ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO

 

 

PROCESSO:                       REC 03/07558240

UG/CLIENTE:                     Fundação Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC

INTERESSADO:                Raimundo Zumblick

ASSUNTO:                          Recurso de Reconsideração no Processo APC TC 0330102/75

 

 

Recurso de Reconsideração. Responsabilização do ordenador de despesas. Ausência de bilhetes de passagem aérea. Apresentação de outras provas documentais. Atestado da liquidação de despesa. Possibilidade.

Desvio de finalidade na aplicação de recursos conveniados. Pagamento de empresa de tíquetes alimentação para servidores universitários por meio da associação. Cobrança de CPMF. Irregularidade diversa da fundamentada pelo acórdão. Cancelamento de multa. Princípio da non reformatio in pejus.

Pagamento de diárias aos servidores de fundação de ensino. Curso de mestrado. Decreto 1.170/96. Inaplicabilidade. Autonomia de gestão financeira e patrimonial conferida pelo art. 169 da CESC.

 

I - RELATÓRIO

Cuidam os autos de manifestação recursal interposta por Raimundo Zumblick contra o Acórdão n° 1774/2003, prolatado no Processo APC - 0330102/75 e proferido na sessão ordinária do dia 15/09/2003. As razões recursais firmadas pelo ex-Reitor da Fundação Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC foram autuadas nesta Corte de Contas como Recurso de Reconsideração, protocolo nº 018569 de 24/10/2003, com o objetivo de ver modificado parte do acórdão, cujo teor observa-se:

“ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos arts. 59 da Constituição Estadual e 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:

6.1. Julgar irregulares, com imputação de débito, com fundamento no art. 18, III, "c", da Lei Complementar n. 202/2000, as contas de recursos antecipados referentes às notas de empenho abaixo relacionadas:

NE     DATA     ITEM     FONTE P/A    VALOR    CREDOR

2223 26/05/97 31320021 50 2190       15.000,00 Luiz Gonzaga Silvano

2289 30/05/97 31320019 20 2100       20.200,00 Sérgio Medeiros

2455 03/06/97 31320019 20 2099       1.650,00 Lenir Benvinda Fleith Rosa

2602 18/06/97 31320021 20 2098       10.000,00 Luiz Gonzaga Silvano

2651 23/06/97 31320019 20 2099            930,00 Valdinei Beltrame

3424 13/08/97 31110203 20 2190       10.000,00 Luiz Gonzaga Silvano

3598 26/08/97 31200006 20 2099      300,00 Gustavo José Fleury Charmillot

3755 05/09/97 31110203 20 2190      10.000,00 Gustavo José Fleury Charmillot

[...]

6.3. Condenar o Responsável – Sr. Raimundo Zumblick - ex-Reitor da Fundação Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC, ao pagamento das quantias abaixo discriminadas, relativas à parte irregular das notas de empenho citadas acima, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar a este Tribunal o recolhimento dos valores dos débitos aos cofres do Tesouro do Estado, atualizados monetariamente e acrescidos de juros legais, calculados a partir da data da ocorrência do fato gerador do débito (arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), ou interpor recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, II, do mesmo diploma legal):

6.3.1. R$ 179,65 (cento e setenta e nove reais, sessenta e cinco centavos), relativa à parte irregular da Nota de Empenho n. 2223, em face da ausência da nota de estorno da despesa, ferindo o disposto no art. 44, inciso VI, da Resolução n. TC-16/94 (item 6 do Relatório DCE);

6.3.2. R$ 1.926,21 (hum mil, novecentos e vinte e seis reais, vinte e um centavos), relativa à parte irregular da Nota de Empenho n. 2289, em face da ausência de documentação regular comprobatória da despesa relativa ao pagamento de passagens aéreas, contrariando o disposto no art. 63, § 2°, inciso III, da Lei Federal n. 4.320/64 c/c o art. 58 da Resolução n. TC-16/94 (item 4 do Relatório DCE);

6.3.3. R$ 82,42 (oitenta e dois reais, quarenta e dois centavos), relativa à parte irregular da Nota de Empenho n. 2455, em face da ausência da nota de estorno da despesa, ferindo o disposto no art. 44, inciso VI, da Resolução n. TC-16/94 (item 6 do Relatório DCE);

6.3.4. R$ 30,81 (trinta reais, oitenta e um centavos), relativa à parte irregular da Nota de Empenho n. 2602, em face da ausência da nota de estorno da despesa, ferindo o disposto no art. 44, inciso VI, da Resolução n. TC-16/94 (item 6 do Relatório DCE);

6.3.5. R$ 8,12 (oito reais, doze centavos), relativa à parte irregular da Nota de Empenho n. 2651, em face da ausência da nota de estorno da despesa, ferindo o disposto no art. 44, inciso VI, da Resolução n. TC-16/94 (item 6 do Relatório de DCE);

6.3.6. R$ 25,00 (vinte e cinco reais), relativa à parte irregular da Nota de Empenho n. 3424, pela não apresentação da guia de recolhimento à Tesouraria da UDESC (art. 44, inciso VI, da Resolução n. TC-16/94), em face do pagamento de ½ (meia) diária a mais em favor do servidor Ricardo Wagner Ad Vincula Veado, em desacordo com o disposto no art. 103, § §1º e 2º, da Lei Estadual n. 6.745/85 (item 10 do Relatório DCE);

6.3.7. R$ 19,84 (dezenove reais, oitenta e quatro centavos), relativa à parte irregular da Nota de Empenho n. 3598, em face da ausência da nota de estorno da despesa, ferindo o disposto no art. 44, inciso VI, da Resolução n. TC-16/94 (item 6 do Relatório DCE);

6.3.8. R$ 1,25 (um real, vinte e cinco centavos), relativa a parte irregular da Nota de Empenho n. 3755, em face da ausência da nota de estorno da despesa, ferindo o disposto no art. 44, inciso VI, da Resolução n. TC-16/94 (item 6 do Relatório DCE);

6.3.9. R$ 75,00 (setenta e cinco reais), relativa a parte irregular da Nota de Empenho n. 3755, em face do pagamento de 1 ½ diária (uma diária e meia) à servidora Márcia Maria Pauletti sem a apresentação dos bilhetes de passagens dos deslocamentos e/ou de qualquer outro documento comprobatório da efetiva realização da viagem, com infração ao disposto no art. 63, § 2°, inciso III, da Lei Federal n. 4.320/64 c/c o art. 62, inciso II, da Resolução n. TC-16/94 (item 12 do Relatório DCE).

[...]

6.5. Aplicar ao Sr. Raimundo Zumblick - ex-Reitor da Fundação Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC, as multas abaixo discriminadas, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar ao Tribunal o recolhimento das mesmas ao Tesouro do Estado, ou interpor recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos artigos 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000:

6.5.1. com fundamento nos arts. 69 da Lei Complementar n. 202/00 e 108, parágrafo único, c/c o 307, V, do Regimento Interno instituído pela Resolução n. TC-06/2001, as multas abaixo discriminadas, com base nos limites previstos no art. 239, I, do Regimento Interno (Resolução n. TC-11/1991) vigente à época da ocorrência das irregularidades:

6.5.1.1. R$ 200,00 (duzentos reais), sendo R$ 100,00 (cem reais) por ato irregular, em face da inclusão de despesas com a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira – CPMF, no tocante aos repasses à Associação dos Servidores da UDESC, referente às Notas de Empenho ns. 2442 e 2975, caracterizando desvio de finalidade na aplicação de recursos conveniados, tendo em vista o descumprimento do art. 116, § 3°, II, da Lei Federal n. 8.666/93 (item 9 do Relatório DCE);

6.5.1.2. R$ 100,00 (cem reais), em face do pagamento de diária ao servidor Jânio Pedro Nolli em data coincidente com a presença do mesmo no seu local de trabalho, segundo verificado no registro de freqüência diário, relativamente à Nota de Empenho n. 2851, com infração ao disposto nos arts. 74 da Constituição Federal, 62 da Constituição Estadual (deficiência de controle interno) e 25, § 2°, da Lei Estadual n. 6.745/85 (item 14 do Relatório DCE);

6.5.1.3. R$ 400,00 (quatrocentos reais), sendo R$ 100,00 (cem reais) por ato irregular, em face do pagamento de despesas com diárias a servidores com o objetivo de freqüentar cursos, congressos, seminários, conferências e assemelhados, sem apresentação da devida autorização governamental e conseqüente exposição de motivos, relativamente às Notas de Empenho ns. 2851, 3025, 3335 e 3600, contrariando o que estabelece o art. 3° do Decreto Estadual n. 611/95, com nova redação dada pelo art. 1º, § 3º, do Decreto Estadual n. 1.170/96 (item 16 do Relatório de DCE);

6.5.2. com fundamento nos arts. 70, II, da Lei Complementar n. 202/00 e 109, II, c/c o 307, V, do Regimento Interno instituído pela Resolução n. TC-06/2001, a multa no valor de R$ 100,00 (cem reais), com base nos limites previstos no art. 239, III, do Regimento Interno (Resolução n. TC-11/1991) vigente à época da ocorrência da irregularidade, em face do pagamento de despesas com diárias a servidores com o objetivo de freqüentar cursos, congressos, seminários, conferências e assemelhados, sem apresentação da devida autorização governamental e conseqüente exposição de motivos, relativamente à Nota de Empenho n. 3424, contrariando o que estabelece o art. 3° do Decreto Estadual n. 611/95, com nova redação dada pelo art. 1º, § 3º, do Decreto Estadual n. 1.170/96 (item 16 do Relatório de DCE).

[...]

6.8. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Relatório de Reinstrução DCE/Insp.1/Div.1 n. 069/2002, à Fundação Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC e ao Sr. Raimundo Zumblick - ex-Reitor daquela entidade.”

 

Os autos foram encaminhados à Consultoria Geral que através do Parecer COG-291/2007 (fls. 11/26), manifestou-se no sentido de:

1) Conhecer do Recurso de Reexame, nos termos do art. 80 da Lei Complementar nº 202/2000, interposto contra o Acórdão 1774/2003, proferido na Sessão Ordinária do dia 15/09/2003, no Processo APC - 0330102/75, e, no mérito, dar-lhe provimento parcial para:

1.1 - alterar o item 6.1 do acórdão recorrido, que se refere à responsabilização, para, com fundamento no art. 18, III, “c”  julgar irregulares com imputação de débito as contas de recursos antecipados referentes às notas de empenho abaixo relacionadas:

NE     DATA     ITEM     FONTE P/A    VALOR    CREDOR

2223 26/05/97 31320021 50 2190       15.000,00 Luiz Gonzaga Silvano

2455 03/06/97 31320019 20 2099       1.650,00 Lenir Benvinda Fleith Rosa

2602 18/06/97 31320021 20 2098       10.000,00 Luiz Gonzaga Silvano

2651 23/06/97 31320019 20 2099            930,00 Valdinei Beltrame

3598 26/08/97 31200006 20 2099      300,00 Gustavo José Fleury Charmillot

 1.2 - Tornar insubsistente as responsabilizações impostas nos itens 6.3.2; 6.3;6; e 6.3;9 do acórdão recorrido.

 1.3 - Cancelar as multas constantes dos itens 6.5.1.1; 6.5.1.2; do Acórdão 1774/2003;

2) Manter na íntegra os demais termos do acórdão recorrido.

3) Dar ciência desta Decisão, bem como do Parecer e Voto que a fundamentam ao Sr. Raimundo Zumblick, ex-Reitor da Fundação Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC, bem como a entidade auditada.

 

O Ministério Público Especial, por meio do Parecer nº 3775/2008, opinou no sentido de conhecer o recurso e, no mérito, dar provimento parcial para cancelar as condenações impostas nos itens 6.3.2 e 6.3.6; e as multas aplicadas nos itens 6.5.1.1, 6.5.1.2, 6.5.1.3 e 6.5.2 da decisão recorrida.

Vieram os autos conclusos.

É o breve relatório.

II – DISCUSSÃO

Ab initio, o presente apelo merece ser conhecido, uma vez que o responsável possui legitimidade para recorrer e o reclamo é adequado, não obstante o parecer da COG ter opinado pelo recebimento do mesmo como recurso de reexame. A decisão combatida foi publicada no DOE, em 10/11/2003, conforme registro a fls. 317 e o recurso foi oferecido em 24/10/2003, respeitado, pois, o trintídio legal.

No mérito, o recorrente combate as sanções imputadas em virtude de diversas irregularidades levantadas pela DCE, as quais serão devidamente separadas a fim de tornar o estudo mais didático.

II.1. Ausência de estorno orçamentário

Com relação aos itens 6.3.1, 6.3.3, 6.3.4, 6.3.5, 6.3.7, 6.3.8 o recorrente alega que o fato de não ter havido estorno orçamentário não quer dizer que o valor não tenha sido recolhido aos cofres da UDESC. Contudo, deixou de colacionar aos autos qualquer prova substancial sobre a sua convicção, motivo pelo qual merecem ser mantidas as penas pecuniárias impostas nesses pontos.

II.2. Inexistência de bilhetes de passagem aérea para comprovar a liquidação de despesa:

No que se refere à condenação imposta no item 6.3.2, a respeito da ausência de documentação regular comprobatória da despesa relativa à nota de empenho n° 2289 concernente a passagens aéreas, o responsável afirmou que “as passagens foram adquiridas com o fim de proporcionar o deslocamento de professores palestrantes no ‘Festival de Inverno’ promovido pelo Centro de Artes da UDESC”.

Aduziu que os nomes dos palestrantes constam da fatura emitida pela empresa Açoriana Turismo, bem como na programação do evento, o que comprovaria a liquidação da despesa. Salientou que os bilhetes ficaram com os beneficiados, já que teriam que ser utilizados para o retorno à cidade de origem.

A obrigatoriedade em referência deriva do art. 63, § 2°, III, da Lei n° 4.320, in verbis:

“Art. 63. A liquidação da despesa consiste na verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito.

[...]

§ 2º A liquidação da despesa por fornecimentos feitos ou serviços prestados terá por base:

I - o contrato, ajuste ou acordo respectivo;

II - a nota de empenho;

III - os comprovantes da entrega de material ou da prestação efetiva do serviço.” Sem grifos no original

Com o intuito de regulamentar o conteúdo da norma, a Corte de Contas publicou a Resolução TC 16/94, com o seguinte teor:

“Art. 58 - Constituem-se comprovantes regulares da despesa pública, a nota fiscal, recibo, folha de pagamento, roteiro de viagem, ordem de tráfego, bilhete de passagem, guia de recolhimento de encargos sociais e tributos, entre outros, que deverão ser fornecidos pelo vendedor, prestador de serviços, empreiteiro e outros.

Parágrafo único - Os comprovantes de despesa deverão apresentar-se preenchidos com clareza e sem rasuras que possam comprometer a sua credibilidade.” Sem grifos no original

Em que pese a especificação efetivada pela referida resolução acerca dos comprovantes de despesa, não se deve conferir interpretação restritiva ao dispositivo. Observe-se que a enumeração realizada pelo ato administrativo exarado pela Corte de Contas não é taxativo, deixando margem à apresentação de outros comprovantes além daqueles ali descritos.

Volvendo-se atenção ao comando legal, ver-se-á que o mesmo é abrangente ao definir que a liquidação da despesa será instruída com “os comprovantes de entrega de material ou a prestação efetiva do serviço”.

A justificativa apresentada a fls. 200 somada ao documento de fls. 246 devem ser aceitos como prova da realização de despesa e a sua conseqüente liquidação, ainda que ausentes os bilhetes de passagem aérea.

Por conseguinte, a responsabilização imposta no item 6.3.2 merece ser afastada.

II. 3. Pagamento indevido de ½ diária:

Ainda, o recorrente combate o acórdão no item 6.3.6, demonstrando que houve ressarcimento ao Erário de R$ 25,00 (vinte e cinco reais), referente ao pagamento indevido de ½ diária ao servidor Ricardo Wagner Ad Vincula Veado. Com razão o recorrente nesse ponto, porquanto o valor foi descontado do servidor, consoante a ficha financeira acostada a fls. 10.

II. 4. Pagamento indevido de 1,5 diárias a servidora Márcia M. Pauletti:

Ainda, no que diz respeito ao item 6.3.9 (nota de empenho n° 3755) sobre o pagamento de 1,5 diárias a servidora Márcia M. Pauletti, entendo que possui razão o Representante do Parquet Especial.

O Relatório da DCE é conclusivo sobre a existência dos bilhetes de passagens, salientando, a fls. 25, o que segue:

Ausência do bilhete de passagem da viagem realizada no dia 23/09/97.

O bilhete nº 043022 da Empresa Viação Catarinense encontra-se ilegível, contrariando o disposto no art. 58, parágrafo único da Resolução nº TC - 16/94

Solicitamos comprovação que justifique a correlação do objetivo da viagem com o desenvolvimento das atividades da UDESC.

Com o intuito de complementar a instrução acerca do fato, a Fundação juntou aos autos uma declaração unilateral da instituição justificando que “a servidora Márcia foi a Florianópolis participar da reunião da COPPTA central como representante dos funcionários da FEJ.”

E, mais adiante, no mesmo arquivo, solicita que “se confira no livro de atas da COPPTA central a presença da referida funcionária na reunião.”

Observe-se que existia uma maneira mais concreta de comprovar a presença da servidora na reunião, no entanto, a Fundação eximiu-se em trazer esse registro ao conhecimento da Corte de Contas. Outrossim, poderia ter demonstrado a lotação da servidora de forma a justificar o deslocamento para Florianópolis e igualmente não o fez.

Sobre esse tópico específico, lecionam José Teixeira Machado Júnior e Heraldo da Costa Reis:

“Os comprovantes da entrega do bem ou da prestação de serviço não devem, pois, limitar-se a dizer que foi fornecido o material, foi prestado o serviço, mas referir-se à realidade de um e de outro, segundo as especificações constantes do contrato, ajuste ou acordo, ou da própria lei que determinou a despesa.” (In: A lei 4.320 comentada e a lei de responsabilidade fiscal. 31 ed. Rio de Janeiro: IBAM, 2002. P. 150/151) Sem grifos no original

Lembre-se que o ônus da prova cabe ao órgão fiscalizado, logo, não vejo outra saída a não ser manter a responsabilização do ex-Reitor nesse ponto.

II. 5. Desvio de finalidade na aplicação de recursos conveniados

A multa aplicada no item 6.5.1.1 foi calcada no art. 116, § 3°, II, da Lei Federal n° 8.666/93, pela existência de desvio de finalidade na aplicação de recursos conveniados decorrente da cobrança de CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira).

A cobrança corresponde aos repasses efetuados pela UDESC a Associação dos Servidores - ASUDESC, referente às notas de empenho nº 2442 e 2975.

Em sua defesa, alega o recorrente que todos os valores foram devolvidos às contas da ASUDESC, com prestação de contas à universidade, todavia, inexistem nos autos as referidas prestações posteriores, apontadas pelo responsável.

Consta no caderno processual que a interessada quitou uma dívida com a empresa Ticket Serviços S/A, por meio da Associação, e, em decorrência da manobra, realizou o pagamento de CPMF. A despesa refere-se ao pagamento de tickets refeições aos servidores da universidade no mês de junho/97, segundo relata a DCE a fls. 13.

A informação foi corroborada pelo Presidente da Associação a fls. 77. Extrai-se:

“Quanto a retirada do valor da CPMF pelo Banco, informamos que o convênio assinado pela Associação e a Universidade em Cláusula Quarta - Das obrigações diz em seu, item II, linha “c” que a ASUDESC abrirá uma conta específica junto ao BESC para pagamento das despesas com o fornecimento do Tickets (sic) alimentação.

Como a ASUDESC não é liberada pelas normas do Banco Central para pagamento da referida taxa, o banco começou a fazer a cobrança deste serviço que prestamos para a UDESC.

Em setembro a ASUDESC cancelou a conta e abriu uma nova em nome da UDESC/ASUDESC, ficando liberada da cobrança da referida taxa.”

 

O Exmo. Relator fundamentou a penalidade no art. 116, § 3°, II, da Lei n° 8.666/93, acerca do desvio de finalidade na aplicação de recursos conveniados:

“Art. 116.  Aplicam-se as disposições desta Lei, no que couber, aos convênios, acordos, ajustes e outros instrumentos congêneres celebrados por órgãos e entidades da Administração.

§ 3o  As parcelas do convênio serão liberadas em estrita conformidade com o plano de aplicação aprovado, exceto nos casos a seguir, em que as mesmas ficarão retidas até o saneamento das impropriedades ocorrentes:

[...]

II - quando verificado desvio de finalidade na aplicação dos recursos, atrasos não justificados no cumprimento das etapas ou fases programadas, práticas atentatórias aos princípios fundamentais de Administração Pública nas contratações e demais atos praticados na execução do convênio, ou o inadimplemento do executor com relação a outras cláusulas conveniais básicas;

 

In casu, o desvio de finalidade não foi na aplicação dos recursos recebidos pela entidade conveniada. Esses últimos foram efetivamente aplicados naquilo em que foram destinados: o pagamento dos tíquetes alimentação dos servidores. A despesa relacionada ao CPMF cobrado pelo repasse dos recursos abrange, de certa maneira, o custo da operação, não constituindo, pois, qualquer desvio.

O que não se atentou, tanto no relatório como no acórdão de fls. 317/321 foi acerca da principal irregularidade supostamente cometida: a burla ao processo licitatório para a contratação da empresa fornecedora dos tíquetes. No entanto, em respeito ao princípio vedação da reformatio in pejus, tal mácula deixará de ser analisada, ao mesmo tempo em que se afastará a multa aplicada por inadequada fundamentação.

Esse é o entendimento do Ministério Público a fls. 28:

“Dessa forma, a irregularidade parece estar na interposição da ASUDESC para o fornecimento de tíquete alimentação aos servidores da Universidade, cuja tarefa deveria ser desempenhada diretamente por esta última. Essa irregularidade, porém, não foi objeto do processo originário, sendo incabível sua análise nesse momento.”

Em vista disso, evidenciado o equívoco na instrução do processo, a multa merece ser cancelada.

II. 6. Pagamento indevido de diária ao servidor Jânio Pedro Nolli:

O item 6.5.1.2 do acórdão enfrentado aplicou multa ao recorrente em razão do pagamento de diária ao servidor Jânio Pedro Nolli em data coincidente com a presença do referido servidor no seu local de trabalho. No registro de ponto, a fls. 39, anotou-se o seu comparecimento no dia 07/07 e a ausência nos dias 08/07 a 11/07. Em suas razões, alegou o recorrente que houve um equívoco no registro da data de saída do servidor, que deveria ter saído no dia 07/07 (inclusive com comprovante de passagem), com direito a 5 (cinco) diárias, mas por necessidade do serviço teve que trabalhar nesse dia, viajando somente no dia seguinte, em 08/07.

Com efeito, ao analisar-se o relatório de instrução, infere-se que o servidor participou do curso “Processo de Integração União Européia-Mercosul”, nos dias 07/07/97 a 11/07/97, percebendo apenas 4 (quatro) diárias no valor de R$ 200,00 (duzentos reais), inexistindo, portanto, qualquer ilegalidade a ser sanada, motivo pelo qual merece ser excluída a multa.

II. 7. Pagamento de diárias sem autorização do Chefe do poder Executivo:

Nos itens 6.5.1.3 e 6.5.2, foram aplicadas penas pecuniárias ao recorrente por ato considerado irregular em razão do pagamento de diárias a servidores que freqüentaram cursos, congressos ou assemelhados sem apresentação de autorização governamental e exposição de motivos, relativamente às notas de empenho 2831, 3025, 3335, 3600 e 3424.

O recorrente alega violação ao princípio do non bis in idem, tendo em vista a multiplicidade de multas pelos mesmos fatos motivadores.

A conduta ilegal repetiu-se em cinco ocorrências, logo, não há duplicidade sobre o mesmo ato como quer fazer crer o recorrente.

Por fim, quanto à necessidade de autorização governamental para o pagamento de diárias em cursos e seminários, possui razão o recorrente.

A obrigatoriedade imposta advém do art. 3° do Decreto n° 611/95, com redação reformulada pelo art. 1°, §3°, do Decreto Estadual 1.170/96, in verbis:

Art. 3° Fica suspensa, até ulterior decisão do Chefe do Poder Executivo, a participa­ção de servidores em cursos, congressos, seminários, conferências e assemelhados que acarretem ônus para o Estado.

[...]

§ 3º - Mediante Exposição de Motivos, fundamentada, apresentada pelo titular do órgão a que estiver vinculado o servidor, o Chefe do Poder Executivo poderá autorizar a participação em eventos outros - cursos, congressos, seminários, conferências e assemelhados - que acarretem ônus para o Estado desde que justificadamente estejam relacionados com o desenvolvimento das atividades do órgão.” Sem grifos no original

Para elucidar a questão, imperioso citar as lições de Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

“Descentralização é a distribuição de competências de uma para outra pessoa, física ou jurídica. Difere da desconcentração pelo fato de ser esta uma distribuição interna de competências, ou seja, uma distribuição de competências dentro da mesma pessoa jurídica; sabe-se que a Administração Pública é organizada hierarquicamente, como se fosse uma pirâmide em cujo ápice se situa o Chefe do Poder Executivo. As atribuições administrativas são outorgadas aos vários órgãos que compõe a hierarquia, criando-se uma relação de coordenação e subordinação entre uns e outros.” (In: Direito administrativo. 20ed. São Paulo: Atlas, 2007 .p. 380) Sem grifos no original

Ora, é assente que o Decreto se refere ao pagamento de diárias no âmbito do Poder Executivo, porquanto a todo tempo a norma se refere ao “órgão”, hierarquicamente inferior ao Chefe do Pode Executivo.

A universidade, por ser uma fundação voltada ao ensino, possui autonomia administrativa e financeira, inclusive para regulamentar o pagamento de diárias requeridas por seus servidores em razão de congressos, cursos, entre outros, na senda do que dispõe o art. 169 da Constituição do Estado:

“Art. 169. As instituições universitárias do Estado exercerão sua autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial na forma de seus estatutos e regimentos, garantida a gestão democrática do ensino através de:

I - eleição direta para os cargos dirigentes;

II - participação de representantes dos diversos segmentos da comunidade universitária nos conselhos deliberativos;

III - liberdade de organização e manifestação dos diversos segmentos da comunidade universitária.” Sem grifos no original

Nesse sentido, vem decidindo o STJ em questões judiciais questões similares:

“TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. GRATIFICAÇÃO DE ATIVIDADE EXCLUSIVA - GAE. DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO. LEGITIMIDADE. UNIVERSIDADE. ILEGITIMIDADE DA UNIÃO.

1. A Universidade tem legitimidade para figurar no pólo passivo da demanda, ao argumento de que possui competência para proceder aos comandos de pagamento de salários e benefícios previdenciários de seus servidores, visto ser autarquia federal dotada de personalidade jurídica própria distinta da União Federal.

2. Precedentes das Primeira e Segunda Turmas do STJ.

3. Agravo Regimental improvido.” (AgRg no REsp 444972 / RS, Rel. Luiz Fux, T1, j. em 25.02.2003)

Saliente-se, por fim, que o Ministério Público opinou também nessa direção:

“Porém, procede a alegação do recorrente acerca da autonomia administrativa e de gestão financeira da Universidade, nos termos do art. 169 da Constituição Estadual, que afasta a incidência do Decreto 1.170/96, que dispõe sobre a contenção de despesas no âmbito do poder Executivo Estadual. Dessa forma, devem ser canceladas ambas as penalidades.” (fls. 29)

Por conseguinte, a imposição de multa calcada no Decreto n° 1.170/96 também se demonstra inadequada, merecendo, pois, ser excluída.

 

III – VOTO

Ante o exposto, considerando as razões expendidas, proponho ao Egrégio Plenário a adoção da seguinte proposta de voto:

1) Conhecer do Recurso de Reexame, nos termos do art. 80 da Lei Complementar nº 202/2000, interposto contra o Acórdão 1774/2003, proferido na Sessão Ordinária do dia 15/09/2003, no Processo APC - 0330102/75, e, no mérito, dar-lhe provimento parcial para:

1.1 - Alterar o item 6.1 do acórdão recorrido, que se refere à responsabilização, passando o mesmo a constar com a seguinte redação:

“6.1. Julgar irregulares, com imputação de débito, com fundamento no art. 18, III, "c", da Lei Complementar n. 202/2000, as contas de recursos antecipados referentes às notas de empenho abaixo relacionadas:”

NE     DATA     ITEM     FONTE P/A    VALOR    CREDOR

2223 26/05/97 31320021 50 2190       15.000,00 Luiz Gonzaga Silvano

2455 03/06/97 31320019 20 2099       1.650,00 Lenir Benvinda Fleith Rosa

2602 18/06/97 31320021 20 2098       10.000,00 Luiz Gonzaga Silvano

2651 23/06/97 31320019 20 2099          930,00 Valdinei Beltrame

3598 26/08/97 31200006 20 2099      300,00 Gustavo José Fleury Charmillot

3755 05/09/97 31110203 20 2190       10.000 Gustavo José Fleury Chamilhot

 

1.2 – Alterar o item 6.2 do acórdão recorrido, o qual passa a constar com a seguinte redação:

“6.2. Dar quitação ao Responsável das parcelas abaixo descritas, de acordo com os pareceres emitidos nos autos:

1.2.1. R$ 14.820,35 (quatorze mil, oitocentos e vinte reais, trinta e cinco centavos), referente à Nota de Empenho n. 2223;

1.2.2. R$ 1.567,58 (um mil quinhentos e sessenta e sete reais e cinqüenta e oito centavos), referente à Nota de Empenho n. 2455;

1.2.3. R$ 9.969,19 (nove mil novecentos e sessenta e nove reais e dezenove centavos), referente à Nota de Empenho n. 2602;

1.2.4. R$ 921,88 (novecentos e vinte e um reais e oitenta e oito centavos), referente à Nota de Empenho n. 2651;

1.2.5. R$ 280,16 (duzentos e oitenta reais e dezesseis centavos), referente à Nota de Empenho n. 3598;

1.2.6. R$ 423,75 (quatrocentos e vinte e três reais e setenta e cinco centavos), referente à Nota de Empenho n. 3755”

 

1.3 – Alterar o item 6.6 do acórdão que passa a constar com a seguinte redação:

“6.6. Julgar regulares com ressalva, com fundamento no art. 18, II, c/c o art. 20 da Lei Complementar n. 202/2000, as contas de recursos antecipados referentes às notas de empenho abaixo relacionadas e dar quitação aos Responsáveis, de acordo com os pareceres emitidos nos autos:”

NE     DATA     ITEM     FONTE P/A    VALOR    CREDOR

07 02/01/97 313200.21 20 2561 10.000,00 Luiz Gonzaga Silvano

1182 02/04/97 313200.21 20 2190 15.000,00 Luiz Gonzaga Silvano

1728 29/04/97 313200.19 20 2190 6.000,00 Maria Helena Krüger

2640 20/06/97 313200.19 20 2101 8.000,00 Maria Helena Krüger

3167 30/07/97 313200.21 20 2099 390,00 Regina Maria de Felice Souza

3496 19/08/97 311102.03 20 2190 5.000,00 Luiz Gonzaga Silvano

3497 19/08/97 313200.19 50 2561 5.000,00 Maria Helena Krüger

2289 30/05/97 31320019 20 2100   20.200,00 Sérgio Medeiros

3424 13/08/97 31110203 20 2190  10.000,00 Luiz Gonzaga Silvano

 

1.3 - Cancelar as multas constantes dos itens 6.5.1.1; 6.5.1.2; 6.5.1.3 e 6.5.2 do Acórdão 1774/2003;

2) Manter na íntegra os demais termos do acórdão recorrido.

3) Dar ciência desta Decisão, bem como do Parecer e Voto que a fundamentam ao Sr. Raimundo Zumblick, ex-Reitor da Fundação Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC, bem como a entidade auditada.

 

Gabinete, em 30 de julho de 2008.

 

 

Cleber Muniz Gavi

Auditor Substituto de Conselheiro

Relator