PARECER
nº: |
MPTC/46170/2016 |
PROCESSO
nº: |
REP 14/00626100 |
ORIGEM: |
Prefeitura Municipal de Taió |
INTERESSADO: |
Arno Xavier |
ASSUNTO: |
Irregularidades no edital de Pregão
Presencial 100/2013, para a aquisição de projetos de literatura para as
escolas do ensino fundamental Prefeita Erna Heidrich, Adolpho Ewald, Centros
de Educação Infantil do Município e execução contratual decorrente. |
Trata-se
de representação encaminhada pelo Poder Legislativo do Município de Taió, por
meio dos Vereadores ocupantes da Mesa Diretora da Câmara Municipal do
Município, Srs. Arno Xavier, Valmor Zanghelini, Marlete Hang Sandri, Iara
Mariza Bonin e Joel Sandro Macoppi, na qual relataram supostas irregularidades
referentes ao edital do Pregão Presencial n. 100/2013, cujo objeto era a
aquisição de projetos de literatura para as escolas de ensino fundamental
Prefeita Erna Heidrich, Adolpho Ewald e Centros de Educação Infantil do
Município.
Após
a juntada da petição inicial de fls. 2-9 e dos documentos de fls. 10-210v, a
Diretoria de Controle de Licitações e Contratações apresentou o Relatório de
Instrução n. DLC-749/2014 (fls. 211-215), no qual sugeriu o conhecimento da
representação e a realização de diligência à Prefeitura Municipal de Taió, na
pessoa de seu Prefeito, Sr. Hugo Lembeck, para apresentação de informações e
documentos acerca das irregularidades constatadas. Este Órgão Ministerial
manifestou-se no mesmo sentido, mediante o Parecer n. MPTC/31244/2015 (fls.
216-217).
A
Relatora, por meio do Despacho n. GASNI 12/2015 (fls. 216-217), acolheu as
sugestões, conhecendo da representação e determinando a realização da referida
diligência.
Os
representantes, Srs. Arno Xavier, Iara Mariza Bonin, Joel Sandro Macoppi,
Marlete Hang Sandri e Valmor Zanghelini foram cientificados deste conteúdo por
meio dos respectivos Ofícios TCE/SEG ns. 3.759/15, 3.760/15, 3.761/15, 3.762/15
e 3.763/15 (fls. 221-225), ao passo que o responsável, Sr. Hugo Lembeck, foi
cientificado por meio do Ofício TCE/DLC n. 4161/15 (fl. 226, com aviso de recebimento
à fl. 227).
O
responsável respondeu à comunicação mediante o Ofício n. SAF/114/2015 (fls.
228-229) e juntou documentos (fls. 230-414), negando a existência de
irregularidades e informando ter tomado providências no sentido de constatar os
fatos narrados na representação, aduzindo que em breve disporia de um panorama
exato do ocorrido.
Em
seguida, a Diretoria de Controle de Licitações e Contratações apresentou o
Relatório de Instrução n. DLC-237/2015 (fls. 417-420), em cuja conclusão
sugeriu a conversão do processo em Tomada de Contas Especial, bem como a
determinação de citação dos responsáveis, Sr. Hugo Lembeck, Prefeito Municipal
de Taió, Sra. Angelita Maria Delfina Vogel, Diretora do Departamento de Ensino
Fundamental, e Sra. Ameri Cristina da Silva Westphal, Diretora da Escola
Adolpho Ewald, para apresentarem alegações de defesa relativas à aquisição de
4860 livros didáticos para escolas municipais sem a comprovação da entrega de
2098 deles, incorrendo na irregularidade de ausência de liquidação de despesa
no montante de R$ 43.037,54.
Este
Órgão Ministerial seguiu o mesmo entendimento, externado por meio do Parecer n.
MPTC/34695/2015 (fls. 421-423).
Entretanto,
a Relatora, no Despacho n. GASNI 061/2015 (fls. 424-425), apontou a necessidade
de se apurar a real existência de indícios da ocorrência de dano ao erário
municipal em virtude da apresentação de documentos que em tese comprovariam a
entrega dos livros. Desse modo, determinou à Diretoria de Controle de
Licitações e Contratações que solicitasse ao Município listagem contendo o
encaminhamento ou a destinação dos livros que foram adquiridos por meio do
Pregão Presencial n. 100/2013, verificando-se sua efetiva entrega e os
pagamentos realizados em decorrência dele, adotando-se as demais providências que
julgasse necessárias.
Em
face disso, a Diretoria de Controle de Licitações e Contratações, por meio do
Relatório de Instrução Preliminar n. DLC-532/2015 (fls. 426-427v), sugeriu a
diligência ao Prefeito Municipal de Taió para que encaminhasse, no prazo de 5
dias, as conclusões dos procedimentos de verificação e de apuração de
responsabilidades acerca da irregularidade apontada.
O
responsável, Sr. Hugo Lembeck, foi cientificado destes termos por meio do
Ofício TCE/DLC n. 19.784/15 (fl. 428, com aviso de recebimento à fl. 429),
apresentando resposta a partir dos Ofícios SAF n. 270/2015 (fls. 430-431) e SAF
n. 024/2016 (fl. 553) e juntando os documentos de fls. 432-550 e 554-849.
Após
tais manifestações, a Diretoria de Controle de Licitações e Contratações
apresentou o Relatório de Reinstrução n. DLC-081/2016 (fls. 851-855), em cuja
conclusão sugeriu que se determinasse a audiência dos Srs. Hugo Lembeck,
Angelita Maria Delfina Vogel e Ameri Cristina da Silva Westphal, para se
manifestarem acerca da irregular liquidação de despesa em face do recebimento
do objeto do Pregão Presencial n. 100/2013 em quantidade inferior ao que foi
licitado e contratado.
A
Relatora manifestou-se (fl. 855v) de acordo com as sugestões da Área Técnica,
tendo sido os responsáveis acima referidos comunicados por meio dos Ofícios
TCE/DLC ns. 6411/16, 6412/16 e 6413/16 (fls. 856-858, com avisos de recebimento
às fls. 859 e 868).
A
Sra. Angelita Maria Delfina Vogel apresentou o Ofício 025/2016 (fl. 860), no
qual afirmou haver divergência quanto ao cargo citado e explicando residir em
outro Município, informando a devolução do Ofício de audiência e os documentos
recebidos (fls. 861-866), e se colocando à disposição dessa Corte de Contas.
Em
face disso, a Diretoria de Controle de Licitações e Contratações, por meio do
Relatório de Instrução Preliminar n. DLC-307/2016 (fls. 869-873v) constatou que
o erro se deu em virtude de confusão com nome muito semelhante ao da real
destinatária, sugerindo a realização de audiência exclusivamente da Sra.
Angelita Vogel, verdadeira responsável pelo que foi constatado nestes autos.
A
Relatora manifestou-se de acordo (fl. 873v), sendo os responsáveis Hugo
Lembeck, Angelita Vogel e Ameri Cristina da Silva Westphal cientificados por
meio dos respectivos Ofícios TCE/DLC ns. 8909/16, 8910/16 e 8911/16 (fls.
874-876, com avisos de recebimento às fls. 878-879 e 893).
A
Sra. Angelita Vogel apresentou defesa sob o protocolo n. 011856/2016 às fls.
880-881, a Sra. Ameri Cristina da Silva Westphal apresentou resposta sob o
protocolo n. 011857/2016 às fls. 884-885, enquanto o Sr. Hugo Lembeck
apresentou justificativas por meio do Ofício n. GAB/036/2016 às fls. 888-889.
Em
seguida, a Diretoria de Controle de Licitações e Contratações emitiu o
Relatório de Reinstrução n. DLC-405/2016 (fls. 894-898), em cuja conclusão
sugeriu a procedência da representação, com a consideração de irregularidade e,
consequentemente, aplicação de multas aos responsáveis, no seguinte sentido:
3.1 Considerar procedente, nos termos
do art. 27, parágrafo único, da IN nº TC – 0021/2015, o mérito da
representação, que trata de irregularidades no recebimento de livros didáticos
pelo município, através do Pregão Presencial nº 100/2013.
3.2 APLICAR MULTAS aos
Responsáveis, Senhor Hugo Lembeck, Prefeito Municipal, inscrito no
CPF/MF sob o nº 628.990.669-00, Rua Luiz Bertoli, nº 44, Taió/SC; Senhora Angelita
Vogel, Diretora do Departamento de Ensino Fundamental, inscrita no CPF/MF
sob o nº 543.414.699-91, Rua Frederico Kraemer, nº 181, casa – Vila Mariana –
CEP 89190000 - Taió - SC; Senhora Ameri Cristina da Silva Westphal, Diretora
da Escola Adolfo Ewald, inscrita no CPF/MF sob o nº 895.474.899-68, Estrada
Geral Ribeirão Osvaldo, CEP 89190-000, Ribeirão Osvaldo, Taió/SC, com
fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar Estadual nº 202/2000, c/c o art.
109, II do Regimento Interno do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina
(Resolução nº TC-06/2001), em razão da irregularidade abaixo descrita,
fixando-lhes o prazo de 30 (trinta) dias a contar da publicação do acórdão no
Diário Oficial Eletrônico do Tribunal de Contas de Santa Catarina para
comprovar a este Tribunal o recolhimento das multas ao Tesouro do Estado, sem o
que fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança
judicial, observado o disposto nos artigos 43, II, e 71 da Lei Complementar n.º
202/2000:
3.2.1. Irregular liquidação da
despesa, em face do recebimento do objeto do Pregão nº 100/2013 – livros
didáticos – em quantidade inferior ao licitado e contratado, haja vista a
necessidade de adoção de medidas administrativas para apuração do real
quantitativo recebido e posterior pedido à empresa contratada de remessa de
mais 700 (setecentos) exemplares, em desacordo com o artigo 63, §2º, III, da
Lei 4320/64 (item
2.1 deste Relatório).
3.3. Dar ciência
do presente relatório, do voto do Relator e da Decisão aos representantes e ao
órgão de controle interno do município de Taió. (grifos do original)
Após,
os autos vieram conclusos a este Órgão Ministerial.
Passo,
enfim, à análise da irregularidade assinalada pela Diretoria de Controle de
Licitações e Contratações.
1. Irregular liquidação da
despesa em face do recebimento do objeto do Pregão n. 100/2013 em quantidade
inferior ao que foi licitado e contratado, haja vista a necessidade de adoção
de medidas administrativas para apuração do real quantitativo recebido e
posterior pedido à empresa contratada de remessa de mais de 700 exemplares, em
desacordo ao art. 63, § 2º, inciso III, da Lei n. 4.320/64.
Em
face da presente irregularidade, a Sra. Angelita Vogel alegou (fl. 880) que foi
chamada à sede da Secretaria de Educação para assinar as notas fiscais dos
livros que já haviam sido destinados à sua unidade escolar para que fosse
efetuado o devido empenho.
A
responsável manifestou (fl. 880) indignação e surpresa com a denominada
“desnecessária exposição” por conta de “erro grave cometido por este Tribunal
de Contas”, referindo-se ao equívoco na cientificação de pessoa homônima acerca
dos termos do presente processo.
Destacou
(fl. 880) que só assinou a referida nota em razão da existência do recebimento
formal dos materiais pela servidora Marlete Deluca, a qual teria afirmado “que
estava tudo conforme a nota fiscal”. Nesse sentido, argumentou que os livros
teriam sido recebidos pela servidora comissionada referida, a qual teria
atestado o recebimento dos livros sem fazer a devida conferência. Aduziu que os
Vereadores teriam efetuado a fiscalização quase um ano após os livros terem
sido distribuídos nas unidades escolares do Município de Taió, sendo “natural
que tais materiais de consumo já estivessem nas mãos de muitos alunos”, pois a
razão de ser da aquisição de livros seria “o estímulo à leitura e não que
fiquem nas estantes das bibliotecas”.
Explicou
ainda (fl. 881) que com a denúncia dos Vereadores, teria ocorrido a abertura de
procedimento administrativo para averiguar o problema, tendo se verificado a
falta de “pouco mais de 300 unidades de livros”, alegando que isso seria
“normal” em virtude de os alunos levarem materiais para suas residências e
afirmando que “a municipalidade insistiu veementemente com a empresa Clássica
Cultural para que procedesse à reposição de livros”, mesmo em face do atestado
de entrega de todos os livros, feito pela servidora.
Alegou
(fl. 881) que todas as medidas administrativas possíveis teriam sido tomadas no
sentido de evitar um prejuízo financeiro para o erário, o que teria se
efetivado com a notificação da empresa vencedora para o envio dos livros
faltantes, com sua redistribuição às unidades escolares.
Ao
final, afirmou (fl. 881) entender pela necessidade de aplicação de normas
processuais civis e penais no sentido de responsabilizar “apenas quem deu causa
a uma situação de perigo de dano ao erário”, buscando transferir a
responsabilidade a terceiros, notadamente os servidores municipais que estavam
sob suas ordens. Em função de suas alegações, requereu o arquivamento do feito
sem a aplicação de qualquer penalidade a si.
As
justificativas de defesa apresentadas pela Sra. Ameri Cristina da Silva
Westphal (fls. 884-885) e pelo Sr. Hugo Lembeck (fls. 888-889) resumiram-se,
basicamente, aos mesmos argumentos apresentados pela Sra. Angelita Vogel.
Apenas cabe acrescentar que o Sr. Hugo Lembeck baseou sua atribuição de
responsabilidade a terceiros alegando (fl. 888) que caso fosse
responsabilizado, em vez de administrar, teria de “se dedicar à conferência de
atividades burocráticas diariamente, desviando, assim, da finalidade para a
qual foi eleito”.
Inicialmente,
cabe salientar que, conforme bem salientado pela Área Técnica (fl. 895), a
questão relativa ao eventual dano ao erário restou superada, na medida em que,
como exposto pelos responsáveis, a empresa contratada forneceu a reposição dos
livros faltantes.
Contudo,
impende notar que o cerne da irregularidade constatada pela Diretoria de
Controle de Licitações e Contratações cinge-se à deficiência no procedimento
financeiro dos responsáveis, na medida em que não observaram a etapa de
liquidação da despesa nos moldes em que previsto expressamente em Lei. Nesse sentido
é que a irregularidade se mantém, sobretudo em função de os argumentos e as
justificativas apresentadas não se mostrarem suficientes para desconstituir a
irregularidade observada.
Conforme
reiterado pela Área Técnica às fls. 895-896, a irregularidade ressai da
duplicidade aparente das Notas Fiscais ns. 4561 e 4563 com as Notas Fiscais ns.
4543 e 4544. Estas últimas, nos respectivos valores de R$ 65.000,00 e R$
83.580,00, receberam os respectivos carimbos e assinaturas das Sras. Angelita
Vogel e Ameri Cristina da Silva Westphal, conforme se pode observar de suas
cópias juntadas às fls. 16-17 destes autos.
Nesse
sentido, não prosperam as tentativas de ambas de atribuir as suas
responsabilidades a terceiros, na medida em que a irregularidade se configurou justamente
por conta das referidas assinaturas apostas em documentos, legitimando o
fornecimento de materiais que apenas supostamente teriam sido entregues nos
quantitativos necessários, estabelecidos e contratados com a empresa vencedora
do certame licitatório.
Ainda
que servidora comissionada tenha atestado formalmente o recebimento e declarado
conformidade de quantidades, a responsabilidade obrigatoriamente era das Sras.
Angelita e Ameri, na qualidade de responsáveis pelas unidades escolares. Tanto
é assim que foram necessários os já mencionados carimbos e assinaturas.
Examinando
os fatos, a Área Técnica delineou a seguinte ordem cronológica dos mesmos (fls.
896v-897):
Os
representantes, vereadores do município de Taió, procederam a contagem física
dos livros entregues nas unidades escolares municipais e obtiveram, conforme o
quadro de folhas 190-203 (...). [...]
Nessa oportunidade a Comissão de Processo
Administrativo Disciplinar, em seu relatório final, conforme consta às folhas
838 a 843, após solicitar informações aos setores envolvidos no recebimento do
objeto, concluiu pela falta de 466 (quatrocentos e sessenta e seis livros).
Assim, foi solicitado pelo Município de Taió à
Empresa Clássica Cultural Comércio de Livros a remessa de mais 700 (setecentos)
livros, sendo o atendimento comprovado com a remessa de cópia da Nota Fiscal nº
4899 de 19.05.2015, onde consta à folha 437 a certificação da Senhora Ameri
Cristina da Silva Westphal da retirada dos livros na sede do credor,
armazenados na Casa da Cultura “Adele Glatz”.
Às folhas 844 a 847 consta o parecer jurídico do
assessor Senhor Marco Vinicius Pereira de Carvalho, no qual ratifica o envio
pelo credor de mais 700 livros.
Assim sendo, constata-se que de acordo com o
levantamento realizado pela Secretaria de Educação, ratificado pela comissão de
apuração, e o documento fiscal especificado anteriormente, a divergência de
livros entregues foi superada.
Contudo, o
procedimento adotado pela administração pública em apurar e solicitar ao credor
o envio de mais 700 livros didáticos evidencia a falta de controle no segundo
estágio da despesa pública, a sua liquidação.
A
administração pública municipal, ao deixar de conferir rigorosamente a
quantidade de livros recebidos, não atendeu a exigência legal mencionada
a seguir.
O disposto no artigo 63, §2º, III, da Lei
4320/64, impõe a necessidade da adoção de mecanismos que efetivamente atestem o
recebimento do objeto em qualidade e quantidade de acordo com o licitado e
contratado. Eis seus termos:
Art. 63. A liquidação da despesa consiste na
verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e
documentos comprobatórios do respectivo crédito.
§ 2º A liquidação da despesa por fornecimentos
feitos ou serviços prestados terá por base:
(...)
III - os
comprovantes da entrega de material ou da prestação efetiva do serviço.
(grifei)
Tais condutas representam
afronta aos trâmites previstos na Lei n. 4.320/64, na medida em que ocorreram
pagamentos de despesas sem que se tivesse comprovado suas regulares
liquidações, que é justamente o que fundamenta o direito do credor. Veja-se a
lição de Rossi e Toledo Jr.[1]:
Defendida
pelo Prof. Heraldo da Costa Reis, respeitável corrente doutrinária entende que
a despesa pública somente se aperfeiçoa após sua regular liquidação; o estágio
anterior, o do empenho, constitui mera reserva orçamentária, contabilizada,
apenas, no sistema compensado do Balanço Patrimonial. Dito de outra maneira, o efetivo reconhecimento da despesa, no
passivo financeiro da entidade (empenho a
pagar ou Restos a Pagar),
verifica-se quando consumado o regular processo de liquidação, ou seja, depois
que o contratado entregou os bens, serviços ou obras previstos na Nota de
Empenho, estando, desta feita, o gasto apto ao pagamento ou, o que dá no mesmo,
a reduzir a disponibilidade de caixa da entidade governamental. [...]
Relativamente
à fase da liquidação da despesa, a Contabilidade e os Tribunais de Contas não
devem validar um singelo carimbo de Almoxarifado. Ao revés,
essa etapa que habilita despesa a pagamento, em face de sua essencialidade,
deve fazer-se anteceder das seguintes condições:
•
A licitação ou sua dispensa estão regulares?
•
O termo contratual, quando couber, foi encartado?
•
A despesa foi corretamente classificada, quer sob a ótica econômica ou
funcional-programática?
•
O princípio do prévio empenho foi obedecido?
•
A primeira via do documento fiscal foi inserida? Corresponde este à
especificação da Nota de Empenho?
• Os
servidores que receberam os materiais/serviços são, de fato, habilitados para
tal mister?
•
No caso de despesa relacionada à aplicação constitucional mínima, os servidores
da Educação ou Saúde chancelaram os documentos da liquidação?
•
Na execução de contratos, o representante da Administração atestou o
recebimento do material, a prestação do serviço ou a medição da obra (art. 67
da Lei nº 8.666, de 1993)? (Grifei).
Nesse mesmo sentido, os
professores Heraldo da Costa Reis e J. Teixeira Machado Jr.[2]
assinalam o seguinte sobre os referidos artigos:
Sua
presença na lei se tornou absolutamente necessária dada a extensão atribuída ao
conceito de empenho. A liquidação da
despesa, de que trataremos logo a seguir, ao comentarmos o art. 63, é que
permite à Administração reconhecer a dívida como líquida e certa, nascendo,
portanto, a partir dela a obrigação de pagamento, desde que as cláusulas
contratadas tenham sido cumpridas.
Vale
a pena acentuar que o empenho não ocorre no pagamento, mas antes, na
autorização. O pagamento já é a segunda fase da despesa. A observação é
pertinente porque algumas Administrações incorrem neste engano. [...]
A
liquidação é, pois, a verificação do implemento de condição. [...]
Trata-se
de verificar o direito do credor ao pagamento, isto é, verificar se o
implemento de condição foi cumprido. Isto se faz com base em títulos e
documentos.
Muito bem, mas há um ponto central a considerar: é a verificação objetiva do
cumprimento contratual. O documento é apenas o aspecto formal da
processualística. A fase de liquidação deve comportar a verificação in loco
do cumprimento da obrigação por parte do contratante. Foi a obra, por
exemplo, construída dentro das especificações contratadas? Foi o material entregue dentro das especificações estabelecidas no
edital de concorrência ou de outra forma de licitação? Foi o serviço
executado dentro das especificações? O móvel entregue corresponde ao pedido? E
assim por diante. Trata-se de uma espécie de auditoria de obras e serviços, a
fim de evitar obras e serviços fantasmas. (Grifei).
Finalmente, Regis Fernandes
de Oliveira[3],
sumariza a ideia básica que rege o procedimento:
Segue-se a liquidação que consiste na verificação
do direito do credor, tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do
crédito
(art. 63 da Lei 4.320/64). Examina-se a origem do crédito, a importância exata
a pagar e a quem se deve pagar. A origem encontra-se no contrato ou na nota de
empenho ou nota fiscal. Tal ato nada cria, é simples verificação da legalidade
e da obediência às formalidades legais. (Grifei).
Atente-se também para o conteúdo do item 1 do
Prejulgado n. 1822 deste Tribunal de Contas, tratando da matéria sobre a qual
ora se debruça:
1. Constituem requisitos para pagamento de despesa a sua legitimidade,
caracterizada pelo atendimento ao interesse público e à observância da lei em
todas as fases de constituição e quitação, e a sua regular liquidação,
consistente na verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os
títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito (arts. 62 e
63 da Lei Federal nº 4.320/64, 57 a 61 da Resolução nº TC-16/94 e 47, II, do
Regimento Interno do Tribunal de Contas). (grifei)
Quanto
à responsabilidade do Sr. Hugo Lembeck, esta não pode ser transferida
exclusivamente a terceiros. Caso seus argumentos fossem acatados, dificilmente
se observaria qualquer imputação de responsabilidades a agentes políticos que
exercem chefia de qualquer dos Poderes. Não se pode vislumbrar a possibilidade
de usufruto dos bônus sem que se responda pelos ônus.
Sob esta ótica, da qual se
utiliza o presente Parecer para opinar pelo não acolhimento das razões e
justificativas do responsável, examine-se, em primeiro lugar, a explanação do
administrativista Celso Antônio Bandeira de Mello sobre a classificação dos
agentes públicos[4]:
Agentes
políticos
são os titulares dos cargos estruturais à organização política do País, ou
seja, ocupantes os que integram o arcabouço constitucional do Estado, o esquema
fundamental do Poder. Daí que se constituem nos formadores da vontade superior
do Estado. São agentes políticos
apenas o Presidente da República, os Governadores, Prefeitos e respectivos vices, os auxiliares imediatos dos
Chefes de Executivo, isto é, Ministros e Secretários das diversas Pastas, bem
como os Senadores, Deputados federais e estaduais e os Vereadores.
O
vínculo que tais agentes entretêm com o Estado não é de natureza profissional, mas de natureza política. Exercem um munus
público. Vale dizer, o que os qualifica para o exercício das correspondentes
funções não é a habilitação profissional, a aptidão técnica, mas a qualidade de
cidadãos, membros da civitas e, por
isto, candidatos possíveis à condução dos destinos da Sociedade. (grifei)
Ainda neste sentido, o mesmo
autor, ao debater a questão da responsabilidade do Estado (e quais os sujeitos
cuja atuação pode comprometer o Estado), ensina[5]:
Quem
são as pessoas suscetíveis de serem consideradas agentes públicos, cujos
comportamentos, portanto, ensejam engajamento da responsabilidade do Estado?
São todas aquelas que – em qualquer nível de escalão – tomam decisões ou realizam
atividades da alçada do Estado, prepostas que estão ao desempenho de um mister
público (jurídico ou material), isto é, havido pelo Estado como pertinente a si
próprio.
Nesta
qualidade ingressam desde as mais altas autoridades até os mais modestos trabalhadores
que atuam pelo aparelho estatal. [...]
Indicadas
as pessoas cuja conduta compromete a responsabilidade do Estado, cumpre
verificar quando esta condição subjetiva
tem o relevo necessário para desencadear tal comprometimento. Sendo certo que a
pessoa também atua em situação totalmente alheia à qualidade de agente, importa
fixar o que se reputará necessário para configurar atuação (ou omissão
indevida) imputável à qualidade jurídica de “agente do Estado”.
Conforme a doutrina
colacionada acima, o Prefeito enquadra-se na qualidade de agente político,
cujos atos e omissões repercutem e refletem diretamente nos destinos da
sociedade. Neste sentido, tem ele responsabilidade tanto direta quanto
indiretamente sobre atos de sua Administração. Tratam-se, aqui, das teorias da
culpa in eligendo e da culpa in vigilando, pelas quais, as
autoridades respondem, respectivamente, pela escolha dos agentes que lhes são
subordinados ou pela falha na fiscalização do correto desempenho daqueles nos
cargos para os quais foram indicados.
Pelo
já exaustivamente examinado e demonstrado, os defendentes em momento algum
obtiveram êxito em demonstrar a regularidade financeira da contratação e os
respectivos dispêndios que se configuraram como desdobramentos daquela.
Portanto,
entende-se que as justificativas e argumentos apresentados pelos responsáveis
não lograram êxito em afastar as suas responsabilidades em face da
irregularidade, culminando na aplicabilidade de pena de multa.
2. Conclusão.
Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com
amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II, da Lei
Complementar Estadual n. 202/2000, manifesta-se:
1. pela PROCEDÊNCIA da presente representação encaminhada pelo Poder
Legislativo do Município de Taió, por meio dos Vereadores ocupantes da Mesa
Diretora da Câmara Municipal do Município, Srs. Arno Xavier, Valmor Zanghelini,
Marlete Hang Sandri, Iara Mariza Bonin e Joel Sandro Macoppi, na qual relataram
supostas irregularidades referentes ao edital do Pregão Presencial n. 100/2013,
cujo objeto era a aquisição de projetos de literatura para as escolas de ensino
fundamental Prefeita Erna Heidrich, Adolpho Ewald e Centros de Educação
Infantil do Município.
2. pela IRREGULARIDADE, na forma do art. 36, § 2º, alínea “a”, da Lei Complementar
Estadual n. 202/2000, na liquidação da despesa em face do recebimento do objeto
do Pregão n. 100/2013 em quantidade inferior ao que foi licitado e contratado,
haja vista a necessidade de adoção de medidas administrativas para apuração do
real quantitativo recebido e posterior pedido à empresa contratada de remessa
de mais de 700 exemplares, em desacordo ao art. 63, § 2º, inciso III, da Lei n.
4.320/64;
3. pela APLICAÇÃO DE MULTAS, com fulcro no art. 70, inciso II, da Lei
Complementar Estadual n. 202/2000, aos
Srs. Hugo Lembeck, Prefeito Municipal de Taió, Angelita Vogel, então Diretora do Departamento de Ensino
Fundamental do Município de Taió, e Ameri Cristina Westphal, então
Diretora da Escola Adolpho Ewald, em razão da restrição apontada no item 1
deste Parecer.
Florianópolis,
18 de novembro de 2016.
Cibelly Farias Caleffi
Procuradora
[1] TOLEDO JUNIOR, Flavio C. de;
ROSSI, Sérgio Ciquera. A lei 4.320 no
contexto da lei de responsabilidade fiscal. São Paulo: Editora NDJ, 2005,
p. 168-172.
[2] MACHADO JR., José Teixeira;
REIS, Heraldo da Costa. A lei 4.320
comentada e a lei de responsabilidade fiscal. Rio de Janeiro: IBAM,
2002/2003, p. 148-149.
[3] OLIVEIRA, Regis Fernandes
de. Curso de Direito Financeiro. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 403.
[4] MELLO, Celso Antônio
Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2010, p.
247-248.
[5] Ibidem, p. 1008-1009.