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ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO GABINETE DO CONSELHEIRO WILSON ROGÉRIO WAN-DALL |
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CON-07/00090827 |
UNIDADE GESTORA: | Companhia Águas de Joinville |
Interessado: | Sr. Henrique Chiste Neto |
Assunto: | Possibilidade de terceirização de serviços. Conceito de atividade-fim e atividade-meio da Administração Federal, quando da omissão da Estadual e Municipal |
Parecer n°: | GC/WRW/2007/473/ES |
Ementa: ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. TERCEIRIZAÇÃO. ATIVIDADE-MEIO E ATIVIDADE-FIM.
NORMA FEDERAL. APLICABILIDADE AOS ESTADOS E MUNICÍPIOS. IMPOSSIBILIDADE.
O Decreto Federal n. 2.271/97 não se aplica às Administrações Estadual e Municipal, ainda que não haja regulamento próprio sobre o tema, pois a referida normativa é dirigida exclusivamente às contratações de serviços pela Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional.
1. RELATÓRIO
Cuidam os autos de consulta, subscrita pelo Ilmo. Sr. Henrique Chiste Neto, Diretor-Presidente da Companhia Águas de Joinville, esboçando o seguinte questionamento:
"[...] Considerando que a Companhia, nos termos do que dispõe a Lei Municipal que autorizou a sua constituição, em seu art. 2º, incisos I e II, tem disciplinada sua atividade finalística quando preconiza que:
'Art. 2º - A Companhia Águas de Joinville terá por objeto social explorar diretamente os serviços públicos de abastecimento de água e de esgotamento sanitário, vedada as suas subconcessão, compreendendo:
I - a captação de água bruta, o tratamento, a adução, a reservação e distribuição para consumo público; e,
II - a coleta de esgotos sanitários trazidos por meio de tubos e condutos, o transporte, o tratamento, o reaproveitamento e a disposição final, bem como outras soluções alternativas.'
Diante desse dispositivo legal que estipula, claramente, quais são as atividades-fim da Companhia, consulta esse Egrégio Tribunal de Contas, se podem ser terceirizadas atividades que não integrem suas atividades finalísticas acima discriminadas no artigo transcrito, como: medições de consumo de água e uso do sistema de esgotamento sanitário, faturamento e acompanhamento da respectiva cobrança, emissão de ordens de serviços e serviços de informática?
Consulta-se também se a disposição do Decreto Federal n. 2.271/97, que define o conceito de atividade-fim e atividade-meio, não obstante voltado para a administração Federal, não deveriam ser aplicadas também às administrações Estaduais e Municipais, quando omissas a legislação destes? (fls. 02 a 03) grifo nosso
A Consultoria-Geral se manifestou por meio do Parecer n. COG-341/07, entendendo preenchidos os pressupostos legais de admissibilidade da consulta e propondo os termos da resposta a ser oferecida ao Consulente (fls. 07 a 20).
A douta Procuradoria-Geral junto a este Tribunal, através do Parecer n. 3.565/07, divergiu quanto ao conteúdo da resposta elaborado pela Consultoria, razão pela qual propôs alteração na sua redação (fls. 21 a 26).
Este o sucinto relatório.
Passo, a seguir, às minhas considerações.
Diante do questionamento apresentado pelo Consulente, o órgão consultivo sugeriu que fosse dada a seguinte resposta:
"2.1. É possível terceirizar as atividades-meio (que não estejam previstas no plano de cargos e salários, ou em extinção), como, enunciativamente, as medições de consumo de água e uso do sistema de esgotamento sanitário, o processamento das informações coletadas em banco de dados informatizado, a conservação, a limpeza e a vigilância das instalações públicas, entre outros.
2.2. Não é possível adotar-se o regime de terceirização das atividades finalísticas do ente público.
2.3. Quando se tratar de companhia de águas e estogo, não poderão ser objeto de terceirização, por exemplo, o lançamento tributário (faturamento), sua respectiva cobrança e arrecadação, assim como a emissão de ordens de serviço relativas à instalação, conserto, reparo ou corte do fornecimento dos ditos serviços, por envolver atividade-fim da companhia.
2.4. O Decreto-Federal n. 2.271/1997, que define, no âmbito da Administração Pública Federal, a natureza jurídica das atividades-meio e fim, e dispõe sobre a contratação de serviços pelos entes pertencentes à esfera Federal (administração direta e/ou indireta), regulamentando o contido no art. 84, IV, da Carta Magna e em obediência ao expresso em norma legal federal (Decreto-Lei Federal n. 200/1967, art. 10, § 7º), pode ser utilizado como referência normativa para os demais entes federativos (Distrito Federal, Estados e Municípios) editarem suas respectivas leis e decretos, levando-se em conta que a disciplina legal federal contém entendimento doutrinário e jurisprudencial vigentes no Brasil, quanto à conceituação jurídica das atividades finalísticas e não-finalísticas da Administração Pública." (fls.18 a 19)
O Ministério Público, por sua vez, acompanhou em parte o entendimento da Consultoria, aduzindo, em síntese, que:
"[...] É pacífico o entendimento de que as atividades finalísticas do ente público não são passíveis de terceirização, sob pena de violação ao dispositivo constitucional que impõe a obrigatoriedade de realização do concurso público.
No que tange à possibilidade de terceirizar as atividades-meio, o Enunciado n. 331 do Tribunal Superior do Trabalho pacificou o entendimento com relação às hipóteses em que seria possível tal contratação [...]
Por tais razões, entendo que devam ser mantidas somente as atividades relacionadas com conservação, limpeza e vigilância como passíveis de terceirização, no item 2.1 da conclusão do relatório de instrução.[...]
Com relação à contratação para medições de consumo de água e uso do sistema de esgotamento sanitário, entendo que tal atribuição não está desvinculada da atividade-fim da empresa, e que a prestação desse serviço por empresa contratada somente seria possível de forma temporária, para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, nos moldes do art. 37, inciso IX, da Constituição Federal e mediante autorização legislativa específica para tal. [...]" (fls. 22 e 24)
Ao final, o Ministério Público propôs a seguinte resposta ao Consulente:
"2.1. É possível terceirizar atividades-meio do Poder Público (como, por exemplo, para funções e atividades que não estejam previstas no plano de cargos e salários ou em extinção), tais como os serviços de vigilância, de conservação e limpeza;
2.2. Não é possível adotar-se o regime de terceirização das atividades finalísticas do ente público;
2.3. Quando se tratar de serviços de exploração dos serviços públicos de abastecimento de água e de esgotamento sanitário, não poderá ser objeto de terceirização, por exemplo, as medições de consumo de água e uso do sistema de esgotamento sanitário, o lançamento tributário (faturamento), sua respectiva cobrança e arrecadação, assim como a emissão de ordens de serviço relativas à instalação, conserto, reparo ou corte do fornecimento dos ditos serviços, por envolver atividades-fim da entidade;
2.4. O Decreto Federal n. 2.271/1997 não se aplica às Administrações Estadual e Municicpal, ainda que não haja regulamento próprio sobre o tema, pois a referida normativa é dirigida exclusivamente às contratações de serviços pela Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional." (fls.25 a 26)
Como é sabido, a regra, no âmbito da Administração Pública, é que a execução das atividades que lhes forem inerentes seja realizada por pessoas investidas em cargos ou empregos públicos, após aprovação em concurso público (art. 37, II da CF). Na hipótese de vacância dos cargos ou empregos públicos forçoso a realização de novo concurso para preenchê-los.
Todavia, quando a Administração não pretender contratar pessoal, mas simplesmente a prestação de serviços, sem vínculo direto com as pessoas que os executarão, é que se falará em "terceirização". Contudo, não é qualquer atividade que pode ser terceirizada no âmbito da Administração Pública. A rigor, essa terceirização apenas é admitida para a execução de atividades-meio. As atividades-fim, geralmente ligadas à noção de funções típicas de Estado não poderão ser terceirizadas.
Nessa senda, o entendimento do Tribunal de Contas da União:
"Portanto, para que a terceirização possa ser considerada legal, deverá o Administrador motivar suficientemente o seu ato, demonstrando que a terceirização pretendida reveste-se, efetivamente, de um contrato de prestação de serviço enquadrável nas previsões da Lei 8.666/93, sem subordinação e pessoalidade, uma vez que a Administração deseja realmente um serviço e não uma intermediação de mão-de-obra; deverá também deixar claro que não será terceirizada atividade-fim do órgão, ou entidade, e que a atividade a ser terceirizada não se insere entre as atividades próprias, típicas e fundamentais de Estado; deverá, igualmente, comprovar que a atividade a ser terceirizada não é inerente às categorias funcionais abrangidas por plano de cargos e salários do órgão ou entidade terceirizante." 1(Acórdão 593/2005 - Primeira Câmara - Número Interno do Documento AC-0593-10/05-1 Processo: 016.932/2004-7 Entidade: Delegacia Regional do Trabalho no Estado do Rio de Janeiro (DRT/RJ)- Dou 13/04/2005)
Parece-me que na distinção de atividade-fim e atividade-meio em relação à Companhia Àguas de Joinville centra-se a discussão travada nos presentes autos.
Enquanto a Consultoria entende viável que a referida Companhia terceirize os serviços de medições de consumo de água e uso do sistema de esgotamento sanitário e o processamento das informações coletadas em banco de dados informatizado, o Ministério Público, não vê a questão da mesma forma, aduzindo que não poderá ser objeto de terceirização, por exemplo, as medições de consumo de água e uso do sistema de esgotamento sanitário.
O Decreto Federal n. 2.271/97, em seu artigo 1º, fornece alguns balizamentos acerca do que pode ser considerado atividade finalística do ente, in verbis:
"Art. 1º No âmbito da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional poderão ser objeto de execução indireta as atividades materiais acessórias, instrumentais ou complementares aos assuntos que constituem área de competência legal do órgão ou entidade.
§ 1º As atividades de conservação, limpeza, segurança, vigilância, transportes, informática, copeiragem, recepção, reprografia, telecomunicações e manutenção de prédios, equipamentos e instalações serão, de preferência, objeto de execução indireta.
§ 2º Não poderão ser objeto de execução indireta as atividades inerentes às categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos do órgão ou entidade, salvo expressa disposição legal em contrário ou quando se tratar de cargo extinto, total ou parcialmente, no âmbito do quadro geral de pessoal."
Ocorre que o mencionado ato normativo é direcionado à Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional, podendo, por isso, servir apenas como orientação, mas sem o condão de regulamentar a matéria na órbita dos demais entes federativos (Estados e Municípios).
Por fim, o Enunciado n. 331 do Tribunal Superior do Trabalho tratou do tema nos seguintes moldes:
Nº 331 CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003
I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).
II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).
III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.
IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial (art. 71 da Lei nº 8.666, de 21.06.1993). grifo nosso
Como se vê, a referida súmula entendeu pela possibilidade de terceirização das atividades de vigilância, conservação e limpeza, bem como de outros serviços ligados à atividade-meio do tomador.
Considerando os termos do citado enunciado, a Procuradora Cibelly Farias, argumentou, no tocante à prestação de serviço de informática, o seguinte:
"De igual sorte, a prestação de serviços de informática também não encontra guarida nas hipóteses de exceção firmadas na jurisprudência do Enunciado 331 do TST e, somente para atividades que não tenham efetivamente nenhuma correlação com a atividade-fim da Companhia, seria possível tal contratação.
Todavia, considerando que há uma infinita gama de atividades que podem ser inseridas no conceito "serviços de informática" ou no processamento de informações coletadas em banco de dados informatizados", somente o caso concreto permitirá aferir se o serviço de informática está realmente inserido entre as atividades-meio ou entre as atividades-fim da Companhia." (fl. 23)
Considero, portanto, válida a observação da citada Procuradora, de que somente o caso concreto poderá indicar se o mencionado serviço integra ou não a atividade finalística da Companhia.
Tendo-se em conta, no entanto, que o exame da consulta não incide sobre caso concreto, não há condições de manifestação sobre esse tema neste momento.
Considerando que a lei municipal, que autorizou a constituição da Companhia, estabeleceu que o objeto social desta é explorar diretamente os serviços públicos de abastecimento de água e de esgotamento sanitário, compreendendo "I - a captação de água bruta, o tratamento, a adução, a reservação e distribuição para consumo público; e, II - a coleta de esgotos sanitários trazidos por meio de tubos e condutos, o transporte, o tratamento, o reaproveitamento e a disposição final, bem como outras soluções alternativas", o entendimento promanado da Consultoria, quanto às atividades passíveis de terceirização, apresenta-se razoável.
Segundo o citado órgão consultivo:
"Quaisquer outras ações não enumeradas taxativamente pela lei local e que não se caracterizem como serviços ou atividades relacionadas ao objeto da Companhia Águas de Joinville, como, enunciativamente, as medições de consumo de água e uso do sistema de esgotamento sanitário, o processamento das informações coletadas em banco de dados informatizado, a conservação, a limpeza e a vigilância das instalações da Companhia, entre outros, podem ser objeto de contratação via regime de terceirização.
Contudo entendemos que o lançamento tributário (faturamento), sua respectiva cobrança e arrecadação, assim como a emissão de ordens de serviço relativas à sua instalação, conserto, reparo ou corte de fornecimento dos ditos serviços não poderá ser objeto de terceirização, por envolver atividade-fim da companhia, as quais só poderão ser desempenhadas pela própria unidade." (fl. 15)
Por fim, friso que, se as atividades-fim da Companhia não podem sofrer terceirização, a admissão de pessoal para a execução dessas atribuições há de ser feita através de concurso público (art. 37, II, CF) ou através de contratação para atender necessidade temporária de excepcional interesse público (art. 37, IX, CF), autorizada, no caso, por lei municipal que trate da matéria.
Desta feita, acompanho o entendimento da Consultoria-Geral, quanto aos termos da resposta a ser oferecida ao Consulente.
2. VOTO
Pelas razões expostas e considerando o que dos autos consta VOTO, em conformidade com o parecer da Consultoria-Geral, no sentido de que o Egrégio Tribunal Pleno adote a decisão que ora submeto à sua apreciação:
6.1. Conhecer da presente Consulta por preencher os requisitos e formalidades preconizados no Regimento Interno deste Tribunal.
6.2. Responder à Consulta nos seguintes termos:
6.2.1. É possível terceirizar as atividades-meio, como, enunciativamente, as medições de consumo de água e uso do sistema de esgotamento sanitário, o processamento das informações coletadas em banco de dados informatizado, a conservação, a limpeza e a vigilância das instalações públicas, entre outros.
6.2.2. Não é possível adotar-se o regime de terceirização das atividades finalísticas do ente público.
6.2.3. Quando se tratar de companhia de águas e esgoto, não poderão ser objeto de terceirização, por exemplo, o lançamento tributário (faturamento), sua respectiva cobrança e arrecadação, assim como a emissão de ordens de serviço relativas à instalação, conserto, reparo ou corte do fornecimento dos ditos serviços, por envolver atividade-fim da companhia.
6.2.4. O Decreto Federal n. 2.271/1997 não se aplica às Administrações Estadual e Municipal, ainda que não haja regulamento próprio sobre o tema, pois a referida normativa é dirigida exclusivamente às contratações de serviços pela Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional.
6.3. Dar ciência desta Decisão, do Relatório e Voto do Relator que a fundamentam, bem como do Parecer n. COG-341/07 à Companhia Águas de Joinville e à Diretoria de Controle de Licitações e Contratações deste Tribunal.
6.4. Determinar o arquivamento dos autos.
WILSON ROGÉRIO WAN-DALL
Conselheiro Relator
Gabinete do Conselheiro, em 19 de julho de 2007.
1
Voto do Ministro Relator Augusto Sherman Cavalcanti, citando trecho do artigo "A Gestão Fiscal Responsável e a Terceirização na Administração Pública", de Leyla Bianca Correia Lima da Costa e Edite Mesquita Hupsel, publicado na seção Doutrina/Parecer/Comentários - 432/17/DEZ/2002 do Informativo de Licitações e Contratos.