PARECER DIVERGENTE

 

                      MPTC/Nº. 7.450/2010

 

 

 

                                                   PROCURADOR - GERAL

                      

          MINISTÉRIO PÚBLICO

  JUNTO AO TRIBUNAL DE CONTAS


 

PARECER MPTC/Nº.

7.450/2010

PROCESSO Nº.

PCP – 10/00109205

ORIGEM

PREFEITURA MUNICIPAL DE CORDILHEIRA ALTA - SC

RESPONSÁVEL

RIBAMAR ALEXANDRE ASSONALIO – PREFEITO

ASSUNTO

PRESTAÇÃO DE CONTAS DO PREFEITO

           REFERENTE AO EXERCÍCIO DE 2009

 

 

                   

01. DO RELATÓRIO

 

O presente processo refere-se à Prestação de Contas do Prefeito, relativa ao exercício de 2009, incluso o Parecer nº 7158/2010, emitido por este Ministério Público de Contas, do qual discordo no que pertine a formação de processo apartado, referente à suposta irregularidade relativa à burla ao concurso público.

 

Discordo deste encaminhamento relativamente à gênese dos procedimentos referidos, pois os pressupostos utilizados pelo diligente Procurador que atuou no processo não existem, conforme passo a demonstrar:

 

 A premissa do representante do Parquet especial para os procedimentos anteriormente relacionados, funda-se no sentido de que existem fortes indícios de que a Unidade Gestora em epígrafe, esteja promovendo a sustentação de atividades de caráter permanente mediante a terceirização das contratações e a contratação por tempo determinado.

 

Conforme o Parecer nº. 7158/2010, as rubricas “outros serviços de terceiros pessoas físicas”, “outros serviços de terceiros – pessoa jurídica”, e a contratação por tempo determinado e terceirizada, correspondem a aproximadamente 100,28% do valor total das despesas com vencimentos e vantagens fixas dos servidores, o que nos leva ao seguinte entendimento conforme segue:

 

 

Terceirização das contratações

 

       As despesas empenhadas, liquidadas e pagas, classificadas no Elemento de Despesa 39 (Outros Serviços de Terceiros – Pessoa Jurídica), são decorrentes da prestação de serviços por pessoas jurídicas para órgãos públicos, tais como assinaturas de jornais e periódicos, tarifas (energia elétrica, água, gás e esgoto), serviços de comunicação (telefone, telex, correios, internet), locação de imóveis e equipamentos, contratação de serviços de transporte, serviços mecânicos, combustíveis, cursos especializados, bancos, softwares, serviços de programação, reparos em obras, seguros, serviços gráficos, projetos arquitetônicos, serviços elétricos, despesas com mídia (rádio), conferências e exposições, auxílio creche, vale transporte, entre outros.

 

    De plano, pois, TODAS estas despesas devem ser excluídas do cálculo que resultou no índice de “100,28%” por não configurarem, de forma alguma, burla ao concurso público, tendo em vista a natureza das despesas empenhadas conforme anteriormente visto.

 

Em relação às despesas empenhadas, liquidadas e pagas na rubrica “outros serviços de terceiros – pessoa física”, mesmo que possam referir-se a atividades de caráter permanente (o que pode não corresponder à realidade dos fatos), não configuram valor expressivo capaz de ensejar a suposta irregularidade.

 

Vale ressaltar que, quando afirmamos que às despesas com “outros serviços de terceiros – pessoa física” não configuram valor expressivo, não estamos menosprezando, por exemplo, a grave irregularidade de contratações que burlam o concurso público, já que, como o próprio colega Ministerial afirmou, não se tratam de valores absolutos, e sim, da natureza da irregularidade.

 

Fazemos menção a valores percentuais, simplesmente porque é o parâmetro usado para ensejar a desconfiança em relação às contratações, que utiliza o elevadíssimo percentual de contratações temporárias e terceirizadas em relação ao montante gasto com vencimentos e vantagens fixas dos servidores, para sustentar a possível irregularidade.  No entanto, conforme raciocínio acima exposto, sabemos que este “elevado” percentual, não pode ser levado em consideração. 

 

Não restam duvidas de que, despesas com locação de imóveis, serviços elétricos, serviços de comunicação (telefone, telex, correios, internet), e até mesmo gasto com combustíveis, por exemplo, não podem gerar desconfiança em relação a contratações ilegais.

 

Isto posto, o que estamos querendo dizer, é que o montante de despesas em “outros serviços de terceiros – pessoa física”, não é relevante a ponto de ensejar à apuração de “eventual” irregularidade em relação a burla ao concurso público.

 

Contratações por tempo determinado:

 

Ressaltamos que essas espécies de contratação possuem previsão constitucional por meio do artigo 37, inciso IX, e amparo legal para sua contabilização, disposta no artigo 18, § 1º da Lei nº. 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal).

 

Existem situações que legitimam o ingresso no serviço público sem a realização de concurso público de provas e títulos. Podemos citar como exemplo, a urgência na contratação de pessoal, devidamente justificada, sob pena de estar violando a regra geral de ingresso no serviço público que é o concurso público.

 

Desta forma, reiteramos o entendimento de que, não há condições nos autos de afirmar que existem “consistentes indícios” de irregularidade nas contratações por tempo determinado, apenas levando-se em consideração um valor percentual.

 

Desde que atendidos os citados pressupostos, nada impede a realização destas contratações pelo Município, mormente nas áreas de saúde e educação.

 

Por certo, não há como afirmar que todas as contratações temporárias acima demonstradas tem amparo legal.  Não é isso que queremos dizer, até porque, não temos como.  Mas, por outro lado, afirmar que algumas delas “podem” estar burlando o concurso público por se tratarem de atividades permanentes, e em razão desta desconfiança formar autos apartados, não é razoável.

 

Até porque os métodos e procedimentos utilizados na análise levada a efeito pela DMU, neste processo, não possuem como objetivo a persecução desta suposta irregularidade, tanto que a própria DMU nem faz menção a este aspecto.  Por certo, irregularidades desta natureza não dizem respeito à Prestação de Contas do Prefeito pois tratam-se de atos de gestão do mandatário municipal.

     

      O Prefeito Municipal assume funções políticas e administrativas, e que são tratadas em processos distintos. Desta forma, entende-se que o presente Parecer Prévio tem por objeto a apreciação geral e fundamentada da gestão orçamentária, patrimonial e financeira do exercício, e não envolve o exame de responsabilidade dos gestores, conforme preceitua o artigo 48 da Lei Complementar nº. 202/2000:

 

Art. 48 - O parecer prévio  do  Tribunal consistirá  em  apreciação  geral e fundamentada da gestão orçamentária, patrimonial e financeira havida no exercício, devendo demonstrar se o Balanço Geral do Estado representa adequadamente a posição financeira, orçamentária e patrimonial do Estado em 31 de dezembro, bem como se as operações estão de acordo com os princípios fundamentais de contabilidade aplicados à administração pública, concluindo por recomendar a aprovação ou a rejeição das contas.
 
§ 1º - A elaboração do parecer prévio não envolve o exame de responsabilidade dos administradores e demais responsáveis de unidades gestoras, por dinheiros, bens e valores, cujas contas serão objeto de julgamento pelo Tribunal.

 

      

Sendo assim, resta evidente que o questionamento relacionado a despesas supostamente exorbitantes com a contratação por tempo determinado, configura como ato de gestão, ou seja, não faz parte do rol de análises para efeito de Parecer Prévio, razão pela qual, entendo não serem pertinentes neste momento.  

 

    Em consonância com esse posicionamento o Acórdão exarado pelo Superior Tribunal de Justiça no Processo RMS 11060, publicado em 16/09/2002, que decidiu:

 

“... O conteúdo das contas globais prestadas pelo Chefe do Executivo é diverso do conteúdo das contas dos administradores e gestores de recurso público. As primeiras demonstram o retrato da situação das finanças da unidade federativa (União, Estados, DF e Municípios).
Revelam o cumprir do orçamento, dos planos de governo, dos programas governamentais, demonstram os níveis de endividamento, o atender aos limites de gasto mínimo e máximo previstos no ordenamento para saúde, educação, gastos com pessoal. Consubstanciam-se, enfim, nos Balanços Gerais prescritos pela Lei 4.320/64. Por isso, é que se submetem ao parecer prévio do Tribunal de Contas e ao julgamento pelo Parlamento (art. 71, I c./c. 49, IX da CF/88).
As segundas – contas de administradores e gestores públicos, dizem respeito ao dever de prestar (contas) de todos aqueles que lidam com recursos públicos, captam receitas, ordenam despesas (art. 70, parágrafo único da CF/88). Submetem-se a julgamento direto pelos Tribunais de Contas, podendo gerar imputação de débito e multa (art. 71, II e  § 3º da CF/88).
Destarte, se o Prefeito Municipal assume a dupla função, política e administrativa, respectivamente, a tarefa de executar orçamento e o encargo de captar receitas e ordenar despesas, submete-se a duplo julgamento. Um político perante o Parlamento precedido de parecer prévio; o outro técnico a cargo da Corte de Contas.”

 

 
 

  Em relação à impropriedade do pedido de autos apartados:

 

É evidente que durante a análise, verificando-se “irregularidades” de atos de gestão praticados pelo Prefeito, há previsão taxativa da formação de autos apartados, esta não é novidade no âmbito do Tribunal de Contas, conforme prevê o §1º, do artigo 5º da Portaria TC 233/2003:

 
 
(...)
§1º: Verificadas irregularidades consideradas relevantes no exame de contas anuais, decorrentes de atos de gestão, será determinada a formação de autos apartados com o objetivo de:   (grifo nosso)
 

O parágrafo acima transcrito é claro, quando diz “verificadas irregularidades. No entanto, neste processo não foram verificadas irregularidades em relação às contratações, e sim, meros indícios de supostas irregularidades, e pior, sustentados por elevados percentuais que não condizem com a realidade, como é o caso da inclusão do elemento 39.

 

Ademais, no mesmo sentido também o § 2º, artigo 85 do Regimento Interno do Tribunal de Contas, a qual determina, de plano, a formação de autos apartados quando “verificadas irregularidades”, sem análise preliminar da existência ou não da suposta irregularidade.

 

Art. 85. O parecer prévio do Tribunal consistirá em apreciação geral e fundamentada da gestão orçamentária, patrimonial, financeira e fiscal havida no exercício, devendo demonstrar se o Balanço Geral representa adequadamente a posição financeira, orçamentária e patrimonial do Município em 31 de dezembro, bem como se as operações estão de acordo
com os princípios fundamentais de contabilidade aplicados à administração pública Municipal, concluindo pela aprovação ou não das contas.
 
§ 1º No parecer prévio não serão apreciados os atos de gestão do Prefeito Municipal, do Presidente de Câmara Municipal e demais responsáveis de unidades gestoras por dinheiro, bens e valores, os quais ficam sujeitos ao julgamento do Tribunal de Contas.
§ 2º Verificadas, no exame de contas anuais, irregularidades decorrentes de atos de gestão sujeitos a julgamento do Tribunal, será determinada a formação de processo apartado com o objetivo de: (Grifo nosso)
 
I - quantificar o dano e imputar o débito ao responsável se verificada irregularidade de que resulte prejuízo ao erário;
 
II – determinar a adoção de providências com vistas a sanar as impropriedades de atos passíveis de correção;
 
III – aplicar multas por infração à norma legal ou regulamentar de natureza orçamentária, financeira, operacional e patrimonial, se for o caso.

Na verdade, os autos apartados tem como objetivos, dispostos nos incisos I, II e III, a quantificação do dano,  a identificação os autores, a aplicação de multas e a adoção providências para sanar as impropriedades.

 

Cita-se como exemplo de irregularidades aptas à formação de autos apartados, as referentes ao descumprimento do artigo 42 da Lei de Responsabilidade Fiscal, e o elevado Déficit Financeiro da Unidade Prefeitura.  Estas são irregularidades constantes “nos autos”, comprovadamente elencadas na conclusão do relatório técnico da DMU. 

 

Não cabe ao processo gerado da formação de autos apartados verificar se houve irregularidade, ela já deve estar configurada, legitimando o próprio processo.  Cabe a ele tão somente quantificar os danos, imputar débito e multa ao responsável, se for o caso, ou adotar providências para sanar as restrições.

 

Desta forma, a formação de autos apartados não tem a finalidade de verificar indícios de suposta irregularidade, e sim, de adotar providências, somente quando já constatada a irregularidade nos autos, razão pela qual, é indevida por parte do Tgribunal de Contas, a sua formação com meros indícios.

 

Por último, cabe lembrar que o Tribunal de Contas pretende criar um processo denominado “PCA – Prestação de Contas de Administrador”, processo este, que justamente deverá investigar os atos de gestão do Prefeito e colher elementos de prova e de autoria, quando verificados apenas indícios de irregularidades.

 

 

CONCLUSÃO

 

Vale ressaltar que o presente entendimento já foi exarado quando da apreciação das Contas de Prefeitos dos exercícios de 2007, 2008 e diversos de 2009, sendo que todos os Excelentíssimos Conselheiros votaram no sentido de acolher o entendimento ora manifestado .

 

Diante do exposto, não vislumbro as condições objetivas exigidas pelo Regimento Interno do Tribunal de Contas para sustentar a formação de autos apartados (item 3), como opinado anteriormente no Parecer nº 7158/2010, motivo pelo qual, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, representado por seu Procurador-Geral, manifesta-se de acordo com o Parecer antes referido, com exceção do impertinente pedido de formação de autos apartados.

        

     É o Parecer.

 

                               

                               Florianópolis, 3 de dezembro de 2010.

     

 

 

 

 

 

 

                           Mauro André Flores Pedrozo

                                                                   Procurador-Geral

                                                      Ministério Público junto ao Tribunal de Contas