Processo:

TCE 06/00242595

Unidade Gestora:

Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina

Responsável:

Sr. Aldo Lauriano da Costa (Gestor Falecido)

Assunto:

Tomada de Contas Especial para apuração da prestação de contas dos recursos repassados a título de subvenção social ao Conselho Comunitário da Vargem do Bom Jesus, no valor de R$ 500,00.

Relatório e Voto:

GAC/HJN -350/2011

 

                                                                                                                               

 

 

1. INTRODUÇÃO

 

Trata-se de Tomada de Contas Especial instaurada pela Assembleia Legislativa, acerca de recursos antecipados repassados ao Conselho Comunitário da Vargem do Bom Jesus, no valor de R$ 500,00, pertinente a Nota de Empenho n. 2335, em atendimento a Decisão n. 2135/2005, exarada nos autos do processo SPC 04/05851588, deste Tribunal de Contas.

Em atendimento a Decisão n. 2135/2005, o Procurador de Finanças da ALESC, à época, instaurou o Processo de Tomada de Contas n. 034-02/2005 (fls. 07-24).

A Tomada de Contas foi encaminhada a Diretoria de Controle da Administração Estadual (DCE). Esta emitiu o Relatório n. 176/2006 (fls. 25-27), sugerindo a citação do responsável.

O Responsável não se manifestou.

A DCE emitiu o Relatório n. 329/2006 (fls. 31-34) sugerindo diligência junto ao Conselho Comunitário da Vargem do Bom Jesus.

Não houve manifestação.

Mediante Relatório 231/2008 (fls. 38-42) a DCE sugeriu o arquivamento dos autos, haja vista o falecimento do responsável, a dificuldade de localizar a instituição recebedora dos recursos, e ainda em face da exiguidade do débito.

O Ministério Público junto ao Tribunal acompanhou o entendimento da Instrução (Parecer n. 2092/2009 de fls. 43-44).

É o Relatório.

 

 

2. DISCUSSÃO

 

Os autos tratam de solicitação de prestação de contas de recursos no montante de R$ 500,00, repassados ao Conselho Comunitário da Vargem do Bom Jesus.

 

Os posicionamentos da Diretoria Técnica e do Órgão Ministerial sugerem que as contas sejam arquivadas, contudo, sem o cancelamento do débito, nos termos do art. 24 da Lei Complementar n. 202/00.

 

O Responsável Sr. Aldo Lauriano da Costa faleceu em 16/09/2002 (fl. 47), ou seja, anteriormente à efetivação da citação por esta Corte de Contas, ocorrida em 14/06/2006.

 

Saliento que ao proceder ao exame de situações análogas este Tribunal vem determinando o arquivamento dos autos.

 

Destaco trechos do Voto proferido pelo Conselheiro Salomão Ribas Júnior, nos autos do processo PCA 02/03244567 (Relatório n. 891/2008):

 

DO GESTOR FALECIDO

 

De plano, afirmo que há duas correntes que discutem acerca dos efeitos do falecimento de responsável em processos de contas. Uma delas é a defendida pelo Conselheiro do TCDF Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, segundo o qual o falecimento do responsável:

 

1) não isenta o interesse dos sucessores de promover a defesa de mérito;

2) isenta os sucessores do dever de pagar multa, em face do caráter personalíssimo de que este se reveste;

3) não inibe o dever de recompor o erário quando já comprovada a irregularidade, até o limite da herança;

4) deve ser documentado, com a juntada, à defesa, da respectiva certidão de óbito;

5) não podem os sucessores proscratinar a abertura do inventário para evitar o pagamento;

6) se anterior à citação, poderá implicar em arquivamento do processo, por ausência do pressuposto de desenvolvimento válido e regular[1]. (grifo do Relator)

 

Acrescenta ainda o autor que:

 

O tema, na forma como hoje se apresenta na jurisprudência, ainda não encontrou seguro equacionamento. Aliás, pouco servem as noções de direito civil e penal, nesse ponto, à esfera do controle, mas é possível assentar que:

I - em relação às penalidades, é regra que as mesmas não passam da pessoa do condenado;

II - em relação ao dever de reparar o dano, o mesmo estende-se aos herdeiros e sucessores apenas até o limite das forças da herança, se:

- o falecimento ocorre após garantida a ampla defesa e o contraditório;

- houve apropriação indébita.[2]

 

A outra corrente, defendida pelo Auditor do TCU Augusto Sherman Cavalcanti[3], afirma que:

 

[...] a defesa e o contraditório, em tese, não ficam prejudicados com a morte do gestor e o processo pode prosseguir sem obstáculos, uma vez que os sucessores podem ser chamados a integrar o pólo passivo da relação processual, tendo em vista que a eles se estende a responsabilidade de reparar o dano, na medida do patrimônio recebido.

 

No entanto, o mesmo autor admite que:

 

[...] em situações específicas, pode ficar demonstrada a impossibilidade fática de os sucessores se defenderem, inviabilizando o contraditório. Os Tribunais de Contas, nesses casos excepcionais, poderão arquivar o processo, sem julgamento, por falta de pressuposto de desenvolvimento válido. (grifo do Relator)

 

No âmbito desta Corte de Contas, os dois entendimentos já foram utilizados para fundamentar a exclusão ou inclusão de herdeiros em processos de contas, respectivamente, os Processos ns. REC 05/00828768[4] e REC 05/04196766[5].

Como já é do conhecimento deste Plenário, filio-me à tese defendida pelo Conselheiro Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, pelos seguintes motivos.

Primeiro, porque tenho certeza que grande parte das matérias que envolvem os processos de contas dizem respeito a questões peculiares da administração pública, consubstanciadas em atos de gestão praticados pelo administrador público, os quais, nem sempre são passíveis de explicações por outras pessoas além daquela que os praticou. Nesses casos, torna-se fácil perceber que eventual defesa por parte dos herdeiros será meramente formal, pois não haverão de ter condições materiais de justificar a prática de um ato administrativo, que, diga-se, muitas vezes envolto em questões burocráticas, políticas e consuetudinárias.

Nessa perspectiva, entendo que o princípio constitucional do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LV, CF/88) é profundamente mitigado em prol do princípio da extensão da responsabilidade civil aos sucessores (art. 5º, XLV, CF/88); e, diga-se, uma responsabilidade não declarada efetivamente.

Ademais, o art. 5º, XLV, da Constituição Federal aduz que a obrigação de reparar o dano pode, ser, nos termos da lei, estendida aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio.           E ainda, é de se notar que o art. 6º da Lei Orgânica desta Corte de Contas prevê, em seu inciso VI, que:

 

Art. 6º [...]

VI - os herdeiros dos administradores e responsáveis a que se refere este artigo, os quais responderão pelos débitos do falecido perante a Fazenda Pública, até a parte que na herança lhes couber;

 

Diante dos textos legais acima transcritos, sem maior esforço de hermenêutica, quer parecer que tanto a Constituição Federal como a Lei Orgânica desta Corte de Contas, ao preverem a responsabilidade dos herdeiros pelos "danos" ou "débitos" do falecido, estão se referindo a obrigações devidamente constituídas, o que, efetivamente, não é o caso dos presentes autos.

 

Posicionamento idêntico foi adotado por este Egrégio Plenário nos seguintes processos: APE-05/03912085 - Decisão n. 505, de 10/03/2008, publicada no DOE n. 18.334, de 03/04/08 – Rel. Cons. Salomão Ribas Junior; RPJ 03/07189538 – Decisão n. 02528, de 13/08/2008, publicada no DOE n. 74, de 18/08/2008 – Rel. Cons. César Filomeno Fontes; TCE 02/07679860 – Decisão n. 0263/2010, de 17/02/2010, publicada no DOTC-e n. 449, de 03/03/2010 e TCE 05/04207040 – Decisão n. 658, de 11/04/2011, publicada no DOTC-e n.721, de 15/04/2011, estes últimos da relatoria do Conselheiro Júlio Garcia.

 

Assim entendo descabida a condenação do espólio do Responsável, por considerar que a responsabilidade dos herdeiros pelos danos ou débitos do falecido abrange apenas as obrigações devidamente constituídas, após o desenvolvimento válido e regular do processo, o que não é o caso dos presentes autos.

 

3. VOTO

 

Diante do exposto, proponho ao Egrégio Tribunal Pleno a adoção da seguinte deliberação:

 

3.1. Extinguir o presente processo, com fundamento no art. 267, IV, do Código de Processo Civil, ante a ausência de desenvolvimento válido e regular do processo, em virtude de afronta aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, haja vista o falecimento do Responsável antes mesmo de sua notificação pessoal para defesa, no âmbito deste Tribunal, e determinar o seu arquivamento.

3.2. Dar ciência desta Decisão, Relatório e voto do Relator, ao Conselho Comunitário da Vargem do Bom Jesus, à Assembleia Legislativa e à Secretaria de estado da Fazenda.

 

Florianópolis, em 14 de julho de 2011.

 

 

SABRINA NUNES IOCKEN

CONSELHEIRA SUBSTITUTA
(art. 86, caput, da Lei Complementar n. 202/00)

 



[1]FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tribunais de Contas do Brasil. Jurisdição e Competência. 2 ed. Belo Horizonte:Fórum, 2005. p.635/636.

[2]Op. Cit. p. 636.

[3]CAVALCANTI, Augusto Sherman. Aspectos da Competência Julgadora do Tribunais de Contas. Disponível em: http://www.tc.df.gov.br/MpjTcdf/imagens/sherman/sherman.PDF. Acesso em 24/10/07.

[4]Acórdão n. 1081/2006, de 19/04/2006.

[5]Acórdão n. 2425/2006, de 22/11/2006.