|
|
TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
Rua Bulcão Viana, 90, Centro – Florianópolis – SC
Fone: (048) 3221-3636 - Fax: (048) 3221-3645
Gabinete
da Auditora Sabrina Nunes Iocken |
||||
|
PROCESSO N. |
|
PRP 08/00719611 |
|||
|
|
|
0 |
|||
|
UNIDADE |
|
Prefeitura Municipal de Içara
|
|||
|
|
|
|
|||
|
RESPONSÁVEL |
|
Sr.
Heitor Valvassori |
|||
|
|
|
|
|||
|
ASSUNTO |
|
Reinstrução das contas prestadas pelo
Prefeito Municipal referente ao ano de 2007, por ocasião do pedido de
reapreciação formulado pelo ex-Prefeito Municipal |
|||
I – RELATÓRIO
Tratam os autos de Pedido de Reapreciação, conforme requerimento protocolado pelo Sr. Heitor Valvassori, Prefeito Municipal de Içara no exercício de 2007, em conformidade com o art. 55 da Lei Complementar n. 202/2000 e art. 93, inciso I, do Regimento Interno, interposto contra a decisão do Tribunal Pleno que em sessão de 13/10/2008, mediante Parecer Prévio n. 0166/2008 recomendou à Egrégia Câmara de Vereadores a REJEIÇÃO das contas do exercício de 2007, da Prefeitura Municipal de Içara, face às irregularidades apontadas pela instrução, em especial o déficit financeiro c/c o déficit orçamentário injustificado, em descumprimento ao princípio de caixa estabelecido nos arts. 48, “b” da Lei Federal n. 4.320/64 e 1º, § 1º da Lei Complementar Federal n. 101/2000.
A Diretoria de Controle dos Municípios
– DMU, procedeu a reapreciação das contas, em que elaborou o Relatório de
Reinstrução nº 6384/2008, fls. 07/69, cuja conclusão permaneceram as seguintes
restrições:
A) RESTRIÇÃO DE ORDEM CONSTITUCIONAL:
1 - Pagamento indevido e reajuste dos subsídios de
agente político do Executivo Municipal - Prefeito, através de Lei de iniciativa
do Poder Executivo, sem atender ao disposto nos artigos 29, V c/c 39, § 4º e
37, X, da Constituição Federal e artigo 111, VI da Constituição Estadual,
repercutindo em pagamento a maior no montante de R$ 23.202,09 (item
B.2.1, do Relatório DMU n. 6384/2008).
B) RESTRIÇÕES DE ORDEM LEGAL:
1 - Déficit de execução orçamentária do
Município (consolidado) da ordem de R$ 1.262.985,62, representando 2,38%
da receita arrecadada do Município no exercício em exame, o que equivale a 0,29
arrecadação mensal - média mensal do exercício, resultante da exclusão do
superávit orçamentário do Instituto de Previdência dos Servidores Públicos do
Município e do Fundo de Assistência à Saúde do Servidor Público Municipal, em
desacordo ao artigo 48, “b” da Lei nº 4.320/64 e artigo 1º, § 1º, da Lei
Complementar nº 101/2000 (LRF) (item A.2.1.a, deste Relatório);
2 - Déficit de execução orçamentária da
Unidade Prefeitura (orçamento centralizado) da ordem de R$ 1.645.361,96,
representando 5,26% da sua receita arrecadada no exercício em exame, o
que equivale a 0,63 arrecadação mensal - média mensal do exercício, em
desacordo ao artigo 48, “b” da Lei nº 4.320/64 e artigo 1º, § 1º, da Lei
Complementar nº 101/2000 (LRF) (item A.2.1.b);
3 - Déficit Financeiro do Município (Consolidado)
ajustado da ordem de R$ 4.480.297,29, resultante do déficit orçamentário do exercício em análise (R$
1.262.985,62), acrescido do déficit financeiro remanescente do exercício
anterior (R$ 3.386.758,94), deduzida a divergência apurada (R$ 169.447,27),
correspondendo a 7,90% da Receita Arrecadada do Município no exercício
em exame e do resultado ajustado com a exclusão do Instituto de Previdência/Assistência
à Saúde do Servidor e, tomando-se por base a arrecadação média mensal do
exercício em questão, eqüivale a 1,01 arrecadação mensal, em desacordo ao
artigo 48, “b” da Lei nº 4.320/64 e artigo 1º da Lei Complementar nº 101/2000 -
LRF (item A.4.2.2.a).
O Ministério Público junto ao Tribunal
de Contas, através do Parecer n. 3064/2009, fls. 75/77, manifesta-se no sentido
de que “permaneceram todas as irregularidades que ensejaram a prolação do
Parecer Prévio n. 0166/2008, que recomendou a rejeição das contas do Município
de Içara, não podendo, dessa forma, ser alterado o teor da Decisão n.
0166/2008.”
É o relatório.
II - CONSIDERAÇÕES
O Pedido de Reapreciação, das Contas Municipais de Içara,
se fundamenta nas justificativas de que as manifestações iniciais não tiveram
acolhimento junto ao TCE e que o déficit, seja o orçamentário ou o financeiro,
não são considerados como infração legal pelas normas de Direito Financeiro e,
mesmo, pela Contabilidade Pública, sendo, antes, situações a evitar, na medida
do possível, com a aplicação de técnicas de programação financeira. Apresenta, ainda, considerações quanto aos
restos a pagar, entendendo ser possível e legal proceder aos ajustes nos balanços
do exercício, mediante a subtração dos restos a pagar. E por fim, acrescenta
que o déficit orçamentário ajustado, correspondendo a 2,38% da Receita
Arrecadada no Município, ou a 0,29 arrecadação mensal, não é considerado
déficit elevado.
Em que pese às alegações apresentadas, cabe novamente
observação do fator determinante para a recomendação da rejeição das contas do
Município de Içara no exercício de 2007, qual seja, o déficit financeiro c/c o
déficit orçamentário injustificado, em descumprimento ao princípio do
equilíbrio de caixa estabelecido nos arts. 48, “b” da Lei n. 4.320/64 e 1º, §
1º da LC n. 101/2000.
Observa-se nos autos, fls. 17, que o Município de Içara
vem apresentando constantemente resultados deficitários, conforme quadro a
seguir transcrito:
Situação
Orçamentário e Financeira do Município nos quatro últimos exercícios:
|
|
2004 |
2005 |
2006 |
2007 |
|
Déficit
Financeiro |
(1) 2.149.191,10 |
(2) 1.408.010,04 |
(3) 3.386.758,94 |
(4) 4.480.297,29 |
|
Déficit
Orçamentário |
(1)
1.762.091,78 |
0,00 |
(3)
2.039.567,38 |
(4)
1.262.985,62 |
Fonte:
(1) – Relatório
n. 4.019/2005, itens II.1 e II.2 – PCP 05/00809461;
(2) – Relatório
n. 4.163/2006, itens A.4.2.2.a – PCP 06/00028160;
(3) - Relatório
n. 2.592/2007, itens A.2.a e A.4.2.2.a – PCP 07/00088172;
(4) – Relatório
n. 6.384/2008, itens A.2.1.a e A.4.2.2.a – PCP 08/00152719
Ressalta-se que as proposições da LRF,
no sentido de aumentar a transparência da gestão pública e melhorar o processo
de planejamento público, com o estabelecimento de limites para despesas e
endividamento, além do estabelecimento de metas para a receita, despesa e
resultados, estão alinhadas à necessidade de construção de uma cultura de
equilíbrio na administração pública, razão que, entre outras, justifica a
recomendação pela Rejeição das Contas quando apresentado um resultado
orçamentário deficitário, agravado pelo déficit financeiro, como é o caso ora
analisado.
Em relação ao cancelamento de restos a pagar, em
momento posterior ao fechamento dos demonstrativos contábeis, como sugerido
pelo Responsável, há de ser observar que os restos a pagar compreendem todas as
despesas empenhadas e não pagas até a data de encerramento do exercício
financeiro, divididas em duas categorias,
os processados e os não-processados. Pertencem ao exercício financeiro,
seguindo o que dispõe o art. 35 da Lei Federal 4.320/64, todas as despesas nele
legalmente empenhadas, não importando a qual categoria pertençam, sejam os
processados ou os não-processados.
Neste sentido, não há como prosperar o entendimento
do Gestor quanto ao procedimento de cancelamento de restos a pagar, à luz do
que dispõe o art. 37 da Lei Federal, n. 4.320/64. Conforme consta à fl. 05 dos
autos, o responsável alega que:
“o ajuste
preconizado nos dispositivos da LC 101/00 e nas cominações da Lei 10.028/00,
levam-nos a considerar que sua aplicação aos empenhos a pagar seria uma
imposição à administração, que deveria fazer os cancelamentos dos empenhos que
não possuíssem lastro financeiro para pagamento, mantendo a situação financeira
equilibrada, sem déficit ao final do exercício.”
De acordo com
o art. 50, II da LRF, “as despesas e a assunção de compromisso serão
registradas segundo o regime de competência, apurando-se, em caráter
complementar, o resultado dos fluxos financeiros pelo regime de caixa.” Do
comando legal extrai-se a obrigatoriedade do registro das despesas pelo regime
de competência, haja vista que além de seguir as normas legais para
escrituração contábil municipal, deve-se, ainda, seguir aos princípios
fundamentais de contabilidade, que entre eles está incluso o princípio da
competência, que preconiza que as despesas devem ser incluídas na apuração do
resultado do período em que ocorrerem independentemente de seu pagamento.
Com efeito, a realização de qualquer despesa pressupõe,
como requisito de legalidade, o prévio empenho conforme preceitua o art. 61 da
Lei Federal 4.320/64. Salienta-se que ao emitir uma nota de empenho o
administrador público reconhece e está criando para o Município obrigação
futura de pagamento, pendente ou não de implemento de condição. O fato de o
empenho se apresentar como resto a pagar não diminui a intenção do gestor em
realizar a despesas.
Não há como adotar o procedimento de cancelamentos
de restos a pagar tão-somente para manter a situação financeira em equilíbrio,
assim como inferiu o Responsável. Pois, tal mecanismo não atende à legalidade
nem aos princípios fundamentais que norteiam a administração pública. Trata-se
de um procedimento “de manobra” com o intuito de ocultar o resultado
orçamentário-financeiro do exercício, além de postergar uma obrigação financeira
assumida dentro daquele exercício, e que futuramente poderá ser reclamada pelo
credor e onerar o orçamento de exercícios futuros.
Ressalto, ainda, a possibilidade de se promover a
anulação do empenho das despesas que ainda não tenham gerado, mesmo que
supostamente, direito ao credor. Todavia, o cancelamento de restos a pagar só
será possível ao final do exercício seguinte à inscrição da despesa e desde que
não tenha sido efetuado o pagamento.
Apenas para enfatizar este entendimento, segue o conceito
de Restos a Pagar apresentado no Manual de Despesa Nacional, Portaria Conjunta
STN/SOF n. 3, de 2008:
No final do exercício, as despesas
orçamentárias empenhadas e não pagas serão inscritas em Restos a Pagar e
constituirão a Dívida Flutuante. Podem-se distinguir dois tipos de Restos a
Pagar, os Processados e os Não-processados.
Os Restos a Pagar Processados são aqueles
em que a despesa orçamentária percorreu os estágios de empenho e liquidação,
restando pendente, apenas, o estágio do pagamento.
Os Restos a Pagar Processados não podem ser
cancelados, tendo em vista que o fornecedor de
bens/serviços cumpriu com a obrigação de
fazer e a administração não poderá deixar de cumprir com a obrigação de pagar
sob pena de estar deixando de cumprir os Princípios da Moralidade que rege a
Administração Pública e está previsto no artigo 37 da Constituição Federal,
abaixo transcrito. O cancelamento caracteriza, inclusive, forma de
enriquecimento ilícito, conforme Parecer nº 401/2000 da Procuradoria-Geral da Fazenda
Nacional.
“Art. 37. A administração pública
direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios obedecerá aos
princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência e, também, ao seguinte:
(grifo nosso)”
Somente poderão ser inscritas em Restos a
Pagar as despesas de competência do exercício financeiro, considerando-se como
despesa liquidada aquela em que o serviço, obra ou material contratado tenha
sido prestado ou entregue e aceito pelo contratante, e não liquidada, mas de
competência do exercício, aquela em que o serviço ou material contratado tenha
sido prestado ou entregue e que se encontre, em 31 de dezembro de cada
exercício financeiro, em fase de verificação do direito adquirido pelo credor
ou quando o prazo para cumprimento da obrigação assumida pelo credor estiver
vigente.
(...)
A inscrição de despesa em Restos a Pagar
não-processados é procedida após a depuração das
despesas pela anulação de empenhos, no
exercício financeiro de sua emissão, ou seja, verificam-se quais despesas devem
ser inscritas em Restos a Pagar, anulam-se as demais e inscrevem-se os Restos a
Pagar não-processados do exercício.
(...)
A inscrição de Restos a Pagar deve observar
aos limites e condições de modo a prevenir riscos e corrigir desvios capazes de
afetar o equilíbrio das contas públicas, conforme estabelecido na Lei de
Responsabilidade Fiscal – LRF.
Cabe ainda observar, que o déficit
orçamentário está entre os fatores de rejeição das contas constantes na
Portaria n. TC 233/2003, não fazer qualquer ressalva quanto ao percentual
deficitário que poderia ser relevado.
Desta forma, não é possível atribuir
margem de relevância aos percentuais da arrecadação em relação ao déficit. A
ocorrência de déficit orçamentário, demonstra que não houve o equilíbrio entre
as contas e provável descumprimento a ação planejada da gestão fiscal, conforme
estabelece o art. 1º, § 1º da LRF. Qualquer percentual tem sua
representatividade em relação ao efetivo funcionamento da gestão pública,
principalmente se considerarmos a continuidade dos serviços prestados, ano a
ano.
Diante de todo o exposto e da evidência
de reincidência da restrição ora apontada não há razões para que a restrição seja
tolerada
III
– PROPOSTA DE VOTO
Considerando o exposto e do mais que dos autos constam, submeto
a matéria à apreciação do Egrégio Plenário, propugnando pela adoção da seguinte
PROPOSTA de VOTO:
1.
Conhecer do Pedido de Reapreciação, nos termos dos arts. 55 da Lei Complementar
n. 202/00 e 93, inciso I, do Regimento Interno, interposto contra o Parecer
Prévio n. 0166/2008, exarado na Sessão Ordinária de 13/10/2008, no Processo n.
PCP – 08/00152719, e, no mérito, negar-lhe provimento, mantendo o parecer
prévio emitido por este Tribunal, que recomendou à Egrégia Câmara Municipal a Rejeição
das contas do exercício de 2007 da Prefeitura Municipal de Içara.
2. Dar
ciência desta Decisão, do Parecer e Voto do Relator que a fundamentam, bem como
do Relatório
DMU n. 6384/2008, ao Sr. Heitor Valvassori - ex-Prefeito Municipal de Içara, e
aos Poderes Executivo e Legislativo daquele Município.
Florianópolis,
22 de julho de 2009.
Sabrina Nunes Iocken
Auditora Relatora