PARECER nº:

MPTC/47175/2017

PROCESSO nº:

RLA 11/00386570    

ORIGEM:

Prefeitura Municipal de Florianópolis

INTERESSADO:

 

ASSUNTO:

Verificar a regularidade da autuação de infrações e aplicação da penalidade de multa na fiscalização do trânsito, bem como o julgamento dos processos de recursos e a aplicação da receita arrecadada.

 

 

 

Trata-se de auditoria especial realizada no Sistema de Fiscalização de Trânsito da Prefeitura Municipal de Florianópolis, com o objetivo de verificar a regularidade da autuação de infrações, aplicação da penalidade de multa, julgamento dos processos de recursos e aplicação da receita arrecadada na fiscalização do trânsito do Município.

Após a tramitação regular do presente processo, este Ministério Público de Contas, por meio do Parecer n. MPTC/33207/2015 (fls. 1764-1836), manifestou-se pela irregularidade dos atos analisados, com a consequente aplicação de multas aos responsáveis Srs. Átila Rocha dos Santos, Geovani Antônio Reis, Ivan da Silva Couto Júnior, Francisco Pereira da Silva, Dário Elias Berger e Carlos Eduardo Medeiros, sugerindo, ainda, a audiência do Sr. Julio Pereira Machado para apresentar justificativas acerca da irregularidade anotada no item 2.1.1 da conclusão do relatório de reinstrução, além da determinação e da recomendação contidas também na parte final daquele relatório técnico.

A Relatora, mediante o despacho de fls. 1837-1837v, determinou, então, a audiência do Sr. Julio Pereira Machado. Após a apresentação do Relatório de Instrução Despacho n. DAE-004/2016 (fls. 1838-1843) no mesmo sentido da manifestação deste órgão ministerial e da Relatora, foi expedido o Ofício TCE/DAE n. 7.210/2016 (fl. 1844), com aviso de recebimento juntado à fl. 1845, resultando na apresentação da justificativa de fl. 1846.

Em seguida, foi apresentado o Relatório de Instrução Despacho n. DAE-014/2016 (fls. 1848-1851v), em cuja conclusão a Diretoria de Atividades Especiais sugeriu a determinação de audiência do Sr. Rubens Carlos Pereira Filho, Secretário Municipal de Segurança e da Defesa do Cidadão no período entre 02/03/2009 e 03/06/2010, para que se manifestasse acerca da irregularidade disposta no item 3.1.1.

A Relatora acolheu a sugestão da área técnica, determinando a realização de audiência do responsável apontado, a qual foi procedida por meio do Ofício TCE/DAE n. 11.705/2016 (fl. 1852). O responsável apresentou pedido de prorrogação para apresentação de defesa, o qual foi acolhido (fl. 1854). Após, o Sr. Rubens Carlos Pereira Filho apresentou a resposta de fls. 1858-1860.

A Diretoria de Atividades Especiais, enfim, apresentou o Relatório de Reinstrução n. DAE-026/2016 (fls. 1862-1911v), em cuja conclusão sugeriu:

3.1. Aplicar multas aos responsáveis abaixo discriminados, com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000, c/c o art. 109, II, do Regimento Interno (Resolução nº TC-06, de 28 de dezembro de 2001), em face das restrições relacionadas, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação do Acórdão no Diário Oficial Eletrônico - DOTC-e, para comprovar ao Tribunal de Contas o recolhimento ao Tesouro do Município das multas cominadas, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da citada Lei Complementar:

3.1.1. Sr. Júlio Pereira Machado, Diretor da Guarda Municipal, no período de 02/03/09 a 09/08/10, portador do CPF nº 020.652.279-74, com endereço residencial na Rua Gecio de Souza e Silva, nº 210, CEP 88.051-210, Sambaqui, Florianópolis – SC; Rubens Carlos Pereira Filho, Secretário Municipal de Segurança e da Defesa do Cidadão, no período de 02/03/09 a 03/06/10, portador do CPF nº 433.101.509-25, com endereço na Rua Esteves Junior, nº 605, apto. 312, centro, Florianópolis, CEP 88.015-130, pela seguinte irregularidade:

3.1.1.1. Inexistência de ato de formalização para cessão de servidor da Guarda Municipal de Florianópolis ao Detran/SC – Departamento Estadual de Trânsito de Santa Catarina – em afronta aos arts. 118 e 118-A, § 1º, da Lei Complementar (municipal) nº 063/2003 (item 2.1.1. deste Relatório).

3.1.2. Sr. Átila Rocha dos Santos, Superintendente do IPUF, no período de 24/11/09 até 21/08/11, portador do CPF nº 178.854.189-87, com endereço residencial na Rua Europa, 209, Trindade – Florianópolis – SC, CEP 88036-135, pela seguinte irregularidade:

3.1.2.1. Ausência de apuração de responsabilidade de servidor público por danos causados em acidentes de trânsito e pagamento de multas de trânsito por infrações cometidas pelos servidores, produzindo prejuízo ao erário municipal no valor nominal de R$ 9.553,23, em desacordo com o disposto no art. 37, XXII, § 6º, da Constituição Federal, art. 10 da Lei Complementar (estadual) nº 202/2000 e arts. 171 e 172 da Lei Complementar (municipal) nº 063/2003 (item 2.1.2 deste relatório).

3.1.3. Sr. Geovanni Antônio Reis, Diretor de Operações do IPUF no período de 28/09/09 a 09/06/10 (254 dias), portador do CPF nº 612.880.209-53, com endereço residencial na Rua Antônio Franca, 70, Bl. 01, apto. 11, Barreiros - São José – SC, CEP 88113-655; Sr. Ivan da Silva Couto Júnior, Diretor de Operações do IPUF no período de 09/06/10 a 09/08/10 (61 dias), portador do CPF nº 006.240.609-42, com endereço funcional na Rua Capitão Euclides de Castro, nº 236, Coqueiros, Florianópolis-SC, CEP 88.080-010; Sr. Francisco Pereira da Silva, Diretor de Operações do IPUF, no período de 09/08/10 a 31/05/11 (295 dias), portador do CPF nº 057.372.146-72, com endereço na Rua Antônio Bayer, 130, Centro, Tijucas, SC; Srª. Camila de Souza Regis, Chefe do Departamento de Trânsito do IPUF no período de 01/01/10 a 14/06/10 (164 dias), com endereço residencial na Rua Tereza Cristina, 122, apto. 403, Estreito - Florianópolis – SC, CEP 88070-790 e Sr. Adriano Roberto de Souza, Chefe do Departamento de Trânsito do IPUF a partir de 14/06/10 até a emissão do Relatório de Instrução nº 22/2011 (913 dias), com endereço funcional na Praça Getúlio Vargas, 194, Centro - Florianópolis - SC, CEP 88020-030, pela seguinte irregularidade:

3.1.3.1. Ausência ou manutenção de sinalização dos equipamentos de fiscalização eletrônica de trânsito em desacordo com a Resolução Contran nº 146/2003 (item 2.2.1 deste relatório).

3.1.4. Sr. Ivan da Silva Couto Júnior, Diretor de Operações, no período de 09/06/10 a 09/08/10, portador do CPF nº 006.240.609-42, com endereço funcional na Rua Capitão Euclides de Castro, nº 236, Coqueiros, Florianópolis, SC, CEP 88080-010; Sr. Geovanni Antônio Reis e Sr. Francisco Pereira da Silva, já qualificados no item 3.1.3 desta conclusão, pela seguinte irregularidade:

3.1.4.1. Inexistência de sinalização dos equipamentos de fiscalização eletrônica de trânsito a 50 metros do cruzamento das vias em que foram instalados, em desacordo com a Cláusula XVI do Contrato nº 002/IPUF/05 e Cláusula Décima Sexta do Contrato nº 0935/IPUF/05 firmados com a empresa Engebras S/A Ind. Com. e Tecn. de Informática (item 2.2.2 deste relatório).

3.1.5. Srs. Átila Rocha dos Santos, Superintendente do IPUF de 24/11/09 a 21/08/11, já qualificado no item 3.1.2 desta conclusão, Francisco Pereira da Silva, Superintendente Adjunto do IPUF no período de 09/02/09 até a emissão do Relatório de Instrução DAE nº 22/2011, e Sr. Geovanni Antônio Reis, Diretor de Operações do IPUF no período de 28/09/09 a 09/06/10 (254 dias), qualificados no item 3.1.3 desta conclusão, pela seguinte irregularidade:

3.1.5.1. Fracionamento de despesas com publicação de editais de Notificação de Autuação e de Imposição de Penalidade sem a realização de processo licitatório, contrariando o disposto no inciso XXI do art. 37 da Constituição Federal e os arts. 2º e 3º da Lei nº 8.666/93 (item 2.3.2 deste relatório).

3.1.6. Sr. Átila Rocha dos Santos, já qualificado no item 3.1.2 desta conclusão, Sr. Francisco Pereira da Silva, Diretor de Operações do IPUF, no período de 09/08/2010 a 31/05/2011, e Superintendente Adjunto do IPUF no período de 09/02/09 até a emissão do Relatório de Instrução DAE nº 22/2011, Srs. Geovanni Antônio Reis e Ivan da Silva Couto Júnior, já qualificados no item 3.1.3 desta conclusão, pela seguinte irregularidade:

3.1.6.1. Aplicação da receita arrecadada com a cobrança de multas de trânsito em áreas diversas às previstas na legislação, caracterizando desvio de finalidade por contrariar o art. 320 da Lei nº 9.503/97 (Código de Trânsito Brasileiro), a Resolução Contran nº 191/2006 e o Convênio nº 12.419/2009-2 (item 2.5.2 deste relatório).

3.1.7. Srs. Geovanni Antônio Reis e Francisco Pereira da Silva, já qualificados no item 3.1.3 desta conclusão; pela seguinte irregularidade:

3.1.7.1. Bens adquiridos com a cota parte dos recursos do convênio de trânsito correspondente à Polícia Militar, ao Detran/SC e à Guarda Municipal de Florianópolis, que deveriam ser transferidos aos órgãos requerentes, permanecem no patrimônio do IPUF, contrariando o disposto no Convênio nº 12.419/2009-2 (item 2.5.3 deste relatório).

3.1.8. Sr. Dário Elias Berger, Prefeito Municipal de Florianópolis, no período de 01/01/2005 a 31/12/2012, portador do CPF nº 341954919-91, com endereço funcional na Rua Tenente Silveira, nº 60, Centro - Florianópolis - SC, CEP 88010-300, Sr. Átila Rocha dos Santos, já qualificado no item 3.1.2 desta conclusão; Sr. Carlos Eduardo Medeiros, Diretor de Operações do IPUF no período de 12/07/06 a 28/09/09 (1.174 dias), portador do CPF nº 378.381.219-49, com endereço residencial na Rua dos Bijupirás, 76, Jurerê - Florianópolis - SC, CEP 88053-414 e Sr. Geovanni Antônio Reis, já qualificado no item 3.1.3 desta conclusão, pela seguinte irregularidade:

3.1.8.1. Remuneração da empresa prestadora de serviço de fiscalização eletrônica de trânsito calculada com base na arrecadação efetiva das multas, em afronta aos princípios da legalidade e da moralidade previstos no art. 37, caput, e contrariando o disposto no art. 7º, § 3º, da Lei nº 8.666/93 (item 2.5.4 deste relatório).

3.2. Determinar ao Superintendente do Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis, a adoção de providências administrativas, nos termos do artigo 3º, §1º, III, da Instrução Normativa nº 13/2012, visando ao ressarcimento dos cofres públicos de R$ 5.792,80, referente ao pagamento do empenho nº 584/2010; e R$ 4.708,56, relativo aos empenhos nº 361/10, 371/10, 560/10, 657/10, 687/10 e 119/11, corrigidos pelo mesmo índice adotado pela Prefeitura de Florianópolis para extinção de créditos tributários, desde a data do pagamento irregular da despesa, e, no caso de restarem infrutíferas as providências, instaure Tomada de Contas Especial, nos termos do artigo 7º da Instrução Normativa nº 13/2012, sob pena de responsabilidade solidária da autoridade administrativa competente, dando conhecimento ao Tribunal de Contas quanto ao ressarcimento integral dos valores apurados, no prazo de 180 dias, conforme se depreende do art. 11, IV, da referida Instrução Normativa.

3.3. Recomendar à Prefeitura Municipal de Florianópolis que estipule responsável pelo controle do prazo para julgamento dos recursos interpostos na Junta Administrativa de Recursos de Infrações. (item 2.4 e 2.4.2 deste Relatório).

Após, voltaram os autos a este Ministério Público de Contas.

Note-se que a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial do ente em questão está inserida entre as atribuições dessa Corte de Contas, consoante os dispositivos constitucionais, legais e normativos vigentes (arts. 70 e 71, inciso IV, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988; arts. 58 e 59, inciso IV, da Constituição Estadual; art. 1º, inciso V, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000; e art. 8° c/c o art. 6° da Resolução n. TC-06/2001).

Passo, assim, à análise da responsabilidade pela irregularidade remanescente, sendo que as demais restrições já foram devidamente analisadas no Parecer n. MPTC/33207/2015.

1.     Inexistência de ato de formalização para cessão de servidor da Guarda Municipal de Florianópolis ao Detran/SC – Departamento Estadual de Trânsito de Santa Catarina – em afronta aos arts. 118 e 118-A, § 1º, da Lei Complementar Municipal n. 063/2003.

Conforme já mencionado, este órgão ministerial apresentou o Parecer n. MPTC/33207/2015, sugerindo, dentre outras questões, a audiência do Sr. Julio Pereira Machado para que apresentasse justificativas acerca da inexistência de ato de formalização para cessão de servidor da Guarda Municipal de Florianópolis ao Detran/SC.

O Sr. Julio Pereira Machado apresentou resposta à fl. 1846, alegando que toda cessão de servidor público municipal deve ser formalizada e justificada a cargo do Secretário da pasta, destacando que em momento algum foi informado da cessão em tela, frisando que o procedimento caberia exclusivamente aos Secretários titulares das pastas, de modo que a responsabilidade, no presente caso, recairia sobre o Secretário Municipal de Segurança e sobre o Secretário da Administração. Afirmou que nenhum diretor tem poderes e autonomia para tal procedimento, motivo pelo qual pediu o deferimento de seu pleito.

Em face de tal resposta, foi sugerida pela área técnica a audiência do Sr. Rubens Carlos Pereira Filho para que se manifestasse acerca da mesma irregularidade, tendo tal responsável apresentado resposta à fl. 1858, informando que exerceu o cargo de Secretário Municipal de Segurança e da Defesa do Cidadão no período entre 02/03/2009 e 03/06/2010, asserindo que a cessão do servidor Rony Schappo deveria ter sido formalizada por meio de Portaria, conforme o Estatuto do Servidor Público Municipal de Florianópolis.

Nesse sentido, afirmou que o art. 1º do Decreto n. 3.333/2005, vigente à época dos fatos, determina que “fica delegado ao Secretário Municipal de Administração, poderes para assinar todas as portarias referentes aos servidores públicos Municipais”, argumentando que a Portaria e a formalização do ato de cessão do servidor em questão não era incumbência sua, mas sim do Secretário da Administração Municipal. Aduziu que não possuía qualquer responsabilidade em exarar atos formais relativos aos servidores, explicando não ter poderes para tanto. Dessa forma, questionou a possibilidade de ser responsabilidade por algo fora de sua esfera de competências.

Alegou, ainda, que nunca foi informado de qualquer cessão ou necessidade de ato formal pelos responsáveis da Guarda Municipal, frisando que não se negou nem se omitiu em relação a qualquer ato. Apontou que tinha ciência somente do Convênio firmado, destacando que “tudo era tratado pela Guarda Municipal e pela Secretaria de Administração”, de modo que presumia que as devidas formalizações eram realizadas pelos responsáveis conforme determinado pela legislação correspondente.

Em que pesem as justificativas apresentadas pelos responsáveis apontados, entendo que não devem ser acolhidas.

Em relação às justificativas apresentadas pelo Sr. Julio Pereira Machado, cabe esclarecer que na data apontada pela área técnica como termo inicial da cessão do servidor Rony Schappo, exercia ele o cargo de Diretor da Guarda Municipal, Diretoria esta hierarquicamente subordinada à Secretaria Municipal de Segurança e Defesa do Cidadão. Acerca dessa relação de subordinação, o art. 5º da Lei Complementar Municipal n. 348/2009 dispunha o seguinte:

Art. 5º A execução das atividades da administração pública municipal será descentralizada e desconcentrada e se dará por meio das Secretarias Municipais, Secretarias Regionais e demais órgãos e entidades públicos municipais, com atuação regional.

Parágrafo Único. A descentralização e a desconcentração serão implementadas em quatro planos principais:

I – das Secretarias Municipais para as Secretarias Regionais;

II – do nível de direção estratégica para o nível gerencial, e deste para o nível operacional;

III – da administração direta para a administração indireta; e

IV – da administração do município para:

a)       a entidade da sociedade civil organizada, por intermédio das Secretarias Municipais ou Secretarias Regionais, mediante convenio, acordo ou instrumento congênere; e

b)       organizações sociais, entidades civis e entidades privadas sem fins lucrativos, mediante contratos de concessão, permissão, termos de parcerias, contratos de gestão e parcerias público-privadas. (grifei)

Relativamente à temática da desconcentração administrativa e da hierarquia, Celso Antônio Bandeira de Mello[1] ensina o seguinte:

Desconcentração

12. No início do capítulo também se anotou que os Estados, assim como as outras pessoas de Direito Público que criem para auxiliá-los, têm que repartir, no interior deles mesmos, os encargos de suas alçadas, para decidir os assuntos que lhes são afetos, dada a multiplicidade deles.

O fenômeno da distribuição interna de plexos de competências decisórias, agrupadas em unidades individualizadas, denomina-se desconcentração. Tal desconcentração se faz tanto em razão da matéria, isto é, do assunto (por exemplo, Ministério da Justiça, da Saúde, da Educação etc.), como em razão do grau (hierarquia), ou seja, do nível de responsabilidade decisória conferido aos distintos escalões que corresponderão aos diversos patamares de autoridade (por exemplo, diretor de Departamento, diretor de Divisão, chefe de Seção, encarregado de Setor). Também se desconcentra com base em critério territorial ou geográfico (por exemplo, delegacia regional da Saúde em São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro etc.). A aludida distribuição de competências não prejudica a unidade monolítica do Estado, pois todos os órgãos e agentes permanecem ligados por um sólido vínculo denominado hierarquia.

A hierarquia e os poderes do hierarca

13. Hierarquia pode ser definida como o vínculo de autoridade que une órgãos e agentes, através de escalões sucessivos, numa relação de autoridade, de superior a inferior, de hierarca a subalterno. Os poderes do hierarca confere-lhe uma contínua e permanente autoridade sobre toda a atividade dos subordinados.

Tais poderes consistem no(a) poder de comando, que o autoriza a expedir determinações gerais (instruções) ou específicas a um dado subalterno (ordens), sobre o modo de efetuar os serviços; (b) poder de fiscalização, graças ao qual inspeciona as atividades dos órgãos e agentes que lhe estão subordinados; (c) poder de revisão, que lhe permite, dentro dos limites legais, alterar ou suprimir as decisões dos inferiores, mediante revogação, quando inconveniente ou inoportuno o ato praticado, ou mediante anulação, quando se ressentir de vício jurídico; (d) poder de punir, isto é, de aplicar as sanções estabelecidas em lei aos subalternos faltosos; (e) poder de dirimir controvérsias de competência, solvendo os conflitos positivos (quando mais de um órgão se reputa competente) ou negativos (quando nenhum deles se reconhece competente), e (f) poder de delegar competências ou de avocar, exercitáveis nos termos da lei.

Nota-se, portanto, que o responsável apontado detinha grau de responsabilidade significativa, tanto no sentido de verificar a movimentação de servidores pertencentes aos quadros sob sua autoridade como no sentido de comunicar tais fatos às autoridades superiores.

Conforme bem delineado pela área técnica (fl. 1867):

Na época dos fatos, a Lei Complementar nº 348/2009, no seu artigo 5º, estabelecia que a Prefeitura se organizava da seguinte forma: I - Secretarias Municipais, II - Do nível de direção estratégica para o nível gerencial, e deste para o nível operacional. Nesse sentido, a Secretaria Municipal de Segurança e Defesa do Cidadão organizava-se por meio de três diretorias, entre elas, a Diretoria da Guarda Municipal. Tal divisão administrativa vem em consonância com o princípio da hierarquia, que estabelece relação de coordenação e subordinação entre os diversos níveis.

Para Di Pietro, “em consonância com o princípio da hierarquia, os órgãos da Administração Pública são estruturados de tal forma que se cria uma relação de coordenação e subordinação entre uns e outros, cada qual com atribuições definidas em lei. Desse princípio, que só existe relativamente às funções administrativas, (...), decorre uma série de prerrogativas para a Administração: a de rever os atos dos subordinados, a de delegar e avocar atribuições, a de punir; para o subordinado surge o dever de obediência”.

O Diretor da Guarda, Sr. Júlio Pereira Machado, deveria ter fiscalizado o efetivo trabalho dos servidores sob sua responsabilidade, em consonância ao princípio da hierarquia. Ao verificar que o servidor Rony Schappo se encontrava prestando serviço ao Detran, em razão de convênio, deveria ter comunicado o fato ao Secretário Municipal de Segurança e da Defesa do Cidadão, seu superior à época. Todavia, não comprovou que realizou a comunicação ao Secretário Municipal de Segurança e Defesa do Cidadão. Por sua omissão em comunicar o seu superior, entende-se por imputar a irregularidade apontada ao Sr. Júlio Pereira Machado (grifei).

Logo, entende-se pela responsabilização do Sr. Julio Pereira Machado pela irregularidade apontada, com a consequente aplicação de penalidade de multa prevista no art. 70, inciso II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000.

Em relação às justificativas apresentadas pelo Sr. Rubens Carlos Pereira Filho, impende destacar que o responsável ocupava o cargo de Secretário Municipal de Segurança e da Defesa do Cidadão à época do fato que deu azo à irregularidade, sendo, assim, a autoridade hierárquica superior ao Diretor da Guarda, Sr. Julio Pereira Machado.

Dessa maneira, o Secretário Municipal possuía o dever legal de supervisionar e fiscalizar os serviços executados no órgão de sua competência, devendo para tanto ser responsabilizado no caso de ilegalidade como a observada no presente processo.

Trata-se, em síntese, de responsabilização em face das chamadas culpa in eligendo e culpa in vigilando, significando esta a ausência de fiscalização das atividades de seus subordinados, ou dos bens e valores sujeitos a esses agentes, ao passo que aquela representa a responsabilidade atribuída a quem deu causa à má escolha de seu representante ou preposto.

A responsabilidade do gestor, assim, decorre de seu comportamento omissivo quanto ao dever de fiscalizar, o que se tornou, no caso em comento, uma das causas determinantes da irregularidade assinalada.

Por fim, destaca-se que o Secretário Municipal de Segurança e da Defesa do Cidadão era quem também detinha responsabilidade pela irregularidade ora analisada, e não o Secretário Municipal da Administração, cuja responsabilidade não restou demonstrada nos autos, como já salientado na primeira manifestação deste órgão ministerial. A propósito, não é outro o entendimento da área técnica (fls. 1867-1867v):

No que se refere ao Sr. Rubens Carlos Pereira Filho, Secretário Municipal de Segurança e Defesa do Cidadão à época dos fatos, entende-se que ele possuía o dever de fiscalizar o efetivo trabalho dos servidores sob sua responsabilidade, tal como o Diretor da Guarda. Caso eles tivessem demonstrado o envio da informação ao Secretário da Administração de que o Servidor Rony Schappo se encontrava no Detran prestando serviços em razão do convênio com a Prefeitura, entende-se que a responsabilidade seria do Secretário de Administração em não emitir a portaria de cessão, mas isso não ficou comprovado nos autos. A omissão do Secretário de Segurança e Defesa do Cidadão permitiu a cessão informal do servidor Rony Schappo sem a emissão de Portaria específica, que deveria ter sido expedida pelo Secretário Municipal de Administração. Diante tal omissão, entende-se por imputar a irregularidade apontada ao Sr. Rubens Carlos Pereira Filho (grifei).

Desse modo, entende-se pela responsabilização do Sr. Rubens Carlos Pereira Filho pela irregularidade apontada, com a consequente aplicação de penalidade de multa prevista no art. 70, inciso II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000.

2.    Conclusão

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, manifesta-se:

2.1. pela APLICAÇÃO DE MULTA, prevista no art. 70, inciso II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, aos Srs. Julio Pereira Machado e  Rubens Carlos Pereira Filho, em face da inexistência de ato de formalização para cessão de servidor da Guarda Municipal de Florianópolis ao Detran/SC, em afronta aos arts. 118 e 118-A, § 1º, da Lei Complementar Municipal n. 063/2003 (item 3.1.1 da conclusão do Relatório de Reinstrução n. DAE-026/2016);

2.2. pela REITERAÇÃO dos demais apontamentos já efetuados na conclusão do Parecer n. MPTC/33207/2015 (fls. 1833-1836).

Florianópolis, 25 de janeiro de 2017.

 

 

Cibelly Farias Caleffi

Procuradora

 



[1] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 150-151.