ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO

Gabinete do Conselheiro Substituto Gerson dos Santos Sicca

PROCESSO N. REC 05/00804079

REC 05/00990433

UG/CLIENTE

PREFEITURA MUNICIPAL DE PIÇARRAS

INTERESSADO

UMBERTO LUIZ TEIXEIRA

MÁRCIO LUIZ COLATTO

ASSUNTO RECURSO DE RECONSIDERAÇÃO DO PROCESSO N. TCE 01/01959206

Tratam os autos de Recurso de Reconsideração interposto contra o Acórdão n. 2255/2004, exarado no Processo n. TCE 01/01959206.

Na forma regulamentar, os autos seguiram à Consultoria Geral que exarou parecer no sentido de prover o Recurso nº 05/00804079, em razão da constatação de inexistência de débito. Em decorrência, considerou prejudicada a análise do Recurso nº 05/00990433.

O Ministério Público Especial, à sua vez, acompanhou o entendimento exarado pela Consultoria Geral no sentido de cancelar a responsabilização pelo débito, porém, pugnou pela aplicação de multa por grave infração à norma legal.

Após o trâmite regular, os autos foram a Plenário no dia 23/08/2006, sendo adiado o julgamento por duas sessões. Posteriormente foi retirado de pauta em virtude de pedido de vista do nobre Conselheiro César Filomeno Fontes, que sugeriu algumas mudanças no voto através do parecer de fls. 53/63. O então Relator do processo, Auditor Clóvis Mattos Balsini, exarou voto acatando parcialmente as sugestões trazidas pelo Conselheiro César Filomeno Fontes, porém, tendo em vista o afastamento do Auditor por motivo de férias e posterior aposentadoria, o processo foi redistribuído. Na sessão do dia 05/02/2007, por ocasião do julgamento, houve debates em Plenário sobre a ocorrência, no caso em questão, de débito ou apenas situação de aplicação de multa e, também, se o Estado deveria ou não recompor os cofres municipais.

Em razão da necessidade de um aprofundamento da questão, solicitei a retirada de pauta. Passo, agora, a apresentar ao egrégio Plenário o voto a ser por mim proferido, que, conquanto mantenha, no mérito, a posição anterior, procura esclarecer, inclusive à luz da jurisprudência do TCU, o entendimento inicialmente sustentado.

É o relatório.

VOTO

Cumpre referir, antes de tudo, assim como fiz na fundamentação de meu voto de fls. 64/69, que as sugestões trazidas pelo Conselheiro Cesar Filomeno Fontes, constantes às fls. 53/56, foram parcialmente acolhidas. Entendi que o caso em estante não comportava nova citação, tendo em vista que a Decisão nº 2751/2003 (fl. 421, da TCE) trouxe expressamente a informação que as irregularidades apontadas pela extinta DDR eram passíveis de imputação de débito e/ou aplicação de multa. Assim, sabedores eram os recorrentes que esta Corte de Contas poderia aplicar-lhes multa. Ademais, entendo que os responsáveis produziram suas defesas sobre os fatos e não sobre a capitulação a eles imposta. Logo, se não houve mudança dos fatos, não há impedimento para o Tribunal mudar a capitulação, a fim de corretamente adequar a conduta transgressiva à norma repressiva. Por último, considerei que a aplicação de penalidade é medida repressiva mais branda que a imposição de débito. Porém, e é nesse ponto que concordo com as sugestões trazidas pelo Conselheiro César Filomeno Fontes, ambos os recorrentes afrontaram a legislação de trânsito ao aplicar recursos provenientes de multas de trânsito em desvio de finalidade.

Feitas essas considerações iniciais, passo a tecer alguns esclarecimentos que entendo necessários e de grande valia para a formação da convicção de Vossas Excelências sobre o caso dos autos.

O debate se circunstancia em duas situações. A primeira, que busca resolver se o desvio de finalidade de recursos públicos, que reverteu em benefício coletivo ou da municipalidade, contempla devolução por parte daquele administrador que deu causa ao desvio. A segunda, que pretende dirimir a questão se o ente beneficiado com a aplicação de recursos em desvio de finalidade deve recompor o ente supostamente prejudicado ou lesado.

No caso dos autos, restou devidamente demonstrado que as receitas provenientes da aplicação de multas de trânsito foram aplicadas em desacordo com o objeto do convênio e em descompasso com o preconizado no art. 320, do CTB. Em outros termos, houve a aplicação de recursos públicos, provenientes da aplicação de multas de trânsito, na reforma da delegacia de polícia civil, de propriedade do Estado de Santa Catarina. O destino dos recursos se deram em desrespeito ao art. 320, do CTB e, também, em desobediência à alínea "d" da cláusula terceira do convênio nº 464/95 (fls. 03/06, da TCE). Os documentos constantes nos autos da Tomada de Contas Especial atestaram, de forma exaustiva, que a despesa realizada teve como fato ensejador a construção de aproximadamente 150 m2 de área na Delegacia de Polícia Civil de Piçarras, obra esta pertencente ao Estado. Portanto, devidamente provado restou o desvio de finalidade na aplicação de recursos públicos, que na linguagem de "contas" significa aplicar os recursos públicos em finalidades outras daquelas legalmente previstas.

Embora caracterizado o desvio de finalidade na aplicação de recursos públicos provenientes da aplicação de multas de trânsito, em nenhum momento ficou demonstrado que tais recursos beneficiaram o Sr. Humberto Luiz Teixeira, prefeito municipal à época, e o Sr. Márcio Luiz Colatto, então delegado. Pelo contrário, os documentos constantes nos autos demonstram, de forma cabal, que os recursos desviados de sua finalidade em verdade foram aplicados na construção de um anexo da delegacia de polícia de Piçarras, com área aproximada de 150 m2 e de propriedade do Estado de Santa Catarina. Portanto, ainda que desviados os recursos, houve reversão destes em prol do bem comum da comunidade local. Em tal hipótese, a jurisprudência do TCU é uníssona no sentido que não cabe a devolução dos valores por parte daqueles administradores que deram causa ao desvio de finalidade. As decisões abaixo, extraídas do site do TCU (www.tcu.gov.br), dão conta de tal entendimento:

7 TCU, Acórdão 307/1999 - Segunda Câmara, Processo 400.003/1995-3, Entidade: Prefeitura Municipal de Paranaíba/MS, Rel. Min. ADYLSON MOTTA.

8 TCU, Acórdão 3445/2006 - Primeira Câmara, Natureza Tomada de Contas Especial Entidade: Prefeitura Municipal de Caucaia/CE, Rel. Min. VALMIR CAMPELO.

9 TCU, Processo nº TC 004.596/90-0, Acórdão 52/94 - Plenário - Ata 22/94, Entidade: Prefeitura do Município de Igreja Nova (AL), Rel. Min.BENTO JOSÉ BUGARIN.

10 TCU, Acórdão 16/2001 - Primeira Câmara, Processo: 016.122/1999-2 (TCE), Unidade: Prefeitura Municipal de Constantina/RS. Rel. Min. LINCOLN M. DA ROCHA.

11 TCU, Acórdão 69/2000, Segunda Câmara, Processo: 929.541/1998-7, Unidade: Prefeitura Municipal de Ponta Porã/MS, Rel. Min. LINCOLN M. DA ROCHA.