Parecer nº:

MPC/38.686/2015

Processo nº:

REC 13/00263102

Un. Gestora:

Fundo Estadual de Incentivo ao Esporte - FUNDESPORTE

Assunto:

Recurso de Reconsideração da decisão exarada no processo TCE 11/00290033

 

 

 

Trata-se de Recurso de Reconsideração interposto pelo Sr. Gilmar Knaesel, ex-Secretário de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, contra o Acórdão nº 169/2013, proferido nos autos da TCE 11/00290033, publicado no DOTC nº 1204 de 11/04/2013.

O recorrente trouxe alegações às fls. 03-10.

A Diretoria de Recursos e Reexames, mediante Relatório nº 368/2015 (fls. 11-17), elaborou sugestão de voto ao Relator no seguinte sentido:

3.1 Conhecer do Recurso de Reconsideração, nos termos do artigo 77 da Lei Complementar Estadual nº 202/2000 e art. 136 do Regimento Interno, interposto contra o Acórdão nº 0169/2013 exarado na Sessão do dia 11/03/2013, nos autos do processo nº TCE 11/00290033 e no mérito negar-lhe provimento, mantendo na íntegra a Decisão Recorrida.

3.2 Dar ciência da Decisão, ao Recorrente, Sr. Gilmar Knaesel, bem como a sua Procuradora Dra. Fabiana Bona, OAB/SC 11.768 e à Secretaria da Cultura, Turismo e Esporte.

 

 

É o relatório.

A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da entidade em questão está inserida entre as atribuições do Tribunal de Contas, consoante os dispositivos constitucionais, legais e normativos vigentes (art. 31 da Constituição Federal, art. 113 da Constituição Estadual, art. 1º, inciso III, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, arts. 22, 25 e 26 da Resolução TC nº. 16/1994 e art. 8° c/c art. 6° da Resolução TC nº. 6/2001).

 

 

1. Da admissibilidade

 

O Acórdão nº 16/2013, proferido nos autos da TCE 11/00290033, foi publicado no DOTC nº 1204 de 11/04/2013 (quinta-feira), e o presente recurso protocolizado em 13/05/2013 (segunda-feira), observando, desta forma, o limite de 30 dias estabelecido pelo art. 77 da Lei Complementar nº 202/2000.

Ao recorrente foi imputado débito nos termos do item 6.1.2 do acórdão recorrido, restando observado seu interesse em recorrer.

A legitimidade do recorrente encontra guarida no art. 77 da Lei Complementar Estadual nº 202/00.

Entende-se, desta forma, pelo conhecimento do presente Recurso de Reconsideração, meio cabível para combater a decisão proferida nos autos da TCE 11/00290033.

 

2. Arguição Preliminar - Da suspeição do Conselheiro Relator Wilson Rogério Wan-Dall

 

Antes de adentrar no mérito, cabem algumas ponderações.

Em decorrência da participação efetiva de um dos responsáveis – o Sr. Gilmar Knaesel – na nomeação do e. Conselheiro Wan-Dall para o Tribunal de Contas, é necessário que o membro da Corte proceda à declaração de sua suspeição para relatar o recurso em apreço.

A atuação política do Sr. Gilmar Knaesel nos anos de 1999 e 2000, quando presidia a Assembleia Legislativa de Santa Catarina, pode ter sido decisiva para a nomeação do Conselheiro Relator Wan-Dall, segundo notícias veiculadas à época pela imprensa:

 

Nas votações políticas da Assembléia, de fevereiro de 99 para cá [março de 2000], Gilmar Knaesel levou a melhor nas três: eleições da nova mesa diretora e preenchimento de duas vagas de conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Além de ter sido eleito presidente contra a vontade do governador e do senador, teve participação decisiva na indicação de Wilson Wan-Dall (PFL) e Luiz Roberto Herbst (PMDB) para o Tribunal de Contas[1].

 

A disputa pelas duas vagas disponíveis e a influência do Sr. Gilmar Knaesel na indicação dos novos conselheiros foram noticiadas em mais de uma oportunidade[2].

Tal circunstância recomendaria que o atual Relator declinasse de sua judicatura para o caso concreto, ante a suspeita de parcialidade do Relator.

Por certo que o julgamento de recurso contra tomada de contas envolvendo um dos nomes decisivos para sua indicação à vaga de Conselheiro do TCE/SC põe em xeque a lisura do procedimento em análise, relatado pelo membro suspeito.

A história traçada entre a atuação política de um dos responsáveis e a nomeação do relator torna indigesto qualquer argumento tendente a defender a neutralidade do julgamento do presente recurso.

Em que pese inexistir disposição expressa no âmbito do Tribunal de Contas acerca das hipóteses de impedimento e suspeição, a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil e o parâmetro de lisura estabelecido pelo Código de Ética dos servidores do TCU[3] servem de diretrizes interpretativas aos casos em que se pode vislumbrar a presença das causas de impedimento e suspeição dos membros envolvidos no processamento do feito. No mesmo sentido, a Resolução n.º TC-087/2013[4], em seus art. 7º, incisos XVIII e XXIV, e art. 11.

Ademais, consoante entendimento exposto pela Suprema Corte no julgamento da ADI n.º 4190/RJ, os Conselheiros dos Tribunais de Contas submetem-se à normativa da Lei Orgânica da Magistratura Nacional. Tal decorre da equiparação constitucional destes agentes à magistratura judicial.

Desta feita, as regras concernentes ao impedimento e suspeição impostas aos magistrados – estatuídas nos artigos 134 e 135 do Código de Processo Civil – estendem-se aos julgadores da Corte de Contas. Nesse sentido apontam os artigos 213 e 221, §1º[5] do Regimento Interno do TCE/SC (Resolução n.º TC-06/2001).

É manifesto o vício de ilegalidade que padecerá o presente processo em decorrência da parcialidade do Conselheiro Relator dos autos, que pode interferir na regular condução deste, e a mera possibilidade de influir torna imprescindível sua abstenção na relatoria e no julgamento do feito.

Na condição de beneficiário direto da atuação política do responsável Sr. Gilmar Knaesel – quando então presidente da ALESC –, deve ser declarado suspeito para atuar no presente processo (conforme art. 135, V[6] e parágrafo único[7], c/c art. 138, I, ambos do CPC), sendo-lhe vedada a participação na discussão (art. 213 do RI do Tribunal de Contas) ou votação do feito (art. 221, §1º do RI do Tribunal de Contas), muito menos na qualidade de relator.

De tal sorte, impõe-se o acolhimento deste incidente de suspeição, no que tange à relatoria do e. Conselheiro Wan-Dall no julgamento das irregularidades apontadas no presente Recurso de Reconsideração envolvendo o responsável Sr. Gilmar Knaesel (então Secretário de Estado de Turismo, Cultura e Esporte).

 

3. Das alegações de recurso

 

3.1. Ausência de defesa no processo originário

 

O recorrente se insurge contra despacho do Relator do processo originário que indeferiu a juntada intempestiva de defesa, o que a seu ver afronta o exercício do contraditório e da ampla defesa.

Verificando-se os autos da TCE 11/00290033, constata-se que a citação do recorrente foi determinada em 22/06/2012 (fl. 91) e sua advogada requereu prorrogação de prazo em 16/07/2012 para apresentar alegações de defesa (fl. 92), o que comprova a devida ciência sobre a existência de processo em que figura como parte.

Nos termos do art. 15, §2º, da Lei Complementar Estadual nº 202/00, o responsável que não acudir à citação será considerado revel, para todos os efeitos, dando-se prosseguimento ao processo. É de amplo conhecimento que uma das formas de não se acudir à citação é deixar transpassar o prazo estabelecido em lei, que no caso foi de 30 dias, prorrogado por mais 30, conforme autorização do Relator (fl. 96).

Se fosse aceita a defesa extemporânea, estar-se-ia dando a um caso específico tratamento diferenciado em relação a todos os demais que se encontram igualmente em trâmite na Corte, em afronta ao princípio da isonomia.

Não se justifica a alegação de que não fora oportunizada defesa ao recorrente no processo de origem, haja vista a comprovação de que sua patrona teve prévio conhecimento dos autos, tendo lhe sido concedida a prorrogação de prazo pleiteada, de modo que não subsiste fundamento jurídico para que sua defesa seja aceita além do prazo estipulado pelo Relator.

 

3.2. Ausência de prestação de contas

 

O recorrente alega que a ausência de adoção de providências administrativas, após o prazo regulamentar de prestação de contas de verba repassa a entidade privada pelo FUNDESPORTE, ocorreu devido a problemas administrativos internos, como escassez de funcionários e grande volume de processos.

Entende também que o titular de uma Secretaria, que comete atos administrativos finais, não pode assumir responsabilidade direta e solidária de procedimentos intermediários, se neles não ingeriu nem se omitiu dolosamente.

Alegou, inclusive, que o objeto do projeto aprovado pela Secretaria foi totalmente executado e que todos os recursos foram aplicados em sua realização, não havendo dano ao erário.

No entanto, não é possível comprovar, com base nos documentos constantes dos autos originários, que o dano ao erário não tenha de fato ocorrido, diante da falta de notas fiscais, de recibos, fotos, listas assinadas por pessoas identificadas, ou seja, não se pode afirmar que os recursos foram realmente aplicados no projeto intitulado “Esporte na Praia” (fl. 15).

A responsabilidade do Recorrente provém de dispositivos legais a respeito:

 

Decreto Estadual nº 1.977/08

Art. 8º Quando ocorrer qualquer das hipóteses previstas no art. 2º deste Decreto, observado o disposto no art. 7º, a autoridade administrativa competente, sob pena de responsabilidade solidária, deverá, no prazo de 30 (trinta) dias, instaurar a tomada de contas especial designando servidor ou comissão para sua realização.

 

Lei Complementar Estadual nº 381/07

Art. 146. A autoridade administrativa competente, sob pena de responsabilidade solidária, deverá adotar providências administrativas com vistas à identificação dos responsáveis, à quantificação do dano e ao ressarcimento do erário quando [...]

 

 Deste modo, persiste o apontamento de irregularidade atribuído ao recorrente no processo de origem, não se vislumbrando nenhuma justificativa plausível para que se proceda à alteração do entendimento exarado no acórdão recorrido.

 

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II, da Lei Complementar no 202/2000, manifesta-se nos seguintes termos:

1) preliminarmente, seja declarada a suspeição do Conselheiro Relator Wilson Rogério Wan-Dall, na condição de Relator do presente Recurso de Reconsideração, para que se abstenha, inclusive, de participar de seu julgamento – em atendimento aos arts. 134 e 135 do CPC e aos arts. 213 e 221, §1º do Regimento Interno do TCE/SC (Resolução n.º TC-06/2001);

2) pelo conhecimento do presente Recurso de Reconsideração e, no mérito, pela negativa de provimento.

Florianópolis, 18 de novembro de 2015.

 

Diogo Roberto Ringenberg

Procurador do Ministério

Público de Contas

 



[1] Disponível em: http://www1.an.com.br/2000/mar/12/0pot.htm, acesso em 17/10/2014.

[2] Notícia “Juíza pede informações sobre escolha de nomes ao TCE”, disponível em http://www1.an.com.br/2000/fev/12/0pot.htm, acesso em 17/10/2014, e a notícia “Juíza nega liminar e Wan-Dall assume no TCE”, disponível em http://www1.an.com.br/2000/fev/17/0pot.htm, acesso em 17/10/2014.

[3] Art. 9º O servidor deverá declarar impedimento ou suspeição nas situações que possam afetar, ou parecer afetar, o desempenho de suas funções com independência e imparcialidade, especialmente nas seguintes hipóteses: […] II – participar de fiscalização ou de instrução de processo de interesse próprio, de cônjuge, de parente consangüíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, de pessoa com quem mantenha ou manteve laço afetivo ou inimigo ou que envolva órgão ou entidade com o qual tenha mantido vínculo profissional nos últimos dois anos, ressalvada, neste último caso, a atuação consultiva, ou ainda atuar em processo em que tenha funcionado como advogado, perito ou servidor do sistema de controle interno. Disponível em: http://portal2.tcu.gov.br/portal/page/portal/TCU/institucional/conheca_tcu/Codigo_etica_servidores.pdf

[4] Adota o Código de Ética aprovado no II Encontro Nacional de Tribunais de Contas, para ser aplicado aos servidores do TCE/SC.

[5] Art. 213 - O Conselheiro que se declarar impedido ou em suspeição não participará da discussão do processo.

Art. 221, §1º - O Conselheiro não poderá abster-se de votar, mesmo quando vencido na preliminar, salvo caso de impedimento ou suspeição.

[6] Art. 135 - Reputa-se fundada a suspeição de parcialidade do juiz, quando: […] V - interessado no julgamento da causa em favor de uma das partes.

[7] Parágrafo único. Poderá ainda o juiz declarar-se suspeito por motivo íntimo.