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ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO |
Processo nº: |
REC-07/00080350 |
Unidade Gestora: |
Centrais
Elétricas de Santa Catarina-CELESC |
Interessado: |
Sr. Marcelo Gasparino da Silva |
Assunto: |
Recurso
de Agravo – art. 82 da LC 202/2000 – RPL-06/00342620 + REC-07/00014489 |
Parecer nº: |
GC/WRW/2008/168/ES |
ISSQN. Incidência. Obra pública.
Os
materiais utilizados pelas empresas prestadoras de serviços na realização de
obra pública se sujeitam à incidência de ISSQN, pois as mercadorias por elas
adquiridas são utilizadas como insumos para a consecução de suas obras.
Assim, quando se estiver diante de uma atividade tributável pelo ISSQN, no bojo da qual haja fornecimento de bens pelo próprio executor do serviço, e desde que tais bens sejam empregados nesta atividade, não há de se falar em incidência do ICMS.
1.
RELATÓRIO
Cuidam os autos de Recurso de Agravo interposto pelo
Sr. Marcelo Gasparino da Silva, Diretor-Jurídico Institucional da Celesc
Distribuição S.A., em face da Decisão n. 3.586/2006, proferida nos autos n.
RPL-06/00342620, considerando procedente a representação e determinando a
instauração de Tomada de Contas Especial, em virtude da existência de suposto
prejuízo causado ao erário quando da não-comprovação da equalização da proposta
de preços da empresa adjudicada.
As razões recursais foram encaminhadas à Diretoria de
Controle de Licitações e Contratações-DLC, para exame e elaboração de relatório
conclusivo, em cumprimento ao art. 25, inciso X, da Resolução n. TC-10/2007.[1]
Houve juntada
de documentos pelo Agravante.[2]
Em seqüência, houve manifestação da DLC,
consubstanciada no Relatório DLC/Insp. 2/Div.4 n. 187/2007, no qual concluiu
por conhecer do agravo e, no mérito, dar-lhe provimento.[3]
O Ministério Público, em parecer da lavra de seu
Procurador-Geral Adjunto, Dr. Mauro André Flores Pedrozo, acompanhou o
entendimento da Instrução.[4]
Este o relatório.
Com efeito, a decisão agravada possui o seguinte teor:
“6.1. Conhecer da Representação formulada nos termos do art. 113, § 1°, da Lei Federal n. 8.666/93, para, no mérito, considerá-la procedente.
6.2. Determinar ao Sr. Miguel Ximenes de Melo Filho - Diretor-Presidente da CELESC, CPF n. 070.331.689-34, a adoção de providências visando à instauração de tomada de contas especial, nos termos do art. 10, §1°, da Lei Complementar n. 202/2000, com a estrita observância do disposto no art. 5º da Instrução Normativa n. 01/2001, em virtude da existência de prejuízo causado ao erário quando da não-comprovação da equalização da proposta de preços da empresa adjudicada de acordo com o que preceitua o item 7.1.6.2 do Edital de Concorrência 0070/2006, para apuração dos fatos, identificação dos responsáveis e quantificação do dano, sob pena de responsabilidade solidária.
6.3. Fixar o prazo de 30 (trinta) dias para que as Centrais Elétricas de Santa Catarina S.A - CELESC instaure a tomada de contas especial e comunique ao Tribunal de Contas sobre a instauração, conforme art. 3º, §2º, da Instrução Normativa n. 01/2001.
6.4. Estabelecer o prazo de 180 (cento e oitenta) dias, a contar da publicação desta Decisão no Diário Oficial do Estado, para conclusão e apresentação ao Tribunal do referido processo de tomada de contas especial, conforme art. 3º, §1º, da referida Instrução Normativa.
6.5. Dar ciência desta Decisão, do Relatório e Voto do Relator que a fundamentam, bem como da Informação DCE/ECO n. 313/2006:
6.5.1. ao Sr. Miguel Ximenes de Melo Filho - Diretor-Presidente da CELESC, com remessa de cópia da Instrução Normativa n. 01/2001;
6.5.2. à interessada no presente processo. [...]”
Constato que os requisitos de admissibilidade do
presente recurso foram atendidos, de modo que o mesmo pode ser conhecido.
No Relatório n.187/2007, a Diretoria Técnica fez breve
relato da situação, narrando que a empresa Santa Rita Comércio e Instalações
Ltda. formulou representação nesta Corte de Contas (RPL-006/00342620), em face
do Edital de Concorrência n. 070/2006, lançado pela CELESC.
A
empresa Santa Rita aduziu que, no referido certame, houve ofensa aos princípios
da isonomia e da determinação legal de escolha da proposta mais vantajosa à
Administração Pública, pois, em virtude da inexistência de equalização das
propostas, quando do julgamento, não foi considerado o desdobramento econômico
decorrente do ICMS, incidente sobre os bens componentes do objeto licitado.
Expôs ainda a Diretoria de Licitações e Contratos que:
“[...] sustentou a representante que, por ser sediada em Santa Catarina, sujeita-se à alíquota interna do ICMS, que é, via de regra, de 17%, enquanto que o consórcio vencedor da licitação em epígrafe, por ser composto por empresas originárias de outros estados da Federação, sujeita-se à alíquota interestadual, que é de 12%, sendo que a diferença entre tais alíquotas - nominada de diferencial de alíquota – deverá ser recolhida diretamente pela CELESC quando da entrega do objeto licitado. Desta forma, asseverou a representante que a sua proposta deveria ser a escolhida, já que mais vantajosa em razão de gerar mais créditos de ICMS para a CELESC, além de afastar o pagamento do diferencial de alíquota”.[5]
De seu turno, o Agravante argüiu, em síntese, que:
“[...] a Representante deixa de observar que o objeto do certame licitatório não se enquadra na aplicação de alíquota de ICMS, pois trata-se de um obra, que conforme será melhor explanado, resulta da contratação de empresa capacitada para construção e ampliação de subestações desta Empresa, sob o regime de empreitada global, o que caracteriza uma prestação de serviço sem incidência de ICMS.
Quanto à incidência de ICMS nas obras, conforme preconiza a exceção prevista na Lei Complementar n. 116/2003, somente se aplica à empresa ou consórcio de empresas prestadoras de serviço produzir o material fora do local da prestação do serviço (canteiro de obra).
Nesse sentido, o item 7.1.6.2 do presente edital preconiza simplesmente atender o inciso II, § 2º, do art. 7º da Lei n. 8.666/93, demonstrando a composição detalhada do preço da proposta.
Porém, na presente licitação, não participaram do certame empresa ou consórcio composto por empresa prestadora de serviço que produzisse o material fora do local da prestação do serviço, ou seja, participaram somente empresas prestadoras de serviço, via disto, foi aplicada a regra geral da Lei Complementar 116/2003, que entre outras palavras, afirma que os materiais utilizados pelas empresas prestadoras de serviços na realização de obra pública se sujeitam ao ISS, pois os materiais por elas adquiridos são utilizados como insumos para a consecução de suas obras.
[...]
De outra banda, ressaltamos que o Edital de Concorrência n. 070/2006 foi enviado para análise desse Tribunal, respeitando o art. 2º, da Instrução Normativa n. TC-01/2002, que o aprovou proferindo decisão favorável sem nenhuma restrição ao objeto ora licitado, conforme Decisão n. 0498/2006 ...
[...]
Conquanto se trate de norma geral, o comando do § 2º do artigo 1º da Lei Complementar n. 116/03 menciona a expressão ‘ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias’, a qual, infelizmente, costuma dar origem a dúvidas. A rigor, ‘fornecer mercadoria’ passa a idéia de objeto que está sendo comercializado e que se vincula a uma obrigação de dar. Essa expressão pode fazer supor que se está referindo a uma espécie de prestação de serviço, na qual, além do esforço despendido para sua execução, também são ‘fornecidas’ – ao contratante do serviço – algumas mercadorias, consistindo assim numa espécie de atividade econômica de caráter híbrido ou misto, mas que seria sujeita apenas à incidência do ISS. [...]
É certo que na espécie de prestação de serviço da Concorrência n. 70/2006 não incide o ICMS, uma vez que tal ‘fornecimento’ não compreende uma etapa de circulação de mercadorias (que, se existisse, daria origem à incidência de ICMS). O que de fato existe é a prestação de serviço que envolve a utilização de ‘material e/ou instrumental’, como necessidade imprescindível para a execução da obra.
Não há etapa de circulação de mercadorias após a aquisição desses materiais pela empresa vencedora do certame, se ela simplesmente os emprega na execução da obra.
[...]
Como pode se notar, a Lei Complementar n. 87, de 13 de setembro de 1996, esclarece-nos que, em se tratando de mercadorias utilizadas pelo próprio autor da saída do serviço, não há incidência de ICMS. E nem poderia ser de outra maneira, uma vez que as ‘mercadorias’ utilizadas na prestação do serviço, efetivamente, não são ‘mercadorias’, mas sim materiais empregados pelo próprio prestador (consumidor final) na execução do serviço. [...]”[6]
Por derradeiro, o Agravante transcreveu
parecer, acerca do tema, elaborado pela Consultoria Empresarial de Assuntos
Tributários, que presta serviços de assessoria tributária ao Departamento de
Contabilidade da CELESC, colacionando diversos julgados e achegas doutrinárias,
a fim de enfatizar que, no contrato de empreitada, o empreitante assume
obrigação de fazer, por conta disso, os materiais utilizados não são
mercadorias, não havendo, portanto, que se falar em incidência de ICMS.
Além disso, juntou também cópia do
Parecer COG n. 233/06, referente ao Processo n. CON-06/00083500, cuja decisão
deu origem ao Prejulgado n. 1815.[7]
Em seqüência, a DLC, em bem elaborado Relatório
(n. 187/2007), acolheu os argumentos sustentados pelo Agravante, conforme se
depreende dos excertos a seguir transcritos:
“[...] ainda que seja possível visualizar, em tese, um negócio jurídico consistente na entrega de mercadorias, no caso concreto não há como considerar isoladamente tal relação jurídica: o liame obrigacional formado entre a vencedora do certame e a CELESC diz respeito à entrega, no regime ‘turn key’, do objeto licitado, cujo funcionamento depende do fornecimento dos bens epigrafados; é dizer, o fornecimento dos bens deixa de te relevância jurídica autônoma, passando a ser mera obrigação acessória à principal, que é a entrega do empreendimento pronto em condições de ser utilizado.
[...]
Diante disso, conclui-se que a entrega dos bens em tela não é uma operação relativa à circulação de mercadorias – por não se tratar de fornecimento de bens móveis -, bem como a relação jurídico-obrigacional concernente ao fornecimento de bens é acessória à contratação principal, que diz respeito à entrega, em regime de empreitada integral, de empreendimento apto à pronta utilização.”[8]
Ao tratar
da incidência tributária, consignou o seguinte:
“[...] ainda que o § 2º da LC n. 87/96 estabeleça que a ‘caracterização do fato gerador independe da natureza jurídica da operação que o constitua’, a legislação do ICMS considera relevante, para fins de delimitação de seu espectro de incidência, a existência de contratação complexa que encerre o fornecimento de mercadorias em conjunto com a prestação de serviços sujeitos ao ISSQN, retirando de sua esfera de tributação a entrega de bens na execução de um serviço [...]
É dizer, quando se estiver diante de uma atividade tributável pelo ISSQN no bojo da qual haja fornecimento de bens pelo próprio executor do serviço, e desde que tais bens sejam empregados nesta atividade, não há de se falar em incidência do ICMS.
Tal previsão se mostra coerente, vez que o ICMS é um imposto que se manifesta precipuamente em relações jurídicas que objetivam essencialmente a tradição de mercadorias; o foco do ICMS é a mercancia, o comércio em si mesmo considerado, e não a entrega de bens. Assim, quando estes bens forem acessórios a uma prestação de serviços, sendo esta a faceta preponderante da relação jurídica constituída, o ICMS cede espaço para o ISSQN, que grava a execução das atividades definidas em lei como sujeitas a tal imposto. [...]
É de se consignar que embora a locução ‘fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador de serviços fora do local da prestação dos serviços’, aposta na parte final do item 7.02 da lista anexa à Lei do ISSQN, possa levar, em uma leitura mais apressada, à conclusão de que haverá incidência do ICMS sobre o fornecimento de bens a serem empregados na obra quando fabricados pelo próprio executor dos serviços fora do local da prestação da atividade contratada, a exegese sistemática de tal disposição aponta para solução diversa.
Como já visto, quando se estiver diante de contratação de serviço arrolado na lista anexa à LC 116/03, cujo objeto pressupõe a entrega de bens para sua fiel execução, não há incidência de ICMS sobre a parcela da obrigação que compreende o fornecimento de produtos, vez que a obrigação de fazer – executar o serviço – prepondera sobre a obrigação de dar, prevalecendo, para fins tributários, tão-somente a obrigação principal, eis que assim definido na legislação.
[...]
A princípio, pois, a entrada de bens oriundos de unidade da federação diversa de Santa Catarina no ativo permanente da CELESC, perfectibilizada após a entrega do empreendimento licitado, geraria a incidência do ICMS, por força do disposto no acima citado inciso VI do art. 1º do RICMS/SC. Entretanto, como no caso concreto o recebimento dos multicitados bens se dará em razão de contrato executado pelo regime de empreitada integral, não se constituindo tais bens em mercadorias, vez que entregues agregados ao bem imóvel objeto da contratação, não se aplica o disposto no inciso VI do art. 1º do RICMS/SC, vez que a hipótese de incidência aí descrita refere-se às ‘mercadorias’ recebidas no bojo de uma operação especificamente destinada à circulação destas.
Conclui-se, pois, que a contratação do empreendimento objeto da licitação em epígrafe será unicamente tributada pelo ISSQN, suportado pela vencedora do certame, não havendo a concretização de quaisquer hipóteses de incidência do ICMS, seja sobre a relação jurídica estabelecida entre a contratada e a CELESC, seja sobre o ingresso de bens no ativo permanente desta última. [...]” [9] grifo nosso
Por fim, concluiu a Instrução pela
não-incidência de ICMS sobre o contrato firmado entre a vencedora e a CELESC e
nem sobre a entrada dos bens listados no item 1.2.3.1 da minuta do contrato
anexa ao Edital n. 070/2006. Além disso,
inferiu que não havia necessidade de equalização das propostas, em virtude de
inexistir alíquotas diferenciadas em razão da sede dos licitantes e, via de
conseqüência, não existe o suposto dano ao erário.
O pronunciamento do Corpo Instrutivo não
merece acréscimos, porquanto constitui minudente exame acerca do tema discutido
nestes autos, razão pela qual o utilizo para fundamentar meu posicionamento, no
sentido de conhecer do presente recurso e, no mérito, dar-lhe provimento para
reformar o acórdão recorrido.
2.
VOTO
CONSIDERANDO
o que mais dos autos consta, VOTO em conformidade com os pareceres da
Consultoria e do Ministério Público, no sentido de que o Tribunal adote a
decisão que ora submeto à sua apreciação:
6.1. Conhecer do Recurso de Agravo, nos termos do art. 82
da Lei Complementar n. 202/2000, interposto contra a Decisão n. 3.586/2006
exarada na Sessão Ordinária de 11/12/2006, nos autos do Processo n. RPL-06/00342620
e, no mérito, dar-lhe provimento para:
6.1.1.
alterar o item 6.1 da decisão recorrida, que passa a ter seguinte redação:
“6.1.
Conhecer da Representação formulada nos termos do art. 113, § 1°, da Lei
Federal n. 8.666/93, para, no mérito, considerá-la improcedente, em razão do
fato de que a contratação, objeto da Concorrência n. 070/2006, será unicamente
tributada pelo ISSQN, não havendo a concretização de quaisquer hipóteses de
incidência do ICMS, descartando-se a necessidade de equalização das propostas.”
6.1.2.
cancelar as determinações contidas nos itens 6.2 a 6.4 da decisão recorrida.
6.2. Dar ciência
desta Decisão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Relatório
n. DLC/Insp.2/Div.4 n. 187/2007 à Consultoria-Geral deste Tribunal,
para que efetue a juntada dos referidos documentos nos autos do Processo n.
RPL-06/00342620, e ao Sr. Eduardo Pinho Moreira,
Diretor-Presidente das Centrais Elétricas de Santa Catarina S.A.
6.3. Determinar
o arquivamento dos autos.
Gabinete do Conselheiro, em 24 de abril de 2008.
Conselheiro Relator
[1] Fl. 83/84 dos autos do Processo n. REC-07/00080350.
[2] Fls. 98/134 dos autos do Processo n. REC-07/00080350.
[3] Fls. 142/163 dos autos do Processo n. REC-07/00080350.
[4] Fls. 164/165 dos autos do Processo n. REC-07/00080350.
[5] Fl. 145 dos autos do Processo n. REC-07/00080350.
[6] Fls. 05/14 dos autos do Processo n. REC-07/00080350.
[7] Prejulgado n. 1815:
“Os materiais utilizados
pelas empresas prestadoras de serviços na realização de obra pública se
sujeitam à incidência do ISS, pois as mercadorias por elas adquiridas são
utilizadas como insumos para a consecução de suas obras.
A base de cálculo do ISS é o preço integral do serviço prestado, não sendo
possível subtrair o montante referente aos materiais utilizados pela empresa
prestadora dos serviços, estejam ou não esses valores discriminados nas notas
fiscais de serviço.”
[8] Fls. 153/154 dos autos do Processo n. REC-07/00080350.
[9] Fls. 154/159 dos autos do Processo n. REC-07/00080350.