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ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO GABINETE DO CONSELHEIRO WILSON ROGÉRIO WAN-DALL |
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REC-05/03888354 |
UNIDADE GESTORA: | Companhia de Desenvolvimento e Urbanização de Joinville |
Interessado: | Sr. Romualdo Theophanes de França Júnior |
Assunto: | Recurso de Reexame (art. 80 da LC 202/2000) - DEN-01/01143940 + DEN-01/01322879 |
Parecer n°: | GC/WRW/2007/562/ES |
Ementa: Licitação. Inexigibilidade. Ratificação pela autoridade superior. Responsabilização.
O ato de ratificação pela autoridade superior, nas dispensas e inexigibilidades, equivale ao de homologação praticado nos certames licitatórios.
Assim, ao ratificar o processo de inexigibilidade, a autoridade confirma a validade do referido procedimento, bem como afirma o interesse da Administração na prestação do serviço a ser contratado, decorrendo desse fato a sua responsabilidade.
1. RELATÓRIO
Tratam os autos de recurso interposto pelo Sr. Romualdo Theophanes de França Júnior, em virtude do Acórdão n. 0140/2005, proferido nos autos n. DEN-01/01143940, cominando-lhe multa, em razão da indevida contratação direta da empresa Caiuá Assessoria Consultoria e Planejamento Ltda., mediante processo de inexigibilidade de licitação.
A peça recursal foi examinada pela Consultoria-Geral, a qual, mediante o Parecer n. COG-333/07, entendeu preenchidos os pressupostos de admissibilidade que autorizam o seu conhecimento. No que concerne ao mérito, propugnou o seu não-provimento, bem como a remessa de documentos dos autos ao Ministério Público, em face da configuração, em tese, do crime previsto no art. 89 da Lei Federal n. 8.666/93 (fls. 06/13).
A Procuradoria-Geral junto a este Tribunal, através do Parecer n. 4088/2007, acompanhou o entendimento da Consultoria (fls. 14/15).
Este o sucinto relatório.
Conclusos os autos, passo às minhas considerações.
Compulsando os autos, depreende-se que a CONURB firmou o Termo de Contrato n. 063/2000-C, com a empresa Caiuá Assessoria, Consultoria e Planejamento Ltda., para a contratação de serviço de Consultoria Técnica para a manutenção e adequação, com novas propostas para o sistema de estacionamento rotativo nas vias e logradouros públicos do município de Joinville. 1
Tal avença foi celebrada sob o amparo do art. 25, inciso II, da Lei de Licitações, o qual dispõe o seguinte:
Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:
[...]
II - para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação;
No julgamento do processo de denúncia este Tribunal entendeu que não foram comprovados os requisitos constantes do preceptivo legal mencionado, de modo a autorizar a citada contratação direta.
Em suas razões, o gestor aduziu que "o fato de ser o Diretor-Presidente a pessoa competente para praticar o ato final por dever de ofício, não implica que assume responsabilidade por todos os atos intermediários praticados pelos diversos departamentos e agentes administrativos encarregados de instruir e trazer à autoridade maior o ato pronto e acabado, para a sua assinatura".
Assinalou a existência de delegação, no âmbito da CONURB, no que tange às responsabilidades pelos atos, previstas no Estatuto da Companhia, aprovado pelo Decreto Municipal n. 8.224/97, razão pela qual não é o responsável pelo ato ensejador da multa.
Finalizou, afirmando que foi induzido a erro, porquanto o objeto contratado foi analisado e justificado pelo ex-Diretor-Técnico da CONURB.
A Consultoria, em seu exame, rechaçou a argumentação do Recorrente nos seguintes moldes:
"[...] Caracterizada a sua qualidade de ordenador da despesa, como Diretor Presidente da Companhia de Desenvolvimento e Urbanização de Joinville - CONURB, não há como ser afastada a responsabilização.
O art. 82 da Lei 8.666/93 responsabiliza todos os agentes que praticarem atos em desacordo com os preceitos da licitação. In verbis:
Art. 82. Os agentes administrativos que praticarem atos em desacordo com os preceitos desta Lei ou visando a frustrar os objetivos da licitação sujeitam-se às sanções previstas nesta Lei e nos regulamentos próprios, sem prejuízo das responsabilidades civil e criminal que seu ato ensejar. (grifou-se)
Note-se, ainda, que o recorrente se enquadra no conceito de responsável enunciado pelo art. 133, § 1º, da Resolução nº TC 16/2001:
Por outro lado, vale destacar que a contratação direta efetuada sem observância das hipóteses de inexigibilidade constitui crime, previsto pela Lei 8.666/93:
Ademais, o recorrente aduz, à fl. 5, cópia de documento que torna incontestável a sua participação nos atos, porquanto exibe assinatura na qualidade de ordenador da despesa.
Considerando, portanto, a inegável participação do recorrente nos atos considerados irregulares, a manutenção da multa aplicada é medida que se impõe." (fls. 11/12)
Percebe-se que a argumentação do Recorrente centrou-se em excluir a sua responsabilidade, no tocante aos atos do processo de inexigibilidade de licitação, considerado irregular por esta Corte.
Realço que consta do processo principal (DEN-01/01143940-fl. 36), que o Recorrente, na condição de Diretor-Presidente da CONURB, assinou o despacho de justificação de inexigibilidade de licitação - sob o argumento de que não havia concorrência possível para a contratação do serviço, diante da exclusividade da empresa contratada-, determinando que se desse publicidade de tal documento.
Considerando que o Diretor-Presidente é a autoridade superior da Companhia, ao justificar a inexigibilidade de licitação, de modo a legitimar a contratação da empresa Caiuá Assessoria, Consultoria e Planejamento Ltda., e determinar a publicação dessa justificativa, o Recorrente ratificou os atos da comissão responsável pelo referido processo de inexigibilidade.
Importa salientar que, igualmente, nos processos de licitação, a autoridade deve homologar o resultado do certame e, em assim agindo, confirma os atos da comissão de licitação. Nesse sentido, leciona Toshio Mukai:
"O ato de homologação é o ato de controle da regularidade de todo o procedimento. Por isso, a autoridade competente, verificando a correção de todo o procedimento, homologa-o, praticando o último ato necessário anterior à contratação. [...]" (Licitações e contratos públicos. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 120).
De igual modo, explica José dos Santos Carvalho Filho:
"A homologação se situa no âmbito do poder de controle hierárquico da autoridade superior e tem a natureza jurídica de ato administrativo de confirmação. Quando a autoridade procede à homologação do julgamento, confirma a validade da licitação e o interesse da Administração em ver executada a obra ou o serviço, ou contratada a compra, nos termos previstos no edital. A lei, além de referir-se à homologação, alude também à expressão aprovação do procedimento, que possui o mesmo significado." (Manual de direito administrativo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, p. 235) grifo nosso
Denota-se, portanto, uma equivalência entre o ato de ratificação pela autoridade superior, nas dispensas e inexigibilidades, ao de homologação praticado nos certames licitatórios.
Acerca desse tema, colhe-se da Revista Zênite de Licitações e Contratos-ILC:
"Embora a Lei n. 8.666/93 não tenha dispensado muita atenção aos procedimentos das contratações diretas, concentrando-se mais no processo licitatório, que é a regra, também nesses casos há um trâmite formal a ser seguido e que deve alinhar-se aos princípios arrolados no art. 3º.
O art. 26, em seu parágrafo único, arrola alguns documentos que devem instrui-los, trazendo nitidamente a idéia de que devem ser formalizados, documentados.
Diante disso, é indispensável a existência de uma 'fase probatória', em que se fará a análise da legalidade do procedimento e da conveniência e oportunidade da contratação.
Nessa linha, o caput do art. 26 já referido, exceto as hipóteses previstas no art. 24, incs. I e II, as dispensas e as inexigibilidades, após devidamente justificadas, devem ser comunicadas à autoridade superior para ratificação. Esse ato consubstancia, então, o controle hierárquico do processo, que nos certames licitatórios é exercido através da homologação.
Veja-se o que escreve Adilson de Abreu Dallari:
'A decisão de contratar sem licitação deve expressar-se em despacho motivado do agente competente. Entretanto, salvo nas hipóteses de dispensa por baixo valor (art. 24, I e II), essa decisão não é desde logo eficaz, sendo inviável celebrar imediatamente a avença.
Para adquirir eficácia, o despacho deve ser submetido à ratificação da autoridade superior e publicado. A ratificação serve ao controle hierárquico da legalidade e da conveniência ou oportunidade do ato. Já a publicação destina-se a permitir o controle externo e difuso das decisões administrativas."2
[...]
Nesse sentido, pode-se dizer que o ato de ratificação de dispensas e inexigibilidades produz efeitos equivalentes aos da homologação da licitação."3 Grifo nosso
Infere-se, portanto, que ao ratificar o processo de inexigibilidade, o Recorrente confirmou a sua validade, bem como o interesse na prestação do serviço a ser contratado.
Decorre desse fato, que, em havendo irregularidade na inexigibilidade de licitação, a autoridade que a ratificou ou confirmou há de ser responsabilizada.
Ademais, cumpre acentuar que o Recorrente assumiu a posição de ordenador da despesa. É o que se conclui do documento para "solicitação de compra ou serviço", acostado à fl. 5 destes autos, no qual o Recorrente apõe sua assinatura na condição de ordenador.
Conforme Hélio Saul Mileski:
"[...] Ordenador de despesa é a autoridade administrativa, o responsável mor, com poderes e competência para determinar ou não a realização da despesa, de cujo ato gerencial surge a obrigação de justificar o bom e regular uso dos dinheiros públicos. [...]
Ostentam a condição de Ordenadores de Despesa originários os Presidentes dos Poderes Legislativo e Judiciário; os Ministros e Secretários de Estado, assim como os dirigentes de autarquias, fundações, sociedades de economia mista e empresas públicas, por possuírem competências e atribuições fixadas em lei, regulamentos ou estatutos societários, para administrarem estas organizações estatais, aplicando os recursos financeiros postos a sua disposição." (O Controle da gestão pública. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p.121/123)
Assim, o fato de o Recorrente ser considerado ordenador da despesa, decorrente do processo de inexigibilidade irregular, reforça a sua responsabilidade.
Assevero que não acolho a proposta de remessa de documentos ao Ministério Público Estadual, defendida tanto pela Consultoria quanto pela Procuradoria-Geral junto a esta Corte.
Na lição de Antônio Roque Citadini, Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, para a configuração do crime do art. 89 da Lei de Licitações é necessário que haja dolo da parte do agente público:
[...] Ao promover qualquer contratação, o agente público deverá, como regra, abrir procedimento licitatório, somente não o fazendo em situações de dispensa ou de inexigibilidade de licitação. Para que a conduta do agente possa ser adequada tipificada como criminosa, haverá de ser demonstrado, em juízo que o claro objetivo de fugir da licitação foi beneficiar-se, ou beneficiar alguém, com prejuízo para a Administração. (Comentários e jurisprudência sobre a lei de licitações públicas. 2. ed. São Paulo: Max Limonad, 1997, p. 433)
Marçal Justen Filho não discrepa desse entendimento, ao realçar o elemento subjetivo dos crimes da Lei Federal n. 8.666/93:
In casu, não consegui vislumbrar, através dos documentos que integram os autos, a existência de dolo específico da parte do Recorrente para o cometimento do crime, tipificado no art. 89 da Lei de Licitações.
No mais, acompanho os pareceres da Consultoria e do Ministério Público.
2. VOTO
CONSIDERANDO o que mais dos autos consta, VOTO em conformidade com os pareceres da Consultoria e do Ministério Público, no sentido de que o Tribunal adote a decisão que ora submeto a sua apreciação:
6.1. Conhecer do Recurso de Reexame, nos termos do art. 80 da Lei Complementar n. 202/2000, interposto contra o Acórdão n. 140/2005, exarado na Sessão Ordinária do dia 21/02/2005, nos autos do Processo n. DEN-01/01143940, para, no mérito, negar-lhe provimento, ratificando na íntegra a decisão recorrida.
Gabinete do Conselheiro, em 15 de agosto de 2007.
WILSON ROGÉRIO WAN-DALL
Conselheiro Relator
2
Nesse sentido também escreve Carlos Ari Sundfeld, no seu Licitação e contrato administrativo. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1994, p. 62. 3
Revista Zênite de Licitações e Contratos-ILC, n. 110, p. 338, abr/2003.
Art. 133. § 1º Para efeito do disposto no caput, considera-se:
a) responsável aquele que figure no processo em razão da
utilização, arrecadação, guarda, gerenciamento ou administração de dinheiro, bens, e valores públicos, ou pelos quais o Estado ou o Município respondam, ou que, em nome destes assuma obrigações de natureza pecuniária, ou por ter dado causa a perda, extravio, ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário; (grifou-se)
Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade:
Pena - detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa.
Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público.
"(...) para configurar-se um crime não basta, por exemplo, deixar de observar formalidades exigidas pela Lei para dispensa de licitação. A caracterização do crime depende de que esta conduta seja exteriorização de um "elemento subjetivo" específico. Somente se pune o agente que deixou de observar a formalidade porque buscava o resultado reprovável (lesar a Administração pública ou fraudar o princípio da Isonomia). Se o agente descumpriu a formalidade por culpa em sentido estrito, estará sujeito à responsabilização administrativa, mas não terá cometido um crime." (Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 7. ed. São Paulo: Dialética, 2000, p. 631/632)
6.2. Dar ciência desta Decisão, do Parecer e Voto do Relator que a fundamentam, bem como do Parecer n. COG-333/07, ao Sr. Romualdo Theophanes de França Júnior - ex-Diretor-Presidente da Companhia de Desenvolvimento e Urbanização de Joinville.
1
Fls. 30 e ss. dos autos n. DEN-01/01143940.