Parecer no:

 

MPC/34.557/2015

                       

 

 

Processo nº:

 

PCR 14/00128002

 

 

 

Un. Gestora:

 

Fundo de Desenvolvimento Social - FUNDOSOCIAL

 

 

 

Assunto:

 

Prestação de Contas de Recursos repassados à Casa de Apoio Ver Tu Livre, por meio de empenho nº 001333, de 09/11/2011, no valor de R$ 19.908,00, visando à aquisição de alimentos e roupas íntimas

 

 

Trata-se de prestação de contas relacionada à aplicação dos recursos públicos repassados pelo Fundo de Desenvolvimento Social – FUNDOSOCIAL à Casa de Apoio Ver Tu Livre, para aquisição de alimentos e vestimentas de residentes do abrigo, conforme estabelecido pelo Plano de Aplicação de fls. 37 e 38.

Inicialmente, o projeto foi submetido à análise técnica e de viabilidade orçamentária/financeira da Diretoria de Gestão dos Fundos Estaduais, que se posicionou favoravelmente ao repasse, após conferência dos documentos juntados à solicitação (fls. 41 a 47). Em 09/11/2011, a verba foi liberada sob o código 2011NE001333.

A prestação de contas, datada de 22/12/2011, foi considerada irregular pelo fato de não estar acompanhada de cheques nominais individualizados e em razão da movimentação da conta bancária não se relacionar às notas fiscais apresentadas.

A Diretoria de Gestão do FUNDOSOCIAL declarou a entidade Casa de Apoio Ver Tu Livre impedida de receber novos recursos do Governo do Estado (fl. 63) e o controle interno, por derradeiro, se manifestou pela reprovação das contas, observando inclusive a falta de verificação in loco do efetivo atendimento das finalidades a que se destinavam os recursos repassados (fl. 68).

 

 

Já no âmbito do Tribunal de Contas, a Diretoria de Controle da Administração Estadual constatou que as três notas fiscais do Mini Mercado Praia Comprida Ltda., juntadas à prestação de contas, continham preços exatamente iguais aos cotados nos estabelecimentos Pernambucanas e Superrosa Ltda. quando da apresentação inicial do projeto, e que tanto a quantidade quanto a variedade de produtos fornecidos eram incompatíveis com a estrutura de um pequeno estabelecimento local.

Encaminhou-se ofício à Secretaria Estadual da Fazenda para comprovar a regularidade destes documentos fiscais.

Acompanhada do Registro Contábil de Saídas de Mercadorias do referido mercado, exercício financeiro de 2011 (fls. 84 a 101), sobreveio resposta ao ofício, informando que as notas fiscais apresentadas eram inidôneas.

 O Relatório DCE 113/2014 apurou irregularidades na concessão dos recursos por ausência de parecer fundamentado quando da análise do pedido, falta de aprovação do programa ou ação pelo Conselho Deliberativo do FUNDOSOCIAL e inexistência de contrato ou termo de ajuste entre a Administração Pública e a entidade beneficiada. Apontou, ainda, irregularidades na prestação de contas por falta de comprovação de efetivo uso dos recursos em finalidade pública, registrando também a ausência de cheques nominais e a inidoneidade das notas fiscais. Sugeriu, portanto:

 

3.1 Definir a responsabilidade solidária, nos termos do art. 15, I, da Lei Complementar Estadual nº 202/00, do Sr. JOÃO CARLOS DA ROSA, portador do CPF nº 496.019.039-68, com endereço na Rua Arlindo A. de Andrade, nº 123, Bairro Ponte do Imaruim, Palhoça/SC, CEP 88.130-335, e da CASA DE APOIO VER TU LIVRE, CNPJ nº 13.976.662/0001-43, com endereço na Rua 24 de abril, nº 227, Centro, Palhoça/SC [fone (48) 3242-2711), por irregularidades verificadas no presente processo, que ensejaram a imputação do débito mencionado no item 2.2, deste relatório, sem prejuízo da aplicação de multa.

3.2 Determinar a CITAÇÃO dos responsáveis nominados no item anterior, nos termos do art. 15, II, da Lei Complementar nº 202/00, sendo a pessoa jurídica na pessoa do seu atual representante legal, para apresentarem alegações de defesa, em observância aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, a respeito das irregularidades constantes do presente relatório, passíveis de imputação de débito, no valor de R$ 19.908,00, e aplicação de multa em face da ausência de comprovação da boa e regular aplicação dos recursos, contrariando o § 1º do art. 144 da Lei Complementar Estadual nº.  381/07, conforme apontado no item 2.2.1, deste Relatório, caracterizada pelas seguintes irregularidades:

3.2.1 ausência de comprovação da realização do objeto do repasse, contrariando o art. 58 da Constituição Estadual, art. 144, § 1º, Lei Complementar Estadual nº 381/07 e arts. 49 e 52, II e IIII, Resolução nº TC – 16/94 (subitem 2.2.1.1, deste Relatório);

3.2.2 comprovação de despesas com documentação inidônea, contrariando o disposto no art. 58 da Constituição Estadual; art. 144, § 1º, da Lei Complementar Estadual nº 381/07 e arts. 49 e 52, II e III, ambos da Resolução nº TC – 16/94 (subitem 2.2.1.2, deste Relatório);

3.2.3 movimentação incorreta da conta bancária, diante da ausência de emissão de cheques bancários nominais e individualizados por credor e da apresentação das cópias dos cheques na prestação de contas, em afronta ao disposto no art. 47 da Resolução nº TC 16/94 e art. 17 do Decreto nº 2.977/05 c/c o item 7.3 da Deliberação nº 37/2011, da Secretaria Executiva de Supervisão de Recursos Desvinculados (subitem 2.2.1.3).

3.3 Determinar a CITAÇÃO do Sr. CELSO ANTÔNIO CALCAGNOTO, inscrito no CPF sob o nº 385.768.649-91, com endereço profissional no Centro Administrativo, Rodovia SC-401, nº 4.600, bairro Saco Grande II, Florianópolis/SC, CEP 88.032-900, nos termos do art. 15, II, da Lei Complementar Estadual n.º 202/2000, para que se manifeste em observância ao princípio contraditório e da ampla defesa, a respeito das irregularidades passíveis de aplicação de multas previstas na Lei Orgânica do Tribunal, em face da (o):

3.3.1 concessão de subvenção social sem a emissão de parecer fundamentado de análise do pedido, descumprindo as exigências do art. 1º e do § 1º do art. 2º da Lei Estadual nº 13.334/05, do art. 21 do Decreto Estadual nº 2.977/05, em inobservância aos princípios constitucionais da legalidade e da impessoalidade previstos no art. 37 da Constituição Federal e a competência estabelecida pelo inciso II do art. 49-A da Lei Complementar nº 381/07, com redação dada pela LC nº 540/2011 (item 2.1.1 deste relatório);

3.3.2 repasse de recursos sem a aprovação do programa ou ação pelo Conselho Deliberativo do FUNDOSOCIAL e sem a formalização de um contrato ou termo de ajuste, contrariando o art. 4º da Lei Estadual nº 13.334/05, que instituiu o FUNDOSOCIAL e os arts. 7º e 8º do Decreto nº 2.977/2005; o art. 2º da Lei nº 5.867/81 e o art. 60, parágrafo único c/c o art. 116 da Lei nº 8.666/93 (item 2.1.2 deste relatório).

3.4 Representar, com envio de cópia integral dos autos, ao Ministério Público do Estado de Santa Catarina, em virtude das irregularidades passíveis de caracterização de ilícito criminal, frente ao noticiado no item 2.2.1.2 deste Relatório, para que sejam tomadas as medidas que entender necessárias.

 

Foi procedida à audiência e, após, apresentadas as manifestações defensivas (fls. 126-208 e 211-212).

O Relatório DCE 88/2015 não verificou em ambas manifestações fatos ou documentos novos que pudessem alterar seu entendimento anterior e concluiu:

3.1 Julgar irregulares com imputação de débito, na forma do art. 18, III, “b” e “c”, c/c o art. 21, caput, da Lei Complementar Estadual nº 202/00, as contas de recursos transferidos para a CASA DE APOIO VER TU LIVRE, referente à Nota de Empenho nº 001333, de 09/11/2011, no valor de R$ 19.908,00 (dezenove mil e novecentos e oito reais).

3.2 Condenar solidariamente os responsáveis: Sr. JOÃO CARLOS DA ROSA, portador do CPF nº 496.019.039-68, com endereço na Rua Arlindo A. de Andrade, nº 123, Bairro Ponte do Imaruim, Palhoça/SC, CEP 88.130-335, presidente, à época, da Casa de Apoio Ver Tu Livre; e CASA DE APOIO VER TU LIVRE, CNPJ nº 13.976.662/0001-43, com endereço na Rua 24 de abril, nº 227, Centro, Palhoça/SC [fone (48) 3242-2711), por seu representante legal ao recolhimento do valor de R$ 19.908,00 (dezenove mil e novecentos e oito reais), fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias a contar da publicação do Acórdão no Diário Oficial Eletrônico do TCE – DOTC-e, para comprovar, perante este Tribunal, o recolhimento dos valores do débito ao Tesouro do Estado, atualizado monetariamente e acrescido dos juros legais (arts. 21 e 44 da Lei Complementar Estadual n.º 202/00), calculados a partir 21/11/2011, sem o que fica, desde logo, autorizado o encaminhamento de peças processuais ao Ministério Público junto ao Tribunal de Contas para que adote providências à efetivação da execução da decisão definitiva (art. 43, II, da Lei Complementar Estadual nº 202/00), em face da ausência da comprovação da boa e regular aplicação dos recursos, em afronta ao § 1º do art. 144 da Lei Complementar Estadual nº 381/07 (item 2.2.1), caracterizada pelas seguintes irregularidades:

3.2.1 ausência de comprovação da realização do objeto do repasse, contrariando o art. 58 da Constituição Estadual, art. 144, § 1º, da Lei Complementar Estadual nº 381/07 e arts. 49 e 52, II e IIII, Resolução nº TC – 16/94 (subitem 2.2.1.1, deste Relatório);

3.2.1.2 comprovação de despesas com documentação inidônea, contrariando o disposto no art. 58 da Constituição Estadual; art. 144, § 1º, da Lei Complementar Estadual nº 381/07 e arts. 49 e 52, II e III, ambos da Resolução nº TC – 16/94 (subitem 2.2.1.2, deste Relatório);

3.2.1.3 movimentação incorreta da conta bancária, diante da ausência de emissão de cheques bancários nominais e individualizados por credor e da apresentação das cópias dos cheques na prestação de contas, em afronta ao disposto no art. 47 da Resolução nº TC 16/94 e art. 17 do Decreto nº 2.977/05 c/c o item 7.3 da Deliberação nº 37/2011, da Secretaria Executiva de Supervisão de Recursos Desvinculados (subitem 2.2.1.3, deste Relatório).

3.3 Aplicar ao Sr. CELSO ANTÔNIO CALCAGNOTO, inscrito no CPF sob o nº 385.768.649-91, com endereço profissional no Centro Administrativo, Rodovia SC-401, nº 4.600, bairro Saco Grande II, Florianópolis/SC, CEP 88.032-900, multa prevista no artigo 70, inciso II, da Lei Complementar Estadual nº 202/00, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias a contar da publicação do Acórdão no DOTC-e, para comprovar perante este Tribunal o recolhimento dos valores ao Tesouro do Estado, sem o que fica, desde logo, autorizado o encaminhamento de peças processuais ao Ministério Público junto ao Tribunal de Contas para que adote providências à efetivação da execução da decisão definitiva (art. 43, II e 71 (ambos) da Lei Complementar nº 202/00), em face:

3.3.1 da concessão de subvenção social sem a emissão de parecer fundamentado de análise do pedido, descumprindo as exigências do art. 1º e do § 1º do art. 2º da Lei Estadual nº 13.334/05, do art. 21 do Decreto Estadual nº 2.977/05, em inobservância aos princípios constitucionais da legalidade e da impessoalidade previstos no art. 37 da Constituição Federal, ao estabelecido nos arts. 16 e 17 da Lei 4.320/64 e a competência estabelecida pelo inciso II do art. 49-A da Lei Complementar nº 381/07, com redação dada pela LC nº 540/2011 (item 2.1.1 deste relatório);

3.3.2 do repasse de recursos sem a aprovação do programa ou ação pelo Conselho Deliberativo do FUNDOSOCIAL e sem a formalização de um contrato ou termo de ajuste, contrariando o art. 4º da Lei Estadual nº 13.334/05, que instituiu o FUNDOSOCIAL e os arts. 7º e 8º do Decreto nº 2.977/2005; o art. 2º da Lei nº 5.867/81 e o art. 60, parágrafo único c/c o art. 116 da Lei nº 8.666/93 (item 2.1.2, deste relatório).

3.4 Declarar a Casa de Apoio Ver Tu Livre e o Sr. João Carlos da Rosa, impedidos de receberem novos recursos do Erário consoante dispõe o art. 16 da Lei nº 16.292/2013 c/c art. 39 do Decreto nº 1.310, de 13 de dezembro de 2012.

3.5 Dar ciência da Decisão, do Relatório e Voto do Relator que a fundamentam à Casa de Apoio Ver Tu Livre, ao Sr. João Carlos da Rosa, ao Sr. Celso Antônio Calcagnotto e ao Fundo de Desenvolvimento Social – FUNDOSOCIAL.

 

É o relatório.

A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da entidade em questão está inserida entre as atribuições dessa Corte de Contas, consoante os dispositivos constitucionais, legais e normativos vigentes (art. 31 da Constituição Federal, art. 113 da Constituição Estadual, art. 1º, inciso III, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, arts. 22, 25 e 26 da Resolução TC nº. 16/1994 e art. 8° c/c art. 6° da Resolução TC nº. 6/2001.

As irregularidades apuradas pelo corpo técnico podem ser agrupadas em dois itens, considerando se tratarem de vícios na concessão dos recursos e na posterior prestação de contas.

 

1. Das irregularidades evidenciadas na concessão dos recursos: concessão de subvenção social sem a emissão de parecer fundamentado de análise do pedido; repasse de recursos sem a aprovação do programa ou ação pelo Conselho Deliberativo do FUNDOSOCIAL; e ausência de formalização de um contrato ou termo de ajuste

 

A entidade Casa de Apoio Ver Tu Livre iniciou suas atividades em 13/07/2011, conforme fl. 15, e em pouco mais de um mês, em 26/08/2011, solicitou auxílio do Governo do Estado para ser subsidiada.

De acordo com a Lei nº 4320/64, verifica-se a imprescindibilidade de se analisar o histórico operacional e financeiro de cada entidade que se propõe a receber auxílio do governo:

Art. 16. Fundamentalmente e nos limites das possibilidades financeiras a concessão de subvenções sociais visará a prestação de serviços essenciais de assistência social, médica e educacional, sempre que a suplementação de recursos de origem privada aplicados a êsses objetivos, revelar-se mais econômica.

Parágrafo único. O valor das subvenções, sempre que possível, será calculado com base em unidades de serviços efetivamente prestados ou postos à disposição dos interessados obedecidos os padrões mínimos de eficiência prèviamente fixados.

Art. 17. Somente à instituição cujas condições de funcionamento forem julgadas satisfatórias pelos órgãos oficiais de fiscalização serão concedidas subvenções.

 

Com menos de dois meses de existência, a entidade convenente dificilmente lograria êxito em obter crédito em instituições financeiras no mercado, pois não há como se assegurar uma administração eficiente na gestão de seus recursos.

Visando afastar o apontamento restritivo que lhe fora imputado, o Sr. Celso Antônio Calcagnotto destacou problemas estruturais temporários pelos quais passava a secretaria responsável, mas que, no entanto, houve análise técnica dos documentos quanto à vinculação do objeto ao programa ou ação de governo.

Alegou, ainda, que as entidades podiam comprovar aptidão na área beneficente através de seus estatutos e objetos sociais, devidamente registrados em cartório, e através de suas propostas, que deveriam relacionar-se às áreas de Assistência Social, Saúde e Educação.

Por fim, elencou normas pertinentes e anexou a Ata da 13ª Reunião do Conselho Deliberativo do fundo, em que consta a aprovação de subvenções a diversas outras entidades, cuja documentação foi analisada de forma isonômica (fls. 126 a 208).

Nota-se, às fls. 41 a 47, que o Sr. Celso Antônio Calcagnotto submeteu o processo à análise técnica, com atribuição inclusive de efetuar as diligências que entendesse necessárias.

No entanto, o retorno positivo foi fruto de uma análise sumária do projeto, de apreciação formal e superficial dos documentos. O Responsável não se atentou ao conteúdo da análise, falhando no dever de supervisionar a concessão de recursos.

Exatamente neste sentido dispõe a Lei Complementar Estadual nº 381/97:

Art. 49-A. À Secretaria Executiva de Supervisão de Recursos Desvinculados, órgão integrante da Secretaria de Estado da Casa Civil, compete:

I - supervisionar e acompanhar as atividades desenvolvidas pelos gestores de Fundos Estaduais;

II - receber e analisar os pedidos de subvenções sociais, transferências voluntárias e outras liberações que dependam de recursos do Fundo de Desenvolvimento Social – FUNDOSOCIAL.

 

Várias outras subvenções foram concedidas com aprovação de apenas duas das cinco assinaturas constantes da 13ª reunião, conforme extraído das fls. 131 a 208.

A capacidade operacional, financeira e, sobretudo, administrativa da convenente não foi questionada do ponto de vista da eficiência, isto é, se de fato os recursos a ela repassados seriam aplicados ao fim perseguido pelo estado. 

A falta de comprometimento com a destinação dos recursos concedidos fica mais evidente quando se constata que não se firmou um termo de ajuste ou um contrato, com dados claros e precisos sobre a aplicação do dinheiro repassado.

Sobre o assunto dispõe a Lei nº 8666/93:

Art. 60.  Os contratos e seus aditamentos serão lavrados nas repartições interessadas, as quais manterão arquivo cronológico dos seus autógrafos e registro sistemático do seu extrato, (...)

Parágrafo único.  É nulo e de nenhum efeito o contrato verbal com a Administração, salvo o de pequenas compras de pronto pagamento, (...)

Art. 116.  Aplicam-se as disposições desta Lei, no que couber, aos convênios, acordos, ajustes e outros instrumentos congêneres celebrados por órgãos e entidades da Administração.

 

Resta justificada a imposição ao Sr. Celso Antônio Calcagnotto da penalidade prevista no art. 70, II da Lei Complementar nº 202/00, devendo ser cominada multa em razão de cada uma das irregularidades constatadas pela área técnica.

 

2. Das irregularidades evidenciadas na prestação de contas: ausência de comprovação da boa e regular aplicação dos recursos; ausência de comprovação da execução do objeto; e movimentação incorreta da conta bancária

 

O Sr. João Carlos da Rosa, representante da Casa de Apoio Ver Tu Livre, alegou em sua defesa que possui apenas primeiro grau completo e que buscou ajuda de pessoa habilitada para prestar as contas. O objetivo de sua entidade seria de acolher pessoas sem condições de se desprenderem das drogas e reintegrá-las à sociedade, e que não houve em nenhum momento má fé.

Não há como acolher as manifestações defensivas.

As três notas fiscais apresentadas, em tese emitidas por determinado estabelecimento, reproduzem de forma literal as cotações de preços das lojas Pernambucanas e Superrosa Ltda., quando na fase inicial de proposição do projeto (fls. 39 e 40).

Os preços no varejo costumam sofrer oscilações, ainda que de centavos. A falta de verossimilhança do conteúdo das notas se acentua ao verificar que os produtos foram adquiridos em local de porte ou estrutura incompatíveis com a variedade e a quantidade relatada.

Ainda que a identidade entre os valores estimados no projeto e aqueles registrados no ato da compra fosse relevada, não houve comprovação de que os recursos recebidos do estado foram efetivamente aplicados na finalidade social.

Não se providenciou documentação contábil da entidade, fichamento dos residentes na casa ou de quem são seus responsáveis, encaminhamentos terapêuticos, fotos das instalações da casa para comprovar acolhimento e tratamento dos pacientes, etc.

Nem na fase de liberação dos recursos, nem na fase de prestação de contas se ocupou destes aspectos, o que descaracteriza boa-fé por parte da entidade e de seu responsável, independentemente do grau de instrução escolar que porventura venha a ter.

O extrato bancário acostado aos autos se restringe ao período de um mês, com apenas três movimentações, que em nada condizem com as notas fiscais. Referem-se a cheques de valor arredondado sem discriminação alguma. A microfilmagem dos títulos também não foi juntada.

Vislumbra-se flagrante desrespeito ao art. 58 da Constituição Estadual, aos arts. 47, 49, 52, II e III da Resolução TC 16/94, e ao art. 17 do Decreto nº 2.977/05, ensejando aplicação das penalidades impostas nos art. 68 e 70, II da LC 202/00, bem como o ressarcimento ao erário dos valores repassados.

 

3. Da comprovação de despesa com documentação inidônea e da necessária comunicação do fato ao Ministério Público de Santa Catarina

 

Como apontado em tópico anterior, verificou-se a inidoneidade das notas fiscais apresentadas.

O fato, atestado pela Secretaria Estadual da Fazenda (fls. 102 e 103), restou incontroverso, visto que não contestado pela entidade beneficiada.

A conduta pode caracterizar crime, assim como ato de improbidade previsto na Lei nº 8.429/92.

Portanto, necessária se faz a remessa dos autos ao Ministério Público Estadual para que, no uso de suas atribuições, adote as providências que entender necessárias.

 

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II, da Lei Complementar no 202/2000, manifesta-se por:

 

 

 

1. Julgar irregulares com imputação de débito, na forma do art. 18, III, “b” e “c”, c/c o art. 21, caput, da Lei Complementar Estadual nº 202/00, as contas de recursos transferidos para a Casa de Apoio Ver Tu Livre, referente à Nota de Empenho nº 001333, de 09/11/2011, no valor de R$ 19.908,00;

2. Condenar solidariamente os responsáveis Sr. João Carlos da Rosa e a Casa de Apoio Ver Tu Livre ao recolhimento do valor de R$ 19.908,00 em face da não comprovação de boa e regular aplicação dos recursos públicos, caracterizada pelas seguintes irregularidades:

2.1. ausência de comprovação da realização do objeto do repasse, contrariando o art. 58 da Constituição Estadual e arts. 47 e 49 da Resolução nº TC – 16/94;

2.2. movimentação incorreta da conta bancária, diante da falta de emissão de cheques bancários nominais e individualizados por credor e da apresentação das cópias dos cheques na prestação de contas, em afronta ao disposto no art. 47 da Resolução nº TC 16/94 e art. 17 do Decreto nº 2.977/05;

2.3. comprovação de despesas com documentação inidônea, contrariando o disposto no art. 58 da Constituição Estadual e arts. 49 e 52, II e III da Resolução nº TC – 16/94;

3. Aplicação de multa ao Sr. João Carlos da Rosa, conforme arts. 68 e 70, II da Lei Complementar Estadual nº 202/00, pelas irregularidades apontadas acima;

4. Aplicação de multa ao Sr. Celso Antônio Calcagnoto, conforme previsto no artigo 70, inciso II, da Lei Complementar Estadual nº 202/00, em razão das seguintes irregularidades:

4.1. concessão de subvenção social sem emissão de parecer fundamentado de análise de pedido, descumprindo o disposto no art. 1º e art. 2º, §1º da Lei Estadual nº 13.334/05, bem como no art. 21 do Decreto Estadual nº 2.977/05, sem observar ainda o estabelecido nos arts. 16 e 17 da Lei nº 4.320/64 e a competência estabelecida pelo inciso II do art. 49-A da Lei Complementar nº 381/07;

4.2. repasse de recursos sem a aprovação do programa ou ação pelo Conselho Deliberativo do FUNDOSOCIAL e sem a formalização de um contrato ou termo de ajuste, contrariando os arts. 7º e 8º do Decreto Estadual nº 2.977/2005, bem como o art. 60, parágrafo único c/c o art. 116 da Lei nº 8.666/93;

 5. Declarar a Casa de Apoio Ver Tu Livre e o Sr. João Carlos da Rosa impedidos de receberem novos recursos do Erário, consoante dispõe o art. 16 da Lei nº 16.292/2013 c/c art. 39 do Decreto nº 1.310, de 13 de dezembro de 2012.

6. Com fundamento na Constituição Federal (artigo 71, inciso XI); na Constituição Estadual (artigo 59, inciso XI); na Lei Complementar Estadual nº 202/2000 (artigos 1º, inciso XIV e 18, parágrafo 3º e/ou 65, parágrafo 5º); na Lei Federal nº 7.347/85 (artigo 7º); na Lei Federal nº 8.429/92 (artigos 14 c/c 22); na Lei Federal nº 8.625/93 (LONMP - artigo 43, inciso VIII); na Lei Complementar nº 35/79 (LOMAN - artigos 35, inciso I c/c 49, inciso II) e no Decreto-Lei n° 3.689/41 (artigos 24, parágrafo 2º c/c 40), pela comunicação ao Ministério Público Estadual, para fins de subsidiar eventuais medidas em razão da possível tipificação de crime e de ato de improbidade administrativa.

6. Dar ciência da Decisão, do Relatório e Voto do Relator que a fundamentam à Casa de Apoio Ver Tu Livre, ao Sr. João Carlos da Rosa, ao Sr. Celso Antônio Calcagnotto e ao Fundo de Desenvolvimento Social – FUNDOSOCIAL.

Florianópolis, 11 de junho de 2015.

 

 

Diogo Roberto Ringenberg

Procurador do Ministério

Público de Contas