ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO

GABINETE DO CONSELHEIRO WILSON ROGÉRIO WAN-DALL

    Processo n°:
DIL - 05/03978779
UNIDADE GESTORA: Fundo Penitenciário do Estado de Santa Catarina
RESPONSÁVEL: Sr. Ronaldo José Benedet - Secretário de Estado da Segurança Pública e Defesa do Cidadão
Assunto: Dispensa de Licitação nº 133/SSP/2005, visando a Contratação emergencial da empresa Montesinos Sistemas de Administração Prisional Ltda, objetivando a execução de serviços de fornecimento de meios materiais necessários à operacionalização da Penitenciária de Joinville
Parecer n°: GC-WRW-2007/026/JW

RESUMO

A Unidade Gestora acima identificada encaminhou a esta Corte de Contas, para exame preliminar, o processo de Dispensa de Licitação nº 133/SSP/2005, visando a Contratação emergencial da empresa Montesinos Sistemas de Administração Prisional Ltda, objetivando a execução de serviços de fornecimento de meios materiais necessários à operacionalização da Penitenciária de Joinville, com valor estimado da contratação de até R$ 1.417.614,00 (um milhão quatrocentos e dezessete mil seiscentos e quatorze reais), em cumprimento ao art. 25, I, "b" da Resolução nº TC 06/2001 - Regimento Interno e nos termos do art. 2º, § 1º, da Instrução Normativa nº 01 de 04/11/2002.

A DCE, , procedeu a análise dos autos, emitindo o Relatório nº 163/2005 (fls. 09/10), concluindo por sugerir a realização de Diligência ao responsável para que o mesmo encaminhasse a esta Corte de Contas cópia de todos os documentos que integram a citada Dispensa de Licitação.

Em 01/02/06, através de Despacho (fls. 163) determinei a realização de Audiência ao responsável.

A audiência foi efetivada através do ofício nº 1642 (fls. 165).

Houve pedido de prorrogação de prazo (fls. 134), que foi concedido.

Os autos foram à Procuradoria Geral do Ministério Público Junto ao Tribunal de Contas que emitiu o Parecer nº MPTC 0045/2007 (fls. 489/495), manifestando-se, após extenso Parecer, conclusivamente, nos seguintes termos:

"Ante o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II, da Lei Complementar no 202/2000, manifesta-se:

1) pela REGULARIDADE dos aspectos examinados da Dispensa de Licitação nº 133/SSP/2005;

2) pela DETERMINAÇÃO ao Secretário Estadual da Segurança Pública e da Defesa do Cidadão para que tome as medidas necessárias no sentido de instituir o controle de custos das unidades carcerárias estaduais;

3) pela CIÊNCIA da Decisão a ser exarada pela Corte ao(s) Gestor(es) implicado(s) do Fundo Penitenciário do Estado de Santa Catarina"

Com fundamento no art. 224 da Resolução n.º TC-06/2001 (Regimento Interno), com base no Relatório de Auditoria, no Parecer do Ministério Público, nas alegações de defesa apresentadas e após compulsar atentamente os autos, passo a tecer algumas considerações que entendo oportunas, para fundamentar o Voto por mim proferido:

3.1. Quanto as multas:

3.1. Restrições da Diretoria de Controle de Obras - DCO:

3.1.1. Objeto licitado que caracteriza contratação indireta, burla à realização de concurso público, contrariando o artigo 37, inciso II, da Constituição Federal por ainda, o disposto no artigo 186 da Lei Estadual nº 284/2005 e, ainda, o Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta firmado com o Ministério Público Estadual em 25/01/2005 - fls. 123/138 (item 2.1 do Relatório 097/2006);

Estes são os argumentos trazidos aos autos, cabendo a este Relator algumas observações a respeito dos mesmos e da matéria abordada, para justificar o posicionamento a ser exarado neste voto.

Os argumentos colacionados pelo Ministério Público junto ao Tribunal de Contas no sentido de que não se poderia afirmar, diante do que foi posto nos autos, que o objeto licitado constitui atividade típica de Estado, nem que houve burla ao Concurso Público, pois não se adentrou na discussão de quais ou tais atividades, dentre todas aquelas contratadas, que seriam efetivamente típicas e quais não seriam típicas, são de todo procedentes e merecem ser acatados.

Compulsando-se o Projeto básico - Disposições Gerais e Preliminares (fls. 25) constata-se que:

- o objeto da contratação compreende fornecimento de alimentação e materiais de higiene e hospedagem;

- a responsabilidade da contratada fica limitada exclusivamente à execução das funções técnico-materiais relativas à execução penal;

- a contratação dos serviços previstos não reduz nem exclui qualquer das competências do Poder Público relativos às atividades jurisdicionais e administrativas-judiciárias da execução penal previstos na Constituição federal, na lei nº 7.210 de 11/07/84 (Lei de Execução Penal), de modo que a contratada deverá subordinar-se às determinações e fiscalizações dos agentes públicos competentes responsáveis pela Administração da Penitenciária;

- as atividades típicas de Estado (atividades administrativas-judiciárias) relativas à promoção das medidas de segurança, controle de disciplina e medidas judiciais cabíveis, incluindo o Poder de Polícia, visando o cumprimento da pena, e as medidas sócio-educativas de reintegração do preso à sociedade, permanecem sob exclusiva competência do Estado.

Deste modo, verifica-se que o que se esta contratando não é única e exclusivamente a mão-de-obra de agentes prisionais, mas sim todos os meios materiais necessários à operacionalização da penitenciária, sendo que toda a estrutura de Administração da penitenciária (Direção Geral e Gerências) será ocupada por Agentes Públicos.

Celso Antônio Bandeira de Mello quando trata da matéria referente a "Delegação de atos de Polícia Administrativa" deixa assentado que:

"A restrição à atribuição de atos de polícia a particulares funda-se no corretíssimo entendimento de que não se lhes pode, ao menos em princípio, cometer o encargo de praticar atos que envolvem o exercício de misteres tipicamente públicos quando em causa liberdade e propriedade, porque ofenderiam o equilíbrio entre os particulares em geral , ensejando que uns oficialmente exercessem supremacia sobre outros.

Daí não se segue, entretanto, que certos atos materiais que precedem atos jurídicos de polícia não possam ser praticados por particulares, mediante, delegação, propriamente dita, ou em decorrência de um simples contrato de prestação. Em ambos os casos (isto é, com ou sem delegação), às vezes, tal figura aparecerá sob o rótulo de "credenciamento". Adilson Dallari, em interessantíssimo estudo, recolhe variado exemplário de 'credenciamentos". É o que sucede, por exemplo, na fiscalização do cumprimento de normas de trânsito mediante equipamentos fotossensores, pertencentes e operados por empresas privadas contratadas pelo Poder Público, que acusam a velocidade do veículo ao ultrapassar determinado ponto e lhe captam eletrônicamente a imagem, registrando dia e momento da ocorrência.

Para execução desta atividade material, objetiva, precisa por excelência, e desde que retentora de dados para controle governamental e dos interessados, nada importa que os equipamentos pertençam ou sejam geridos pelo poder público ou que pertençam e sejam geridos por particulares, aos quais tenha sido delegada ou com os quais tenha sido meramente contratada. É que as constatações efetuadas por tal meio caracterizam-se pela impessoalidade (daí porque não interfere o tema do sujeito, da pessoa) e asseguram, além de exatidão, uma igualdade completa no tratamento dos administrados, o que não seria possível obter com o concurso da intervenção humana.

De resto, não há nisto atribuição alguma de poder que invista os contratados em qualquer supremacia engendradora de desequilíbrio entre os administrados, pois não está aí envolvida expedição de sanção administrativa e nem mesmo a decisão sobre se houve violação de norma de trânsito, mas mera constatação objetiva de um fato.

(...)

Para concluir: (...). Pode haver, entretanto, habilitação do particular à prática de ato material preparatório ou sucessivo a ato jurídico desta espécie, nos termos e com as limitações supra-assinaladas." (De Mello, Celso Antônio Bandeira, Curso de Direito Administrativo. 15º ed, São Paulo. Malheiros, 2002, pg. 726/728) .

O Professor Celso Antônio Bandeira de Mello deixa clara a plausibilidade jurídica da atribuição, a um ente privado, de atividades que são meramente instrumentais, e que irão possibilitar, com o seu produto, o efetivo exercício do poder de polícia por parte do Estado.

Assim, diante dos fatos e fundamentos retro citados entendo que a restrição possa ser relevada até mesmo porque trata-se de contratação realizada através de Dispensa de Licitação em caráter emergencial e com duração determinada de 90 (noventa) dias, período este em que foi realizada a Concorrência nº 171/SSP/2005 (cuja Contrato - Contrato nº 21/SSP/2006 - foi assinado em 03/01/2006).

3.1.2. Não caracterização da situação de emergência de que tratam os artigos 24, inciso IV e 26, inciso I, todos da Lei nº 8.666/93 (item 2.2 do Relatório 097/2006);

Em relação a esta restrição acato na sua totalidade os argumentos trazidos aos autos pelo Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, especialmente quando este aborda a questão de que a dispensa de licitação como fato ilícito somente restaria caracterizada quando a falta de planejamento ou a má-gestão tivessem sido dolosamente "construídas", fato que não exsurge dos elementos que instruem os autos.

Como muito bem asseverou o representante do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, na atual conjuntura de um sistema prisional que amontoa mais do que o dobro da população carcerária que poderia acolher (fls 156), é plausível que a oferta de mais de 350 (trezentas e cinqüenta) vagas, em um presídio recém-inaugurado, retira do gestor a possibilidade de refletir demoradamente sobre o uso ou não dessas instalações.

Deste modo afasto a irregularidade apontada, entendendo que efetivamente, no momento, a Dispensa de Licitação com fundamento na situação de emergência do sistema Penitenciário de Santa Catarina, era a atitude mais coerente, de acordo com a legislação, a ser tomada pelo Administrador.

3.1.3. Ausência de justificativa do preço contratado em e sua correlação com o custo atual de manutenção dos presídios cujos serviços não foram terceirizados no Estado de Santa Catarina, em cumprimento ao artigo 7º, inciso II e § 9º e 26, inciso III, da Lei nº 8.666/93 (item 2.3 do Relatório 097/2006);

Uma vez revelados os argumentos colacionados aos autos, cabem alguns esclarecimentos a fim de embasar o posicionamento adotado por este Relator.

Manifestando-se acerca da matéria em discussão, Marçal Justen Filho disse:

"A regra do inc. II não poderá ser cumprida rigorosamente, em todos os casos. (...). Ora, a Administração não deterá condições, muitas vezes, de promover a apuração desses montantes. Como não atua empresarialmente em certos setores, a Administração não disporá de elementos para fixar o orçamento detalhado. Mas isso não elimina o dever de estimar custos, pois não é lícito à administração iniciar a licitação sem previsão dos valores a desembolsar." (Comentários a Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 10ª ed., São Paulo, Dialética, 2004, pg. 111) (g.n)

Ora, como muito bem deixou assentado o Insígne Jurista, nem sempre deterá a Administração os dados e o conhecimento necessário para elaborar um "orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os seus custos unitários", sendo que neste casos, e este que se apresenta nos autos, se trata de um deles, deverá a Administração "ESTIMAR CUSTOS".

Ora, para "Estimar os Custos" afim de efetivar a contratação ora examinada, uma vez que não possuia sistema de custos organizado e adequado para a verificação do efetivo custo de uma penitenciária, o Administrador se utilizou da comparação entre o preços praticados pelas penitenciárias que já efetivavam este tipo de contratação.

Verifica-se ainda que o preço contratado encontra-se em posição intermediária em relação aos preços paradigmas. Logo, com os dados que constam dos autos, não há sustentação para qualquer assertiva no sentido da sua irrazoabilidade.

O Tribunal de Contas da União - TCU quando chamado a se manifestar sobre a questão do "Orçamento Detalhado" constante do art. 7º, § 2º, Inciso I da Lei nº 8.666/93, exarou o seguinte entendimento:

"Planilha - ausência - relevação

Nota: O TCU considerou falha formal, não punível entre outras: ausência de estimativa de custos (....)." (Fonte: TCU. Processo nº 675.217/97-0. Decisão nº 755/1998 - Plenário. Apud FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby, Vade-Mécum de Licitações e Contratos. Legislação: Organização e seleção, Jurisprudência, Notas e Índices. 2º ed.,Belo Horizonte, Fórum, 2005, pg. 183/184)

"Planilha de custos x preços

Nota: O TCU entendeu que em alguns casos não é possível estimar custos (...)" (Fonte: TCU. Processo nº 006.007/96-1. Decisão nº 821/1997 - Plenário. Apud FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby, Vade-Mécum de Licitações e Contratos. Legislação: Organização e seleção, Jurisprudência, Notas e Índices. 2º ed.,Belo Horizonte, Fórum, 2005, pg. 188)

Assim é que diante dos fatos, argumentos e posicionamentos apresentados, entende este Relator por transformar a restrição em recomendação para que a Unidade de Origem tome as medidas necessárias no sentido de instituir o controle de custos das unidades carcerárias Estaduais.

3.1.4. Não procedência da justificativa para a razão da escolha do fornecedor, em elisão ao disposto no artigo 26, inciso II, da Lei nº 8.666/93 (item 2.4 do Relatório 097/2006);

Expostas as posições e argumentos colacionados aos autos, entende este Relator que cabem alguns esclarecimentos a fim de embasar o posicionamento adotado por este Relator.

Efetivamente o inciso II, Parágrafo Único do art. 26 da Lei Federal 8.666/93 exige que no caso de Dispensa de Licitação se esclareça a "razão da escolha do fornecedor ou executante", e o Responsável, como muito bem deixou assentado o representante do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, apresentou as seguintes justificativas:

* a comprovação de experiência anterior na gestão de unidades prisionais (atestado de capacidade técnica fornecido pelo vizinho Estado do Paraná;

* a apresentação de documentos necessários à contratação (qualificação jurídica e técnica).

Sendo que não houve, nos autos comprovação de que estas justificativas não seria procedentes, de modo que, diante da relativa "Discricionariedade" do Administrador nas contratações realizadas por meio de Dispensas de Licitação, entendo que não procede a irregularidade apontada.

Manifestando-se acerca da questão da "Discricionariedade" nos processos de contratação por meio de Dispensa ou Inexigibilidade de Licitação , Marçal Justen Filho diz:

"(...)

O processo de escolha de um dentre diversos Sujeitos será permeado por juízos de preferência. Será decisão discricionária, o que não caracterizará ofensa ao princípio da isonomia.

Não é possível inviabilizar a atividade administrativa para tutelar o princípio da isonomia. A Administração necessita realizar o contrato e terá de contratar um único sujeito - ou, pelo menos, não poderá contratar todos os sujeitos potencialmente em condições equivalentes de conhecimento, experiência e notório saber. É impossível estabelecer critério objetivo de seleção da melhor alternativa. Logo e havendo situações equivalentes, a única solução é legitimar a escolha fundada na vontade do agente administrativo. Isso corresponde ao conceito de discricionariedade." (Comentários a Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 10ª ed., São Paulo, Dialética, 2004, pg. 297).

Considerando o que dos autos consta, e o Parecer do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, VOTO, no sentido de que o Egrégio Tribunal Pleno adote a decisão que ora submeto à apreciação:

4.1. Conhecer da Dispensa de Licitação n. 133/SSP/2005, de 17/06/2005, do Fundo Penitenciário do Estado de Santa Catarina cujo objeto é a Contratação emergencial da empresa Montesinos Sistemas de Administração Prisional Ltda, objetivando a execução de serviços de fornecimento de meios materiais necessários à operacionalização da Penitenciária de Joinville, com valor máximo previsto de R$ 1.471.614,00, considerando seus termos, excepcionalmente, em consonância com as determinações dos arts. 24, inciso IV e 26, da Lei Federal n. 8.666/93.

Gabinete do Conselheiro, 21 de fevereiro de 2007.

Wilson Rogério Wan-Dall