ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO

GABINETE DO CONSELHEIRO WILSON ROGÉRIO WAN-DALL

    Processo n°:
CON-06/00304370
UNIDADE GESTORA: Prefeitura Municipal de Mondaí
Interessado: Sr. Valdemar Arnaldo Bornholdt
Assunto: Consulta. Município. Prefeito-Médico. Realização de cirurgias de emergência.
Parecer n°: GC/WRW/2006/766/ES

ADENDO AO PARECER N. GC/WRW/2006/637/ES (fls. 13 a 18)

Cuida-se de consulta formulada pelo Ilmo. Sr. Valdemar Arnaldo Bornhold, Prefeito do Município de Mondaí, indagando acerca da possibilidade de o Prefeito Municipal (médico) realizar cirurgias de emergências, independentemente de horário, sendo que as mesmas não são rotineiras, e o Prefeito receberia apenas os Autos de Internação Hospitalar (AIH) que são pagos pelo Sistema Único de Saúde (SUS)- UNIÃO.

Na conclusão do Parecer n. GC/WRW/2006/637/ES, o Auditor Gerson dos Santos Sicca, Conselheiro Substituto, após examinar as manifestações da Consultoria-Geral (Parecer n. COG-423/06) e da Procuradoria-Geral junto a este Tribunal (Parecer n. 4.988/06), proferiu o voto nos seguintes termos:

6.1. Conhecer da presente Consulta por preencher os requisitos e formalidades preconizados no Regimento Interno deste Tribunal.

6.2. Responder à Consulta nos seguintes termos:

6.2.1. Investido no mandato de Prefeito, deve o servidor afastar-se do cargo, emprego ou função de médico que ocupe, sendo-lhe facultado optar pela sua remuneração, nos termos do inciso II, do art. 38, da Constituição Federal;

6.2.2. Não há qualquer impedimento legal a que o Prefeito, atuando como médico, realize "cirurgias de emergência", desde que em uma relação de direito privado, não recebendo qualquer parcela remuneratória dos cofres públicos.1

Levado a apreciação do Tribunal Pleno, na Sessão de 25/10/06, o presente processo teve o seu julgamento adiado, em função da concessão de vistas ao Exmo. Conselheiro César Filomeno Fontes.

Na Sessão de 1º/11/06, os autos retornaram à pauta de julgamento, sendo discutidos pelos membros do Tribunal Pleno. Todavia, dada a complexidade da matéria, a Presidência desta Corte avocou o processo.

Em 24/11/06, os autos foram remetidos a este Relator, com a juntada da Informação n. APRE-035/06, subscrita pela Assessoria da Presidência, sendo devidamente endossada pelo Exmo. Conselheiro Otávio Gilson dos Santos.

A mencionada Informação complementa o Parecer firmado pelo Auditor Gerson Sicca, abordando os temas a) da possibilidade do exercício da medicina e do mandato político; b) da necessidade de atendimento de pacientes em casos de emergência; e, por fim, c) do recebimento ou não de pagamento pela prestação de serviços médicos pelo Prefeito.

No tocante à compatibilidade do exercício da medicina e do mandato político de prefeito, consignou a Assessoria da Presidência desta Corte que:

[...] O prefeito, no exercício de suas funções, não pode exercer outra função pública (lato sensu, abrangendo cargos, empregos ou funções). Esta é a restrição constitucional.

Outra regra que poderia ser violada com o proceder do prefeito seria a Lei Orgânica do Município. Nota-se que a Lei Orgânica de Mondaí traz algumas restrições para o exercício do cargo de Prefeito. Todavia, nenhuma delas alcança a situação exposta na consulta.

A Lei Orgânica de Mondaí veda que o prefeito, desde a diplomação celebre contratos com a municipalidade. Mas, no caso de realização de cirurgias de emergência, esporádicas, ainda que fossem realizadas em instituição hospitalar pública, mesmo municipal, não caracterizaria ilegalidade.

O risco para o prefeito, seria a perda de mandato, ante a realização de outra atividade profissional. Todavia, os casos de perda de mandato estão definidos na Constituição Federal, no Decreto-Lei n. 201/67 e na Lei Orgânica Municipal.

[...]

Assim, perderá o mandato o prefeito que assumir outro cargo ou função na administração pública direta ou indireta, salvo virtude de concurso público, hipótese em que deverá afastar-se pelo período em que estiver na titularidade do cargo de prefeito (art. 38, CF).

No caso do Decreto-Lei n. 201/67, as hipóteses lá especificadas não contemplam a situação vertida nesta consulta.

[...]

Enfim, nenhuma das hipóteses previstas na Constituição Federal, no Decreto-Lei n. 201/67 ou na Lei Orgânica municipal seriam compatíveis com a situação aventada nesta consulta, de modo a propiciar a perda de mandato. Conclui-se, pois, que não há impedimento legal à realização de cirurgias eventuais, em casos de emergência médica, caso não haja outro profissional, naquele momento, no local.2 Grifo nosso

Ao tratar acerca da questão do atendimento de pacientes, em caso de emergência, a Assessoria da Presidência asseverou que "o elemento emergência médica deve estar presente para legitimar o procedimento", cuidando de apresentar a distinção existente entre as situações de urgência e de emergência médicas:

A urgência médica é a situação que necessite tratamento a curto prazo de tempo, porém sem o caráter de morte iminente. Nesses casos não há o risco de vida para o paciente, nem de agravamento da situação, por isso se tem mais tempo para transportar e atender o enfermo.

Considera-se emergência médica a situação na qual é necessário tomar ações e decisões médicas imediatas, devido à sua importância e gravidade. São quadros que colocam a vida em risco.

[...]

Nota-se que o consulente não faz menção às urgências, mas à situações de "cirgurgias de emergência". Se por emergência se tem as situações em que é necessário atendimento imediato ante o risco iminente de vida ou sofrimento intenso do paciente, é de se considerar como admissível a atuação do médico que esteja no cargo de prefeito, quando é o único profissional para o caso disponível no local.

A vida é o bem que está acima de todos os demais bens e valores. Portanto, não se pode considerar afronta a qualquer norma constitucional a atuação de profissional médico no intuito de preservação da vida, diante de circunstâncias daquele momento, independentemente da função pública que esteja ocupando.

[...]

É do sistema nacional que o chefe do Poder Executivo, nas três esferas, tenha dedicação exclusiva ao cargo. Só situações excepcionais como a aventada nesta consulta permitiria o desenvolvimento de outras atividades profissionais. O que não se admitiria é a prestação de serviços habituais.3 Grifo nosso

Por fim, no que tange à possibilidade de recebimento de pagamento pela prestação de serviços médicos pelo Prefeito Municipal, a Presidência desta Corte, muito bem consignou que:

Outro aspecto diz respeito à remuneração pelos serviços excepcionais e esporádicos prestados pelo prefeito-médico. Aqui, a nosso ver, duas situações devem ser consideradas.

A primeira diz respeito à prestação dos serviços com habitualidade, caracterizando espécie de contratação. Nesta hipótese é evidente que não poderá perceber outros valores do poder público, mesmo no caso de atendimento no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS, que constitui sistema público e pago pelo Município.

Além disso, como exposto, é vedada a acumulação de cargos, empregos e funções, estando o prefeito obrigado a se afastar de cargo ou emprego público quando for servidor. Ademais, a Lei Orgânica do Município não permite que o prefeito celebre contratos com o município, aqui se incluindo os credenciamentos de médicos.

A segunda situação se refere à prestação dos serviços de forma excepcional, mediante chamado para atender emergência médica. Nessa circunstância, não havendo habitualidade e caracterizando serviços realizados em situação de emergência, não se pode exigir que o profissional realize o atendimento gratuito, sem contraprestração pecuniária. Mesmo que o atendimento seja realizado em ambiente hospitalar público, o médico que atende paciente em situação de emergência médica, ainda que ocupando o cargo de prefeito, pode perceber os honorários correspondentes pagos pelo SUS.4 Grifo nosso

Parece, salvo melhor juízo, que o posicionamento firmado pela Presidência deste Tribunal, acerca da possibilidade de o Prefeito-médico receber pagamento pelo Sistema Único de Saúde, desde que não haja habitualidade na prestação do serviço e que o mesmo seja caracterizado como situação de emergência, constitui a melhor solução para a discussão travada no Plenário desta Corte.

Desta feita, após exame das considerações apresentadas pela Presidência deste Tribunal de Contas, as quais acolho por entender adequadas para o presente processo, retifico o VOTO então submetido ao Plenário, nos seguintes moldes:

2 - VOTO

Considerando o mais que dos autos consta, VOTO, no sentido de que o Tribunal Pleno adote a decisão que ora submeto à apreciação:

6.1. Conhecer da presente Consulta por atender os requisitos de legitimidade e admissibilidade previstos no Regimento Interno do Tribunal:

6.2. Responder à Consulta nos seguintes termos:

6.2.1. Investido no mandato de Prefeito, deve o servidor afastar-se do cargo, emprego ou função de médico que ocupe, sendo-lhe facultado optar pela sua remuneração, nos termos do inciso II, do art. 38 da Constituição Federal;

6.2.2. Enquanto estiver no exercício do cargo de prefeito, o profissional da medicina não pode realizar atendimentos médicos no âmbito do Sistema Único de Saúde que caracterizem procedimentos de atendimento eletivo, habitualidade na prestação de serviços ou contratação direta ou indireta com entes gestores do sistema, incluído o método de credenciamento, porquanto estas situações podem caracterizar irregular acumulação remunerada de funções públicas;

6.2.3. Salvo vedação contida na Lei Orgânica do Município, o profissional médico em exercício do cargo de Prefeito não está impedido de realizar procedimento cirúrgico, em casos excepcionais decorrentes de chamamento para atendimento de emergência médica, cuja recusa de atendimento possa caracterizar omissão de socorro, hipótese em que pode perceber os honorários pagos no âmbito do Sistema Único de Saúde pelo procedimento.

6.3. Dar ciência desta Decisão, do Relatório e Voto do Relator que a fundamentam, bem como da Informação n. APRE-035/06, à Prefeitura Municipal de Mondaí.

6.4. Determinar o arquivamento dos autos.

Gabinete do Conselheiro, 30 de novembro de 2006.

WILSON ROGÉRIO WAN-DALL

Conselheiro Relator


1 Fl. 18 dos autos do Processo n. CON-06/00304370.

2 Fls. 24 a 25 dos autos do Processo n. CON-06/00304370.

3 Fls. 27 a 30 dos autos do Processo n. CON-06/00304370.

4 Fls. 31 dos autos do Processo n. CON-06/00304370.