Processo n°

REC 05/00828415

Unidade Gestora

Prefeitura Municipal de Rancho Queimado

Recorrente

Sr. Mério César Goedert – Prefeito Municipal de Rancho Queimado

Assunto

Recurso de Reconsideração (art. 77 da LC nº 202/2000) do Processo n° TCE 03/00740700

Relatório n°

268/2009

 

 

1.   Relatório

               

Trata-se de Recurso de Reconsideração interposto pelo Sr. Mério César Goedert, Prefeito Municipal de Rancho Queimado, em face do Acórdão n° 0893/2004[1] (em relação ao qual foram interpostos Embargos Declaratórios, não conhecidos por esta Corte de Contas, conforme Acórdão n° 2262/2004[2]), exarado nos autos do Processo n° TCE 03/00740700, nos seguintes termos:

 

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:

 

6.1. Julgar irregulares, com imputação de débito, na forma do art. 18, III, "c", da Lei Complementar n. 202/2000, as contas pertinentes à presente Tomada de contas Especial, que trata da análise de irregularidades constatadas quando da auditoria ordinária realizada na Prefeitura Municipal de Rancho Queimado, com abrangência sobre atos de pessoal referentes ao exercício de 2002, e condenar o Responsável – Sr. Mério César Goedert - Prefeito daquele Município, ao pagamento das quantias abaixo relacionadas, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado para comprovar, perante este Tribunal, o recolhimento dos valores dos débitos aos cofres do Município, atualizados monetariamente e acrescidos dos juros legais (arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), calculados a partir das datas de ocorrência dos fatos geradores dos débitos, ou interpor recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, II, do mesmo diploma legal):

6.1.1. R$ 1.738,64 (um mil setecentos e trinta e oito reais e sessenta e quatro centavos), referente a despesas com conversão de licença-prêmio em dinheiro, em desacordo ao estabelecido na Lei Municipal n. 1046/99 - Estatuto e Plano de Carreira e Remuneração do Magistério Público Municipal, art. 105 (item 1.1 do Relatório DMU);

6.1.2. R$ 19.078,39 (dezenove mil setenta e oito reais e trinta e nove centavos), referente a despesas com remuneração de servidor à disposição da Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina - ALESC, sem autorização legal e cumprimento de outros requisitos previstos no art. 62 da Lei Complementar n. 101/2000 (item 1.8 do Relatório DMU).

 

6.2. Aplicar ao Sr. Mério César Goedert - Prefeito Municipal de Rancho Queimado, com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 109, II, do Regimento Interno, as multas abaixo relacionadas, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, ou interpor recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos artigos 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000:

6.2.1. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da contratação de servidora em caráter temporário sem comprovação do excepcional interesse público, contrariando o art. 37, inciso IX, da Constituição Federal (item 1.2 do Relatório DMU);

6.2.2. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da existência, em 2002, de servidores municipais em desvio de função, contrariando o estabelecido na Lei Municipal n. 1046/99, art. 7º (item 1.9 do Relatório DMU).

 

6.3. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Relatório de Reinstrução DMU n. 44/2004, ao Sr. Mério César Goedert - Prefeito Municipal de Rancho Queimado.

A Consultoria Geral – COG – através do Parecer n° COG 294/2008 sugeriu o conhecimento do recurso para, no mérito, dar provimento parcial tão-somente para cancelar o item 6.1.1 do Acórdão, mantendo-o nos demais aspectos, no que foi secundada pelo Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, que exarou o Parecer n° 4739/2008.

 

 

2.   Voto

 

 

Todos os itens do Acórdão n° 0893/2004 foram objeto de recurso:

a) Item 6.1.1 do Acórdão n° 0893/2004: imputação de débito ao Responsável, pagamento de R$ 1.738,64 (um mil setecentos e trinta e oito reais e sessenta e quatro centavos), referente a despesas com conversão de licença-prêmio em dinheiro, em desacordo ao estabelecido na Lei Municipal n. 1046/99 - Estatuto e Plano de Carreira e Remuneração do Magistério Público Municipal, art. 105.

Em relação a esse item, o recorrente afirma que o pagamento de R$ 1.738,64 (um mil setecentos e trinta e oito reais e sessenta e quatro centavos), referente a despesas com conversão de licença-prêmio em dinheiro ao servidor Pedro Paulo Bunn (licença-prêmio do quinquênio 1991/1996) foi corretamente efetuado, pois houve direito adquirido do servidor, considerando que a legislação em vigor, à época, era a Lei Municipal n° 720/91, que autorizava tal prática.

Afirma a Consultoria Geral que:

Houve engano da área técnica, no que se refere a data da lei municipal que rege o estatuto de carreira e remuneração do magistério de Rancho Queimado.

Na época, o referido estatuto era a Lei Municipal n. 720/91, que permaneceu em vigor até o ano de 1999; e não até o ano de 1996, como vislumbra a área técnica (fl. 307 da TCE-03/00740700). Assim, o direito de conversão de licença-prêmio em dinheiro do servidor Sr. Pedro Paulo Bunn, foi adquirido nos anos de 1991 a 1995, enquanto estava em vigor a Lei Municipal n. 720/91.

(...)

Do exposto, nota-se que não deve permanecer a restrição, porquanto o servidor Sr. Pedro Paulo Bunn adquiriu nos anos de 1991 a 1995 o direito à licença-prêmio, que por sua vez, não foi gozada, convertendo-se em pecúnia.

Concordo com o entendimento da Consultoria Geral: o direito do servidor foi adquirido com base na legislação que autorizava a conversão de 1/3 da licença prêmio em pecúnia (Lei Municipal n° 320/91), sendo que o período aquisitivo da licença referiu-se a 1991/1996. A referida legislação foi alterada somente com a entrada em vigor da Lei Municipal n° 1046/99.

Alexandre de Moraes[3], acerca de direito adquirido, leciona:

De difícil conceituação, o direito denomina-se adquirido quando consolidada sua integração ao patrimônio do respectivo titular, em virtude da consubstanciação do fator aquisitivo (requisitos legais e de fato) previsto na legislação.

Acerca do direito adquirido à percepção em pecúnia de licenças-prêmio não gozadas, veja-se, mutatis mutandis, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça[4]:

ADMINISTRATIVO. ESTADO DE PERNAMBUCO. SERVIDOR PÚBLICO CIVIL. APOSENTADORIA. TEMPO DE SERVIÇO. LICENÇAS-PRÊMIO NÃO GOZADAS. CONTAGEM EM DOBRO. NÃO UTILIZAÇÃO. RECEBIMENTO EM PECÚNIA DE TODOS OS PERÍODOS. DIREITO ADQUIRIDO.

1. Existe direito adquirido à percepção em pecúnia de todas as licenças-prêmio não gozadas e não utilizadas para contagem em dobro na aposentadoria por tempo de serviço se, quando editada a Lei Complementar Estadual nº 16/1996, o servidor havia completado o período aquisitivo do benefício. Inteligência do art. 8º do referido diploma.

2. Recurso provido. (grifou-se).

Assim, deve ser cancelada a imputação de débito referida.

b) Item 6.1.2 do Acórdão n° 0893/2004: imputação de débito ao Responsável ao pagamento de R$ 19.078,39 (dezenove mil setenta e oito reais e trinta e nove centavos), referente a despesas com remuneração de servidor à disposição da Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina - ALESC, sem autorização legal e cumprimento de outros requisitos previstos no art. 62 da Lei Complementar n. 101/2000.

Em relação a esse item, o recorrente afirma que o servidor Isaac Diniz encontra-se à disposição da ALESC desde 22/10/1997, portanto, em data anterior à promulgação da Lei de Responsabilidade Fiscal, tratando-se de situação jurídica pré-existente à edição da LRF.

Ademais, salienta que a Câmara Municipal de Vereadores de Rancho Queimado expressamente homologou a Portaria n° 072/97, que colocou o servidor à disposição da ALESC, além de a cessão do servidor ser autorizada pelo Estatuto dos Servidores Municipais.

Requereu o cancelamento da imputação de débito ou então a aplicação de multa no mínimo legal, sob pena de enriquecimento ilícito da Administração Pública, porquanto houve a efetiva prestação de serviços pelo servidor público.

A Consultoria Geral, quanto a esse aspecto, elucida que a partir do ano de 2000, com a edição da Lei de Responsabilidade Fiscal, os Prejulgados 1009, 1115 e 1097 desta Corte de Contas passaram a disciplinar a matéria, tratando dos requisitos exigidos para que a cessão de servidor público a outro órgão seja feita de forma legal.

Entre tais requisitos estão: autorização legislativa amparada em norma legal, formalização por instrumento adequado (Portaria, Resolução etc), necessidade de constar do ato as condições da cessão, custeio pelo Município de despesas de competência de outros entes somente será admitido se estiver contemplado na lei de diretrizes orçamentárias e na lei orçamentária anual, e pactuado entre as partes, através de convênio, acordo, ajuste ou congênere, o servidor deve ser efetivo, a cessão deve atender ao interesse público etc.

Assim, concluiu que a cessão do servidor em questão, do quadro de pessoal do Município de Rancho Queimado para a ALESC, no período de 1997 até o ano de 2000 é considerada regular, e após tal data, quando entrou em vigor a Lei de Responsabilidade Fiscal, irregular.

Concordo com a Consultoria Geral quanto à análise efetuada.

Contudo, vislumbro que não houve manifestação quanto ao pedido do recorrente de que, caso seja mantido o entendimento de que a cessão do servidor foi irregular, que seja cancelada a imputação de débito, aplicando-se multa, já que o servidor efetivamente laborou, sob pena de enriquecimento ilícito da Administração Pública.

Entendo que como houve a efetiva prestação de serviços pelo servidor, não é adequado imputar débito ao Responsável, mas sim aplicar multa.

Nesse sentido vem decidindo este Egrégio Plenário, conforme os seguintes precedentes: Acórdão 1134/2008[5], TCE 07/00014306; Acórdão 0658/2007[6], TCE 05/00518300; Acórdão 1782/2008[7], TCE 05/00973776; Acórdão 1188/2006[8], TCE 04/01382249.

Por isso, meu voto é no sentido de cancelar a imputação de débito constante do item 6.1.2 do Acórdão n° 0893/2004, aplicando-se multa ao Responsável, no valor de R$ 1.000,00 (um mil reais), em razão desse fato.

c) Item 6.2.1 do Acórdão n° 0893/2004: multa ao Responsável de R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da contratação de servidora em caráter temporário sem comprovação do excepcional interesse público, contrariando o art. 37, inciso IX, da Constituição Federal.

 

Em relação a esse item, o recorrente afirma que houve excepcional interesse público na contratação por prazo determinado da servidora Roseli Bratfisch Munsfeldt, faxineira e merendeira, tanto é que no ano de 2002 foi realizado concurso público municipal para o preenchimento da vaga. Por isso, entende incabível a multa ou pugna pela sua redução.

 

A Consultoria Geral ressalta que nenhum fato novo foi trazido ao recurso a fim de justificar a necessidade temporária de excepcional interesse público, de modo que a multa aplicada deve ser mantida.

 

Concordo com o posicionamento, ressaltando que a realização de concurso público para preenchimento da vaga, por si só, não justifica a necessidade temporária de excepcional interesse público para a contratação da servidora, mas tão-somente legaliza uma situação irregular.

 

Por isso, deve ser mantida a multa aplicada.

d) Item 6.2.2 do Acórdão n° 0893/2004: multa ao Responsável de R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da existência, em 2002, de servidores municipais em desvio de função, contrariando o estabelecido na Lei Municipal n. 1046/99, art. 7°.

 

Em relação a esse item, o recorrente afirma que não teve outra opção senão a de valer-se dos conhecimentos dos servidores Pedro Paulo Bunn e Isolete Eger Nienkotter, considerando o reduzido número de servidores do Município de Rancho Queimado. Ressalta que a situação foi passageira, requerendo o cancelamento da multa ou sua redução.

 

A Consultoria Geral sugeriu a manutenção da multa, eis que o recorrente traz apenas “alegações de eqüidade” (fl. 28), não apresentando argumentos novos ao recurso.

 

Acompanho o entendimento do Órgão de Controle, mantendo a multa aplicada, em razão do descumprimento da Lei Municipal n° 1.046/99, art. 7°.

 

Considerando os termos do Parecer COG 294/2008 e Parecer do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas nº 4739/2008, e tudo mais que dos autos consta, proponho ao egrégio plenário o seguinte voto:

 

2.1. Conhecer do Recurso de Reconsideração, nos termos do art. 77 da Lei Complementar n° 202/2000, interposto contra o Acórdão n° 0893/2004, exarado na Sessão Ordinária de 09/08/2004, nos autos do Processo n° TCE 03/00740700 e, no mérito, dar-lhe provimento parcial para cancelar os débitos constantes dos itens 6.1.1 e 6.1.2 do Acórdão n° 0893/2004, aplicando-se multa em razão da infração constante no item 6.1.2 do mesmo Acórdão, que passa a ter a seguinte redação:

6.1. Julgar irregulares, sem imputação de débito, com fundamento no art. 18, III, c/c o art. 21, parágrafo único, da Lei Complementar n° 202/2000, as contas pertinentes à presente Tomada de contas Especial, que trata da análise de irregularidades constatadas quando da auditoria ordinária realizada na Prefeitura Municipal de Rancho Queimado, com abrangência sobre atos de pessoal referentes ao exercício de 2002.

 

6.2. Aplicar ao Sr. Mério César Goedert - Prefeito Municipal de Rancho Queimado, CPF nº 536.777.309-53, com fundamento no art. 69, da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 109, II, do Regimento Interno, as multas abaixo relacionadas, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovar ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, ou interpor recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos artigos 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000:

 

6.2.1. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da contratação de servidora em caráter temporário sem comprovação do excepcional interesse público, contrariando o art. 37, inciso IX, da Constituição Federal (item 1.2 do Relatório DMU);

 

6.2.2. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da existência, em 2002, de servidores municipais em desvio de função, contrariando o estabelecido na Lei Municipal n. 1046/99, art. 7º (item 1.9 do Relatório DMU).

 

6.2.3. R$ 1.000,00 (um mil reais), em razão da cessão de servidor à disposição da Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina - ALESC, sem autorização legal e cumprimento de outros requisitos previstos no art. 62 da Lei Complementar n. 101/2000 (item 1.8 do Relatório DMU).

 

6.3. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Relatório de Reinstrução DMU n. 44/2004, ao Sr. Mério César Goedert - Prefeito Municipal de Rancho Queimado.

2.2. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Parecer COG 294/2008 à Prefeitura Municipal de Rancho Queimado.

 

                 Florianópolis, 26 de março de 2009.

 

 

 

Conselheiro Salomão Ribas Junior

Relator

 



[1] Sessão Ordinária de 02/06/2004. Relator Conselheiro José Carlos Pacheco, publicado no DOE n° 17453, de 09/08/2004.

[2] Sessão Ordinária de 13/12/2004. Relator Conselheiro José Carlos Pacheco, publicado no DOE n° 17603, de 22/03/2005.

[3] MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 6. ed. São Paulo, Atlas, 2006, p. 301.

[4] Superior Tribunal de Justiça. RMS 11443. Ministro Fernando Gonçalves. Publicação DJ 12/11/2001.

[5] Sessão Ordinária de 16/07/2008. Relator Conselheiro Salomão Ribas Junior, publicado no DOTC-e n° 64, de 04/08/2008.

[6] Sessão Ordinária de 11/04/2007. Relator Auditor Substituto de Conselheiro Cleber Muniz Gavi, publicado no DOE n° 18115, de 04/05/2007.

[7] Sessão Ordinária de 08/12/2008. Relator Conselheiro Luiz Roberto Herbst, publicado no DOTC-e n° 190, de 10/02/2009.

[8] Sessão Ordinária de 14/06/2006. Relator Conselheiro Luiz Roberto Herbst, publicado no DOE n° 17930, de 24/07/2006.