ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO

Gabinete do Auditor Adircélio de Moraes Ferreira Junior

PROCESSO Nº

REC nº 05/01003940

UNIDADE

Prefeitura Municipal de Turvo

INTERESSADOS

Heriberto Afonso Schmidt, Venício da Silva e Adoaldo Otávio Teixeira

ASSUNTO

Recurso de Reconsideração no processo nº TCE- 02/07846944

 

 

 

CARGOS. ACUMULAÇÃO. VICE-PREFEITO. SECRETÁRIO. ILEGALIDADE. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO.

Tendo em vista a impossibilidade de acumulação de subsídio, bem como de quaisquer acréscimos adicionais – porquanto se trata de parcela única, impelente o ressarcimento ao erário dos valores percebidos indevidamente.

 

 

RELATÓRIO

 

Tratam os autos do Recurso de Reconsideração, conforme prescrito no art. 77 da LC (estadual) nº 202/00, interposto pelos Srs. Heriberto Afonso Schmidt - ex-Prefeito Municipal (1997 a 2004), Venício da Silva - ex-Vice-Prefeito Municipal (1997 a 2000), e Adoaldo Otávio Teixeira - ex-Vice-Prefeito Municipal (2001 a 2004), em face do Acórdão de nº 0163, da sessão ordinária de 21/02/05, proferido nos autos do processo nº TCE 02/07846944, o qual decidiu por julgar irregulares as contas em análise, com imputação de débito, com fulcro no art. 18, III, alínea "c" da LC (estadual) nº 202/00; cita-se:

 

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:

 

6.1. Julgar irregulares, com imputação de débito, com fundamento no art. 18, inciso III, alínea “c”, c/c o art. 21, caput, da Lei Complementar n. 202/2000, as contas pertinentes à presente Tomada de Contas Especial, que trata de irregularidades constatadas quando da auditoria realizada na Prefeitura Municipal de Turvo, com abrangência sobre irregular acumulação de valores remuneratórios pelo Vice-Prefeito nos exercícios de 1997 a 2003, e condenar os Responsáveis a seguir discriminados ao pagamento de débitos de sua responsabilidade, fixando-lhes o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovarem, perante este Tribunal, o recolhimento dos valores dos débitos aos cofres do Município, atualizados monetariamente e acrescidos dos juros legais (arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), calculados a partir das datas de ocorrência dos fatos geradores dos débitos, ou interporem recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, II, da Lei Complementar n. 202/2000):6.1.1. De responsabilidade solidária dos Srs. Heriberto Afonso Schmidt - ex-Prefeito Municipal de Turvo (1997 a 2004), CPF 289.671.789-72, e Venício da Silva - ex-Vice-Prefeito Municipal de Turvo (1997 a 2000), CPF 018.526.989-34, as seguintes quantias:

 

6.1.1.1. R$ 61.999,12 (sessenta e um mil, novecentos e noventa e nove reais e doze centavos), referentes a despesas com irregular acumulação remunerada nos exercícios de 1997 a 2000, pelo Sr. Venício da Silva, do subsídio do cargo de Vice-Prefeito Municipal com o vencimento do cargo comissionado de Secretário Municipal, em confronto com o disposto no art. 37, XVI, da Constituição Federal;

 

6.1.1.2. R$ 12.904,73 (doze mil, novecentos e quatro reais e setenta e três centavos), referente a despesas decorrentes da concessão irregular de gratificações financeiras ao Sr. Venício da Silva, em função do cargo comissionado de Secretário Municipal ocupado pelo Vice-Prefeito de julho de 1998 a dezembro de 2000, contrariando o art. 39, § 4º, da Constituição Federal. 6.1.2. De responsabilidade solidária dos Srs. Heriberto Afonso Schmidt - ex-Prefeito Municipal de Turvo (1997 a 2004), CPF 289.671.789-72, e Adoaldo Otávio Teixeira - ex-Vice-Prefeito Municipal de Turvo (2001 a 2004), CPF 047.673.579-34, as seguintes quantias:6.1.2.1. R$ 51.670,63 (cinqüenta e um mil, seiscentos e setenta reais, e sessenta e três centavos), referentes a despesas com irregular acumulação remunerada, pelo Sr. Adoaldo Otávio Teixeira, no período de janeiro de 2001 a maio de 2003, do subsídio do cargo de Vice Prefeito Municipal com o vencimento do cargo comissionado de Secretário Municipal, em confronto com o art. 37, XVI, da Constituição Federal;

 

6.1.2.2. R$ 13.984,70 (treze mil, novecentos e oitenta e quatro reais e setenta centavos), referente a despesas decorrentes da concessão irregular de gratificações financeiras ao Sr. Adoaldo Otávio Teixeira, em função do cargo comissionado de Secretário Municipal ocupado pelo Vice-prefeito, no período de janeiro de 2001 a maio de 2003, contrariando o art. 39, § 4º, da Constituição Federal. 6.2. Determinar ao Sr. José Brina Tramontin - Prefeito Municipal de Turvo, a adoção de providências visando à instauração de tomada de contas especial, nos termos do art. 10, §1°, da Lei Complementar n. 202/2000, com a estrita observância do disposto no art. 5º da Instrução Normativa n. 01/2001, em virtude da existência de prejuízo causado ao erário público quando do pagamento simultâneo do subsídio de Vice-Prefeito Municipal e do vencimento do cargo de Secretário Municipal ao Sr. Adoaldo Otávio Teixeira no período de junho de 2003 até a efetiva sustação de tais pagamentos, bem como dos pagamentos de gratificações aos cargos em comissão de Secretários Municipais, desde o início de tal prática até a efetiva sustação de tais pagamentos, excetuando-se os valores compreendidos pelo Relatório de Inspeção DDR n. 67/03, em atendimento ao disposto nos arts. 38 e 39, § 4º, da Constituição Federal, para apuração dos fatos, identificação dos responsáveis e quantificação do dano, sob pena de responsabilidade solidária.

 

6.2.1. Fixar o prazo de 30 (trinta) dias para que a Prefeitura Municipal de Turvo instaure a tomada de contas especial e comunique ao Tribunal de Contas sobre a instauração, conforme art. 3º, §2º, da Instrução Normativa n. 01/2001.

 

6.2.2. Estabelecer o prazo de 180 (cento e oitenta) dias, a contar da publicação desta Decisão no Diário Oficial do Estado, para conclusão e apresentação ao Tribunal do referido processo de tomada de contas especial, conforme art. 3º, §1º, da referida Instrução Normativa.

 

6.3. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como:

 

6.3.1. do Parecer DDR n. 027/2004, aos Representantes no Processo n. REP-02/07846944 e aos Responsáveis nominados no item 3 desta deliberação;

 

6.3.2. do Relatório de Inspeção DDR n. 67/2003, do Parecer DDR n. 027/2004 e da Instrução Normativa n. TC-01/2001, ao Sr. José Brina Tramontin - Prefeito Municipal de Turvo.

 

Em suas alegações recursais, os Recorrentes manifestam-se pela legalidade da situação, e indicam, nesse sentido, o posicionamento favorável da Justiça Catarinense (fls. 03-18). Também, que a Lei Orgânica do Município de Turvo permite a acumulação de cargo, assim como, nem a CF/88, tampouco a CE/89, realizam qualquer restrição. Afirma, ainda, que o vice-prefeito não exerce cargo, mas apenas um mandato num papel de substituto, razão pela qual considera como escorreitas as situações em voga.

Por fim, a insurgência levanta as seguintes questões: que o Tribunal de Justiça de Santa Catarina já concedeu o direito ao Sr. Romanin Dagostim, ex-Vice-Prefeito de Turvo, o direito de receber as verbas de representação quando fora nomeado secretário municipal; que as contas do Município foram devidamente aprovadas pela Corte de Contas (Pareceres de 1997 a 2002); e, por derradeiro, salientam que não houve prejuízo ao erário, posto que não se obteve nenhuma vantagem financeira, porquanto os serviços foram prestados. 

Encaminhado os autos à Consultoria Geral, esta emitiu o Parecer nº COG-464/08 (fls. 19-33), ocasião em que concluiu pelo conhecimento do recurso e, no mérito, negar-lhe provimento.

Na ocasião, inferiu o Órgão Consultivo pela impossibilidade de cumulação de cargos e remuneração, com a aplicação do inciso II do art. 38 da CF/88 ao caso concreto.

Concluída a análise jurídica, seguiram os autos ao Ministério Público Especial, o qual se manifestou através do Parecer nº 4851/MPTC/08, de fls. 34, que entendeu por acompanhar na íntegra os termos dispostos no Parecer COG.

Por meio de despacho, o Exmo. Sr. Conselheiro Relator deu-se por impedido, tendo em vista sua atuação anterior no presente processo como membro do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas (fls. 35-36).

Seguindo a sua tramitação regular, vieram os autos para manifestação deste Relator.

Presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, passa-se à análise do mérito.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

FUNDAMENTAÇÃO

 

Na contenda em análise questiona-se a possibilidade de cumular o subsídio do cargo de vice-prefeito com o vencimento do cargo comissionado de secretário municipal (itens 6.1.1.1 e 6.1.2.1 do Acórdão nº 0163/05), bem como perceber gratificação financeira decorrente do cargo comissionado de secretário municipal ocupado pelo vice-prefeito (itens 6.1.1.2 e 6.1.2.2 do Acórdão nº 0163/05). Foram dados como infringidos os seguintes dispositivos:

 

art. 37, inciso XVI, da CF/88

 

art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

 

[...]

 

X - a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (Regulamento)

 

XI - a lei fixará o limite máximo e a relação de valores entre a maior e a menor remuneração dos servidores públicos, observados, como limites máximos e no âmbito dos respectivos poderes, os valores percebidos como remuneração, em espécie, a qualquer título, por membros do Congresso Nacional, Ministros de Estado e Ministros do Supremo Tribunal Federal e seus correspondentes nos Estados, no Distrito Federal e nos Territórios, e, nos Municípios, os valores percebidos como remuneração, em espécie, pelo Prefeito;  (Vide Lei nº 8.448, de 1992)

XI - a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal;(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

XI - a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003)

 

[...]

 

XVI - é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o disposto no inciso XI. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

 

 

 

 

art. 39, §4º, da CF/88

 

Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas.

Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas. (Vide ADIN nº 2.135-4)

 

[...]

 

§ 4º O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

 

 

 

 

Cita-se, ainda, o art. 38 da Carta Magna:

 

Art. 38. Ao servidor público em exercício de mandato eletivo aplicam- se as seguintes disposições:

 

 

 

Art. 38. Ao servidor público da administração direta, autárquica e fundacional, no exercício de mandato eletivo, aplicam-se as seguintes disposições:(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

 

I - tratando-se de mandato eletivo federal, estadual ou distrital, ficará afastado de seu cargo, emprego ou função;

 

II - investido no mandato de Prefeito, será afastado do cargo, emprego ou função, sendo-lhe facultado optar pela sua remuneração;

 

[...]

 

Analisa-se.

Ab initio, reporta-se ao Parecer elaborado pela Consultoria Geral– fls. 23-24:

 

Em que pesem as alegações dos recorrentes, nota-se que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sinaliza em outro sentido. Assim, para a Suprema Corte brasileira, a Constituição Federal de 1988, em seu art. 38, inciso II proíbe a acumulação de cargo de Vice-Prefeito com a de Secretário Municipal.

Este é o posicionamento do Supremo Tribunal Federal – STF, no qual entende que o servidor público investido no mandato de Vice-Prefeito, aplicam-se-lhe, por analogia, as mesmas disposições contidas no inciso II do art. 38 da Constituição Federal, [...].

 

Acompanha-se o posicionamento do órgão Consultivo; vejamos: o Pretório Excelso foi claro ao destacar, através da ADIN 199 (Relator Ministro Maurício Corrêa, julgamento: 22/04/98), que, ao “servidor investido no mandato de vice-prefeito, aplicam-se-lhe, por analogia, as disposições contidas no inciso II do art. 38 da Constituição Federal”.

Nessas condições, não há o que se discutir frente à posição ora adotada pelo Supremo Tribunal Federal em sede de ADIN. A decisão do órgão supremo da interpretação constitucional possui efeito vinculante, conforme se abstrai das palavras de Alexandre de Moraes – In: Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 2003. 13. ed. p. 628-629:

 

A Lei nº 9.868/99 também previu, expressamente, que a declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, inclusive a interpretação conforme a Constituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto, têm efeitos vinculantes em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública Federal, estadual e municipal.

 

Dessa forma, seguindo a orientação da EC nº 03, de 17 de março de 1993, que instituiu efeitos vinculantes à ação declaratória de constitucionalidade, a nova lei previu o obrigatório respeito das decisões do STF, em sede de ação direta de inconstitucionalidade.

Assim, uma vez proferida a decisão pelo STF, haverá uma vinculação obrigatória em relação a todos os órgãos do Poder Executivo e do Poder Judiciário, que deverão pautar o exercício de suas funções na interpretação constitucional dada pela Corte Suprema, afastando-se, inclusive, a possibilidade de controle difuso por parte dos demais órgãos do Poder Judiciário.

Entendemos que os efeitos vinculantes aplicam-se inclusive ao legislador, que não poderá editar nova norma com preceitos idênticos aos declarados inconstitucionais, ou ainda, norma derrogatória da decisão do STF; ou mesmo, estará impedido de editar normas que convalidem os atos nulos praticados com base na lei declarada inconstitucional.

 

A vinculação obrigatória ocorrerá nas quatro seguintes situações:

- procedência da ação: a norma foi declarada inconstitucional, com os efeitos já estudados acima;

 

[...]

 

Essa vinculação obrigatória decorre da própria racionalidade do sistema concentrado de constitucionalidade, onde compete ao Supremo Tribunal Federal, por força da escolha política realizada pelo legislador constituinte originário, a guarda da Constituição Federal.

 

Assim, uma vez que interprete a norma constitucional abstratamente, em sede de ação direta de inconstitucionalidade, a Corte Suprema define seu significado e alcance, que deverá ser respeitado por todos os demais órgãos estatais, sob pena de desrespeito à sua função constitucional.

 

No mesmo sentido, colaciona-se o AI-AgR476390/MG (Relator Min. Sepúlveda Pertence, julgamento: 22/03/05):

 

EMENTA: 1. Acumulação de vencimentos e subsídios: impossibilidade. O Vice-Prefeito não pode acumular a remuneração percebida como servidor público municipal (Escriturário III), e posteriormente como Secretário de Obras do Município, com os subsídios do cargo eletivo: firmou-se o entendimento do STF no sentido de que as disposições contidas no inciso II do art. 38 da Constituição Federal, relativas ao Prefeito, aplicam-se, por analogia, ao servidor público investido no mandato de Vice-Prefeito (ADIn 199, Pleno, Maurício Corrêa, DJ 7.8.1998).

 

2. Recurso extraordinário: descabimento: questões que demandam prévio exame de legislação infraconstitucional e dos fatos que permeiam a lide: incidência da Súmula 279.

 

3. Agravo regimental: necessidade de impugnação de todos os fundamentos da decisão agravada (RISTF, art. 317, § 1º).

 

4. Agravo regimental manifestamente infundado: aplicação da multa de 2% (dois por cento) sobre o valor corrigido da causa (C. Pr. Civil, art. 557, § 2º). – (grifo nosso)

 

Dita o inciso II do retrocitado art. 38 da CF/88 que “investido no mandato [...], será afastado do cargo, emprego ou função, sendo-lhe facultado optar pela sua remuneração”.

E mais: determina, ainda, a Carta Magna, em seu §4º do art. 39, que “o detentor de mandato eletivo” será remunerado “exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória”.

Nessa linha de entendimento, se está investido no mandato de vice-prefeito não é possível perceber outro subsídio advindo do cargo de secretário.

Com se percebe, ainda, é inconciliável perceber gratificações outras tendo em vista a proibição constante do já analisado §4º do art. 39, porquanto o subsídio se perfaz de parcela única.

As alegações realizadas pelos Recorrentes não subsistem, portanto, frente aos ditames constitucionais, além dos parâmetros dispostos na ADIN de nº 199/PE[1], com efeito vinculante, inclusive para os órgãos da administração pública.

Do Tribunal de Contas dos Municípios do Estado do Ceará, extrai-se a seguinte análise jurídica, realizada pela Coordenadoria de Assistência Técnica (processo nº 18.853/00, Informação nº 77/01, Interessado: Câmara Municipal de Independência):

 

[...]

 

I- No regime constitucional anterior à Emenda Constitucional nº 19/98 a remuneração do Vice-Prefeito era denominada de Verba de Representação, passando, a partir da referida emenda, a chamar-se de subsídio. A remuneração na forma intitulada “subsídio” não permite quaisquer tipos de acréscimos adicionais e parcelas remuneratórias, sendo aplicada a membros de Poder e outros cargos e categorias previstas na Constituição ou em Lei.

 

Por sua vez, a paga recebida pelos ocupantes de cargos em comissão de secretários também é denominada de subsídios.

 

A dúvida reside na acumulabilidade de verbas da mesma natureza – os subsídios, ao tom do art. 37, inciso XI, da CF/88, que preceitua:

 

 

“Art. 37 – ...................................................................................................

XI – a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargo, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos  membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidas cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal” (grifo nosso).

 

 

No entanto, a cumulatividade permitida pelo artigo supra diz respeito somente as hipóteses previstas nas alíneas do inciso XVI do art. 37 da CF/88, o qual continua vedando a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto quando houver compatibilidade de horários nos casos de:

 

a)                  dois cargos de professor;

b)                  um cargo de professor com outro, técnico ou científico;

c)                  dois cargos privativos de médico.

 

Isso posto, há vedação de acumular subsídios decorrentes do cargo de Vice-Prefeito com os oriundos do cargo de confiança, porque ambos são remunerados pelo Poder Público e não podem ser conjuntamente percebidos pelo mesmo agente político, pois não há cobertura das alíneas do inciso XVI do art. 37 da CF/88.

 

Portanto, entendemos, s.m.j. que o Vice-Prefeito deverá licenciar-se de suas funções para assumir o cargo de Secretário, optando por apenas um dos subsídios.

 

 

[...]  

 

Por fim, apresenta-se o Prejulgado de nº 650 desta Casa que esclarece a contenda em debate - sessão de 28.07.2008, mediante a decisão nº 2394/2008, exarada no Processo PAD-07/00024875:

 

Prejulgados nº 0650

 

1. Não são auto-aplicáveis as normas do art. 37, XI, e 39, § 4º, da Constituição Federal, na redação que lhes deram os arts. 3º e 5º, respectivamente, da Emenda Constitucional n. 19, de 4 de junho de 1998.

2. A fixação dos subsídios dos agentes políticos deve observar o que preceituam os incisos X e XI do art. 37, o § 4º do art. 39, o inciso XV do art. 48 e os incisos V e VI do art. 29, todos da Constituição da República.

3. O subsídio dos Ministros do Supremo Tribunal Federal encontra-se regulado pela Lei 11.143/05.



4. As funções de confiança serão exercidas exclusivamente por servidores ocupantes do cargo efetivo.

 

5. O vice-prefeito, investido na condição de secretário municipal, deverá optar entre o subsídio afeto ao mandado eletivo e o vencimento do respectivo cargo.


6. Ao servidor público não é possível, quando se aposenta, continuar exercendo normalmente suas funções, ressalvando-se a aposentadoria voluntária do empregado de empresa pública ou sociedade de economia mista, vez que é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos.


7. É permitido ao servidor inativo retornar ao exercício da função pública, acumulando proventos e vencimentos, observando-se, contudo, as vedações do § 10 do art. 37 da Constituição Federal.

8. Poderá o aposentado que for aprovado em concurso público para ocupar cargo efetivo optar pelos vencimentos deste cargo, solicitando, contudo, a renúncia de sua aposentadoria, quando esta ensejar acúmulo vedado pela Constituição Federal.


9. É permitido ao servidor público inativo, sem vício de acumulação indevida, exercer cargo de provimento em comissão. – (grifo nosso)

 

Em suma, entende este Relator que, considerando as razões acima explanadas, persistem as responsabilizações constantes do Acórdão recorrido.

 

PROPOSTA DE VOTO

 

Considerando a manifestação da Consultoria Geral desta Corte, mediante Parecer nº COG-464/08, de fls. 19 a 33;

 

Considerando o que mais dos autos consta, VOTO no sentido de que o Egrégio Tribunal Pleno adote a decisão que ora submeto à sua apreciação:

 

1. Conhecer do Recurso de Reconsideração, nos termos do art. 77, da LC (estadual) nº 202/2000, interposto Heriberto Afonso Schmidt - ex-Prefeito Municipal (1997 a 2004), Venício da Silva - ex-Vice-Prefeito Municipal (1997 a 2000), e Adoaldo Otávio Teixeira - ex-Vice-Prefeito Municipal (2001 a 2004), em face do Acórdão de nº 0163, exarado na sessão ordinária de 21/02/05, nos autos do processo nº TCE 02/07846944, e, no mérito, negar-lhe provimento;

 

2. Dar Ciência deste Acórdão, bem como do Parecer e Voto que a fundamentam à Prefeitura Municipal de Turvo, aos Srs. Heriberto Afonso Schmidt - ex-Prefeito Municipal (1997 a 2004), Venício da Silva - ex-Vice-Prefeito Municipal (1997 a 2000), e Adoaldo Otávio Teixeira - ex-Vice-Prefeito Municipal (2001 a 2004), bem como aos procuradores dos Recorrentes, Dr. Arnildo Steckert Júnior (OAB/SC nº 9.868) e Dra. Elisângela Dandolini (OAB/SC nº 13983).

 

Gabinete, em 17 de outubro de 2008.

 

 

 

 

Adircélio de Moraes Ferreira Junior

Auditor Relator

 



[1] EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE PERNAMBUCO: ART. 98, § 2º, I, VI, XII, XVII: CONCESSÃO DE VANTAGENS A SERVIDOR PÚBLICO. VÍCIO DE INICIATIVA. COMPETÊNCIA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. ART. 99, IV E PARÁGRAFO ÚNICO: INVESTIDURA EM MANDATO ELETIVO. POSSIBILIDADE DE EXERCÍCIO SIMULTÂNEO DA VEREAÇÃO E DE FUNÇÃO PÚBLICA. EXTENSÃO AO VICE-PREFEITO E AO SUPLENTE DE VEREADOR. 1. Conversão em pecúnia de metade das férias e da licença- prêmio adquirida, pagamento de indenização a servidor exonerado de cargo em comissão, estabilidade financeira relativamente a gratificação ou comissão a qualquer título percebida. Impossibilidade. São inconstitucionais dispositivos de Cartas Estaduais, inclusive Emendas, que fixem vencimentos e vantagens, concedem subvenção ou auxílio, ou, de qualquer modo, aumentem a despesa pública, por ser da competência exclusiva do Chefe do Poder Executivo a iniciativa de lei sobre a matéria. Precedentes. 2. Exercício funcional simultâneo com a edilidade ou o cargo de Vice-Prefeito. Garantia aos servidores públicos civis e aos empregados de empresas públicas e sociedades de economia mista, integrantes da administração indireta estadual. Extensão ao suplente de Vereador. 2.1. A Constituição Federal condiciona o exercício simultâneo do mandato de Vereador e das funções de agente público à compatibilidade de horários, que, não ocorrendo, impõe o seu afastamento do cargo, emprego ou função, sendo-lhe facultado optar pela remuneração. 2.2. Carta Estadual. Restrição do exercício funcional ao domicílio eleitoral. Impossibilidade. A Constituição Federal prevê tão-somente a hipótese do desempenho simultâneo das funções públicas, observada a compatibilidade de horários. 2.3. Extensão ao suplente de vereador. Insubsistência. Ao suplente de Vereador não se pode validamente estabelecer nenhuma limitação ao exercício do cargo, emprego ou função, por não ser titular de mandato eletivo. 2.4. Servidor público investido no mandato de Vice- Prefeito. Aplicam-se-lhe, por analogia, as disposições contidas no inciso II do art. 38 da Constituição Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade que se julga procedente.