PARECER  nº:

MPTC/6429/2009

PROCESSO nº:

PDI-00/03965759    

ORIGEM     :

Prefeitura Municipal de Biguaçu

INTERESSADO:

Poder Judiciário - Comarca de Biguaçu - 2ª Vara

ASSUNTO    :

Cópia de decisão proferida nos autos da Ação Civil Pública nº 007.00.000173-9, relatando supostas irregularidades na anulação de licitação para aquisição de merenda escolar, no âmbito da Prefeitura de Biguaçu, no exercício de 1999.

 

1 – DO RELATÓRIO

         Trata-se de processo autuado a partir do Ofício nº 110/2000, subscrito pelo Sr. Jaime Pedro Bunn, Juiz de Direito da 2ª Vara da Comarca de Biguaçu, remetendo cópia de decisão proferida na Ação Civil Pública nº 007.00.000173-9, acerca de irregularidades em licitações e aquisições de merenda escolar no Município de Biguaçu (fls. 2/20).

Mediante Parecer de fls. 23/24, os auditores da Consultoria-Geral sugeriram a remessa dos autos à Diretoria de Controle dos Municípios, para que os fatos fossem apreciados por ocasião do julgamento das Contas Municipais.

Tal posicionamento foi ratificado pelo Procurador-Geral deste Ministério Público, mediante Parecer de fl. 25.

A providência foi determinada pelo Exmo. Conselheiro Relator, por meio do despacho de fl. 26.

Os auditores da Diretoria de Controle dos Municípios emitiram a Informação nº 223/2006, de fls. 77/79, propondo o arquivamento dos autos.

Por intermédio do Parecer nº 214/2007, de fls. 81/85, o então Procurador deste Ministério Público sugeriu o conhecimento do processo como Representação, e a determinação para adoção das providências necessárias à apuração dos fatos.

Por meio do despacho de fls. 86/87, o Exmo. Conselheiro Relator conheceu a Representação.

Os auditores da Diretoria de Controle dos Municípios emitiram o Relatório nº 5535/2008, de fls. 276/285, sugerindo a audiência do responsável, para manifestação acerca das restrições anotadas.

A providência foi determinada pelo Exmo. Conselheiro Relator, mediante despacho de fl. 288.

O responsável apresentou as justificativas de fls. 290/307.

Por fim, por meio do Relatório nº 589/2009, de fls. 312/329, os auditores da Diretoria de Controle dos Municípios sugeriram a irregularidade dos atos descritos nos itens 1.1 e 1.2 de sua conclusão, com aplicação de multas ao responsável.

 

2 – DO MÉRITO

         Inicialmente, destaco tramitar Ação Civil Pública na comarca de Biguaçu, acerca do assunto objeto deste processo.[1]

         Todavia, em face do princípio da independência de instâncias, a eventual responsabilização do agente na esfera civil não interfere na atuação do Tribunal de Contas.

         No mérito, tenho que as justificativas apresentadas pelo responsável não são hábeis para sanear as irregularidades identificadas pelos auditores da Diretoria de Controle dos Municípios, como segue:

 

2.1 Anulação de procedimento licitatório autuado sob o nº 006/99 na modalidade Tomada de Preços, tendo por objeto a aquisição de merenda escolar para o exercício de 1999, sem a devida fundamentação, em desacordo com o art. 49 da Lei nº 8.666/93.

            Conforme o art. 49 da Lei nº 8.666/93, a autoridade competente para a aprovação do procedimento deverá anular a licitação por ilegalidade, de ofício ou por provocação de terceiros, mediante parecer escrito e devidamente fundamentado.

         A exigência legal, específica para as licitações, é corroborada pelas súmulas nºs 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal.

         Sobre o assunto, o magistério de Hely Lopes Meirelles:[2]

 

O que a Administração não pode é invalidar licitação sem justa causa, (...). Se assim agir praticará ato nulo por excesso ou abuso de poder, com todos os consectários desse desvio de finalidade.

A justa causa para anular ou revogar a licitação deve ficar evidenciada em procedimento regular, com oportunidade de defesa. Não basta a simples alegação de vício ou de interesse público para invalidar a licitação; necessário que a Administração demonstre o motivo invalidatório.

 

         Conforme o documento de fl. 90, a Comissão de Licitação sugeriu ao prefeito municipal a anulação da Tomada de Preços, em virtude de recursos impetrados pelas empresas, que apontaram erros no julgamento da habilitação; e o prefeito “acatou a decisão”.

         A referida anulação do certame licitatório não atende a exigência contida na Lei de Licitações, por estar precariamente fundamentada, e por não haver a observância de procedimento regular.

         Ademais, no caso, o correto seria a apreciação dos recursos interpostos pelas empresas, com o saneamento de eventuais irregularidades.

         A gravidade do fato aumenta por ter dado margem à indevida dispensa de licitação, como se verá a seguir.

 

2.2 Aquisição direta de mercadorias para elaboração da merenda escolar no exercício de 1999, no montante de R$ 94.656,14, sem observância do disposto no art. 26 da Lei nº 8.666/93 quanto à formalização de processo de dispensa e seus elementos obrigatórios, bem como quanto à publicação para a eficácia do ato, caracterizando ausência de procedimento licitatório, em desacordo com o disposto no art. 37, XXI, da Constituição e art. 2º da Lei Federal nº 8.666/93.

Conforme observam os auditores da Diretoria de Controle dos Municípios, com a anulação do procedimento licitatório, foram efetuadas compras diretas de mercadorias para a merenda escolar, sem a formalização de procedimento de dispensa de licitação e sem a publicação na imprensa oficial, conforme exigido pelo art. 26 da Lei nº 8.666/93.

Eis os ensinamentos de Jorge Ulisses Jacoby Fernandes[3] sobre o assunto:

 

O procedimento de dispensa e inexigibilidade apresenta fases próprias, atípicas em relação aos demais procedimentos administrativos regulados por lei. Sua conclusão, de forma correta, foi erigida como condição de eficácia dos atos pelo legislador. Portanto, a rigor, mesmo que o contrato tenha sido assinado, enquanto não acabados os procedimentos delineados no art. 26, o mesmo não pode produzir efeitos válidos sob a ordem jurídica (....).

 

Em suas justificativas, o responsável sustenta que o decurso do tempo necessário à finalização do processo de licitação e o risco das crianças ficarem sem merenda criariam profundos e irreparáveis danos, o que, em sua visão, justificaria a compra direta, com fundamento no art. 24, XII, da Lei Federal nº 8.666/93.

Contudo, não foram apresentadas justificativas para a ausência de formalização do procedimento de dispensa de licitação, necessários à validade jurídica do ato.

 

Dessa feita, estão caracterizadas as restrições; motivo pelo qual ratifico os termos do Relatório nº 589/2009 da Diretoria de Controle dos Municípios.

 

3 – DA CONCLUSÃO

         Ante o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, II, da Lei Complementar nº 202/2000, manifesta-se pela adoção das seguintes providências:

- Decisão de IRREGULARIDADE dos atos analisados nestes autos, nos termos do art. 36, § 2º, a, da Lei Complementar nº 202/2000;

- APLICAÇÃO de MULTAS ao responsável, Sr. Arlindo Correa, prefeito de Biguaçu na época, nos termos do art. 70, II, da Lei Complementar 202/2000, em virtude da ocorrência das infrações a normas legais descritas nos itens 1.1 e 1.2 da conclusão do Relatório nº 589/2009.

         Florianópolis, 19 de maio de 2010.

                      ______________

Aderson Flores

 Procurador

mb

 



[1] Conforme andamento processual anexo.

[2] Apud Mukai, Toshio. Licitações e Contratos Públicos. 8ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2008. pp. 132/133.

[3] Jacoby Fernandes, Jorge Ulisses. Contratação Direta sem Licitação. 8ª Ed. Belo Horizonte: Fórum, 2009. p. 643.