PARECER nº:

MPTC/17497/2013

PROCESSO nº:

PCR 08/00460294    

ORIGEM:

Fundo Estadual de Incentivo ao Turismo - FUNTURISMO

INTERESSADO:

 

ASSUNTO:

Referente ao NEs  77/2005, item 335043, no valor de R$ 20.000,00,  e 6/2006, item 335043, no valor de R$ 22.000,00 repassados ao Movimento Tradicionalista Gaúcho.

 

1 . DO PROCESSO

 

Para exame e parecer desta Procuradoria, os autos do processo epigrafado que versa sobre Prestação de Contas de Recursos Repassados ao Movimento Tradicionalista Gaúcho do Estado de Santa Catarina.

Em cumprimento ao que determina a Constituição Estadual em seu art.58 e 59, na Lei Complementar nº 202/00, art. 106, III e o Regimento Interno desse Tribunal (Resolução TC-06/01), a Diretoria de Controle da Administração Estadual, realizou auditoria na Prestação de Contas de Recursos Antecipados da Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte.

 

2. DA INSTRUÇÃO

 

Após tramitação dos presentes autos em todas as suas fases preliminares no Tribunal de Contas, incluindo análise dos órgãos técnicos, juntada de documentos e/os esclarecimentos, a Diretoria de Controle da Administração Estadual, elaborou o Relatório nº 163/2013, fls. 182-190, e ao final, sugere ao Relator em seu Voto propugne ao Tribunal Pleno para:

3.1 Julgar irregulares, com imputação de débito, na forma do art. 18, III, “b” e “c”, c/c o art. 21, caput, da Lei Complementar nº 202/00, as contas de recursos transferidos para Movimento Tradicionalista Gaúcho de Santa Catarina, no montante de R$ 42.000,00 (quarenta e dois mil reais), referente às Notas de Empenho: nº 77/000, de 09/12/2005, no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) e nº 6/000, de 20/01/2006, no valor de R$ 22.000,00 (vinte e dois mil reais).

3.2 Condenar solidariamente os responsáveis – Édio Schweitzer, responsável pela Entidade Movimento Tradicionalista Gaúcho de Santa Catarina, CPF 179.281.259-00, residente na Avenida Bom Jesus de Nazaré, nº 295, Bairro Aririú, Palhoça/SC, CEP 88.135-100, Movimento Tradicionalista Gaúcho de Santa Catarina, CNPJ 75.439.125/0001-11, estabelecida na Avenida Luis de Camões, nº 1842, Bairro Conta Dinheiro, Cidade Lages, CEP  88.520-000 e Sr. Gilmar Knaesel, inscrito no CPF sob o nº 341.808.509-15, por meio de sua procuradora constituída, Dra. Fabiana Bona, com endereço profissional na Rua Dr. Jorge Luz Fontes, nº 310, sala 117, Bairro Centro, Florianópolis/SC, CEP 88.020-900 (fls. 883-884), ao recolhimento da quantia de R$ 41.615,44 (quarenta e um mil, seiscentos e quinze reais e quarenta e quatro centavos), considerando as devoluções de fls. 137 e 138, como forma de ressarcimento dos recursos utilizados em desacordo com o objeto do projeto, conforme segue:

3.2.1 De responsabilidade do Sr. Édio Schweitzer e da pessoa jurídica Movimento Tradicionalista Gaúcho de Santa Catarina:

3.2.1.1 R$ 41.615,44 (quarenta e um mil, seiscentos e quinze reais e quarenta e quatro centavos), pela ausência da comprovação da regular destinação dos recursos públicos, em face da não demonstração da efetiva execução do objeto, e da apresentação de documentos fiscais que não permitem atestar e verificar a efetiva aquisição das mercadorias, da prestação dos serviços, contrariando a Lei Complementar nº 284/05, art. 140, à época em vigor, Decreto Estadual nº 3.115/05, art. 21, §§ 1º e 2º, antes vigente e Resolução nº TC-16/94, arts. 49, 52 e 65, conforme item 2.2.1 do Relatório de Instrução nº 00632/2012;

3.2.2 De responsabilidade do Sr. Gilmar Knaesel, conforme apontado no item 3.2.1 supra, em face:

3.3.2.1 da liberação de recursos sem comprovação de prévia captação junto às empresas contribuintes do ICMS, em afronta ao disposto no art. 37 da Constituição da República Federativa do Brasil e aos arts. 31, § 1º e 32, do Decreto Estadual nº. 3.115/05 (subitem 2.1.1 deste relatório);

3.2.2.2 da ausência do Contrato/Termo de Convênio ou outro instrumento de ajuste na apresentação da prestação de contas, em desacordo com o disposto no art. 60, parágrafo único e art. 116, ambos, da Lei Federal nº 8.666/93, e art. 16, § 3º, do Decreto Estadual nº. 3.115/05 (subitem 2.1.2 deste relatório);

3.2.2.3 da ausência de parecer do Conselho Estadual de Turismo, contrariando o previsto no art. 11, II e art. 20, ambos, do Decreto Estadual nº. 3.115/05 (subitem 2.1.3 deste relatório).

3.3 Aplicar ao Sr. Édio Schweitzer, à pessoa jurídica Movimento Tradicionalista Gaúcho de Santa Catarina e ao Sr. Gilmar Knaesel, já qualificados, multa proporcional aos danos constantes do item 3.2 desta Conclusão, prevista no artigo 68 da Lei Complementar n.º 202/00, fixando-lhes o prazo de 30 (trinta) dias a contar da publicação do Acórdão no DOTC-e, para comprovarem perante este Tribunal o recolhimento dos valores ao Tesouro do Estado, sem o que fica, desde logo, autorizado o encaminhamento de peças processuais ao Ministério Público junto ao Tribunal de Contas para que adote providências à efetivação da execução da decisão definitiva (art. 43, II e 71 da Lei Complementar nº 202/00).

3.5 Declarar o Movimento Tradicionalista Gaúcho de Santa Catarina e o Sr. Édio Schweitzer, impedidos de receber novos recursos do Erário até a regularização do presente processo, consoante dispõe o art. 5º, alínea “c”, da Lei Estadual nº 5.867/81.

3.6 Dar ciência deste Relatório ao Movimento Tradicionalista Gaúcho de Santa Catarina, ao Sr. Édio Schweitzer, ao Sr. Gilmar Knaesel, e ao Fundo Estadual de Turismo - FUNTURISMO.

 

 

3 . DO MINISTÉRIO PÚBLICO JUNTO AO TRIBUNAL DE CONTAS

Este Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, ao analisar os documentos que compõe o presente feito, passa a se manifestar.

Após análise de toda a documentação dos autos e consoante informa o relatório técnico nº 163/2013, fls. 182-190, tem-se que as impropriedades anteriormente apontadas não foram saneadas conforme noticia os autos.

Entretanto, acompanho o entendimento dispendido pela Área Técnica, pelo não saneamento das irregularidades descritas nos itens 3.2.1.1, do referido relatório, uma vez que as alegações de defesa apresentada, não foram suficientes para elidi-la.

No que tange a sugestão do Corpo Técnico em condenar solidariamente o Sr. Gilmar Knaesel ao pagamento da quantia de R$ 41.615,44 (quarenta e um mil, seiscentos e quinze reais e quarenta e quatro centavos), em face da liberação de recursos sem comprovação de prévia captação junto às empresas contribuintes do ICMS, ausência do Contrato/Termo de Convênio ou outro instrumento de ajuste na apresentação da prestação de contas e da ausência de parecer do Conselho Estadual de Turismo, peço vênia para externar posicionamento diverso da Instrução.

Primeiramente há que se ressaltar que de acordo com o art. 265 do Código Civil a solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes.

Em sede de Tomada de Contas Especial, o Fundamento jurídico para o reconhecimento da responsabilidade solidária do administrador público perante a administração, no âmbito do Tribunal de Contas, está prevista no artigo 10 da Lei Complementar nº 202/2000, in verbis:

Art. 10. A autoridade administrativa competente, sob pena de responsabilidade solidária, deverá imediatamente adotar providências com vistas à instauração de tomada de contas especial para apuração de fatos, identificação dos responsáveis e quantificação do dano, quando não forem prestadas as contas ou quando ocorrer desfalque, desvio de dinheiro, bens ou valores públicos, ou ainda se caracterizada a prática de qualquer ato ilegal, ilegítimo ou antieconômico de que resulte prejuízo ao erário.

Considerando que não há lei em sentido estrito a sustentar a solidariedade apregoada pela Instrução Técnica, entende-se que tal sanção não tem aplicabilidade ao mencionado como sujeito a ela, qual seja: o administrador.

Ademais, não se evidencia, pois, qualquer dano ao erário que justifique a sanção de ressarcimento, máxime porque não se apercebe conduta (omissa ou comissiva) que traduza, propriamente, qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida, importando enriquecimento ilícito do Sr. Gilmar Kanaesel. Cabe registrar que a jurisprudência não condena a inércia, inexperiência ou ingenuidade, do gestor público, haja vista que o que caracteriza o ato ilícito é a má-fé, o dolo ou a culpa, a contrariedade a lei e a mora por parte do agente.

O Gestor Público responde civilmente por seus atos funcionais no caso de praticá-los com má-fé, dolo ou culpa manifesta, abuso ou desvio de poder.

Sobre a má-fé, ensejadora da responsabilidade civil do Agente Público, destaco a lição do renomado HELY LOPES DE MEIRELLES:

... o ato praticado por uma autoridade, principalmente em matéria que depende de julgamento, embora reconhecido ilegítimo pelos Tribunais, se não se macula de má-fé, de corrupção, de culpa de maior monta, não deve acarretar a responsabilidade pessoal da autoridade" (Direito Municipal Brasileiro, 10ª edição, Malheiros Editores, p. 610).

A má-fé, conforme ressaltado pelo ilustre administrativista, é premissa do ato ilegal e ímprobo e a ilegalidade só adquire o status de improbidade quando a conduta antijurídica fere os princípios constitucionais da Administração Pública coadjuvados pela má-intenção do administrador.

Conforme salientado acima, a caracterização do dever de indenizar pressupõe a existência de ação negligente, com má-fé, dolo ou culpa grave, situação que não se verifica nestes autos, com destaque para o fato de que sequer foi demonstrado prejuízo real ao Erário e seu respectivo valor mediante prova técnica, que não é suprida apenas pelo levantamento numérico constante dos autos às de fls. 697.

É preciso verificar se existe indício de má-fé que revele a presença de um comportamento desonesto do agente público, pois não basta a prática de um ato ilegal, tendo em vista que, se for inconsistente, não será caracterizador do dano, eis que a Lei de regência visa punir o agente público desonesto, não o que comete erro ou ilegalidade.

Dentro do raciocínio exposto acima, entendo plenamente aplicável ao caso presente a manifestação do eminente Conselheiro Salomão Ribas Júnior nos autos do processo nº TCE 05/00519625, acatada pelo e. Tribunal Plenário na sessão de 26/10/2009, cujo Acórdão nº 1.379, assim dispõe:

(...)

O pressuposto jurídico da obrigação de indenizar é o dano resultante do dolo ou culpa. A regra geral está inserida no art. 186, do Código Civil: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete o ilícito”. E é complementada pelo art. 927 do mesmo diploma: “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187) causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

 

Decorre daí que a imputação de débito – que importa a geração de um título executivo extrajudicial, consequentemente, a obrigação de indenizar – reclama a presença, no mínimo, de culpa, seja por negligência, seja por imprudência. Sem culpa ninguém pode ser obrigado a indenizar. Este raciocínio harmoniza-se com o art. 21 da Lei Complementar n. 202/2000, quando diz: “Julgadas irregulares as contas, e havendo débito, o Tribunal Condenará o responsável ao pagamento da dívida atualizada monetariamente, acrescida dos juros de mora devidos, podendo, ainda aplicar-lhe a multa prevista no art. 68 desta Lei”. Veja-se que a lei coloca duas premissas, para efeito de condenação ao ressarcimento: a existência do débito e a responsabilidade (culpa) do agente.

Cabe registrar que na sessão realizada em 30/11/2009, o Tribunal Pleno, apreciando o processo nº TCE 01/00798314, convalidou a interpretação acima exposta que orientou a decisão então adotada, julgando irregular sem imputação de débito com fundamento no art. 18, inciso III, alínea “b”, c/c o art. 21 parágrafo único da Lei Complementar nº 202/2000 as contas pertinentes à Tomada de Contas.

Desse modo, entendo que não cabe a responsabilidade ao Sr. Gilmar Knaesel, ao pagamento da quantia de R$ 41.615,44 (quarenta e um mil, seiscentos e quinze reais e quarenta e quatro centavos), pois não restou comprovado nos autos que o responsável, agiu com má-fé, dolo ou culpa, o que torna suficiente para descaracterizar a infração, a imputação de débito e a multa do art. 68 da Lei Complementar nº 202/2000.

Ante o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II, da Lei Complementar 202/2000, ao apreciar a documentação que compõe os autos, manifesta-se por considerar irregulares com imputação de débito e aplicação de multa proporcional ao dano, na forma do art. 18, inciso III, alínea “b” e “c”, c/c o art. 21, caput, e 68, da Lei Complementar nº 202/00, as contas de recursos repassados ao Movimento Tradicionalista Gaúcho do Estado de Santa Catarina e condenar solidariamente os responsáveis, Sr. Édio Schweitzer, responsável à época pela Entidade Movimento Tradicionalista Gaúcho de Santa Catarina e a pessoa jurídica Movimento Tradicionalista Gaúcho de Santa Catarina, a recolherem ao Tesouro do Estado, o valor de R$ 41.615,44 (quarenta e um mil, seiscentos e quinze reais e quarenta e quatro centavos), assim como, declarar o Movimento Tradicionalista Gaúcho do Estado de Santa Catarina e o Sr. Édio Schweitzer, impedidos de receberem novos recursos do erário, até a regularização do presente processo.

Manifesto-me, pela não imputação de débito ao Sr. Gilmar Knaesel, por entender que as irregularidades apontadas não se revestiram de gravidade suficiente para justificar a imposição de débito, bem como ocorreu no primeiro ano de implantação.

 

É o Parecer.

Florianópolis, 12 de junho de 2013.

 

 

MÁRCIO DE SOUSA ROSA

Procurador-Geral