Parecer no:

 

MPC/36.109/2015

Processo nº:

 

REP 11/00257257

Origem:

 

Município de Ilhota

Assunto:

 

Irregularidades na publicação de atos oficiais no Município.

 

Trata-se de Representação formulada pelo Sr. Luiz Peixe, Presidente da Câmara de Vereadores do Município de Ilhota, por meio de petição de fls. 02-08, relatando supostas irregularidades quanto às publicações dos atos oficiais municipais.

Acostou-se documentação pertinente às fls. 09-82.

A Diretoria de Controle dos Municípios - DMU elaborou o Relatório nº 952/2012, às fls. 83-86, concluindo pela admissibilidade do presente processo.

Tal posicionamento foi acolhido pelo Ministério Público de Contas, em seu Despacho nº GPDRR/034/2012, às fls. 87, e pelo Sr. Relator, por meio do Despacho nº 17/2012, às fls. 88-90, o qual determinou a adoção de providências para apuração do fato.

A Diretoria de Controle dos Municípios - DMU emitiu o Relatório nº 4.524/2014, às fls. 101, por meio do qual requereu as seguintes informações e documentos:

 

1. Cópias dos Jornais com circulação local e/ou meio utilizado para a publicidade dos atos do Poder Público do Município de Ilhota (amostra composta por pelo menos 10 atos publicados em edições diversas em cada ano, entre 2010 e 2013), tendo em vista as disposições do art. 86 da Lei Orgânica do Município com redação dada pela Emenda nº 001/2010;

2. Informar se a Emenda à Lei Orgânica do Município nº 001/2010 entrou em vigência com a pertinente publicação (e apresentar cópia da edição nº 18.943, de 01/10/2010, quando supostamente teria sido publicada) e, caso não tenha entrado em vigência, detalhar os motivos para tal fato;

3. Identificar e encaminhar cópia da Legislação/normas/decretos vigentes entre os exercícios de 2010 a 2013 (anteriores à Emenda à LOM nº 001/2013) específicos sobre os procedimentos de publicidade dos atos emanados pelo Poder Público;

4. Identificação com documento pertinente acerca da data de publicação da Emenda à LOM nº 001/2013.

Em atendimento à diligência, foi acostado o Ofício nº 187/2014, de fls. 104-108, e colacionada a documentação de fls. 109-203.

Da análise destes, originou-se o Relatório de Instrução nº 5.620/2014, às fls. 205-207, o qual sugeriu a realização de audiência do Responsável.

As justificativas foram apresentadas às fls. 218-223.

Após, a Instrução apresentou o Relatório nº 1.161/2015, às fls. 225-229, no qual concluiu pela aplicação de multa ao Sr. Ademar Felisky, Prefeito Municipal – Gestão 2009/2012, em razão da publicação dos atos oficiais municipais exclusivamente no quadro de editais ou mural municipal.

É o Relatório.

A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da entidade em questão está inserida entre as atribuições dessa Corte de Contas, consoante os dispositivos constitucionais, legais e normativos vigentes (art. 31 da Constituição Federal, art. 113 da Constituição Estadual, art. 1º, inciso III, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, arts. 22, 25 e 26 da Resolução TC nº. 16/1994 e art. 8° c/c art. 6° da Resolução TC nº. 6/2001).

 

1. Omissão do Chefe do Executivo Municipal em regulamentar o dispositivo da Lei Orgânica de Ilhota e consequente publicação dos atos oficiais municipais exclusivamente no quadro de editais ou mural municipal

 

Em sua defesa, o Sr. Ademar Felisky sustentou a ausência de circulação de Diário Oficial no Município, optando-se pela afixação dos atos oficiais no átrio da Prefeitura, local de grande movimentação de pessoas. Concluiu elencando jurisprudências, abaixo relacionadas:

[...] Embargos em recurso de revista. Decisão embargada publicada na vigência da Lei 11.496/2007. Competência da Justiça do Trabalho. Publicação de Lei Municipal instituidora do Regime Jurídico Único. Afixação do seu texto na sede da Prefeitura ou no pátio da Câmara Municipal. Divulgação em jornal local. Validade. Nos Municípios de pequeno porte e situados em regiões mais distantes dos centros urbanos e nos quais não foi instituído o Diário Oficial, é válida a publicação de Leis e Atos da Administração mediante afixação em locais de grande movimento, como a sede da Prefeitura ou o pátio da Câmara Municipal ou até pela divulgação em jornal local. Essa prática atende à finalidade a que se propõe, qual seja, o conhecimento do texto por seus destinatários, de modo a tornar obrigatória a sua observância. Recurso de embargos provido.” (E-RR – 166100-97.2008.5.21.0019, Relator Ministro Horácio Raymundo de Senna Pires, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, DEJT 13/05/2011).

 

Recurso de Revista. Incompetência da Justiça do Trabalho. Instituição de Regime Jurídico Único. Lei Municipal. Publicação. Validade. Infere-se do artigo 1º da Lei de Introdução ao Código Civil que é formalidade essencial para eficácia e vigência da Lei, a sua publicação oficial. No entanto, o referido dispositivo não restringe a forma de publicação da Lei à divulgação de seu teor em Diário Oficial. Assim, considera-se válido o ato do chefe do Executivo, diante da ausência de órgão de imprensa oficial no Município, de veicular os atos oficiais por meio de afixação no quadro de avisos da Prefeitura ou da Câmara Municipal. Por conseguinte, deve ser declarada a incompetência desta Justiça Especializada para julgar a presente ação, diante da natureza jurídica estatutária da relação de trabalho estabelecida entre as partes. Precedente da jurisprudência atual da SBDI-1 do TST. Recurso de revista conhecido e provido.” (RR – 28900-92.2009.5.07.0022, Relatora Ministra Dora Maria da Costa, 8ª Turma, DEJT 16/05/2011). Grifo nosso.

 

Validade da Publicação de Lei Municipal que instituiu o regime Estatutário – Art. 1º da LICC – Publicação no Diário Oficial do Estado – Inexigibilidade. 1. Conforme estabelece o art. 1º da LICC, a vigência da norma jurídica vincula-se à sua publicação. Ademais, o art. 37, caput, da CF submete todos os entes públicos da Federação Brasileira ao princípio constitucional da publicidade. 2. In casu, o Regional não reconheceu a validade da Lei Municipal que instituiu o regime estatutário. Reconheceu assim, a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar o feito. 3. Entretanto, tem-se como legítima a publicação da Lei Municipal realizada mediante afixação em prédio da Prefeitura Municipal, atendendo, assim, à finalidade de divulgação da norma jurídica. Ainda se considera oficial essa modalidade de publicidade, restando atendida a regra contida na Constituição Federal e na Lei de Introdução ao Código Civil. 4. Portanto, merece reforma o acórdão regional, a fim de se declarar a validade da Lei Municipal que instituiu o regime estatutário e, como corolário lógico, afastar a competência desta Justiça Especializada para julgar a presente ação, que envolve servidor público e ente da Administração Pública direta. Recurso de revista provido.” (RR – 22900-10.2008.5.07.0023 Data de julgamento: 28/04/2010, Relatora Ministra: Maria Doralice Novaes, 7ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 14/05/2010). Grifo nosso. [...]

 

Ainda que fosse possível considerar como aplicáveis os precedentes mencionados acima, no caso do Município em apreço, tem-se a disposição expressa da Lei Orgânica do ente, impondo a publicização dos atos municipais por meio de órgão oficial de imprensa. Não há como afastar, portanto, a obrigatoriedade de cumprimento de normativa elaborada no âmbito de competência de um ente federado municipal.

A não implementação deste meio de publicidade implicou na consequente inviabilização do cumprimento do disposto no art. 86 do diploma citado, em clara afronta à normativa que rege a matéria.

A prática contraria, ainda, entendimento do Tribunal de Contas, externado através dos Prejulgados nº 1834 e nº 1934, abaixo transcritos:

Prejulgado nº 1834:

1. O Município não pode publicar os atos oficiais somente em mural público, sem previsão na lei orgânica que o defina como meio de publicidade dos atos municipais. Segundo dispõe o art. 111, parágrafo único, da Constituição Estadual, tal publicidade pode se dar pela publicação no órgão oficial do Município ou da respectiva associação municipal ou em jornal local ou da microrregião a que pertencer ou de acordo com o que determinar a sua lei orgânica, ou, ainda, em meio eletrônico digital de acesso público. (grifamos)

[...]

 

Prejulgado nº 1934:

1. Com fundamento nos arts. 111, parágrafo único, da Constituição Estadual e 6º, XIII, da Lei (federal) nº 8.666/93, as exigências de publicações previstas nos arts. 26, caput, e 61, parágrafo único, da Lei (federal) nº 8.666/93 e 4º, I, da Lei (federal) nº 10.520/02 podem ser cumpridas pela publicação dos atos neles previstos no diário oficial eletrônico, desde que lei municipal defina este meio como o oficial de publicação.

2. A publicação dos atos normativos somente pelo diário oficial eletrônico é possível desde que lei municipal defina este meio como o oficial de publicação também para este tipo de ato - aplicação analógica do art. 111, parágrafo único, da Constituição Estadual e da Lei (federal) nº 11.419/06.

3. Em ambos os casos, a lei deve garantir que sejam cumpridos os requisitos de autenticidade, integridade, validade jurídica e interoperabilidade previstos no âmbito da Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP Brasil.

4. Quando a lei exigir outros meios de publicidade e divulgação dos atos administrativos além do diário oficial, como na hipótese do art. 21 da Lei (federal) n. 8.666/93, deverá a Administração Pública realizar os referidos procedimentos.

 

Sobre o Princípio da Publicidade, cabe trazer o ensinamento de Hely Lopes Meireles, em sua obra Direito Administrativo Brasileiro[1]

A publicidade, como princípio de administração pública (CF, art. 37, caput), abrange toda atuação estatal, não só sob o aspecto de divulgação oficial de seus atos como, também, de propiciação de conhecimento da conduta interna de seus agentes. Essa publicidade atinge, assim, os atos concluídos e em formação, os processos em andamento, os pareceres dos órgãos técnicos e jurídicos, os despachos intermediários e finais, as atas de julgamentos das licitações e os contratos com quaisquer interessados, bem como os comprovantes de despesas e as prestações de contas submetidas aos órgãos competentes. Tudo isto é papel ou documento público que pode ser examinado na repartição por qualquer interessado, e dele pode obter certidão ou fotocópia autenticada para os fins constitucionais.

 

Em consonância com o entendimento exposto pela área técnica, manifesto-me pela manutenção do apontamento de irregularidade.

Entendo cabível determinar ao atual gestor, ainda, a adoção de providências com vistas a sanar a ausência de implementação de órgão oficial de imprensa no Município, adotando ao menos uma das alternativas previstas no §1º do art. 86 da Lei Orgânica Municipal.

 

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II da Lei Complementar 202/2000, manifesta-se por:

1. Considerar irregular, na forma do artigo 36, § 2º, “a” da Lei Complementar nº 202/2000, o ato abaixo relacionado, aplicando multa ao Sr. Ademar Felisky, Prefeito Municipal – Gestão 2009/2012, prevista no artigo 70, II da Lei Complementar nº 202/2000, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias a contar da publicação do acórdão no Diário Oficial Eletrônico da Corte de Contas para comprovar ao Tribunal o recolhimento da multa ao Tesouro do Estado, sem o que fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos artigos 43, II, e 71 da Lei Complementar nº 202/2000:

1.1. Publicação dos atos oficiais municipais exclusivamente no quadro de editais ou mural municipal, contrariando o artigo 86 e parágrafos da Lei Orgânica Municipal e o entendimento da Corte de Contas, firmado mediante o Prejulgado nº 1834.

2. Determinar ao atual gestor que proceda à implementação de, no mínimo, um dos instrumentos previstos no art. 86, §1º de sua Lei Orgânica.

3. Dar ciência da decisão ao Representado e ao Representante.

Florianópolis, 07 de agosto de 2015.

 

Diogo Roberto Ringenberg

Procurador do Ministério

Público de Contas

 



[1] In Direito Administrativo Brasileiro, 25.ª ed., 2000, p. 89.