Processo n°

REC 08/00655702

Unidade Gestora

Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - CASAN

Recorrente

Sr. Cezar Paulo de Luca – Diretor Presidente em Exercício da CASAN

Assunto

Recurso de Reexame (art. 80, LC nº 202/2000) do Processo n° ELC 08/00333268

Relatório n°

881/2008

 

 

1.   Relatório

               

                Trata-se de Recurso de Reexame interposto pelo Sr. Cezar Paulo de Luca, Diretor Presidente em Exercício da CASAN, em face da Decisão n° 3316/2008, exarada nos autos do Processo n° ELC 08/00333268, nos seguintes termos:

 

O TRIBUNAL PLENO, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos arts. 59 da Constituição Estadual, 1° da Lei Complementar n. 202/2000 e 8º da Instrução Normativa n. TC-05/2008, decide:

 

6.1. Declarar ilegal o Edital de Concorrência n. Edital de Concorrência n. 04/2008, de 05/03/2008, da Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - CASAN, cujo objeto é execução de serviços especializados relativos à elaboração de estudos técnicos e projetos de engenharia de sistemas de esgotos sanitários, em razão das seguintes irregularidades:

 

6.1.1. Previsão orçamentária genérica, contrariando o art. 5º, § 4º, da Lei Complementar (federal) n. 101/00 e o caput do art. 20 da Lei (federal) n. 4.320/1964 (item 2.2.1 do Relatório DLC n. 644/2008);

 

6.1.2. Objeto não preciso e indeterminado, em desacordo com o disposto no art. 40, I, da Lei (federal) n. 8.666/93 (item 2.1 do Relatório DLC/Insp.1/Div.2 n. 251/08);

 

6.1.3. Previsão de devolução de garantia de proposta condicionada a evento estranho ao licitante, caracterizando cláusula exorbitante, com ausência de amparo legal, em descumprimento do disposto no art. 31, III, c/c o art. 56, §4º, da Lei (federal) n. 8.666/93 (item 2.2.2 do Relatório DLC/Insp.2/Div.4 n. 644/2008);

 

6.1.4. Exigência de que o licitante vencedor tenha escritório ou sede em Florianópolis, circunstância impertinente ou irrelevante para o específico objeto do contrato, caracterizando cláusula exorbitante, com ausência de amparo legal, e evidenciando restrição ao competitório, inibindo a maior participação de interessados no certame, em descumprimento ao disposto no art. 3º, §1º, I, da Lei (federal) n. 8.666/93 (item 2.2.3 do Relatório DLC n. 644/2008);

 

6.1.5. Critério desproporcional de julgamento das propostas de preços, no item 17.2.2, b.4 do Edital (Fase de classificação da proposta de preços), caracterizando desigualdade e desproporcionalidade na avaliação das propostas de preços, evidenciando fator impertinente que inibe o princípio da igualdade entre os participantes, em descumprimento aos arts. 3º, § 1º, I, e 44, caput e § 1º, da Lei (federal) n. 8.666/93 (item 2.2.4.1 do Relatório DLC n. 644/2008);

 

6.1.6. Julgamento das propostas técnicas fundado em critérios subjetivos, contendo exigências impertinentes ou irrelevantes que frustram e restringem o competitório, em desacordo com o disposto no art. 3º, §1º, I, c/c os arts. 44, caput e § 1º, e 45, caput, da Lei (federal) n. 8.666/93 (item 2.2.4.2 do Relatório DLC n. 644/2008);

 

6.1.7. Exigências quanto à qualificação técnica das proponentes que podem frustrar o caráter competitivo da licitação, em desrespeito aos arts. 3º, § 1º, I, e 30, II e § 5º, da Lei (federal) n. 8.666/93 e 37, XXI, da Constituição Federal (item 2.2 do Relatório DLC n. 251/2008);

 

6.1.8. Orçamento Básico inadequado ao que se pretende adquirir, com quantitativos e preços não corretamente avaliados, em desrespeito ao art. 6º, IX, alínea "f", Lei (federal) n. 8.666/93 (item 2.3 do Relatório DLC n. 251/2008);

 

6.1.9. Previsão de apropriação do valor total da garantia contratual, pela CASAN, em caso de rescisão contratual e/ou interrupção dos trabalhos, caracterizando cláusula exorbitante e locupletamento ilícito ou sem causa, em inobservância do teor do art. 80, III, da Lei (federal) n. 8.666/93 (item 2.2.6 do Relatório DLC n. 644/2008);

 

6.1.10. Prazo contratual inicial previsto para 24 (vinte e quatro) meses, extrapolando a vigência dos créditos orçamentários, e sem demonstração de que se trata de exceções previstas nos incisos I e II do art. 57 da Lei (federal) n. 8.666/93, em descumprimento do caput do referido artigo (item 2.2.5 do Relatório DLC n. 644/2008);

 

 6.1.11. Critérios subjetivos de julgamento - exigências impertinentes ou irrelevantes que frustram e restringem o competitório - pontuação para equipe técnica, valorando o tempo de exercício profissional e número de obras, em afronta ao art. 3º, §1º, I, da Lei (federal) n. 8.666/93 (item 2.2.4.3 do Relatório DLC n. 644/2008);

 

 6.1.12. Edital, no item a.1.2, atribui até 5 (cinco) pontos ao proponente que detenha a certificação ISO 9001, circunstância impertinente ou irrelevante, que frustra e restringe o competitório, em desacordo com o disposto no art. 3º, §1º, I, da Lei (federal) n. 8.666/93 (item 2.2.4.4 do Relatório DLC n. 644/2008);

 

 6.1.13. Critério de aceitabilidade de preços sem a especificação prevista no art. 48, I e II, da Lei (federal) n. 8.666/93 (item 2.2.8 do Relatório DLC n. 644/2008).

 

 6.2. Determinar, ao Sr. Walmor Paulo de Luca - Diretor-Presidente da Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - CASAN, que promova a anulação do Edital de Concorrência n. 04/2008, com fundamento no art. 49, caput, da Lei (federal) n. 8.666/93, com observância do disposto nos §§ 1º a 3º do mesmo diploma legal, bem como encaminhe a este Tribunal cópia do ato de anulação, no prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação desta deliberação no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas.

 

6.3. Determinar à Secretaria Geral - SEG, deste Tribunal, que proceda ao acompanhamento do prazo fixado nesta deliberação.

 

6.4. Dar ciência desta Decisão, do Relatório e Voto do Relator que a fundamentam, bem como do Relatórios DLC/Insp.1/Div.2 n. 251/08 e DLC/Insp.2/Div.4 n. 644/2008, ao Sr. Walmor Paulo de Luca - Diretor-Presidente da Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - CASAN, ao Presidente da Comissão de Licitações daquela entidade, Sr. José Carlos Cativo Gedeão, e às empresas A. R. Consultoria e Saneamento Ltda., ACECON (Associação Catarinense de Engenharia Consultiva) e MPB Saneamento Ltda. por terem protocolado impugnação ao presente edital.

Objetiva, o recorrente, em síntese, a reforma da Decisão em epígrafe a fim de que o Edital de Concorrência Pública n° 04/2008 seja declarado em consonância com a lei.

A Consultoria Geral – COG – através do Parecer nº COG 985/08 sugeriu o conhecimento e desprovimento da insurgência.

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas discordou do posicionamento da Consultoria Geral, manifestando-se, por meio do Parecer nº 7678/2008, pelo conhecimento e provimento do recurso.

 

2.   Voto

 

O art. 79 da Lei Orgânica desta Corte de Contas (Lei Complementar n° 202, de 15 de dezembro de 2000) prevê as hipóteses de cabimento do Recurso de Reexame:

Art. 79. De decisão proferida em processos de fiscalização de ato e contrato e de atos sujeitos a registro, cabem Recurso de Reexame e Embargos de Declaração. (grifou-se).

Por entender que a análise prévia de Edital de Concorrência configura-se em hipótese de fiscalização de ato do Poder Público, a Consultoria Geral entendeu cabível o recurso interposto para combater a Decisão proferida nos autos n° ELC 08/00333268.

O Recurso contra Edital é medida atípica nesta Corte de Contas, mas não inédita.

Basta verificar que este Tribunal já examinou, noutras oportunidades, o cabimento de Recurso de Reexame contra Decisões exaradas em processos de análises de Editais de Concorrência. São as seguintes, a título exemplificativo: Acórdão n° 1631/2008, referente aos autos do Processo n° REC 08/00297792, Relator Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall; Decisão n° 1754/2005, Processo n° REC 05/03970875, Relator Conselheiro José Carlos Pacheco; Decisão n° 3099/2008, Processo n° REC 06/00509770, Relator Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall; Decisão n° 0399/2005, Processo n° REC 03/08104935.

Por isso, acompanhando o posicionamento da Consultoria Geral, o recurso deve ser conhecido.

No mérito, o recorrente insurge-se em relação aos seguintes aspectos da Decisão: atribuição de pontuação ao proponente que detenha certificação ISO 9001; exigência de que o licitante vencedor do certame tenha escritório ou sede em Florianópolis; prazo contratual inicial fixado em 24 (vinte e quatro) meses; existência de critérios subjetivos de julgamento e exigências de pontuação da equipe técnica conforme o tempo de exercício profissional e número de obras.

Em relação aos demais itens da Decisão, o recorrente requer sejam reiterados os argumentos expostos nas justificativas apresentadas.

Minha proposta de voto original nos presentes autos era a de conhecer o recurso e negar-lhe provimento.

No entanto, quando o presente processo já estava pautado, recebi memorial, protocolado sob n° 024820, em 12 de dezembro corrente, através do qual a empresa CASAN apresenta “Exposição de Motivos e Pedido de Pauta com Preferência”, reiterando esclarecimentos prestados nos autos e acrescentando circunstâncias e fatos supervenientes ao início do processo licitatório sub examen que me obrigam a rever a proposta de voto anterior e submeter à apreciação do Pleno as alegações referidas.

Ressalta, a Unidade, que o cenário econômico internacional foi totalmente abalado pela crise de crédito mundial, o que, conseqüentemente, refletirá na negativa de concessão de financiamentos, de modo que não resta à CASAN outra solução que não a busca de recursos provenientes do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), a fim de universalizar a prestação dos serviços de saneamento básico.

Além do problema da crise financeira internacional, lembra a Unidade a calamidade pública ocorrida no Estado de Santa Catarina em novembro do corrente ano, quando o Estado foi assolado por intensas chuvas, que causaram prejuízos aproximados em R$ 1 milhão de reais em alguns sistemas de abastecimento de água e esgotos sanitários.  Assim, argumenta que os projetos de engenharia objeto da licitação em apreço, que já eram necessários, tornaram-se emergenciais.

Dessa forma, reitera o pedido pela reforma da Decisão n° 3316/2008, para que o Edital de Concorrência Pública n° 04/2008 seja declarado em consonância com a lei.

É sabido que os negócios públicos não ficam parados aguardando a decisão do Tribunal de Contas do Estado. Depois que o Edital de Concorrência Pública n° 04/2008 foi lançado, houve verdadeira explosão de crise financeira internacional, crise esta que inevitavelmente chega ao Brasil e afeta fontes de financiamentos de obras públicas.

Além desse fato, as inundações ocorridas no nosso Estado nos últimos dias abalaram sobremaneira os sistemas de saneamento. Para isso, é preciso que se dê seguimento à licitação envolvendo os projetos de água e saneamento.

A contratação de obras sem projetos é impossível; de outro lado, mesmo em estado de calamidade pública, a lei deve ser cumprida.

Há que se considerar, também, o compromisso assumido por esta Corte de Contas em cooperar com a situação de calamidade pública instaurada no Estado de Santa Catarina.

Diante disso, entendo prudente e pertinente não julgar o Edital n° 04/2008 em consonância com a lei, mas relevar, excepcionalmente, os itens que esta Corte de Contas declarou ilegais, mediante a Decisão n° 3316/2008, e estabelecer mecanismo de monitoramento dos projetos, viabilizando-os, ante a urgência que a medida requer.               

 

Considerando todo o exposto, proponho ao egrégio plenário a seguinte decisão:

2.1. Conhecer do presente Recurso de Reexame para, no mérito, modificar a decisão n° 3316/2008, relevando, excepcionalmente, os itens que esta Corte de Contas declarou ilegais, estabelecendo mecanismo de monitoramento dos projetos, viabilizando-os, e determinar quanto aos itens abaixo relacionados da referida Decisão n° 3316/2008:

2.1.1. Previsão orçamentária genérica (item 6.1.1 da Decisão n° 3316/2008): determinar que se faça constar do orçamento de investimento da Companhia de Águas e Saneamento de Santa Catarina para 2009 sub-ação específica para cada projeto.

2.1.2. Objeto não preciso e indeterminado (item 6.1.2 da Decisão n° 3316/2008): determinar, considerando o orçamento de referência regionalizado, que a Companhia de Águas e Saneamento de Santa Catarina não ultrapasse o orçamento estimado para cada região; determinar que a Companhia de Águas e Saneamento de Santa Catarina não efetue remanejamento dos quantitativos de uma região para outra; determinar que a Companhia de Águas e Saneamento de Santa Catarina defina quais os projetos que serão elaborados quando da assinatura do contrato, observando o valor orçado para cada região.

2.1.3. Previsão de devolução de garantia de proposta condicionada a evento estranho ao licitante, caracterizando cláusula exorbitante (item 6.1.3 da Decisão n° 3316/2008): determinar à Companhia de Águas e Saneamento de Santa Catarina que após a homologação da proposta, devolva a garantia oferecida pelos proponentes não vencedores do certame.

2.1.4. Exigência que o licitante vencedor tenha escritório ou sede em Florianópolis (item 6.1.4 da Decisão n° 3316/2008): relevar, excepcionalmente, esta irregularidade, determinando à Companhia de Águas e Saneamento de Santa Catarina que em futuros Editais não faça tal exigência.

2.1.5. Critério desproporcional de julgamento das propostas de preços, no item 17.2.2, “b.4” do Edital – Fase de classificação da proposta de preços (item 6.1.5 da Decisão n° 3316/2008): determinar, quando do julgamento da proposta de preços, que a Companhia de Águas e Saneamento de Santa Catarina adote o menor preço das propostas válidas.

2.1.6. Julgamento das propostas técnicas fundado em critérios subjetivos (item 6.1.6 da Decisão n° 3316/2008): relevar, excepcionalmente, esta irregularidade, considerando que onde há técnica, há certa margem de subjetividade, determinando à Companhia de Águas e Saneamento de Santa Catarina que em futuros Editais busque eliminar ou reduzir o grau de subjetividade para julgamento das propostas técnicas.

2.1.7. Exigências quanto à qualificação técnica das proponentes que podem frustrar o caráter competitivo da licitação (item 6.1.7 da Decisão n° 3316/2008): relevar esta irregularidade, ao entendimento que os serviços compatíveis estão definidos no item 13.5.1, alíneas “a” a “e” do Edital.

2.1.8. Orçamento básico inadequado ao que se pretende adquirir, com quantitativos e preços não corretamente avaliados (item 6.1.8 da Decisão n° 3316/2008): relevar esta irregularidade, em face das considerações constantes no item 2.1.2 acima, determinando à Companhia de Águas e Saneamento de Santa Catarina que remeta os orçamentos dos projetos a serem contratados a esta Corte de Contas, para autuação de novo processo.

2.1.9. Previsão de apropriação do valor total da garantia contratual, pela CASAN, em caso de rescisão contratual e/ou interrupção dos trabalhos (item 6.1.9 da Decisão n° 3316/2008): determinar à Companhia de Águas e Saneamento de Santa Catarina a inclusão de cláusula no contrato de que a retenção da garantia se dará após o direito ao contraditório e à ampla defesa.

2.1.10. Prazo contratual inicial previsto para 24 (vinte e quatro) meses, extrapolando a vigência dos créditos orçamentários (item 6.1.10 da Decisão n° 3316/2008): sanar esta irregularidade, em razão de os projetos enquadrarem-se na exceção prevista no artigo 57, inciso I, da Lei n° 8.666/93.

2.1.11. Critérios subjetivos de julgamento - exigências impertinentes ou irrelevantes que frustram e restringem o competitório - pontuação para equipe técnica, valorando o tempo de exercício profissional e número de obras (item 6.1.11 da Decisão n° 3316/2008): relevar, excepcionalmente, esta irregularidade.

2.1.12. Previsão no Edital, no item a.1.2, de atribuição de até 5 (cinco) pontos ao proponente que detenha a certificação ISO 9001, circunstância impertinente ou irrelevante, que frustra e restringe o competitório (item 6.1.12 da Decisão n° 3316/2008): relevar, excepcionalmente, esta irregularidade.

2.1.13. Critério de aceitabilidade de preços sem a especificação prevista no art. 48, I e II, da Lei (federal) n. 8.666/93 (item 6.1.13 da Decisão n° 3316/2008): relevar, excepcionalmente, esta irregularidade.

  

 

2.2.     Dar ciência desta Decisão, do Relatório e Voto do Relator que a fundamentam, bem como do Parecer COG nº 985/08 ao Sr. Cezar Paulo de Luca, Diretor Presidente em Exercício da CASAN.

 

                 Florianópolis, 17 de dezembro de 2008.

                 

 

Conselheiro Salomão Ribas Junior

Relator