Processo nº CON-06/00314251
Unidade Gestora Câmara de Vereadores de São Francisco do Sul
Interessado Rid Garcia dos Santos, Presidente da Câmara à época
Assunto
      1. Consulta. Questionamentos a respeito da incidência do reajuste concedido aos servidores da Câmara através da Lei Municipal n. 460, de 26/05/2006.
      2. Pareceres da COG e do MPTC pelo conhecimento e resposta da consulta, com posições, em parte, discordantes.
      3. Conhecer da consulta e respondê-la na forma do voto.
Relatório nº
      GCMB/2007/00405

Ementa: Lei Municipal. Reajuste de vencimentos. Abrangência. Incidência sobre vantagem pessoal (estabilidade financeira).

A lei que concede aumento real de vencimentos e especifica sua destinação para os cargos efetivos e comissionados exclui o reajuste de outras funções. Na ausência de lei local que limite à revisão geral anual (art. 37, X, da CF) da parcela incorporada nos vencimentos na forma da lei, a título de vantagem pessoal decorrente do exercício de cargo em comissão ou função gratificada, o reajuste (aumento real) incide sobre referido adicional.

A COG, ao examinar a questão, indica que "o Anexo VII da Lei Municipal n. 303/2004 se refere à função gratificada e não vencimento". Considera que o reajuste foi destinado aos cargos efetivos e comissionados, razão pela qual "não incide sobre o valor da gratificação CV-CAS 01" (fls. 59).

O Ministério Público, acerca deste item, acompanha a COG, considerando que "por falta de previsão legal expressa, não se poderia estender o disposto na Lei Municipal n. 460/2006 a nenhuma outra parcela remuneratória".

Nota-se que a Lei Municipal n. 303, de 27/05/2004, dispõe sobre o Plano de Cargos e Salários dos servidores da Câmara Municipal, cujo art. 3º estipula a codificação - CV-CAS - para as funções de direção, chefia e assistência de níveis inferiores, caracterizando, portanto, que não se trata de cargo (comissionado).

Já o art. 22 da mesma Lei define "os valores de vencimentos e gratificações, estabelecidos nos Anexos VI a VIII" da Lei. Ao se examinar o Anexo VII, constata-se o título: "Tabela de Vencimentos dos Cargos de Chefia e Assistência Subalterna". Função: CV-CAS 01, e a seguir, atribui um valor a título de gratificação.

A despeito da imprecisão técnica que se verifica na redação dos diversos textos normativos, o entendimento não pode ser outro, que não aquele proposto pela COG e pelo Ministério Público, qual seja: o art. 1º da Lei n. 460, de 2006, não abrange o Anexo VII da Lei n. 303, de 27/05/2004, e, portanto, o reajuste de 10% não pode ser concedido aos servidores que exercem Função CV-CAS 01 (Anexo VII).

O segundo item consultado discorre sobre a incidência (ou não) do reajuste concedido sobre a parcela da remuneração correspondente à incorporação do "valor da diferença do cargo comissionado ou da função gratificada" e o valor do vencimento do cargo efetivo, segundo previsão no Estatuto dos Servidores Públicos Municipais.

A Lei Complementar Municipal n. 008, de 30/101/2003, no art. 72, prevê:

Art. 72. Ao servidor que tiver exercido cargo de provimento em comissão, ou função gratificada, por mais de 3 (três) anos, consecutivos ou não, ficará assegurado o direito à percepção de um adicional, para cada período de 12 (doze) meses, equivalente a 1/5 (um quinto) da diferença entre o vencimento padrão do servidor e da remuneração pertinente ao mencionado cargo ou função, a partir do mês subseqüente ao de sua exoneração desse cargo, até o limite de 5/5 (cinco quintos).

A COG em sua apreciação menciona a agregação (antigo instituto que assegurava ao servidores não só perceberem a remuneração como ocupar cargo diverso do efetivo, do qual era desligado), procedendo demonstração de como seriam os vencimentos dos servidores da Câmara nessa hipótese (fls. 59/60), ressaltando ao final que esse instituto (da agregação), por força constitucional, não mais é admitido.

Igualmente, a Procuradora Cibelly Farias distingue o adicional que assegura estabilidade financeira - que constitui vantagem pessoal, do instituto da agregação (fls. 71/72).

Entende-se que esse assunto - agregação - não merece qualquer consideração, haja vista que não é objeto da presente consulta, não é mencionado na legislação municipal, além de não encontrar amparo na Constituição Federal.

A seguir, a COG discorre sobre a estabilidade financeira, instituto hoje adotado, em que "o servidor incorpora o valor da diferença entre o cargo efetivo e o cargo em comissão, ou a função gratificada como vantagem pessoal". Afirma a Consultoria, que "Desse momento em diante a parcela (vantagem pessoal) comporá a remuneração, não estando atrelada aos valores definidos para os cargos em comissão ou funções gratificadas" (fls. 60/63).

Reproduz entendimento do STF a respeito do assunto e apresenta cálculo hipotético da remuneração que resultará da aplicação da Lei Municipal n. 460, de 2006 (fls. 63/65), nessa situação.

Com referência à indagação complementar deste segundo item da Consulta, que questiona a possibilidade de "o valor incorporado" superar o valor dos vencimentos fixados para os cargos e funções, expõe a COG - com relação ao valor adicionado em face ao exercício de cargo em comissão -, que o reajuste incide tanto sobre o valor do cargo efetivo como do cargo comissionado, motivo pelo qual não se verifica hipótese de a parcela ser superior à remuneração do cargo em comissão.

Já quando se trata da percepção de função gratificada (Anexo VII da Lei - Nível CV-CAS 01), ressalta a COG que, em razão de o reajuste não se estender para a função, "os servidores que exercem a função irão receber menos que os servidores que possuem vantagem pessoal decorrente do exercício dessa função".

Alerta, porém, a COG, que inexiste vinculação entre a vantagem pessoal e a função gratificada em que se fundamenta. Se, por exemplo, mediante lei, o valor da função gratificada CV-CAS 01 for acrescida em 20%, aqueles "servidores que exercem a função iriam receber mais que os servidores que possuem a vantagem pessoal", uma vez que esta, a partir de sua concessão, desvincula-se do cargo ou função de origem (fls. 65/66).

O Ministério Público diverge da Consultoria Geral, quando se trata do adicional incorporado aos vencimentos em face ao exercício de cargo em comissão ou função gratificada como na hipótese destes autos.

Segundo o entendimento da Sra Procuradora Cibelly Farias acerca do art. 72 do Estatuto dos Servidores Municipais de São Francisco do Sul, "o adicional pelo exercício de cargo em comissão ou função comissionado, uma vez incorporado à remuneração do servidor municipal, trata-se de uma vantagem pessoal desvinculada e não equiparada a nenhuma outra parcela remuneratória, concedida com o intuito de conferir estabilidade financeira ao servidor".

Adiante, cita o páragrafo único, do art. 62-A do Estatuto dos Servidores da União (Lei Federal n. 8.112, de 1990, e alterações posteriores), o qual estabelece que a vantagem pessoal (denominada de VPNI-Vantagem Pessoal Nominalmente Identificável) decorrente da estabilidade financeira originária do exercício de cargos ou funções de confiança, "somente estará sujeita às revisões gerais de remuneração dos servidores públicos federais" (fls. 72).

Com esse mesmo propósito a Sra. Procuradora menciona o art. 3º, da Lei Complementar Estadual n. 43, de 1992, com as alterações posteriores, que veda o reajuste da vantagem nominalmente identificável (derivada do art. 90 do Estatuto dos Servidores Estaduais).

A Dra. Cibelly Farias salienta que essas disposições legais "foram ao encontro do entendimento firmado pelas Cortes Superiores no que tange ao critério para estabelecer reajuste da vantagem pessoal oriunda do exercício de cargo em comissão ou função comissionada", relacionando para esse fim julgados do Supremo Tribunal Federal (STF) às fls. 73/74 e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), de fls. 74/75. Conclui que "é corrente a jurisprudência firmada no sentido de que as vantagens pessoais derivadas da mesma origem da prevista no art. 72 da Lei Complementar n. 8/2003 está sujeita unicamente aos reajustes gerais da remuneração dos servidores públicos" (fls. 75).

Sustenta a Sra. Procuradora que "andou bem o legislador municipal em não incluir no rol das parcelas remuneratórias reajustadas o adicional (...), pois se trata de vantagem pessoal, parcela autônoma da remuneração do servidor, (...), está sujeita tão-somente ao reajuste por meio da revisão geral anual" (fls. 77).

Em sua conclusão responde negativamente ao questionamento formulado pela Câmara Municipal de São Francisco do Sul (fls. 77/78).

Neste item acolho o entendimento da Consultoria Geral desta Casa, considerando que:

1 - a Lei Complementar Municipal n. 008, de 30/10/2003, em seu art. 72 assegura aos servidores municipais a percepção de adicional a título da diferença dos vencimentos do cargo efetivo e o do cargo em comissão e/ou da função gratificada;

2 - inexiste dispositivo no Estatuto dos Servidores Municipais (LC n. 08, de 2003); na Lei Municipal n. 303, de 2004, que dispõe sobre o plano de cargos e salários dos servidores da Câmara; bem como, na Lei Municipal n. 460, de 2006, que concede reajuste real aos vencimentos dos servidores da Câmara; que restrinja o reajuste da vantagem pessoal decorrente da aplicação do art. 72 do Estatuto ao percentual da revisão geral prevista na parte final do inc. X do art. 37 da CF;

3 - tanto a União como o Estado Catarinense, consoante as normas citadas pela Dra. Cibelly Farias, estabeleceram, expressamente, que os valores da vantagem pessoal estão sujeitos exclusivamente à revisão geral anual;

4 - a manifestação do Poder Judiciário vem sendo provocada precisamente por servidores irresignados com as normas estaduais, além da federal, que passaram a restringir a incidência de reajustes sobre a parcela relativa à estabilidade financeira, a chamada vantagem pessoal nominalmente identificável (VPNI), limitando-a às revisões gerais anuais.

Por exemplo, no Agravo Regimental no Agravo de Instrumento - AI 440.202-1/AgR de Pernambuco (STF, 2ª Turma, Relatora Min. Ellen Gracie, Acórdão de 13/12/2005), que entende

"ser legítimo que, mediante lei, o cálculo da vantagem seja desvinculado, para o futuro, dos vencimentos do cargo em comissão outrora ocupado pelo servidor, passando a quantia a ela correspondente a ser reajustada segundo os critérios das revisões gerais de remuneração do funcionalismo" (Grifou-se).

Constata-se que o STF reiteramente tem decidido que "Nada impede que o legislador desvincule o cálculo da referida vantagem da remuneração atribuída aos cargos ou funções em que se dera a incorporação, desde que o faça para o futuro, hipótese em que o STF não reconhece a existência de direito adquirido dos titulares da vantagem ao regime remuneratório anterior (voto do Ministro Sepúlveda Pertence no julgamento do RE 233.958, DJ de 17/09/1999)", conforme Agravo Regimental no Recurso Extraordinário - RE-AgR 454415/PE (STF, Primeira Turma, Min. Carlos Britto, Sessão de 21/03/2006), admitindo a Suprema Corte que o valor passe "a ser reajustado segundo os critérios das revisões gerais do funcionalismo".

Portanto, somente na presença de expressa disposição legal pode-se restringir a incidência de reajuste (real) sobre o adicional (vantagem pessoal), a que se refere o presente processo.

Deve-se considerar, ainda, que o art. 1º da Lei Municipal nº 460, de 2006, que concede o reajuste de 10% reporta-se ao vocábulo "vencimentos".

Observa-se que o Estatuto dos Servidores Municipais contém conceituação apenas do vocábulo "remuneração" (art. 44) e do "vencimento" (art. 51). Porém, no art. 52 faz uso da expressão "vencimentos".

O STF ao julgar o Agravo Regimental em Recurso Extraordinário n. 201460-5/RS (Relator o Min. Maurício Correa, Segunda Turma, julgamento em 27/09/1996), assim se manifestou acerca dessas expressões encontradas comumente nos textos legais da União, dos Estados e Município, assim como, na própria Constituição Federal:

"... Na Constituição Federal, os termos vencimentos e remuneração aparecem um ao lado do outro com os respectivos sentidos em função de situações diversas (art. 37, V, CF). Este preceito estatui que 'os vencimentos dos servidores públicos, civis e militares, são irredutíveis e a remuneração observará o que dispõe os arts. 37, XI, XII, 150, II, 153, III e 153, § 2º, I. De fato, só os vencimentos (vencimento e vantagens fixas) podem ser irredutíveis. A remuneração, em sentido próprio, não, precisamente porque um de seus componentes é necessariamente variável e, portanto, em um mês poderá ser maior ou menor do que em outro". Grifou-se.

Desse modo, ao conceder reajuste (real) aos vencimentos dos cargos efetivos devem ser consideradas as vantagens concedidas - incorporadas ao vencimento - do servidor a Câmara Municipal de São Francisco do Sul, por se caracterizar na situação concreta de vantagem pessoal fixa, como definiu o STF.

Por essas razões deixo de acompanhar o entendimento do Ministério Público e acolho o posicionamento da COG, que indica que o reajuste concedido, objeto de questionamento, abrange o adicional originário do exercício de cargo em comissão ou função de confiança, percebido em consonância com o art. 72 do Estatuto dos Servidores do Municipio de São Francisco do Sul.

A propósito da matéria em estudo anoto que em 23 de maio de 2007 foi editada pelo Município de São Francisco do Sul a Lei n. 528, que concede (novo) reajuste (aumento real) de 10% dos vencimentos dos cargos efetivos e comissionados do Quadro de Pessoal da Câmara de Vereadores, ou seja, é reproduzido o mesmo conteúdo do art. 1º da Lei Municipal n. 460, de 2006, ora examinada, razão pela qual se estende o mesmo entendimento exposto neste processo.

PROPOSTA DE DECISÃO

Em conformidade com o exposto e mediante o acolhimento do Parecer n. 616/2006 da COG e parcial adoção do Parecer n. 1059/2007 do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, VOTO por submeter à deliberação Plenária a seguinte proposta de DECISÃO:

6.1. Conhecer da Consulta formulada pela Câmara de Vereadores de São Francisco do Sul, que objetiva a interpretação de lei, conforme o inc. XV, art. 1º, da LC nº 202, de 2000.

6.2. Responder a consulta nos seguintes termos:

6.2.1. O reajuste (aumento real) de 10% concedido na forma do art. 1º da Lei Municipal n. 460, de 2006, por ser destinado expressamente aos cargos efetivos e comissionados, não incide sobre a função de nível CV-CAS 01, constante do Anexo VII da Lei Municipal n. 303, de 2004.

6.2.2. Incidem sobre a vantagem pessoal, assim considerado o adicional concedido e incorporado aos vencimentos do servidor na forma do art. 72 da Lei Complementar Municipal n. 008, de 2003, em face ao exercício de cargo em comissão ou função gratificada, os reajustes que importem em aumento real, diante da inexistência de norma legal local que limite a correção dos valores à revisão geral anual prevista no inc. X do art. 37 da CF.

6.2.3. Por não abranger a função prevista no Anexo VII da Lei n. 303, de 2004, a aplicação do reajuste previsto pela Lei Municipal n. 460, de 2006, poderá resultar em percebimento de valor incorporado de função equivalente (vantagem pessoal) superior ao valor da função gratificada de nível CV-CAS 01 - Chefia e Assistência Subalterna.

6.3. Determinar à Consulente que, em futuras consultas, encaminhe o parecer de sua assessoria jurídica, nos termos do que dispõe o artigo 104, inciso V, do Regimento Interno do Tribunal de Contas.

6.4. Dar ciência desta Decisão, do Relatório e Voto do Relator e do Parecer nº COG-616/2007, que a fundamentam, à Câmara de Vereadores de São Francisco do Sul.

6.5. Determinar o arquivamento destes autos.

Florianópolis, 27 de agosto de 2007.

Moacir Bertoli

Relator