PARECER nº:

MPTC/27132/2014

PROCESSO nº:

REC 14/00301154    

ORIGEM:

Câmara Municipal de Florianópolis

INTERESSADO:

César Luiz Belloni Faria

ASSUNTO:

Recurso de Reexame da decisão exarada no processo APE-10/00398398

 

 

1. HISTÓRICO

Cuidam os autos de Recurso de Reexame interposto pelo Senhor César Belloni Farias – Presidente da Câmara de Vereadores do Município de Florianópolis, ante a Decisão nº 1.304/2014, prolatada no Processo APE 10/00398398, que denegou o registro do ato de Aposentadoria da Senhora Maria Eduvirgem Cardoso.

Nas razões recursais, o Recorrente sustenta que no caso em tela operou-se a prescrição administrativa, ou seja, a preclusão da oportunidade de atuação do poder público sobre a matéria sujeita à sua apreciação.

Colaciona julgados de diversas instâncias judiciais e de Tribunais de Contas para referendar a tese da prescrição administrativa.

E sobre a transformação do cargo de advogado em Procurador, registra o Procedimento nº 001/2005/27ª PJC – Defesa Administrativa e Controle de Constitucionalidade de Leis e Atos Normativos Municipais e do Conselho Superior dos Procuradores do Ministério Público Estadual de Santa Catarina – em que restou afastada a ocorrência de mácula normativa acerca da matéria.

Nesse sentido, requer o registro do ato aposentatório da Senhora Maria Eduvirgem Cardoso.

2. ANÁLISE

Do expediente, recepcionado e autuado por esse Tribunal, designou-se a Diretoria de Recursos e Reexames para verificar os requisitos de admissibilidade e análise do recurso.

A Instrução assevera que a presente peça recursal preencheu os requisitos estampados nos arts. 79 e 79 da LC nº 202/2000 e art. 133, § 1º da Resolução TC-06/2001.

No mérito, anota que não há que se discutir a ocorrência da decadência, pois o ato aposentatório da requerente foi acedido em 08 de junho de 2009 pelo Ato da Mesa nº 271/09 e a decisão da Corte de Contas (denegação) em 09 de maio de 2014, ou seja, em prazo inferior a cinco anos, conforme estabelece a Lei nº 9.784/99.

Enfatiza que o ingresso da servidora no quadro de servidores da Câmara de Vereadores não foi precedido de concurso público; a ascensão funcional – enquadramento do cargo de Técnico em Atividades Complementares I para o Cargo de Advogado – por intermédio de concurso interno, e a transposição do cargo de advogado para Procurador, efetuada através de Portaria, infringiram dispositivos constitucionais.

Informa que “a Servidora Maria Eduvirgem Cardoso manteve vínculo funcional com a Administração Pública por mais de 20 (vinte) anos, e que antes de ingressar no serviço público já havia trabalhado e contribuído para a Previdência Social, contando da data de sua aposentadoria, com mais de 30 (trinta) anos de trabalho”. (Parecer DDR – 105/2014, fls. 40-41)

E assim, resta incontroverso o cumprimento dos requisitos inerentes à aposentação. Porém, salienta que deverá ser ressalvada a prejudicialidade do art. 41 do Regimento Interno da Corte de Contas, evitando-se que a servidora seja impelida a regressar ao exercício laboral.

Nesse sentido, propõe conhecer do Recurso de Reexame. No mérito, dar provimento parcial, para denegar o registro do ato aposentatório e ressalvar a prejudicialidade do art. 41 do Regimento Interno.

3. DA PROCURADORIA

A matéria ora em análise assume fundamental importância nas decisões da Corte de Contas. A denegação de atos de aposentadoria eivados de vícios insanáveis, mas que já produziram efeitos favoráveis a seus destinatários encontra limite temporal no princípio da segurança jurídica, também de hierarquia constitucional, pela evidente razão de que os administrados não podem ficar indefinidamente sujeitos à instabilidade originada do poder de autotutela do Estado.

Esta Procuradoria vem externando entendimento de que os atos inquinados por vícios insanáveis, que tenham despassado o prazo quinquenal previsto no art. 55 da Lei 9.784/99, prazo decadencial para a revisão dos atos administrativos, seja mantida sua eficácia, evitando-se grave lesão a direito subjetivo, sendo o seu titular isento de responsabilidade pelo ato eivado de vício.

No mesmo sentido se pronunciou o Superior Tribunal de Justiça no RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 25.652 - PB (2007/0268880-8):

EMENTA

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO.

SERVIDORES PÚBLICOS QUE ASSUMIRAM CARGOS EFETIVOS SEM PRÉVIO

CONCURSO PÚBLICO, APÓS A CF DE 1988. ATOS NULOS. TRANSCURSO DE QUASE 20 ANOS. PRAZO DECADENCIAL DE CINCO ANOS CUMPRIDO, MESMO CONTADO APÓS A LEI 9.784/99, ART. 55. PREPONDERÂNCIA DO PRINCÍPIO DA

SEGURANÇA JURÍDICA. RECURSO ORDINÁRIO PROVIDO.

1. O poder-dever da Administração de invalidar seus próprios atos encontra limite temporal no princípio da segurança jurídica, de índole constitucional, pela evidente razão de que os administrados não podem ficar indefinidamente sujeitos à instabilidade originada da autotutela do Poder Público.

2. O art. 55 da Lei 9.784/99 funda-se na importância da segurança

jurídica no domínio do Direito Público, estipulando o prazo decadencial de 5 anos para a revisão dos atos administrativos viciosos e permitindo, a contrario sensu, a manutenção da eficácia dos mesmos, após o transcurso do interregno qüinqüenal, mediante a convalidação ex ope temporis, que tem aplicação excepcional a situações típicas e extremas, assim consideradas aquelas em que avulta grave lesão a direito subjetivo, sendo o seu titular isento de responsabilidade pelo ato eivado de vício.

3. A infringência à legalidade por um ato administrativo, sob o ponto de vista abstrato, sempre será prejudicial ao interesse público; por outro lado, quando analisada em face das circunstâncias do caso concreto, nem sempre sua anulação será a melhor solução. Em face da dinâmica das relações jurídicas sociais, haverá casos em que o próprio interesse da coletividade será melhor atendido com a subsistência do ato nascido de forma irregular.

4. O poder da Administração, dest'arte, não é absoluto, de forma que a recomposição da ordem jurídica violada está condicionada primordialmente ao interesse público. O decurso do tempo, em certos casos, é capaz de tornar a anulação de um ato ilegal claramente prejudicial ao interesse público, finalidade precípua da atividade exercida pela Administração.

5. Cumprir a lei nem que o mundo pereça é uma atitude que não tem mais o abono da Ciência Jurídica, neste tempo em que o espírito da justiça se apoia nos direitos fundamentais da pessoa humana, apontando que a razoabilidade é a medida sempre preferível para se mensurar o acerto ou desacerto de uma solução jurídica.

6. Os atos que efetivaram os ora recorrentes no serviço público da Assembléia Legislativa da Paraíba, sem a prévia aprovação em concurso público e após a vigência da norma prevista no art. 37, II da Constituição Federal, é induvidosamente ilegal, no entanto, o transcurso de quase vinte anos tornou a situação irreversível, convalidando os seus efeitos, em apreço ao postulado da segurança jurídica, máxime se considerando, como neste caso, que alguns dos nomeados até já se aposentaram (4), tendo sido os atos respectivos aprovados pela Corte de Contas Paraibana.

7. A singularidade deste caso o extrema de quaisquer outros e impõe a prevalência do princípio da segurança jurídica na ponderação dos valores em questão (legalidade vs segurança), não se podendo fechar os olhos à realidade e aplicar a norma jurídica como se incidisse em ambiente de absoluta abstratividade.

8. Recurso Ordinário provido, para assegurar o direito dos impetrantes de permanecerem nos seus respectivos cargos nos quadros da Assembléia Legislativa do Estado da Paraíba e de preservarem as suas aposentadorias.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da

QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Jorge Mussi, Laurita Vaz e Arnaldo Laurita Vaz e Arnaldo Esteves Lima votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Felix Fischer.

Brasília/DF, 16 de setembro de 2008 (Data do Julgamento).

NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO

MINISTRO RELATOR

Em recente decisão proferida por essa e. Corte de Contas, sob o nº 0741/2010, ordenou o registro dos atos de aposentadoria, consubstanciando nesse preceito legal:

1. Processo n. APE - 09/00385928

2. Assunto: Grupo 4 – Registro de Ato de Aposentadoria

3. Responsável: Luiz Henrique da Silveira - ex-Prefeito Municipal de Joinville

4. Entidade: Instituto de Previdência Social dos Servidores Públicos do Município de Joinville – IPREVILLE

5. Unidade Técnica: DAP

6.Decisão: O TRIBUNAL PLENO, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1º da Lei Complementar n. 202/2000, decide:

6.1. Ordenar o registro, nos termos do art. 34, II, c/c o art. 36, §2º, "b", da Lei Complementar n. 202/2000, do ato aposentatório de Reny Beatriz da Silveira, matrícula n. 7565-8, no cargo de Professor de 1ª a 4ª Séries do 1º Grau, CPF n. 162.253.769-68, do Quadro de Pessoal da Prefeitura Municipal de Joinville, consubstanciado no Decreto n. 9.123/1999, por ter operado a decadência do direito da Administração Pública de anular/rever referido ato (art. 54 da Lei n. 9.784/99).
6.2. Dar ciência desta Decisão à Prefeitura Municipal de Joinville e ao Instituto de Previdência Social dos Servidores Públicos daquele Município.
7. Ata n. 14/10

8. Data da Sessão: 24/03/2010 – Ordinária

9. Especificação do quorum:

9.1. Conselheiros presentes: César Filomeno Fontes (Presidente - art. 91, I, da LC n. 202/2000), Luiz Roberto Herbst, Salomão Ribas Junior, Julio Garcia (Relator) e Gerson dos Santos Sicca (art. 86, caput, da LC n. 202/2000).

10. Representante do Ministério Público junto ao TC: Mauro André Flores Pedrozo.

11. Auditores presentes: Cleber Muniz Gavi e Adircélio de Moraes Ferreira Junior.

CÉSAR FILOMENO FONTES JULIO GARCIA
Presidente (art. 91, I, da LC n. 202/2000) Relator

Fui presente: MAURO ANDRÉ FLORES PEDROZO
Procurador-Geral do Ministério Público junto ao TCE/SC

O direito da Administração de anular e/ou rever seus atos (poder dever de autotutela) se baliza nos termos do art. 54 da Lei nº 9.784/99, e ao regular o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, acerca dos casos de anulação dos atos administrativos, assim dispôs:

Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má−fé.

§ 1o No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.

Logo, é de se afirmar que a norma acima referida, estabelece o prazo qüinqüenal para a administração anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis aos seus destinatários, ressalvando-se a má-fé. Findo tal prazo, o ato não mais poderá ser anulado, ocorrendo, via de conseqüência, a convalidação tácita.

Outrossim, o § 1º do referido artigo estabelece que nos casos em que houver efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência será contado a partir do primeiro pagamento.

Importa salientar que o referido artigo estabelece como marco inicial da contagem do prazo a data em que os atos foram praticados.

Seguindo esse entendimento, verifica-se estar presente tal conseqüência jurídica, e que de fato ficou evidenciada no processo em tela, demonstrando-se a oportuna manifestação do registro do ato pensionatório, insculpido no princípio da segurança jurídica.

Assim, entende-se por segurança jurídica o princípio jurídico que envolve os limites à retroatividade dos atos do Estado e da proteção à confiança das pessoas nesses atos, procedimentos e condutas praticados pelo Estado. Preceito constitucional insculpido no artigo 5º, inciso XXXVI, da Carta Magna.

O princípio da segurança jurídica assumiu valor ímpar no sistema jurídico, cabendo-lhe papel diferenciado na realização da própria ideia de justiça material.

Nesse sentido, este Órgão Ministerial acolhe as razões recursais apresentadas pelo Recorrente e opina pelo REGISTRO do ato de aposentadoria da Senhora Maria Eduvirgem Cardoso.

Florianópolis, em 12 de agosto de 2014.

                                                    

                         

 

MÁRCIO DE SOUSA ROSA

Procurador-Geral

 

af