Parecer no:

 

MPTC/12.187/2012

                       

 

 

Processo nº:

 

RLI 11/00033499

 

 

 

Origem:

 

Prefeitura Municipal de Anita Garibaldi

 

 

 

Assunto:

 

Ausência de elaboração do Parecer do Conselho do FUNDEB.

           

Trata-se formação de processos apartados decorrentes da Prestação de Contas do Prefeito do Município de Anita Garibaldi (PCA 10/00149681), para apurar a ausência de elaboração do Parecer do Conselho do FUNDEB, a ausência de comprovação de aplicação de recursos e o repasse de recursos do Poder Executivo ao Legislativo, superior ao limite máximo de 8%.

A Diretoria de Controle dos Municípios – DMU, concluiu por (fls. 68):

1 CONSIDERAR IRREGULARES, na forma do artigo 36, §2º, “a” da Lei Complementar n.º 202/2000, os atos abaixo relacionados, aplicando ao Sr. Roberto Marin – Prefeito Municipal (Gestão 2009/2012), CPF 385.970.129-00, residente à Praça Paulino Ganzotto, nº 20, Anita Garibaldi/SC, CEP 88590-000, multas previstas no artigo 70, inciso II, da Lei Complementar nº 202/2000, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias a contar da publicação do acórdão no Diário Oficial do Estado para comprovar ao Tribunal o recolhimento da multa ao Tesouro do Estado, sem o que fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos artigos 43, II e 71 da Lei Complementar n.º 202/2000.

1.1            Ausência de comprovação, por intermédio das informações remetidas através do Sistema e-Sfinge, da aplicação de R$ 35.193,24 dos recursos oriundos do FUNDEB na manutenção e desenvolvimento do ensino básico, em afronta ao disposto no caput do art. 21 da Lei Federal n. 11.494/2007 (item 1.1.1.1, deste Relatório)

1.2            Repasse do Poder Executivo ao Poder Legislativo, a título de duodécimos, no montante de R$ 559.700,00, correspondendo a 8,57% das receitas tributárias e das transferências previstas no §5º do art. 153 e nos arts. 158 e 159 da CF, efetivamente realizada no exercício anterior, quando o limite máximo de 8% a ser repassado seria da ordem de R$ 522.406,89, portanto, em valor a MAIOR de R$ 37.293,11, contrariando o previsto no artigo 29-A, § 2º, inciso I da CF (item 1.2.1.1);

1.3            Ausência da elaboração do Parecer do Conselho do FUNDEB, em desacordo com o artigo 27, parágrafo único, da Lei nº 11.494/2007 (item 2.1)

2 – DAR CIÊNCIA da decisão com remessa de cópia do Relatório de Reinstrução n.º 537/2012 e do Voto que a fundamentam ao responsável/interessado Sr. Roberto Marin, atual Prefeito Municipal de Anita Garibaldi.

É o sucinto relatório.

A matéria trazida aos autos está inserida entre aquelas cuja competência para fiscalizar foi atribuída constitucionalmente ao Tribunal de Contas.

O tema relacionado à ausência da elaboração do Parecer do Conselho do FUNDEB foi acolhido no exame das contas apresentadas pelo Prefeito Municipal de Anita Garibaldi, relativas ao exercício de 2009, cuja relatoria esteve sob o encargo do eminente Conselheiro César Filomeno Flores.

 

1-              Ausência de comprovação, por intermédio das informações remetidas através do Sistema e-Sfinge, da aplicação de R$ 35.193,24 dos recursos oriundos do FUNDEB na manutenção e desenvolvimento do ensino básico

 

Sobre o tema, apontou o Corpo Técnico (fls. 63):

Apurou-se no demonstrativo [...] o montante de R$ 58.694,85 de recursos do FUNDEB que não foram utilizados no exercício, contudo, conforme consta no Sistema e-Sfinge (Anexo 5) a conta corrente do FUNDEB (Banco do Brasil c/c nº 16.402-X) ao final do exercício registra um saldo de R$ 13.501,61, ou seja, inexiste relação de igualdade entre o saldo bancário e o montante não utilizado, evidenciando-se, desta forma, recursos do FUNDEB no valor de R$ 35.193,24 sem a devida comprovação de que tenham sido efetivamente aplicados na manutenção e desenvolvimento do ensino básico, em desacordo ao caput do art. 21 da Lei n. 11.494/2007 [...]

Chamado a se manifestar, alegou o Responsável (fl. 63)

Anexamos cópia da conciliação bancária e extrato da conta 16.402-X do Banco do Brasil. Nele constamos (sic) que o saldo é de R$ 25.173,61, menos os cheques em conciliação R$ 11.672,00, temos nessa conta o saldo final em R$ 13.501,61.

Concluiu o Corpo Técnico, então, que os documentos apresentados pelo Responsável não comprovam a aplicação no valor de R$ 35.193,24 dos recursos oriundos do FUNDEB. Por isso, mantiveram a restrição.

Os recursos do FUNDEB são destinados à manutenção e ao desenvolvimento da educação básica pública e à valorização dos trabalhadores em educação, incluindo sua condigna remuneração, observado o disposto na Lei 11.494/07, que o regulamenta.

Dispõe a Lei 11.494/07 em seu artigo 27:

Art. 27.  Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios prestarão contas dos recursos dos Fundos conforme os procedimentos adotados pelos Tribunais de Contas competentes, observada a regulamentação aplicável.

Ocorre que ao analisar a documentação referente à prestação de contas do FUNDEB na Prefeitura Municipal de Anita Garibaldi, não foi possível observar a comprovação da aplicação na educação do saldo resultante da diferença entre os recursos apresentados no demonstrativo e os constantes na conta do fundo.

A não aplicação dos recursos destinados à educação fere a garantia constitucional ao acesso à educação, estabelecida no artigo 205, e a previsão de investimento em educação constante no artigo 212:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

[...]

Art. 212. A União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino.

Assim, acompanho o entendimento técnico em considerar irregular a ausência de comprovação, por intermédio das informações remetidas através do Sistema e-Sfinge, da aplicação de R$ 35.193,24 dos recursos oriundos do FUNDEB na manutenção e desenvolvimento do ensino básico, em contrariedade à Lei 11.494/07 e aos artigos 205 e 212 da Constituição Federal.

 

2-              Repasse do Poder Executivo ao Poder Legislativo, a título de duodécimos, no montante de R$ 559.700,00, correspondendo a 8,57%, quando o limite máximo de 8% a ser repassado seria da ordem de R$ 522.406,89

 

Sobre o ponto, manifestou-se a Instrução Técnica (fl. 64):

O montante da despesa do Poder Legislativo foi da ordem de R$ 543.435,04, representando 8,32% da receita tributária do Município, e das transferências previstas no § 5º do artigo 153, e artigos 158 e 159 da CF, arrecadadas no exercício de 2008 (R$ 6.530.086,14). Dessa forma, fica evidenciado que o Poder Legislativo DESCUMPRIU o limite de 8,00% (referentes ao seus 9.299 habitantes, segundo dados divulgados pelo IBGE – estimativa de 2008), conforme estabelecido no artigo 29-A da Constituição Federal.

[...]

Conforme registrado no Balanço Financeiro – Anexo 13 da Prestação de Contas (PCA 10/00219990) da Câmara Municipal, durante o exercício de 2009, a Prefeitura Municipal passou ao Poder Legislativo duodécimos a título de “Transferências Financeiras” no montante de R$ 559.700,00. Porém, considerando a receita tributária do Município, e as transferências previstas no § 5º do artigo 153, e artigos 158 e 159 da CF, arrecadadas no exercício de 2008 (R$ 6.530.086,14), o valor máximo a ser repassado seria de R$ 553.348,43.

Apresentou o Responsável as seguintes justificativas (fl. 65):

Ao final do exercício, houve um pedido de socorro formulado pela Mesa Diretora da Câmara de Vereadores devidamente aprovada em plenário, solicitando repasse de recursos superiores ao limite constitucional de até 8% da receita tributária e transferências constitucionais.

Essa situação fora criada pela gestão anterior no Poder Legislativo, quando fixou pra a remuneração dos agentes políticos, valores completamente fora da realidade financeira do município.

Na fixação dos valores de remuneração para os agente políticos, concederam aumentos que certamente não serão suportados ainda no próximo exercício, talvez até o final dessa legislatura.

Verificando a inviabilidade no cumprimento aos compromissos sobre a mesa, os vereadores vieram ao Prefeito solicitando a compreensão e o apoio financeiro para encerramento do movimento orçamentário-financeiro na Câmara.

[...]

Entendemos seja bastante desconfortável nossa situação frene a fatos estranhos a nossa vontade. Apenas estamos tentando resolver da melhor forma possível essa equação.

Enquanto a receita cresceu em torno de 10% ao ano, remuneração do vereador saltou de R$ 1.549,83 para 2.356,00, equivalendo a mais de 52%.

Entendeu o Corpo Técnico na reinstrução que o Responsável reconheceu que o repasse de recursos foi superior ao permitido pela Constituição Federal.

Assim, mesmo estando consciente dos relevantes motivos para não efetuar os repasses, ainda assim o fez, o que ocasionou o descumprimento do limite constitucional (fl. 66), motivo pelo qual o apontamento foi mantido.

Extrai-se do artigo 29-A do texto constitucional:

Art. 29-A. O total da despesa do Poder Legislativo Municipal, incluídos os subsídios dos Vereadores e excluídos os gastos com inativos, não poderá ultrapassar os seguintes percentuais, relativos ao somatório da receita tributária e das transferências previstas no § 5o do art. 153 e nos arts. 158 e 159, efetivamente realizado no exercício anterior:

I - oito por cento para Municípios com população de até cem mil habitantes; (grifou-se)

O ato, como visto, além de ter sido apurado pela Instrução Técnica, foi comprovado pelo Responsável. Tratando-se de claro descumprimento constitucional por parte da gestão do Município de Anita Garibaldi.

Por isso, acompanho o entendimento técnico em considerar irregular o repasse do Poder Executivo ao Poder Legislativo, a título de duodécimos de valor superior ao limite máximo constitucional de 8%, contrariando o disposto no artigo 29-A da Constituição Federal.

 

3-              Ausência da elaboração do Parecer do Conselho do FUNDEB

 

Na análise da documentação referente às contas do FUNDEB, não foi encontrado o parecer do Conselho. (fl. 66)

Sobre o assunto, manifestou-se o responsável:

Anexamos cópia de ata de reunião do conselho de acompanhamento e avaliação do Fundeb, contemplando a aprovação da prestação de contas dos recursos em manutenção da educação.

Concluiu-se, então, na Reinstrução Técnica:

A Unidade enviou a ata nº 004/2010 (fl.26) porém não se constatou a remessa do parecer do Conselho do Fundeb.

Importante trazer o significado de ata e parecer. Segundo o Dicionário Aurélio, ata significa ‘registro escrito no qual se relata o que se passou numa sessão, convenção, congresso, etc.’ enquanto parecer é a ‘opinião fundamentada sobre determinado assunto, emitida por especialista’.

Desse modo, o envio da ata não substitui a remessa do parecer [...].

Dispõe a Lei 11.494/07 que regulamenta o FUNDEB:

Art. 27.  Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios prestarão contas dos recursos dos Fundos conforme os procedimentos adotados pelos Tribunais de Contas competentes, observada a regulamentação aplicável.

Parágrafo único.  As prestações de contas serão instruídas com parecer do conselho responsável, que deverá ser apresentado ao Poder Executivo respectivo em até 30 (trinta) dias antes do vencimento do prazo para a apresentação da prestação de contas prevista no caput deste artigo.

Como visto, o único documento apresentado pelo Responsável foi a ata da reunião dos membros do Conselho e acompanhamento do FUNDEB que, na ocasião, aprovaram a prestação de contas do exercício de 2009. (fl. 26) No entanto, como bem observou o relatório técnico, tal documento não substitui o parecer exigido na legislação.

Destarte, acompanho o entendimento técnico, em considerar irregular a ausência da elaboração do Parecer do Conselho do FUNDEB, em contrariedade ao disposto no artigo 27, parágrafo único da Lei 11.494/07.

 

Ante o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II da Lei Complementar 202/2000, manifesta-se:

1)              pelo conhecimento da Inspeção referente a Registros Contábeis e Execução Orçamentária realizada nos registros da Prefeitura Municipal de Anita Garibaldi, referente ao exercício de 2009, para nos termos do art. 36, § 2º, “a” da Lei Complementar nº 202/2000;

2)              em considerar irregulares os seguintes atos praticados:

2.1)         ausência de comprovação, por intermédio das informações remetidas através do Sistema e-Sfinge, da aplicação de R$ 35.193,24 dos recursos oriundos do FUNDEB na manutenção e desenvolvimento do ensino básico, em contrariedade à Lei 11.494/07 e aos artigos 205 e 212 da Constituição Federal;

2.2)         repasse do Poder Executivo ao Poder Legislativo, a título de duodécimos, de valor superior ao limite máximo constitucional de 8%, contrariando o disposto no artigo 29-A da Constituição Federal;

2.3)         ausência da elaboração do Parecer do Conselho do FUNDEB, em contrariedade ao disposto no artigo 27, parágrafo único da Lei 11.494/07.

3)              pela aplicação de multa Sr. Roberto Marin, atual Prefeito Municipal de Anita Garibaldi, nos termos do art. 70, II da Lei Complementar 202/2000 c/c o art. 109, II, do Regimento Interno, em virtude das irregularidades supracitadas;

4)              pela comunicação do acórdão, relatório e voto ao Responsável.

 

Florianópolis, 15 de agosto de 2012.

 

Diogo Roberto Ringenberg

Procurador do Ministério

Público de Contas