Processo nº LRF 05/04182544
Unidade Gestora Prefeitura Municipal de São Bento do Sul
Responsável Sílvio Dreveck - Prefeito Municipal à época
Interessado Fernando Mallon - Prefeito Municipal
Assunto Análise dos dados do Relatório de Gestão Fiscal referente ao 1º, 2º e 3º quadrimestres de 2004, dos Relatórios Resumidos de Execução Orçamentária relativos aos 1º, 2º, 3º, 4º, 5º e 6º bimestres de 2004 e de outras informações, para cumprimento da LRF
Relatório nº 10/2007

1 - Relatório

Tratam os presentes autos de procedimento de verificação do cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, com base nas informações prestadas por meio de sistema eletrônico pela Prefeitura Municipal de São Bento do Sul.

Os dados relativos ao Relatório de Gestão Fiscal do 1º quadrimestre de 2004, foram analisados pela Diretoria de Controle dos Municípios - DMU, que exarou o Relatório LRF nº 2165/05, às fls. 03 a 12 concluindo por apontar a seguinte irregularidade:

"1.1 - Ausência de previsão da LDO da Meta Fiscal de Resultado Nominal até o 2º bimestre de 2004, em desacordo com a L.C. Nº 101/2000, art. 4º, §1º e art. 9, sujeitando à multa prevista na Lei nº 10.028/2000, art. 5º, inciso II (item 2.3.2)".

Por conseqüência, os Relatórios relativos aos 2º e 3º quadrimestres, Relatórios LRF nºs 2166/051 e 2167/052, respectivamente, apontaram a mesma irregularidade, tendo este último constatado também o seguinte:

"1. Meta Fiscal de resultado primário prevista na LDO até o 6º bimestre de 2004 em conformidade com a L.C. nº 101/2000, art. 4º, §1º e art. 9º, não realizada (item 2.3.5)".

Em função disso este Relator determinou a realização de audiência ao interessado, a qual foi respondida às fls. 29 a 33 aduzindo em síntese:

1. Que cumpriu o art. 4º, §1º, da L.C. Nº 101/2000 em quase a sua totalidade, faltando apenas estabelecer as Metas Fiscais relativas ao Resultado Nominal;

2. Que tal fato não causou nenhum dano ao erário, uma vez que o resultado nominal, apesar de não constar da LDO, teria sido acompanhado e levado em consideração pela Administração municipal;

3. Que nas audiências públicas determinadas pelo art. 9º, §4º da LRF o resultado nominal foi debatido, o que evidenciaria a intenção do Prefeito em cumprir integralmente os preceitos da citada Lei;

4. Que apesar de ter havido omissão na previsão das metas fiscais de resultado nominal, no momento da execução estas foram cumpridas;

5. Que os resultados financeiros e orçamentários do ano de 2004 resultaram em superávits;

6. Que a ausência de previsão das metas fiscais de resultado nominal foi um equívoco do departamento que elaborou a LDO.

A DMU emitiu então o Relatório nº 1.931/2006 no qual concluiu por sugerir a aplicação da multa prevista na Lei nº 10.028/2000 de 30% (trinta por cento) dos vencimentos anuais do Responsável face a proposição da Lei de Diretrizes Orçamentárias sem as metas fiscais de resultado nominal, bem como ressalvar o não atingimento da meta fiscal de resultado primário prevista na LDO.

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas manifestou-se no sentido de acompanhar o entendimento exarado pelo Órgão de Controle3.

2 - Voto

É sabido que os gestores públicos brasileiros encontram enorme dificuldade em cumprir os preceitos da Lei Complementar nº 101/2000 - LRF - em sua total amplitude. Entre os críticos alega-se que trata-se de uma lei draconiana, que "amarra" as mãos dos administradores públicos por seu excesso de rigor.

Em que pesem as críticas, a LRF foi um avanço necessário no controle externo brasileiro, e seu rigorismo, proposital diante da cena política que nos encontrávamos à época.

A Lei nº 10.028 de 19 de outubro de 2000, chamada de "nova Lei dos Crimes contra as Finanças Públicas"4, ou "Lei de Crimes de Responsabilidade Fiscal", foi criada para ser o instrumento sancionatório da Lei de Responsabilidade Fiscal, estimulando desta forma os jurisdicionados pela Lei Complementar nº 101/2000, a cumprirem-na.

Além de criar sanções administrativas para infrações à L.R.F., a referida lei criou também novos tipos penais, inclusive, prevendo pena de detenção de até 4 (quatro) anos para gestores que descumprissem determinadas regras lá estabelecidas. O que, no entender deste Relator, é criticável, na medida de que o que deve se buscar, mais do que o apenamento do Responsável, é a restituição aos cofres públicos dos valores mal aplicados, ou aplicados de maneria criminosa. A moderna tendência dos ordenamentos jurídicos mundiais é reservar a cadeia somente para quem revela periculosidade. Quanto mais em nosso país, em que poucos acabam efetivamente cumprindo a pena a qual são condenados, não haveria nem a aplicação da pena de reclusão, muito menos o ressarcimento ao erário.

Como disse, as penas de reclusão previstas pela Lei 10.028 são mais um estímulo aos administradores a cumprirem a lei do que um mecanismo efetivo de controle externo, funcionando como uma verdadeira espada de Dâmocles sobre as cabeças de seus jurisdicionados.

Mas ao Tribunal de Contas importa apenas as sanções administrativas impostas pela Lei 10.028/00 em seu art. 5º, a qual especificamente deixou a cargo dos Tribunais de Contas à sua aplicação.

O art. 5º da Lei nº 10.028 instituiu:

A primeira crítica, a meu ver, está no próprio caput do artigo 5º da Lei 10.028/2000, o qual diz "constitui infração administrativa...", note-se que o legislador redigiu no singular "infração administrativa", tendo elencado uma série de diferentes infrações (incs. I a IV). Qual seria a "mens legis" no caso? Será que cada uma delas constitui infração independente? Ou será que para a aplicação da multa integral do §1º necessita-se da execução conjunta de todas as ações previstas nos incisos I a IV?

A segunda crítica ao artigo diz respeito a não gradação da multa cominada. Ao redigir, em seu § 1º, que "A infração prevista neste artigo é punida com multa de trinta por cento dos vencimentos anuais do agente que lhe der causa", o legislador tornou a multa estanque, rígida, o que, em termos de técnica legislativa é muito perigoso. Melhor seria se o legislador da citada Lei Federal estabelecesse multa de ATÉ 30% dos vencimentos anuais dos responsáveis, isto porque, dependendo da gravidade da infração, a aplicação do total da multa daquele dispositivo poderá ser excessivamente gravosa ao gestor, pois não estabelece qualquer gradação. E afirmo isso citando um exemplo: na hipótese do inciso I que diz "I – deixar de divulgar ou de enviar ao Poder Legislativo e ao Tribunal de Contas o relatório de gestão fiscal, nos prazos e condições estabelecidos em lei", ou seja, se um gestor atrasar em um dia o envio do relatório de gestão fiscal ao Tribunal de Contas, pelo art. 5º da Lei nº 10.028/2000, a multa seria a mesma daquela aplicada ao gestor que tivesse atrasado o envio em centenas de dias. Onde estaria aí o princípio da PROPORCIONALIDADE?

Lembrando que dentre as funções atribuídas aos Tribunais de Contas pela Constituição Federal encontra-se a do art. 71, inc. VIII, segundo o qual comanda aos mesmos "aplicar aos responsáveis, em caso de ilegalidade de despesa ou irregularidade de contas, as sanções previstas em lei, que estabelecerá, entre outras cominações, multa proporcional ao dano causado ao erário".

Sobre o assunto, extraio de artigo dos juristas Carlos Miola e Geraldo Costa da Camino, intitulado "Infrações Administrativas à Legislação Fiscal":

O douto Procurador do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, Carlos Humberto Prola Júnior, analisou com muita propriedade caso semelhante ocorrido no município de Macieira:

      E aduz o eminente Procurador:

          "Nesse sentido, quando se compara o quantum da penalidade por infração de qualquer dos incisos do art. 5º da Lei 10.028/2000 com as multas previstas na Lei Orgânica e demais normas regulamentares do Tribunal de Contas, identifica-se uma grande e injustificada desproporcionalidade.
          Por exemplo, para o fato extremamente grave de burla ao concurso público, com violação de importante norma de estatura constitucional, têm sido aplicadas multas de R$ 400,00 (Processos TCE 04/01382320, APE-04/05921381, PDI 01/05256960). Por outro lado, nestes autos, em que teria sido proposta lei de diretrizes orçamentárias sem o estabelecimento de metas fiscais, sugere-se a aplicação de multa de R$ 13.139,04, correspondente a 30% da remuneração anual do responsável. A desproporção é gritante, e a impropriedade da solução proposta pelo órgão técnico parece clara.

      A proporcionalidade a que me refiro, não é apenas em relação as demais multas aplicadas pelo Tribunal de Contas, a qual por certo estaria configurada, haja vista que muitas das multas aplicadas por esta Casa não ultrapassam a quantia de R$ 400,00 (quatrocentos reais), mas sim, em relação à gravidade da irregularidade configurada.

      No caso em tela, a multa de 30% dos vencimentos anuais do Responsável, se fosse aplicada, seria da monta de R$ 31.711,85 (trinta e um mil, setecentos e onze reais e oitenta e cinco centavos), o que é absolutamente desproporcional, no meu entender, a gravidade da irregularidade cometida pelo mesmo. Uma vez que, irregularidades muito mais nocivas ao erário público são objeto de aplicação de multas bem inferiores a esta da Lei 10.028, pelo Tribunal de Contas.

      Por esta razão, em atenção aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, deixo de aplicar a multa prevista no art. 5º da Lei nº 10.028/2000.

      Considerando que não houve dano ao erário pela ausência de publicação na LDO de São Bento do Sul para o ano de 2004 das metas fiscais de resultado nominal;

      Considerando que o objetivo maior da Lei de Responsabilidade Fiscal é o "equilíbrio fiscal", o que foi plenamente observado pela Administração Municipal de São Bento do Sul, haja vista que, no ano em tela, 2004, as contas daquele município foram aprovadas por este Relator9, tendo havido ocorrência de superávit e o cumprimento de todos os limites máximos e mínimos impostos pela Constituição Federal;

      Considerando que o Responsável, no caso, deixou de publicar com relação ao anexo de metas fiscais constante de sua Lei de Diretrizes Orçamentárias apenas aquelas referentes ao Resultado nominal, publicando junto a sua LDO, em anexo, as demais metas fiscais exigidas pela Lei (de Receita, Despesas, e de Resultado Primário);

      Considerando que este Tribunal já se manifestou pela não aplicação da multa prevista no art. 5º, inc. II, da Lei nº 10.028, de 19.10.00, no julgamento dos Processos LRF nº 05/0418459810, da Prefeitura Municipal de Jaguaruna, e LRF 06/00197948, da Prefeitura Municipal de Macieira, nos quais não houve a publicação na Lei de Diretrizes Orçamentárias das Unidades de nenhuma das metas fiscais exigidas pela lei (resultado primário, resultado nominal, receita e despesas), proponho ao egrégio plenário o seguinte voto:

      2.1 Conhecer do Relatório de Instrução nº DMU 1.931/2006 que trata da análise dos dados dos Relatórios de Gestão Fiscal pertinente ao 1º, 2º e 3º quadrimestres de 2004, encaminhado a esta Corte de Contas, por meio documental, pela Prefeitura Municipal de São Bento do Sul, em atendimento à Instrução Normativa nº 002/2001, deste Tribunal.

      2.2 Ressalvar que conforme dispõe a Resolução TC 06/2001, em seu artigo 27, §5º, os pontos de controle a seguir especificados foram juntados às Contas Anuais respectivas e considerados na emissão do Parecer Prévio:

      2.2.1 Meta Fiscal de Resultado Primário prevista na LDO não atingida;

      2.3 Ressalvar que os percentuais relacionados à Saúde e ao Ensino foram apurados na análise das Contas Anuais do exercício de 2004, com emissão de Parecer Prévio.

      2.4 Dar ciência desta Decisão, do Relatório e Voto do Relator que a fundamentam, bem como do Relatório de Instrução DMU nº 1.931/2006 ao Sr. Sílvio Dreveck, ex-Prefeito Municipal de São Bento do Sul e à Prefeitura Municipal de São Bento do Sul.

      Florianópolis, 1º de março de 2007.

      Conselheiro Salomão Ribas Junior

      Relator


      1 Fls. 08 a 12.

      2 Fls. 13 a 19.

      3 Parecer nº MPTC nº 6.361/2006, fls. 56 e 57.

      4 A "antiga" Lei de Crimes de Responsabilidade era a Lei n° 1.079, de 10 de abril de 1950.

      5 Revista Interesse Público nº 11 e Informativo da Associação dos MPE's junto aos TC's de 01 de julho de 2001, In http://www.tce.rs.gov.br/MPE/Artigos/artigo5.php.

      6 GOMES, Luis Flávio. Os Princípios Constitucionais Reitores do Direito Penal e da Política Criminal. Material de leitura da disciplina Princípios Constitucionais Penais e Teoria Constitucionalista do Delito, do Curso de Pós-Graduação em Ciências Criminais – LFG/UVB/UNAMA, 2005. p. 05.

      7 Parecer MPTC nº 5.011/2006, Processo LRF 06/00197948, Prefeitura Municipal de Macieira.

      8 Parecer MPTC nº 5.011/2006, Processo LRF 06/00197948, Prefeitura Municipal de Macieira.

      9 Processo PCP nº 05/03904490.

      10 Sessão plenária do dia 07.02.07, Acórdão nº 057/2007, Relator Conselheiro Luiz Carlos Herbst e Processos LRF 06/00197948 da Prefeitura Municipal de Macieira e LRF 04/03855314 da Prefeitura Municipal de Taió, Relator Conselheiro Cézar Filomeno Fontes.