ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
GABINETE DO CONSELHEIRO WILSON ROGÉRIO WAN-DALL

 

Processo nº:

REC-05/04111019

Unidade Gestora:

Câmara Municipal de Campos Novos

Responsável:

Sr. Rui Jorge Thomazoni

Assunto:

Recurso de Reconsideração (art. 77 da LC 202/2000) - TCE-02/06795050 + AOR-8858505-99 + REC-05/04110802

Parecer nº:

GC/WRW/2009/132/ES

 

 

RESUMO

 

Cuidam os autos de recurso interposto pelo Sr. Rui Jorge Thomazoni, ex-Presidente da Câmara de Campos Novos, em face do Acórdão n. 1.733/2005, proferido nos autos n. TCE-02/06795050.

 

A peça recursal foi examinada pela Consultoria-Geral, que, mediante o Parecer n. COG-710/06, e, no mérito, propôs o provimento parcial.[1]

 

O Ministério Público, em manifestação subscrita pela Procuradora Cibelly Farias divergiu do órgão consultivo e se posicionou pelo não provimento do recurso.[2]

 

Examinando os autos principais, constato que a Instrução apurou que a Câmara Municipal de Campos Novos efetuou pagamentos a servidores municipais de vantagens a título de qüinqüênios e biênios de forma cumulativa, com base no mesmo fundamento, isto é, o tempo de serviço público.

 

A meu ver, a inconstitucionalidade dos dispositivos legais transcritos é inconteste, porquanto ofende o preceito contido no art. 37, XIV da Constituição Federal, que estabelece que “os acréscimos pecuniários percebidos por servidor público não serão computados nem acumulados para fins de concessão de acréscimos ulteriores”.

 

Com efeito, a acumulação de vantagens concedidas sob o mesmo título (por exemplo, tempo de serviço público), como o adicional bienal e qüinqüênios, incide na vedação contida no art. 37, inciso XIV da Constituição Federal.

O Supremo Tribunal Federal assentou que a Constituição da República veda a acumulação de acréscimos pecuniários para fins de cálculo de acréscimos ulteriores, sob o mesmo fundamento, tendo, inclusive, proferido diversos julgados entendendo não ser permitida acumulação do adicional bienal e qüinqüênios, tendo como base o tempo de serviço.

No que tange aos servidores beneficiados com os pagamentos indevidos, com fulcro nas Súmulas n. 106 e 235 do TCU e julgados mais recentes do STJ e STF, entendo que, como não ficou comprovado nos autos que os tais servidores agiram com má-fé, não há que se falar em ressarcimento das importâncias recebidas pelos mesmos até a data do pronunciamento definitivo deste Tribunal.

Em relação ao Recorrente, considero que a questão preponderante para o cancelamento do débito que lhe foi imputado não é diretamente a sua boa-fé, mas o fato de agir resguardado por lei.

Na situação examinada nos presentes autos, verifico que as leis municipais que amparam o pagamento das gratificações, tidas por inconstitucionais, vigoram desde 1990 e que a tomada de contas especial deste Tribunal enfocou os atos pertinentes ao exercício de 1998, isto é, o Recorrente apenas deu continuidade a um procedimento que já estava ocorrendo.

Sublinho que as leis municipais n. 1742/90 e 1981/93 estavam em plena vigência, gozando, por isso, da presunção de legitimidade das leis, segundo a qual toda norma jurídica presume-se legítima (ou constitucional) enquanto não declarada, efetivamente, a existência de um vício de inconstitucionalidade.

Assim, acompanho a consultoria no que tange ao cancelamento do débito, embora discorde parcialmente dos fundamentos utilizados na manifestação do órgão consultivo.

Ressalto que não houve uma decisão desta Corte de Contas se pronunciando acerca da inconstitucionalidade das normas municipais, quando do exame dos autos principais.

Por este motivo entendo pertinente que este Tribunal - ante a inconstitucionalidade das referidas leis municipais - negue cumprimento aos referidos dispositivos normativos, nos termos dos arts. 149 a 153 do Regimento Interno deste Tribunal, bem como recomende à Administração Municipal a adoção de medidas para eliminar ou adequar à Constituição Federal as referidas normas, a fim de evitar a continuidade do pagamento a outros servidores ou novas concessões das mencionadas vantagens, que venham a lesar ainda mais o erário.

Em relação às multas aplicadas ao Recorrente, acompanho a Consultoria para manter a sanção aplicada, concernente à irregularidade relacionada à nomeação de pessoal para cargo comissionado, mas com atribuições eminentemente técnicas e sem identificação hierárquica específica, pois se tratou de contratação de contador para cargo em comissão.

Anoto que tal situação não se coaduna aos termos do recente Prejulgado n. 1939, editado por este Tribunal acerca da matéria, conforme assinalou o Ministério Público.

Concernente à multa em face da não-retenção em folha de pagamento e conseqüente não-recolhimento de valores devidos à Previdência Social, acolho o entendimento do órgão consultivo para cancelar a multa aplicada e afasto a argumentação do Parquet para alterar a redação da irregularidade, a fim de punir o gestor por infração diversa (não-contabilização dos valores), por caracterizar reformatio in pejus, vedada em sede recursal.

 

2.   PROPOSTA DE DECISÃO

 

CONSIDERANDO o que mais dos autos consta, submeto à apreciação deste Tribunal a seguinte proposta de decisão:

 

6.1. Conhecer do Recurso de Reconsideração, nos termos do art. 77 da Lei Complementar n. 202/2000, interposto contra o Acórdão n. 1733/2005 exarado na Sessão Ordinária de 29/08/2005, nos autos do Processo n. TCE-02/06795050 e, no mérito, dar-lhe provimento parcial, para:

 

6.1.1. cancelar o débito constante do item 6.1 da decisão recorrida;

 

6.1.2. cancelar a multa constante do item 6.2.2 da decisão recorrida.

 

6.1.3. conferir nova redação à decisão recorrida, nos seguintes moldes:

 

6.1. Preliminarmente, com fulcro nos arts. 149 a 152 da Resolução n. TC-06/2001, negar cumprimento aos arts. 177 a 179 da Lei Municipal n. 1.742/1990 e o art. 14 da Lei Municipal n. 1.981/1993, por instituir gratificações cumulativas aos servidores municipais, sob o mesmo fundamento e em efeito “cascata”, em afronta ao disposto no art. 37, inciso XIV, da Constituição Federal.

 

6.2. Representar ao Procurador-Geral de Justiça, nos termos do art. 153 do Regimento Interno deste Tribunal, para a adoção das providências que entender pertinentes.

 

6.3.  Julgar irregulares, sem imputação de débito, na forma do art. 18, III, alínea “b”, c/c o art. 21, parágrafo único, da Lei Complementar n. 202/2000, as contas pertinentes à presente Tomada de Contas Especial, que trata de irregularidades acerca de irregularidades constatadas quando da auditoria ordinária realizada na Câmara Municipal de Campos Novos, envolvendo a avaliação dos mecanismos de controle interno e a fiscalização financeira e orçamentária, referentes ao exercício de 1998.

 

6.4. Aplicar ao Sr. Rui Jorge Thomazoni – Presidente da Câmara de Vereadores em 1998, CPF n. 076.421.649-04, multa prevista no art. 69 da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 108, parágrafo único, do Regimento Interno, no valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da nomeação de pessoal para cargos comissionados cujas atribuições a serem desempenhadas pressupõem trabalho eminentemente técnico e/ou sem identificação hierárquica específica, caracterizando burla ao concurso público, previsto na Constituição Federal, art. 37, II e V (item 1.1 do Relatório DMU), fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovar ao Tribunal o recolhimento da multa ao Tesouro do Estado, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000.”

 

6.2. Recomendar ao Sr. Vilibaldo Erich Schmid, Prefeito Municipal de Campos Novos, que adote providências junto ao Poder Legislativo Municipal, com vistas a adequar os arts. 177 a 179 da Lei Municipal n. 1.742/1990 e o art. 14 da Lei Municipal n. 1.981/1993 ao preceituado no art. 37, inciso XIV, da Constituição Federal.

6.3. Determinar ao Sr. Maurílio Castro Campagnoni, Presidente da Câmara Municipal de Campos Novos que cesse o pagamento cumulativo das vantagens sob o mesmo fundamento, bem como evite novas concessões, por afrontarem o art. 37, inciso XIV, da Constituição Federal, configurando dano ao erário.

 

6.4. Alertar a Câmara Municipal de Campos Novos, na pessoa do Sr. Maurílio Castro Campagnoni, acima qualificado, que o não-cumprimento do item 6.3 desta deliberação implicará a cominação das sanções previstas no art. 70, VI e § 1º, da Lei Complementar (estadual) n. 202/00, conforme o caso, e o julgamento irregular das contas, na hipótese de reincidência no descumprimento de determinação, nos termos do art. 18, § 1º, do mesmo diploma legal.

 

6.5. Determinar à Secretaria Geral - SEG, deste Tribunal, que, após o trânsito em julgado, comunique à Diretoria Geral de Controle Externo - DGCE, para fins de registro no banco de dados.

 

6.6. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Parecer COG n. 710/06 ao Sr. Vilibaldo Erich Schmid, Prefeito do Município de Campos Novos, ao Sr. Maurílio Castro Campagnoni, Presidente da Câmara Municipal de Campos Novos, ao Sr. Rui Jorge Thomazoni, ex-Presidente da citada Casa Legislativa, e à Sra. Ana Carla Wolff Lopes, responsável pelo Controle Interno do Poder Legislativo Municipal.

 

              Gabinete do Conselheiro, em 13 de abril de 2009.

 

 

WILSON ROGÉRIO  WAN-DALL
Conselheiro Relator


[1] Fls. 17/40 dos autos n. REC-05/04111019.

[2] Fls. 41/54 dos autos n. REC-05/04111019.