatório DCE);
"Art.85- Os serviços de contabilidade serão organizados de forma a permitir o acompanhamento da execução orçamentária, o conhecimento da composição patrimonial, a determinação dos custos dos serviços industriais, o levantamento dos balanços gerais, a análise e a interpretação dos resultados econômicos e financeiros."
6.2.8. R$ 200,00 (duzentos reais), em face da ausência de procedimentos para leiloar os veículos apreendidos pela Polícia Rodoviária Estadual - PRE, em descumprimento ao art. 328 do Código de Trânsito Brasileiro (item 7 do Relatório DCE);
"A regra prevista no artigo 328 do Código de Trânsito Brasileiro ao dispor que os veículos apreendidos ou removidos a qualquer título e os animais não reclamados por seus proprietários, dentro do prazo de noventa dias, serão levados à hasta pública, não se configura como norma de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional ou patrimonial, o que realmente impede a aplicação da multa prevista no artigo 70, II da Lei Complementar nº 202/2000.
O Artigo de Lei em questão, estabelece um direito do Órgão Público de agira conforme a lei, não fixando um prazo para que esta ação seja implementada, o prazo fixado na lei é para o proprietário do bem, que não o fazendo dentro de noventa dias, estará sujeito ao estabelecido na regra legal."
"Art. 328. Os veículos apreendidos ou removidos a qualquer título e os animais não reclamados por seus proprietários, dentro do prazo de noventa dias, serão levados à hasta pública, deduzindo-se, do valor arrecadado, o montante da dívida relativa a multas, tributos e encargos legais, e o restante, se houver, depositado à conta do ex-proprietário, na forma da lei."
"(...);
Nota-se que a norma do Código de Trânsito não fixa prazo para que a Administração realize leilão dos bens apreendidos. Então não se pode fundamentar nesse dispositivo a aplicação da multa, por motivo de não realização do leilão. Considerando que o Acórdão n. 1386/2003 já contém recomendação para que a Unidade Gestora realize o leilão dos veículos e semoventes apreendidos - item 6.3, letra b - descabe proposição nesse sentido.
(...);"
6.2.9. R$ 200,00 (duzentos reais), em face da utilização indevida, para suprir a falta de servidores da Autarquia, do objeto do contrato de empreitada firmado entre o DER/SC e SETEP-Topografia e Construções Ltda., em descumprimento ao art. 37, II, da Constituição Federal (item 12 do Relatório DCE).
"O que pode e o que não pode ser terceirizado?
A resposta deve ser contextualizada no mesmo âmbito e com a mesma dificuldade que vive o Direito Administrativo, em relação ao conceito de serviço público. Ambos têm forte matiz política na definição de suas cores. O Direito, porém, fornece em cada época os limites precisos de cada um deles, admitindo-se uma nuvem cinzenta na zona intermediária.
Costuma-se afirmar que não podem ser terceirizadas as atividades fim de cada empresa ou instituição. A primeira vista esta restrição é suficientemente clara; em termos práticos, contudo, há dificuldade de separar o que é propriamente atividade fim. Veja-se o exemplo das companhias telefônicas e a extraordinária mudança de mentalidade que ocorreu até a privatização. No começo estendiam os cabos, importavam aparelhos telefônicos, gerenciavam a produção, reparavam os defeitos, com empregados do próprio quadro.
Tudo isso era atividade fim. Mais tarde tornou-se raro o usuário do serviço ter contato com empregados dessas companhias: essas etapas da prestação do serviço foram terceirizadas; os empregados passaram a desenvolver as atividades de planejamento, controle e coordenação.Desse modo, embora tal parâmetro seja enfatizado pela doutrina, não se revela o mais prático.
Melhor mesmo é verificar o conjunto de atividades que o empregador, no caso a Administração Pública, definiu como específica dos integrantes do seu quadro de pessoal.
Esse parâmetro é o mais correto, pois:
a) parte da manifestação de vontade dos dirigentes da empresa ou da vontade do legislador, que previamente estruturou o quadro de pessoal, distinguindo atividades próprias do quadro e por exclusão admitindo-se a terceirização das demais;
b) evita pleitos trabalhistas buscando a caracterização da relação de emprego e equiparação entre empregados da contratada e empregado ou servidor do quadro da contratante;
c) é medida de Justiça que não se coloquem, lado a lado, pessoas sujeitas a regime de trabalho e salários diferentes;
d) finalmente, torna clara e flexível a possibilidade de transição com a adoção da figura de cargo ou emprego "em extinção", viabilizando o decurso de tempo para adaptação."(Fernandes, Jorge Ulisses Jacoby.Terceirização: restrições e cautelas na aplicação no serviço público. Fórum de Contratação e Gestão Pública - FCGP, Belo Horizonte, n. 58, ano 5 out. 2006, pag. 7871 a 7877. Disponível em:<http://www.editoraforum.com.br/sist/conteudo/lista_conteudo.asp?FIDT_CONTEUDO=37804> Acesso em: 08 nov. 2007.
"Art. 10. A execução das atividades da Administração Federal deverá ser amplamente descentralizada.
(...);
7º Para melhor desincumbir-se das tarefas de planejamento, coordenação, supervisão e contrôle e com o objetivo de impedir o crescimento desmesurado da máquina administrativa, a Administração procurará desobrigar-se da realização material de tarefas executivas, recorrendo, sempre que possível, à execução indireta, mediante contrato, desde que exista, na área, iniciativa privada suficientemente desenvolvida e capacitada a desempenhar os encargos de execução."
6.1. Conhecer do Recurso de Reexame, nos termos do art. 80 da Lei Complementar n. 202/2000, interposto contra o Acórdão n. 1389/2003, exarado na Sessão Ordinária de 11/08/2003, nos autos do Processo n. AOR 01/04763264, para, no mérito, dar-lhe provimento parcial, nos seguintes termos:
6.1.1. Modificar a redação do item 6.2.1 da decisão recorrida, que passa a ser a seguinte:
"6.2.1. R$ 200,00 (duzentos reais), em face da não-adequação do controle de freqüência dos servidores do 20º Distrito Rodoviário do DER/SC, em descumprimento aos arts. 25 e 93 da Lei n. 6.745/85(item 1 do Relatório DCE);"
6.1.2. Cancelar as multas previstas nos itens 6.2.3, 6.2.6, 6.2.7, 6.2.8 e 6.2.9 do Acórdão n. 1389/2003.
6.1.3. Manter os demais termos da decisão recorrida.
6.2. Dar ciência da decisão, do relatório e voto do relator, bem como do Parecer COG n. 274/07(fls.43-92), ao Sr. Edgar Antônio Roman.
Gabinete, em 12 de novembro de 2007.
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SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Recurso Extraordinário nº 190985/SC. Rel. Min. Néri da Silveira. Tribunal Pleno. J. Em 14/02/1996. DJ de 24/08/2001.p.61.
2 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 23Ed. São Paulo: Malheiros, 2007.p.329.
3 Id., p.355.