ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA

Conselheiro José Carlos Pacheco

PROCESSO Nº   CON 06/00440710
     
    UG/CLIENTE
  PREFEITURA MUNICIPAL DE ITAPOÁ
     
    INTERESSADO
  SÉRGIO FERREIRA DE AGUIAR
     
    ASSUNTO
  CONSULTA. TRIBUTÁRIO. AUSÊNCIA DE LANÇAMENTO E EXECUÇÃO FISCAL SEM CITAÇÃO. REPERCUSSÕES.

RELATÓRIO

Tratam os autos de consulta formulada pelo Prefeito Municipal de Itapoá - Sr. Sérgio Ferreira de Aguiar, solicitando Parecer deste Tribunal de Contas, sendo o expediente encaminhado nos seguintes termos:

Sérgio Ferreira de Aguiar, Prefeito do município de Itapoá (SC), com fulcro no art. 103, inciso II, do Regimento Interno do TCE, vem perante Vossa Excelência, para formular a seguinte consulta:

- É lícito à Administração Pública Municipal reconhecer via administrativa a ocorrência do intituto da prescrição, face ao contido no art. 174 do CTN, uma vez que não precedeu o regular lançamento de seu crédito ou porque, embora promovida a execução fiscal, não houve citação do devedor no prazo de 5 anos?

A Consultoria Geral deste Tribunal, em análise ao mencionado expediente, elaborou o Parecer COG nº 0549/2006, de fls. 03 a 10, da lavra da Dra. Eliane Guettky, salientando, preliminarmente, que a parte é legítima para propor consulta e que a indagação feita versa sobre matéria sujeita a exame e fiscalização desta Corte de Contas.

No mérito, a COG concluiu que este Tribunal pode conhecer da consulta, respondendo ao Consulente, em suma, que é possível o reconhecimento, de ofício, pela Administração Pública Municipal, da ocorrência da prescrição, nos termos do art. 174 c/c art. 156, V, do CTN em decorrência do não-ajuizamento da ação de execução fiscal ou, caso ajuizada, não tenha ocorrido a citação do devedor no prazo de 05 anos (desde que inércia não decorra de ato do próprio executado). Havendo o reconhecimento de ofício da prescrição do crédito tributário inscrito em dívida ativa pela Administração, devem ser adotadas as seguintes medidas administrativas: a) autorização legislativa para exclusão do crédito, em razão do princípio da legalidade; b) apuração da responsabilidade do agente público incumbido da cobrança dos créditos tributários; c) comunicação do fato ao Ministério Público estadual, tendo em vista que créditos tributários são bens públicos indisponíveis.

Levados os autos à consideração do Ministério Público junto ao Tribunal, este entendeu por acompanhar a manifestação da Consultoria Geral, efetuando ajuste em à resposta (item 6.2.1 da conclusão do Relatório da Consultoria Geral), por entender que a partir do ingresso da ação de execução fiscal, somente o juiz poderá declarar a prescrição, nos autos do processo, após a oitiva da Fazenda Pública, conforme prevê a Lei nº 11051/2004, que conferiu nova redação ao art. 40 da Lei de Execução Fiscal nº 6.830/80. (Parecer MPTC 6838/2006 - fls. 11 a 15).

É o relatório.

VOTO

Ao compulsar os autos, este Relator compartilha do entendimento apresentado pela Consultoria Geral desta Casa (Parecer COG nº 549/2006), com o ajuste promovido pela Procuradoria Geral junto ao Tribunal de Contas, através do Parecer MPTC nº 6838/2006, da lavra da Procuradora Cibelly Farias.

Do parecer da Consultoria Geral, entendo necessário reproduzir os seguintes termos:

Com relação ao reconhecimento de ofício do instituto da prescrição, oportuno destacar que nas ações judiciais de âmbito de direito privado e especialmente quando se tratava de direitos patrimoniais, prevalecia o entendimento pelo não reconhecimento da prescrição.

Já no âmbito do Direito Tributário (Direito Público), não era esse o entendimento, conforme destaca Rizzatto Nunes1"o direito de cobrar tributo, por ser indisponível, e por ter que respeitar o princípio da legalidade e em estando estabelecido pelo CTN que a prescrição se opera em cinco anos, pode e deve ser avaliado e julgado ex offício".

Nesse sentido também se manifesta o Superior Tribunal de Justiça2, consagrando a possibilidade/necessidade do reconhecimento, de ofício, da prescrição do crédito tributário, nos seguintes termos:

"(...)

2. A mera prolação do despacho que ordena a citação do executado não produz, por si só, o efeito de interromper a prescrição (...)

4. Paralisado o processo por mais de 5 (cinco) anos impõe-se o reconhecimento da prescrição, ainda que de ofício, se o executado não foi citado (...)

6. Permitir à Fazenda manter latente relação processual inócua, sem citação e com prescrição intercorrente evidente, é conspirar contra os princípios gerais de direito (...)

7. A prescrição (...) Faz exsurgir, por força de sua intercorrência no processo, a falta de interesse processual superveniente, matéria conhecível pelo juiz a qualquer tempo".

Apesar de tratar de hipótese de reconhecimento de ofício em ação judicial, e não pela Administração, o mesmo procedimento deve ser observado pela Administração porque, como bem destaca o acórdão, é inviável o ajuizamento de ação de execução fiscal pela Administração em razão de estarem prescritos os créditos tributários em face da ausência de interesse processual da ação.

Oportuno registrar ainda o advento da Lei n. 11.280/2006 de 17/02/2006, que revogou o art. 194 do Código Civil ("O juiz não pode suprir, de ofício, a alegação de prescrição, salvo se favorecer a absolutamente incapaz) e alterou o § 5º do art. 219, do Código de Processo Civil (O juiz pronunciará, de ofício, a prescrição). Com efeito, o entendimento que já era adotado pela jurisprudência vem chancelado pela lei, possibilitando o reconhecimento de ofício do instituto da prescrição pela autoridade judicial.

Estando prescrita a ação executiva, entende-se que não se pode dar curso a uma ação que, a priori, já se sabe inviável. O processo não pode servir como instrumento de perseguição. Não se pode perder de vista de que o rigor e a prudência devem ser observados, não somente por aqueles que detêm o poder de iniciativa das ações, mas sobretudo, por aqueles que podem decidir sobre a sua iniciativa. Ademais, quando o crédito encontra-se prescrito e a ação não foi protocolada, não existe razão para o ajuizamento de uma ação que já nascerá frustada, demandando gastos e tempo não só à Administração como ao Poder Judiciário. Já quando estiver protocolada a execução e não sendo a razão da demora da citação atribuída ao próprio executado, ocorrendo a prescrição, também cabe a Fazenda Pública pedir a extinção do feito.

Assim, o Município deve adotar as medidas administrativas quando ocorrida a prescrição do crédito tributário inscrito em dívida ativa, contudo, para excluir os créditos tributários prescritos faz-se necessária a autorização legislativa, em razão do princípio da legalidade.

Outro procedimento que é imprescindível, é apurar a responsabilidade do servidor público incumbido da cobrança dos créditos tributários que não adotou as providências necessárias, fazendo a comunicação do fato ao Ministério Público Estadual, tendo em vista que os créditos tributários são bens públicos indisponíveis.

Do Parecer do MPTC, convêm ressaltar:

(...) em relação ao conteúdo do art. 174 do CTN, que trata da prescrição, cumpre esclarecer que, conforme alteração promovida pela Lei Complementar n. 118/2005, a primeira causa interruptiva da prescrição se dá pela data do despacho do juiz que ordena a citação na execução fiscal e não mais da data da citação.

(...)

Assim sendo, uma vez constituído o crédito tributário, a Administração tem cinco anos para promover judicialmente a cobrança do crédito, sob pena de prescrição.

Nessa hipótese, se decorrem cinco anos sem a propositura da devida ação de cobrança pela Administração - entendo que, conforme concluiu a Consultoria-Geral, poderia a Administração reconhecer de ofício a prescrição e evitar o ajuizamento de uma ação judicial sabidamente frustada.

Todavia, a partir do ingresso da ação, somente o juiz poderá declarar a prescrição, nos autos do processo, após a oitiva da Fazenda Pública.

É o que prevê a Lei n. 11.051/2004, que confiriu nova redação ao art. 40 da Lei de Execução Fiscal, acrescentando-lhe o § 4º, para permitir que o magistrado reconheça de ofício a prescrição intercorrente, ouvida a Fazenda Pública, extinguindo o processo de execução fiscal.

(...)

Portanto, à luz das normas atualmente vigentes sobre a matéria, após decorrido o prazo de um ano sem que seja localizado o devedor ou bens penhoráveis, o magistrado ordenará o arquivamento dos autos e se, a partir da data dessa decisão que determina o arquivamento decorrer o lapso prescricional de cinco anos, o juiz poderá reconhecer e decretar de ofício a prescrição intercorrente, ouvido o representante da Fazenda Pública.

Assim, considerando que o consulente é parte legítima para subscrever consultas a este Tribunal - vide art. 103, II e art. 104, III, do Regimento Interno do Tribunal de Contas (Resolução TC nº 06/2001);

considerando que a matéria enfocada na peça indagativa versa sobre matéria sujeita a exame e fiscalização desta Corte de Contas, nos termos do inciso XII da Constituição Estadual, proponho ao egrégio Plenário o seguinte VOTO:

6.1. Conhecer da presente consulta, por prencher os requisitos e formalidades preconizados no Regimento Interno deste Tribunal;

6.2 Responder à Consulta nos seguintes termos:

6.2.1 È possível o reconhecimento, de ofício, pela Administração Pública Municipal, da ocorrência da prescrição, nos termos do art. 174 c/c art. 156, V, do CTN em decorrência do não-ajuizamento da ação de execução fiscal no prazo de 05 (cinco) anos;

6.2.2 Caso ajuizada a ação, após decorrido o prazo de um ano sem que seja localizado o devedor ou bens penhoráveis, o magistrado ordenará o arquivamento dos autos e se, a partir da data dessa decisão que determina o arquivamento decorrer o lapso prescricional de cinco anos, o juiz poderá reconhecer e decretar de ofício a prescrição intercorrente, ouvido o representante da Fazenda Pública (art. 40 da Lei n. 6830/80);

6.2.3 Havendo o reconhecimento de ofício da prescrição do crédito tributário inscrito em dívida ativa pela Administração, devem ser adotadas as seguintes medidas administrativas: a) autorização legislativa para exclusão do crédito, em razão do princípio da legalidade; b) apuração da responsabilidade do agente público incumbido da cobrança dos créditos tributários; c) comunicação do fato ao Ministério Público Estadual, tendo em vista que créditos tributários são bens públicos indisponíveis.

6.3 Dar ciência desta Decisão, do Relatório e Voto do Relator que a fundamentam, bem como do Parecer COG nº 549/06 e MPjTC nº 6838/06 ao Prefeito Municipal de Itapoá, Sr. Sérgio Ferreira de Aguiar.

6.4 Determinar o arquivamento dos autos.

GCJCP, em 06 de Dezembro de 2006.

JOSÉ CARLOS PACHECO

Conselheiro Relator


1 ¹ A possibilidade do reconhecimento de ofício da prescrição em matéria de execução fiscal, em Revista Interesse Público. Notadez, n. 25, maio/junho de 2004, p. 172

2 Recurso Especial n. 622165/PE Relator Min. Luiz Fux, julgado em 10/08/2004