Processo nº ARC-05/04217941
Unidade Gestora Secretaria de Estado da Informação atual Secretaria de Comunicação
Interessado Derly Massaud de Anunciação
Assunto Auditoria in loco de registros contábeis e execução orçamentária
Voto nº GCF-964/2006

1. RELATÓRIO

Tratam os Autos nº ARC-05/04217941 de Auditoria in loco de Registros Contábeis e Execução Orçamentária empreendida na Secretaria de Estado da Informação pela Diretoria de Controle da Administração (DCE), referente ao período de janeiro a dezembro de 2004.

Efetivada a fiscalização, a DCE elaborou o Relatório de Auditoria nº 28/2006 (fls. 64-72 dos autos), sugerindo a Audiência do Sr. Derly Massaud de Anunciação para, nos termos regimentais, apresentar suas razões defensivas em razão das irregularidades apuradas.

Em resposta ao ofício encaminhado, o Sr. Derly protocolizou seus argumentos defensivos (fls. 75-98 dos autos), os quais foram examinados pela Instrução - Relatório nº 076/2006 (fls. 101-113 dos autos) - que concluiu, ao final, por sugerir a este Relator a conversão do processo em Tomada de Contas Especial, determinar a Citação do responsável, haja vista irregularidade passível de imputação de débito.

O Ministério Público junto ao Tribunal (Parecer nº MPTC-5108/2006) acompanhou o entendimento esboçado pela Instrução.

Em seguida vieram-me os autos, na forma regimental, para Voto e respectiva proposta de Decisão.

É o breve relatório.

2. DISCUSSÃO

Com fundamento no art. 224 da Resolução nº TC-06/2001, e, por conseguinte, nos Relatórios do Corpo Instrutivo e no Parecer do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, e após compulsar atentamente os autos, passo a tecer algumas questões fáticas e jurídicas que entendo oportunas para fundamentar o Voto por mim proferido.

Com efeito, consta na conclusão do Relatório de Instrução nº 076/2006, à fl. 112, a sugestão do Corpo Técnico de converter o presente processo em Tomada de Contas Especial, determinar a Citação do responsável, em razão do pagamento de transportes aos servidores, conforme nota de empenho nº 34/000, de 09/01/04; 4408/000, de 27/02/04 e 6.234/000, de 31/03/04, contrariando os princípios constitucionais da moralidade e impessoalidade administrativa e o exposto no art. 1º e parágrafo único do art. 3º da Lei nº 7.975/1990.

No seu exame, a Instrução arguiu que o art. 1º da Lei nº 7975/90 ao dispor sobre o vale-transporte dos servidores públicos e delinear que "os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário e Tribunal de Contas anteciparão aos servidores públicos para utilização efetiva em despesas de deslocamento residência - trabalho e vice-versa, através do sistema de transporte coletivo público, urbano e intermunicipal, excluídos os serviços seletivos e os especiais", impossibilitou o administrador de utilizar outros meios para atender o transporte dos seus servidores. Argumentou, ainda, que:

[...] "não foi comprovado também o recolhimento do valor correspondente a 6% do vencimento dos servidores beneficiados pelo transporte nos termos do art. 3º, parágrafo único da mesma Lei e com a alteração dada pela Lei nº 8425/91, que dispõe:

Art. 3º - A concessão do benefício ora instituído implica a aquisição dos Vales-Transporte necessários aos deslocamentos do servidor público no percurso residência-trabalho e vice-versa, no serviço de transporte que melhor se adequar.

Parágrafo único - O Poder Público participará dos gastos de deslocamento do servidor público, com a ajuda de custo equivalente à parcela que exceder a 6% (seis por cento) da sua remuneração.

Cabe ressaltar que o gabinete do Governador do Estado formulou Consulta nº 04/01964370 a este Tribunal, acerca da possibilidade da contratação de serviços de transporte pela Administração Direta para atender à demanda do funcionalismo.

Com referência à consulta, o Tribunal Pleno, proferiu a Decisão nº 1.334, consubstanciada no Prejulgado nº 1550, em Sessão de 14/06/04, nos seguintes termos:

A concessão de transporte especial para a locomoção de servidores da Administração Direta até o local de trabalho e vice-versa ofende os princípios constitucionais da moralidade e impessoalidade administrativa e a Lei estadual nº 7.975/90, privilegiando apenas determinada classe de servidores públicos.

Ao considerar a Decisão supramencionada , constata-se, portanto, irregular o procedimento adotado pela Secretaria, referente ao pagamento de transporte especial para locomoção de servidores, pois fere os princípios constitucionais da moralidade e impessoalidade administrativa e a Lei Estadual nº 7975/90, por privilegiar determinada classe de servidores.

Em resposta à Audiência, o Sr. Derly alegou que o Decreto nº 3853/2002, vigente à época e posteriormente revogado pelo de nº 1345/2004, ao classificar a despesa pública do Estado de Santa Catarina, autorizou a contratação de ônibus para o transporte de servidores, especificando-a, inclusive, como elemento de despesa, dispensando, assim, a necessidade de uma legislação específica.

Outrossim, alegou que a despesa com transporte não está subordinada aos ditames do art. 118 da Constituição Estadual, pois não se trata de despesa com pessoal. Em síntese, eis os argumentos apresentados:

1) A despesa com contratação de ônibus para transporte de funcionários não pode ser confundida com despesa de pessoal, assim como não pode, também, ser confundida com despesa de vale-transporte. Ou seja, a discricionariedade na escolha, pelo ordenador, não pode ser contestada, posto que a despesa em questão não fere a Constituição Federal, assim como também não fere a Lei Estadual nº 7975, de 28 de junho de 1990, por não ser aplicável a esse tipo de despesa.

2) Salienta-se, ainda, que, o fato de o TRANSPORTE DE SERVIDORES estar previsto no Decreto nº 1.345, de 16 de janeiro de 2004, que aprova a Classificação da Despesa Pública para o Estado de Santa Catarina, demonstra cabalmente que esse tipo de despesa é legal e, portanto, permitida.

3) O fato de haver uma lei específica que trata de vale-transporte não elide a possibilidade de a Administração fazer a contratação questionada, em face da discricionariedade apontada, até porque ela se mostrou mais eficaz, como já foi dito anteriormente.

Com efeito, considerando a redação do art. 1º da Lei nº 7975/90 concordo com a Instrução quanto à impossibilidade do Administrador Público efetuar a contratação de ônibus para transporte de seus servidores, pois a expressão "serviços especiais", contida na parte final do supracitado dispositivo, não está relacionada à concessão do vale-transporte. Em outras palavras, à luz da Lei Municipal nº 34/98, que dispõe sobre os sistemas de transporte coletivo de passageiros no Município de Florianópolis, o art. 4º, §2º, é claro ao estabelecer que o fretamento, isto é, a contratação de ônibus pelo poder público para transporte de servidores, é modalidade de serviço especial. Por este motivo, não parece lógico que a lei tenha relacionado a concessão de vale-transporte com este contrato. Entendo que a interpretação mais coerente é a que veda o Poder Público de prestar o transporte por meio de fretamento, já que lhe é permitido conceder o vale-transporte. Para melhor corroborar este raciocínio, transcrevo abaixo o dispositivo da lei municipal supracitado:

Art. 4º Os serviços classificam-se em:

[...]

II - especial;

[...] §2º - especial é o serviço remunerado através de contrato entre o operador e o contratante, classificando-se em:

a) Fretamento: serviço de locação de veículos para o transporte de empregados ou clientes de empresas públicas ou privadas, com ponto de partida e chegada delineados, sem paradas intermediárias para embarque ou desembarque de passageiros, observada a regulamentação estabelecida pelo Poder Executivo;

b) Transporte escolar: serviço de transporte exclusivo para o atendimento de estudantes, com ligação residência-escola-residência, regulamentado pelo Poder Executivo;

c) Turismo: serviço de transporte exclusivo para o atendimento de turistas, com ponto de partida e chegada delineados, sem paradas intermediárias para o embarque ou desembarque de passageiros, observando-se o prescrito nas leis Municipais nº 2.988, de 28 de julho de 1988 e nº 2.990, de 28 de julho de 1988, a legislação federal e a regulamentação estabelecida pelo Poder Executivo;

Portanto, a interpretação exposta pelo Sr. Derly de que "a exclusão dos serviços seletivos e dos especiais, grifada pelos analistas no final da transcrição do art. 1º da Lei nº 7.975/90, diz respeito apenas à concessão do vale-transporte, não se aplicando ao caso em questão (contratação de ônibus). Ou seja, nesta lei que trata exclusivamente de vale-transporte, a exclusão de transportes seletivos e especiais refere-se, tão-somente, por exemplo, aos hoje chamados de 'Amarelinhos', utilizados no transporte urbano de Florianópolis, cujos preços são mais elevados do que os de linha normal", não me parece ser a mais acertada. Tal hipótese levaria ao absurdo do poder público conceder o vale e ao mesmo tempo custear o fretamento, já que se trata de "serviço especial". E, mesmo que se pensasse na possibilidade do fretamento ocorrer pelos servidores públicos, via associação, nenhuma razão teria a norma de vedá-lo, pois cuidaria-se de um contrato firmado entre particulares sem qualquer participação do poder público. Neste caso, se os custos fossem maiores, correriam por conta e risco dos servidores contratantes, restando à Administração apenas conceder o vale-transporte nos termos do preço da tarifa vigente do transporte coletivo público convencional, urbano ou intermunicipal, conforme prescreve o art. 4º da Lei nº 7975/90, verbis:

Art. 4º A empresa operadora do sistema de transporte coletivo público fica obrigada a emitir e a comercializar o Vale-Transporte, ao preço da tarifa vigente, colocando-o à disposição do Poder Público e assumindo os custos dessa obrigação.

Quanto à proposta de conversão em Tomada de Contas Especial, para Citação do responsável, entendo que seja muito mais adequada a cominação de multa, sem conversão, haja vista que mesmo ao "arrepio" da lei o serviço de transporte foi realizado, beneficiando diretamente os servidores da Administração. Assim sendo, inexiste dano ao erário para fins de Tomada de Contas Especial, como exige a Lei Complementar nº 202/00. Para corroborar este posicionamento valho-me da lição de Celso Antônio Bandeira de Mello acerca do enriquecimento sem causa em sede administrativa:

Nesta linha, uma futura responsabilização do Sr. Derly implicaria no enriquecimento sem causa à medida que o Poder Público seria ressarcido de um serviço que lhe foi efetivamente prestado e que, a princípio, refletiu o preço de mercado, já que não houve qualquer questionamento quanto a despesa ser antieconômica ou superfaturada.

Igualmente esclareço que a menção ao Prejulgado nº 1550, cujo entendimento consolidou-se apenas em 14 de junho de 2004, data posterior à emissão das notas de empenho, não servirá como fundamento legal para a penalidade, nem influirá no quantum da multa a ser imputada ao Sr. Derly.

No que tange à Informação nº 607/2004 (fls. 97-98 dos autos), não a considero uma causa excludente da culpabilidade do Sr. Derly, haja vista que por imperativo legal (Decreto nº 349/2003) foi solicitada autorização para realização da licitação, não se adentrando, propriamente, no mérito do objeto a ser licitado, se legal ou ilegal.

Por fim, quanto ao valor da multa, considerando que a despesa foi de R$ 13.880,00 (treze mil e oitocentos e oitenta reais), e o valor arbitrado no Processo nº TCE-04/00881209, fixo em R$ 600,00 (seiscentos reais).

3. PROPOSTA DE DECISÃO

Ante o exposto e com base no exame feito pelo Corpo Instrutivo, no parecer do Ministério Público junto ao Tribunal e nas razões aventadas pelo responsável, VOTO no sentido de que o Tribunal adote a decisão que ora submeto à sua apreciação:

6.1. Conhecer do Relatório da Auditoria realizada na Secretaria de Estado da Informação, com abrangência sobre registros contábeis e execução orçamentária relativos ao período de janeiro a dezembro de 2004.

6.2. Aplicar ao Sr. Derly Massaud de Anunciação, CPF n. 130.645.500-63, multa prevista no art. 70, II, da Lei Complementar nº 202/00, no valor de R$ 600,00 (seiscentos reais), referente a despesas com contratação de ônibus especial para o transporte de servidores da Secretaria de Estado da Informação, sem embasamento legal, contrariando a Lei nº 7.975/90 e o princípios da legalidade previsto no art. 37 da Constituição Federal, conforme apontado no Relatório DCE nº 076/2006, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar, perante este Tribunal, o recolhimento do valor do débito aos cofres do Estado, atualizado monetariamente e acrescido dos juros legais (arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), calculados a partir da data da ocorrência do fato gerador do débito, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, II, da Lei Complementar n. 202/2000).