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ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO Gabinete
do Auditor Adircélio de Moraes Ferreira Junior |
PROCESSO Nº |
REC nº 04/06260915 |
UNIDADE |
Secretaria de
Estado da Fazenda |
RESPONSÁVEL |
Laudemar
Bittencourt |
ASSUNTO |
Recurso de Reconsideração
– SPC-04/06260915 |
DESPESAS. NOTA FISCAL. COMPROVAÇÃO. DOCUMENTOS COM
RASURAS.
Flagrante
o comprometimento quanto à credibilidade das notas fiscais (documentos com
rasuras), necessária a aplicação de débito, tendo em vista a ausência de confiança
necessária para que o documento sirva como suporte para a efetiva comprovação
da despesa.
RELATÓRIO
Tratam
os autos do Recurso de Reconsideração,
conforme prescrito no art. 77 da Lei Complementar nº 202/00, interposto pelo
Sr. Laudemar Bittencourt, Presidente do Grêmio
Recreativo, Esportivo, Social União do Mocotó de Florianópolis (exercício de
2001), em face do Acórdão de nº 1825,
da sessão ordinária de 13/10/04, Relator Exmo. Sr. Conselheiro José Carlos
Pacheco, proferido nos autos do processo nº SPC-03/02616004, o qual decidiu por
julgar irregulares as contas em análise, com imputação de débito, com fulcro no
art. 18, III, alínea "c" c/c o art. 21, caput, ambos da Lei Complementar nº 202/00, em razão da
apresentação de documentos inidôneos e com rasuras; cita-se:
ACORDAM os
Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em
Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos
arts. 59 da Constituição Estadual e 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:
6.1. Julgar
irregulares, com imputação de débito, com fundamento no art. 18, III,
"c", c/c o art. 21, caput, da Lei Complementar n. 202/2000, as contas
de recursos antecipados referentes à Nota de Empenho n. 1310/000, de
10/08/2001, P/A 4769, item 323100.00, fonte 00, no valor de R$ 20.000,00 (vinte
mil reais).
6.1.1. Dar quitação
ao Responsável da parcela de R$ 100,00 (cem
reais), de acordo com
os pareceres emitidos nos autos;
6.1.2. Condenar o
Responsável – Sr. Laudemar Bittencourt - Presidente do Grêmio Recreativo,
Esportivo, Social União do Mocotó em 2001 - CPF n. 485.004.379-87, ao pagamento
da quantia de R$ 19.900,00 (dezenove mil novecentos reais), relativa à parte
irregular da nota de empenho citada acima, em face da apresentação de documentos
inidôneos (R$ 13.100,00), conforme classificado pelo art. 29 do Anexo 5 do
Decreto n. 2870/2001 - RICMS, e com rasuras (R$ 6.800,00), contrariando o
parágrafo único do art. 58 da Resolução n. TC-16/94 (item 2.3.3 do Relatório
DCE), fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste
Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar a este Tribunal o
recolhimento do valor do débito aos cofres do Estado, atualizado monetariamente
e acrescido de juros legais, calculados a partir de 20/08/2001 (arts. 40 e 44
da Lei Complementar n. 202/2000), ou interpor recurso na forma da lei, sem o
que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança
judicial (art. 43, II, do mesmo diploma legal).
6.2. Declarar o
Grêmio Recreativo, Esportivo, Social União do Mocotó, de Florianópolis, e o Sr.
Laudemar Bittencourt impedidos de receberem novos recursos do Erário até a
regularização do presente processo, consoante dispõe o art. 5°, alínea
"c", da Lei Estadual n. 5.867/81.
6.3. Recomendar ao
Grêmio Recreativo, Esportivo, Social União do Mocotó que após a regularização
do presente processo, e no caso de receber novos recursos do erário, atente
para os seguintes dispositivos legais:
6.3.1. art. 8° da Lei
Estadual n. 5.867/81, quanto ao prazo para apresentação da prestação de contas
à Secretaria de Estado da Fazenda (item 2.3.1 do relatório DCE);
6.3.2. caput do art.
47 da Resolução n. TC-16/94, quanto à movimentação da conta bancária através de
cheques nominais e individualizados (item 2.3.2 do relatório DCE).
6.4. Dar ciência
deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do
Relatório de Reinstrução DCE/Insp.2/Div.06 n. 277/2004, ao Grêmio Recreativo,
Esportivo, Social União do Mocotó, de Florianópolis, ao Sr. Laudemar
Bittencourt - Presidente daquela entidade em 2001, e à Secretaria de Estado da
Fazenda.
Em
sua defesa (fls. 02-05), alega o Recorrente,
primeiramente, a questão da falta de experiência no que se refere à prática de
‘prestação de contas’. Também, que os recursos foram destinados à reconstrução
da sede da entidade, destruído por um incêndio, bem como, que há registros nos
autos de que o prédio foi reconstruído e está em funcionamento. Argúi, ainda, que,
por conta de problemas com um dos Diretores, a conta corrente bancária da
instituição estava indisponível. Por fim, comenta que “a inidoneidade dos
documentos não cabe a entidade responder, pois se houve qualquer alteração ou
mesmo burla, quanto a tributos, esta questão é de exclusividade do emitente da
nota fiscal”.
Encaminhado
os autos à Consultoria Geral, esta
emitiu o Parecer nº COG-391/08 (fls. 06-18), ocasião em que concluiu pelo
conhecimento do recurso e, no mérito, dar-lhe provimento, para cancelar o
débito aplicado.
Concluída
a análise jurídica, seguiram os autos ao Ministério
Público Especial que, através de Parecer da lavra do Procurador Márcio de
Sousa Rosa (nº 4.737/MPTC/08 - fls. 19), entendeu por acompanhar o órgão
consultivo.
Por
meio de despacho, o Exmo. Sr. Conselheiro César Filomeno Fontes deu-se por impedido, tendo em vista
sua atuação anterior no presente processo como membro do Ministério Público
junto ao Tribunal de Contas (fls. 20-21).
Seguindo a sua tramitação regular, vieram os autos para manifestação deste Relator.
Em
sequência, ante a necessidade de esclarecimentos, e em razão da empresa emitente
(J. C. Manutenção Instalação Elétrica Nossa Senhora de Lurdes Ltda.) da nota
fiscal nº 046 estar cadastrada no município de São José, este relator requereu à
Secretaria daquele município diligências no sentido de obtenção de cópia da via
da nota fiscal em poder do estabelecimento, para conferência a ser realizada
por este Tribunal (fls. 22).
Em
razão da ausência de resposta, reiterou-se o pedido já formulado anteriormente (fls.
28), o que resultou na informação de fls. 32 por parte do Município. Destarte,
explicou a Unidade que, de fato, a empresa está cadastrada no Município de São
José e que na data de 20/09/1999 foi autorizada a confecção do talão de nota
fiscal de serviços. No entanto, após vistoria in loco, a empresa não está mais funcionando no endereço constante
da nota fiscal. Acrescentou, ainda, que tentou por diversas vezes contato
telefônico, não obtendo êxito.
É
o relatório.
FUNDAMENTAÇÃO
Presentes
os pressupostos de admissibilidade
recursal, passa-se à análise do mérito.
A
discussão cinge-se à prestação de contas de recursos repassados
(Nota
de Empenho nº 1310/00) ao Grêmio Recreativo Esportivo, Social
União do Mocotó de Florianópolis, no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais); transcrevem-se dispositivos legais dados
como atingidos:
Art. 58 da Resolução nº TC-16/94
Art. 58. Constituem-se
comprovantes regulares da despesa pública, a nota fiscal, recibo, folha de pagamento,
roteiro de viagem, ordem de tráfego, bilhete de passagem, guia de recolhimento
de encargos sociais e tributos, entre outros, que deverão ser fornecidos pelo
vendedor, prestador de serviços, empreiteiro e outros.
Parágrafo único - Os comprovantes de
despesa deverão apresentar-se preenchidos com clareza e sem rasuras que possam
comprometer a sua credibilidade.
Art. 29 do Anexo 5 do Decreto nº 2870/01 -
RICMS
Art. 29. É considerado inidôneo para todos os efeitos fiscais,
fazendo prova apenas em favor do fisco, o documento que:
I - omita indicações
obrigatórias;
II - não seja o
legalmente exigido para a respectiva operação ou prestação;
III - não guarde as
exigências ou requisitos previstos neste Regulamento;
IV - contenha
declarações inexatas, esteja preenchido de forma ilegível ou apresente emendas
ou rasuras que lhe prejudiquem a clareza.
Vejamos.
O Corpo Técnico assim se
pronunciou a respeito das ilegalidades constatadas – fls. 205:
Conforme ficou
comprovado através dos Processos de Verificação Fiscal de fls. 96 a 132, as
notas fiscais nºs 000746 e 000137 não foram emitidas na época da aplicação dos
recursos, sendo que a nota nº 000746 foi emitida em meados de 2002.
Desta forma as notas
fiscais 000746, no valor de R$ 8.529,00 (oito mil, quinhentos e vinte e nove
reais), fls. 89 e 000137, no valor de R$ 4.571,00 (quatro mil, quinhentos e
setenta e um reais), fls. 90, são consideradas inidôneas, conforme art. 29 do
Anexo 5 do Decreto 2.870/2001 – RICMS, transcrito anteriormente.
Quanto à nota fiscal
046 de fls. 88, possui rasuras nos campos destinados à identificação da data de
emissão e valor dos serviços, contrariando o parágrafo único do art. 58 da
Resolução TC-16/94.
Quanto às notas fiscais
de nºs. 000746 e 000137 (fls.
96 a 132 dos autos originais), que montam a quantia de de R$ 13.100,00 (treze
mil e cem reais), acompanho o entendimento do Órgão Consultivo, no sentido de
que o vício apontado está relacionado tão-somente às datas de emissão, o que,
por si só, não tem o condão de macular a despesa – fl. 12.
Compulsando-se
os autos, constata-se que a data considerada incorreta disposta na via da nota
fiscal nº 000746 apresentada pela
entidade (fl. 89) está de acordo com a via da nota do estabelecimento emitente
(fl. 111), já que em ambas as vias constam a data de 22/08/01. Portanto, ao que
parece, o vício adveio do estabelecimento que fez a emissão de notas fiscais sem
observar a devida seqüência cronológica.
Quanto
à nota fiscal nº 000137 (fl. 90), na
qual consta a data de emissão de 22/08/01, a via do estabelecimento emitente (fl.
113) apresenta-se sem data, o que indica uma falha no procedimento de emissão,
que também deve ser atribuída ao estabelecimento que forneceu o documento
fiscal. Verifica-se, assim, que as irregularidades constatadas nas notas
fiscais de nºs. 000746 e 000137, ao que tudo indica, decorrem de erro do
emitente.
Dessa
feita, entende este Relator que o débito
em exame, no importe de R$ 13.100,00 (treze mil e cem reais), deve ser
cancelado.
Por
outro lado, em relação à nota fiscal de
nº 046 (fls. 88 dos autos originais), relativa à quantia de R$ 6.800,00
(seis mil e oitocentos reais), diverge-se do Parecer da Consultoria Geral.
Ab initio, venho reiterar o já dito quanto às
notas fiscais retro analisadas. Assim, o vício relacionado à data de emissão, em
que se questiona a sequência cronológica da emissão das notas fiscais, não é, a
meu ver, elemento suficiente para ensejar a imputação de débito.
No
entanto, ao se proceder à verificação do documento de fl. 88, carreado aos
autos originais, depara-se com flagrante rasura no valor apontado na nota
fiscal, já que a tinta e a grafia utilizadas para registrar o valor do serviço
prestado são visivelmente diferentes daquelas utilizadas para registrar os
outros campos da nota fiscal, tais como: discriminação dos serviços, nome, CGC,
endereço, etc.
Tais
observações culminam no desrespeito às recomendações expostas no art. 58 da
Resolução nº TC-16/94 e especificações constantes do art. 29 do Anexo 5 do
Decreto nº 2870/01 (RIMCS), em que determinam que os documentos para serem
considerados idôneos devem ser preenchidos sem rasuras e de forma clara.
Além
disso, é oportuno trazer à tona, o disposto nos arts. 386 e 387 do Código de
Processo Civil Brasileiro (Lei nº 5.869/73)[1]:
Art. 386. O juiz
apreciará livremente a fé que deva merecer o documento, quando em ponto
substancial e sem ressalva contiver entrelinha, emenda, borrão ou cancelamento.
Art. 387. Cessa a fé
do documento, público ou particular, sendo-lhe declarada judicialmente a
falsidade.
Parágrafo único. A
falsidade consiste:
I - em formar
documento não verdadeiro;
II - em alterar
documento verdadeiro.
Acerca
da redação do teor do retrocitado art. 386, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de
Andrade Nery observam: [2]
1.
Emendas, rasuras e
espaços em branco.
A regra é de que o documento deve ser o mais límpido possível e revelador dos
fatos probandos de forma nítida, clara e indiscutível. Por isso os espaços em
branco devem ser inutilizados e as emendas e rasuras ressalvadas. Se nada disso
tiver sido feito, esses defeitos podem comprometer a eficácia probatória do
documento.
É
flagrante, portanto, o comprometimento da credibilidade do documento que serviu
como prova de efetivo dispêndio dos recursos repassados. Ao que tudo indica, o
documento, a priori, verdadeiro,
contém fortes indícios de que foi alterado no campo ‘valor’ – o que faz com que
perca sua força probante.
Além
disso, não procede o argumento de que a responsabilidade quando do
preenchimento da nota fiscal é do seu emitente, porquanto a responsabilidade em prestar contas é da
entidade beneficiada com o repasse do dinheiro público. Nesse caso, deve haver zelo
por parte do beneficiário, que deveria ter exigido do estabelecimento emitente outra
nota fiscal sem o vício apontado.
Assim,
em conformidade com o art. 58 da Resolução TC-16/94 c/c o art. 29 do Anexo 5 do
Decreto nº 2870/01, bem como com o disposto no art. 386 do Código de Processo
Civil Brasileiro (Lei nº 5.869/73), que possibilita ao julgador dar ao
documento a força probante que ele merecer, este relator conclui que uma nota
fiscal com adulteração no campo valor não pode ser considerada como documento
hábil para comprovação do efetivo dispêndio dos recursos públicos repassados.
Pelo
exposto, divergindo dos Pareceres da Consultoria
Geral e do Ministério Público de Contas, manifesta-se este Relator pela manutenção do débito referente ao importe
de R$ 6.800,00 (seis mil e oitocentos reais).
PROPOSTA DE VOTO
Considerando
o que mais dos autos consta, VOTO no sentido de que o Egrégio Tribunal
Pleno adote a decisão que ora submeto à sua apreciação:
1. Conhecer do Recurso de Reconsideração,
nos termos do art. 77, da LC (estadual) nº 202/2000, interposto pelo Sr. Laudemar
Bittencourt, Presidente do Grêmio Recreativo, Esportivo, Social União do Mocotó
de Florianópolis (exercício de 2001), em face do Acórdão de nº 1825, da sessão
ordinária de 13/10/04, proferido nos autos do processo nº SPC-03/02616004, e, no mérito, dar-lhe parcial provimento
para:
1.1 modificar o item 6.1 da decisão
recorrida, que passa a ter a seguinte redação:
6.1
Julgar irregulares, com imputação de débito, com
fundamento no art. 18, III, "c", c/c o art. 21, caput, da Lei
Complementar n. 202/2000, as contas de recursos antecipados referentes à Nota
de Empenho n. 1310/000, de 10/08/2001, P/A 4769, item 323100.00, fonte 00, no
valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais).
6.1.1. Dar quitação ao Responsável da
parcela de R$ 100,00 (cem reais), bem como da parcela de 13.100,00 (treze mil e
cem reais), este referente às notas fiscais de nºs. 000746 e 000137, de acordo com os pareceres emitidos
nos autos;
6.1.3. Condenar o Responsável – Sr. Laudemar
Bittencourt - Presidente do Grêmio Recreativo, Esportivo, Social União do
Mocotó em 2001 - CPF n. 485.004.379-87, ao pagamento da quantia de R$ 6.800,00
(seis mil e oitocentos reais), relativa à parte irregular da nota de empenho
citada acima, em face da apresentação de documento com rasuras, contrariando o
parágrafo único do art. 58 da Resolução nº TC-16/94 c/c o art. art. 29 do Anexo
5 do Decreto nº 2870/01 – RICMS (item 2.3.3 do Relatório DCE) e em conformidade
com os arts. 386 e 387 do Código de Processo Civil Brasileiro
(Lei nº 5.869/73), fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da
publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico, para comprovar a este
Tribunal o recolhimento do valor do débito aos cofres do Estado, atualizado
monetariamente e acrescido de juros legais, calculados a partir de 20/08/2001
(arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), ou interpor recurso na forma
da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para
cobrança judicial (art. 43, II, do mesmo diploma legal).
1.2 ratificar seus demais termos.
2. Dar Ciência deste
Acórdão, bem como do
Parecer e Voto que o fundamentam ao Sr.
Laudemar Bittencourt, ao Grêmio Recreativo Esportivo, Social União do
Mocotó e à Secretaria de Estado da Fazenda.
Gabinete,
em 14 de abril de 2009.
Adircélio de Moraes Ferreira Junior
Auditor Relator
[1] A Resolução TC-06/01
prevê a aplicação subsidiária da legislação processual:
Art.
308. Os casos omissos serão resolvidos mediante a aplicação subsidiária da
legislação processual ou, quando for o caso, por deliberação do Tribunal Pleno.
[2] In: Código de Processo Civil
Comentado: e legislação processual civil em vigor. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2002. fls. 723