Parecer nº: |
MPC/48.472/2017 |
Processo nº: |
TCE 11/00474355 |
Origem: |
Fundo
Estadual de Incentivo ao Esporte - FUNDESPORTE |
Assunto: |
TCE
referente à Nota de Empenho n° 297, de 08/12/2009, no valor de R$ 30.000,00,
repassados à Associação dos Mesatenistas de Florianópolis, para o projeto
Manutenção Equipe de Florianópolis. |
Trata-se
de Tomada de Contas Especial instaurada internamente pela Secretaria de Estado
de Turismo, Cultura e Esporte, com vistas a analisar as irregularidades
concernentes ao repasse de recursos públicos à Associação dos Mesatenistas de
Florianópolis, no valor de R$ 30.000,00.
O
caderno processual iniciou-se com os documentos encaminhados pela Unidade
Gestora (fls. 04-110).
Ao
analisar os autos, a Diretoria de Controle da Administração Estadual, sob o
relatório nº 482/2014, sugeriu definir a responsabilidade solidária e realizar
a citação dos responsáveis, ante a observância de diversas irregularidades no
processo de concessão de recursos públicos e tendo em vista, ainda, a não
apresentação da prestação de contas pela Associação dos Mesatenistas de
Florianópolis (fls. 111-122).
Determinada
a realização do ato processual (fl. 112), o Sr. César Souza Júnior apresentou
razões de defesa às fls. 132-149 e o Sr. Valdir Borges Walendowski às fls. 152-156.
Após
examinar as contestações apresentadas, o corpo técnico opinou por julgar
irregulares os autos da tomada de contas especial e condenar, de forma
solidária, os responsáveis à devolução dos valores aos cofres públicos (fls.
170-185).
O
Ministério Público de Contas, por sua vez, acompanhou as conclusões exaradas
pela área técnica (fls. 189-200).
Ato
contínuo, o Sr. Neri Antônio Cataneo veio aos autos juntar documentos
relacionados à prestação de contas (fls. 201-229), razão pela qual o Relator
determinou o retorno do feito à diretoria técnica (fl. 231).
Em
sequência, o Sr. Valdir Rubens Walendowski apresentou aditamento às suas
alegações de defesa (fls. 232-247) e novo documento (fls. 248-249).
Examinadas
as contas, a Diretoria de Controle da Administração Estadual elaborou novo
relatório técnico, sob o nº 687/2015, sugerindo definir a responsabilidade
solidária e efetuar nova citação dos responsáveis (fls. 258-288), o que foi
acolhido pelo Relator (fl. 289).
Perfectibilizada
a realização do ato processual, o Sr. Gilmar Knaesel apresentou defesa às fls.
310-334, o Sr. João Augusto Freyesleben Valle Pereira às fls. 336-338, a Sra.
Márcia Regina Alves Valle Pereira à fl. 340, o Sr. Neri Antônio Caetano às fls.
349-364 e o Sr. César Sousa Júnior às fls. 376-389.
Por
fim, sobreveio novo relatório técnico, sob o nº 394/2016, com a seguinte
conclusão (fls. 398-450):
3.1 Julgar irregulares, com imputação
de débito,
na forma do art. 18, III, “b” e “c”, c/c o art. 21, caput da Lei Complementar Estadual nº 202/2000, as contas de
recursos repassados a Associação
dos Mesatenistas de Florianópolis, no montante de R$ 30.000,00 (trinta mil reais),
referentes à Nota de Empenho nº 2009NE000297, paga em 16/12/2009, discriminada
na Tabela 1 do item 1, de acordo com os relatórios emitidos nos autos.
3.2 Condenar solidariamente, nos termos do art.
18, § 2º da Lei Complementar Estadual nº 202/2000, o Sr. Neri Antônio Cataneo, inscrito no CPF sob o nº 006.408.839-15,
Presidente à época da Associação dos Mesatenistas de Florianópolis, residente
na Rua Hoepcke nº 179, apto 807, Torre 2, Centro, Florianópolis/SC, CEP
88.010-130; a pessoa jurídica Associação dos Mesatenistas de
Florianópolis, inscrita no CNPJ sob o nº 07.256.395/0001-37, estabelecida
no Largo São Sebastião nº 61, apto. 305, Centro, Florianópolis/SC, CEP
88.015-560; o Sr. João Augusto
Freyesleben Valle Pereira, inscrito no CPF sob o nº 516.952.609-10,
residente na Rua Vereador Ramon Filomeno nº 255, apto. 903, bl. Baía Sul,
Itacorubi, Florianópolis/SC, CEP 88.034-495; a Sra. Márcia Regina Alves Valle Pereira, inscrita no CPF sob o nº
579.480.979-53, com endereço residencial na Rua Vereador Ramon Filomeno nº 255,
apto. 903, bl. Baía Sul, Itacorubi, Florianópolis/SC, CEP 88.034-495; o Sr. Ronaldo Macedo Rodrigues, inscrito no
CPF sob o nº 454.427.469-91, residente na Rua Desembargador Arno Hoeschel nº
159, apto. 305, Centro, Florianópolis/SC, CEP 88.015-620; e o Sr. Gilmar Knaesel, inscrito no CPF sob o
nº 341.808.509-15, ex-Secretário de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, com
endereço na Rua Vereador Osni Ortiga nº 70, Lagoa da Conceição,
Florianópolis/SC, CEP 88.040-450, ao recolhimento
da quantia de até R$ 30.000,00
(trinta mil reais), fixando-lhes prazo de 30 (trinta) dias, a contar da
publicação do Acórdão no Diário Oficial Eletrônico do Tribunal (DOTC-e), para
comprovar perante esta Corte de Contas o recolhimento do valor do débito ao
Tesouro do Estado, atualizado monetariamente e acrescido dos juros legais
(arts. 21 e 44 da Lei Complementar nº 202/2000), partir de 16/12/2009 (data do
repasse), sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento de peças
processuais ao Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, para que adote
providências à efetivação da execução da decisão definitiva (art. 43, II da Lei
Complementar nº 202/2000), em razão da não comprovação da boa e regular
aplicação dos recursos públicos, contrariando o art. 144, § 1º da Lei
Complementar Estadual nº 381/2007 e o art. 49 da Resolução TC nº 16/1994,
conforme segue:
3.2.1 De responsabilidade solidária do Sr. Neri Antônio Cataneo e da pessoa jurídica Associação dos Mesatenistas de Florianópolis, já qualificados nos
autos, sem prejuízo da aplicação da
multa prevista no art. 68 da Lei Complementar Estadual nº 202/2000, em face
da:
3.2.1.1 ausência de
comprovação material da efetiva realização do objeto do projeto proposto e
incentivado com recursos públicos, ante a ausência de elementos de suporte que
demonstrem cabalmente em que especificamente foram aplicados, no importe de R$ 30.000,00 (trinta mil reais),
descumprindo o art. 70, IX, XI e XXI do Decreto Estadual nº 1.291/2008, o art.
144, § 1º da Lei Complementar Estadual nº 381/2007 e os arts. 49 e 52, II e III
da Resolução TC nº 16/1994 (item 2.4.1.1 deste
Relatório);
3.2.1.2 ausência de comprovação
material do efetivo fornecimento dos materiais ou prestação dos serviços,
aliado a descrição insuficiente das declarações e algumas notas fiscais
apresentadas e agravado pela não juntada de outros elementos de suporte, no
montante de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), mesmo valor tratado no item 3.2.1.1 desta conclusão, em afronta ao
disposto no art. 70, IX, XI e XXI, e § 1º do Decreto Estadual nº 1.291/2008,
nos arts. 49, 52, II e III, e 60, II e III, todos da Resolução TC nº 16/1994, e
no art. 144, § 1º da Lei Complementar Estadual nº 381/2007 (item 2.4.1.2 deste Relatório;
3.2.1.3 indevida
apresentação de comprovantes de despesas inábeis para comprovar gastos com
recursos públicos, no montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais), valor já incluído nos itens 3.2.1.1 e 3.2.1.2 desta conclusão, o que os tornam sem a devida credibilidade, em
afronta ao art. 70, XI, §§ 2º, 5º e 6º do Decreto Estadual nº 1.291/2008, aos
arts. 46, parágrafo único, 49, 52, II e III, e 59, todos da Resolução TC nº
16/1994, e ao art. 144, § 1º da Lei Complementar Estadual nº 381/2007 (item 2.4.1.3 deste Relatório);
3.2.1.4 indevida realização de despesas intrínsecas
à capacidade operacional da entidade proponente para a realização do projeto
incentivado, no montante de R$
10.000,00 (dez mil reais), valor já incluído nos itens 3.2.1.1 e 3.2.1.2 e mesmo do item 3.2.1.3 todos desta conclusão,
contrariando o disposto no a art. 1º, § 2º do Decreto Estadual nº
1.291/2008, bem como os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade,
razoabilidade, economicidade e eficiência, previstos no art. 37, caput da Constituição Federal e no art.
16, caput da Constituição do Estadual (item 2.4.1.4 deste Relatório);
3.2.1.5 realização de despesas sem comprovação de
três orçamentos originais ou da exclusividade, no montante de R$ 28.826,60
(vinte e oito mil, oitocentos e vinte e seis reais e sessenta centavos), valor
já incluído nos itens 3.2.1.1 e 3.2.1.2 e parte consta dos itens 3.2.1.3
e 3.2.1.4, todos desta conclusão, contrariando o disposto no art.
48, I e II do Decreto Estadual nº 1.291/2008 (item
2.4.1.5 deste Relatório);
3.2.1.6 ausência de extrato
da conta bancária específica, abrangendo a data do recebimento da parcela até o
último pagamento efetuado e conciliação bancária, com vistas a verificar a
movimentação do repasse de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), o qual abarca os itens 3.2.1.1 ao 3.2.1.5 desta
conclusão, em desobediência ao art. 70, inciso III do
Decreto Estadual nº 1.291/2008, ao art. 144, § 1º da Lei Complementar Estadual nº 381/2007
e aos arts. art. 44, III, 49, 52, II e III da Resolução TC nº 16/1994 (item 2.4.1.6 deste Relatório);
3.2.1.7 não emissão de
cheques cruzados no montante do repasse de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), o
qual abarca os itens 3.2.1.1 ao 3.2.1.5
desta conclusão, em
desacordo com o art. 58, § 2º do Decreto Estadual nº 1.291/2008, bem como com o
art. 144, § 1º da Lei Complementar Estadual nº 381/2007 e os arts. 47, 49 e 52,
II e III da Resolução TC nº 16/1994 (item 2.4.1.7
deste Relatório); e
3.2.1.8 ausência de
declaração do responsável, nos documentos comprobatórios da despesa, no valor
de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), o
qual abarca os itens 3.2.1.1 ao 3.2.1.5 desta conclusão, certificando que o
material foi recebido ou o serviço prestado, em descumprimento ao art. 70, XII
do Decreto Estadual nº 1.291/2008, ao art. 144, § 1º da Lei Complementar
Estadual nº 381/2007 e aos arts. 44, VII, 49 e 52, II e III da Resolução TC nº
16/1994 (item 2.4.1.8 deste Relatório).
3.2.2 De responsabilidade solidária do Sr. Gilmar Knaesel, já qualificado, em
razão de irregularidades que corroboraram para a ocorrência do dano apontado no
item 3.2 desta conclusão, no valor de
até R$ 30.000,00 (trinta mil reais), sem prejuízo da aplicação da multa prevista no art. 68 da Lei Complementar Estadual
nº 202/2000, em face da:
3.2.2.1 aprovação
do projeto, assinatura do contrato e repasse de recursos mesmo diante da
ausência de documentos exigidos na tramitação inicial dos projetos, contrariando os itens 12, 13, 16, 19, 21, 23 e 24 do Anexo
V do Decreto Estadual nº 1.291/2008, por força dos art. 30 e 36, § 3º do mesmo
Decreto, bem como descumpriu o princípio da legalidade e a necessária motivação
dos atos, ditado pelo art. 37, caput da Constituição Federal e o art.
16, caput e § 5º da Constituição
Estadual (item 2.3.1 deste Relatório);
3.2.2.2 aprovação do
projeto, firmado o contrato e repasse dos recursos mesmo diante da ausência de
Parecer Técnico e Orçamentário emitido pelo SEITEC, contrariando os arts. 11, I
e 36, § 3º do Decreto Estadual nº 1.291/2008, c/c a Lei Estadual nº
13.336/2005, o art. 37, caput da
Constituição Federal e o art. 16, caput
e § 5º da Constituição Estadual (item 2.3.2 deste Relatório); e
3.2.2.3 aprovação do
projeto, assinatura do contrato de apoio financeiro e repasse dos recursos
mesmo diante da ausência da avaliação, pelo Conselho Estadual de Esporte,
quanto ao julgamento do mérito do projeto apresentado pela entidade,
descumprindo as exigências contidas no art. 10, § 1º da Lei Estadual nº
13.336/2005, com redação dada pela Lei nº 14.366/2008, nos arts. 10 e 11 da Lei
Estadual nº 14.367/2008 e nos arts. 10, II e § 2º, e 19 do Decreto Estadual nº
1.291/2008, c/c o art. 37, caput da Constituição Federal e o art.
16, caput e § 5º da Constituição
Estadual (item 2.3.3 deste Relatório).
3.2.3 De responsabilidade solidária do Sr. João Augusto Freyesleben Valle Pereira,
já qualificado, em face da emissão de documento impróprio para receber por
serviços prestados, pois não há comprovação do efetiva prestação dos serviços, no
valor de R$ 4.375,91 (quatro mil, trezentos e setenta e cinco reais e noventa e
um centavos), valor já incluído nos
itens 3.2.1.1 ao 3.2.1.8 desta
conclusão, nos termos do art. 70, parágrafo único, c/c art. 71, inciso II,
da Constituição Federal, do art. 144, § 1º da Lei Complementar Estadual nº
381/2007, dos art. 70, XI, §§ 2º, 5º e 6º do Decreto Estadual nº 1.291/2008 e
dos arts. 46, 49, 52, II e III, 59 e 60 da Resolução nº TC 16/1994 (item
2.4.1.3 deste Relatório).
3.2.4 De responsabilidade solidária da Sra. Márcia Regina Alves Valle Pereira, já
qualificada, em face da emissão de documento impróprio para receber por
serviços prestados, pois não há comprovação do efetiva prestação dos serviços,
no valor de R$ 869,00 (oitocentos e sessenta e nove reais), valor já incluído nos itens 3.2.1.1 ao
3.2.1.8 desta conclusão, nos
termos do art. 70, parágrafo único, c/c art. 71, inciso II, da Constituição
Federal, do art. 144, § 1º da Lei Complementar Estadual nº 381/2007, dos art.
70, XI, §§ 2º, 5º e 6º do Decreto Estadual nº 1.291/2008 e dos arts. 46, 49,
52, II e III, 59 e 60 da Resolução nº TC 16/1994 (item 2.4.1.3 deste
Relatório).
3.2.5 De responsabilidade solidária do Sr. Ronaldo Macedo Rodrigues, já
qualificado, em face da emissão de documento impróprio para receber por
serviços prestados, pois não há comprovação do efetiva prestação dos serviços,
no valor de R$ 4.755,09 (quatro mil, setecentos e cinquenta e cinco reais e
nove centavos), valor já incluído nos
itens 3.2.1.1 ao 3.2.1.8 desta
conclusão, nos termos do art. 70, parágrafo único, c/c art. 71, inciso II,
da Constituição Federal, do art. 144, § 1º da Lei Complementar Estadual nº
381/2007, dos art. 70, XI, §§ 2º, 5º e 6º do Decreto Estadual nº 1.291/2008 e
dos arts. 46, 49, 52, II e III, 59 e 60 da Resolução nº TC 16/1994 (item
2.4.1.3 deste Relatório).
3.3 Aplicar ao Sr. Neri Antônio Cataneo, já qualificado, multas prevista no art. 70, inciso II
da Lei Complementar Estadual nº 202/2000, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta)
dias, a contar da publicação do Acórdão no DOTC-e, para comprovar perante este
Tribunal o recolhimento do valor ao Tesouro do Estado, sem o que, fica desde
logo autorizado o encaminhamento de peças processuais ao Ministério Público
junto ao Tribunal de Contas, para que adote providências à efetivação da
execução da decisão definitiva (art. 43, II e 71 da Lei Complementar nº
202/2000), em função da:
3.3.1 ausência do
Balancete de Prestação de Contas de Recursos Antecipados, em desobediência ao art. 70, VII do Decreto Estadual nº
1.291/2008 e ao art. 44, I da Resolução TC nº 16/1994 (item 2.4.2 deste Relatório);
3.3.2 indevida
apresentação da prestação de contas 1.863 (um mil, oitocentos e sessenta e
três) dias depois do término do prazo regulamentar, em desacordo com o que
determina o art. 69, I do Decreto Estadual nº 1.291/2008 e a Cláusula Oitava,
II do Contrato de Apoio Financeiro nº 17204/2009-9 (item 2.4.3 deste Relatório);
3.3.3
ausência da comprovação da realização da contrapartida social, contrariando o
previsto no art. 52 do Decreto Estadual 1.291/2008 e no art. 130 da Lei
Complementar Estadual nº 381/2007 (item 2.4.4 deste Relatório);
3.3.4 ausência de
comprovação da divulgação e promoção do Estado de Santa Catarina, assim como do
SIEITEC/Fundo Estadual de Incentivo ao Esporte (FUNDESPORTE), contrariando o
disposto no art. 25, inciso I do Decreto Estadual nº 1.291/2008, no art. 144, §
1º da Lei Complementar Estadual nº 381/2007 e nos arts. 49, 52, II e III e 65
da Resolução TC nº 16/1994 (item 2.4.5 deste
Relatório).
3.4 Aplicar ao Sr. Valdir Rubens Walendowsky, inscrito no
CPF sob o nº 246.889.329-87, ex-Secretário de Estado do Turismo, Cultura e
Esporte (de 12/04/2010 a 30/12/2010), com endereço para intimações/notificações de sua procuradora constituida nos autos, Dra. Claudia Bressan (fl. 166), na Rua Júlio Moura nº 30, sala
201, Centro, Florianópolis/SC, CEP 88020-150, multa
prevista no art. 70, inciso II da Lei Complementar Estadual nº 202/2000,
fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação do Acórdão no
DOTC-e, para comprovar perante este Tribunal o recolhimento do valor ao Tesouro
do Estado, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento de peças
processuais ao Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, para que adote
providências à efetivação da execução da decisão definitiva (art. 43, II e 71
da Lei Complementar nº 202/2000), em face da intempestiva adoção de providências
administrativas preliminares e omissão na instauração de tomada de contas
especial, contrariando os arts. 6º, 7º e 8º do Decreto Estadual nº 1.977/2008,
o art. 10 da Lei Complementar Estadual nº 202/2000, os arts. 143 e 146 da Lei
Complementar Estadual nº 381/2007 e nos arts. 50 e 51 da Resolução TC nº
16/1994 (itens 2.3.4.1 deste Relatório e 2.1.4.2 do Relatório de Instrução nº
0687/2015 – fls. 266-272v).
3.5 Aplicar ao Sr. César Souza Júnior, inscrito no CPF sob
o nº 028.251.449-08, ex-Secretário de Estado do Turismo, Cultura e Esporte (de
03/01/2011 a 15/01/2012), com endereço profissional na Rua Tenente Silveira nº 60, Centro,
Florianópolis/SC, multa
prevista no art. 70, inciso II da Lei Complementar Estadual nº 202/2000,
fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação do Acórdão no
DOTC-e, para comprovar perante este Tribunal o recolhimento do valor ao Tesouro
do Estado, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento de peças
processuais ao Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, para que adote
providências à efetivação da execução da decisão definitiva (art. 43, II e 71
da Lei Complementar nº 202/2000), em face da demora injustificada na instauração de
tomada de contas especial, contrariando os arts. 7º e 8º do Decreto Estadual nº
1.977/2008, o art. 10 da Lei Complementar Estadual nº 202/2000, os arts. 143 e
146 da Lei Complementar Estadual nº 381/2007 e nos arts. 50 e 51 da Resolução
TC nº 16/1994 (item 2.3.4.2 deste Relatório).
3.6 Declarar o Sr. Neri Antônio Cataneo e a pessoa
jurídica Associação dos Mesatenistas de
Florianópolis, impedidos de receber novos recursos do erário até a
regularização do presente processo, consoante dispõe o art. 16, § 3º da Lei
Estadual nº 16.292/2013, c/c o art. 1º, § 2º, inciso I, alíneas “b” e “c” da Instrução Normativa TC nº 14/2012 e o art. 61 do Decreto
Estadual nº 1.309/2012.
3.7 Dar ciência do Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o
fundamenta, ao Sr. Gilmar Knaesel, ao Sr. Valdir Rubens Walendowsky e a sua procuradora (fl. 166), ao Sr.
Cesar Souza Júnior e a seu procurador (fl. 390), ao Sr. Neri Antônio Cataneo e a seu
procurador (fl. 365), à entidade Associação dos Mesatenistas de
Florianópolis, ao Sr. João Augusto Freyesleben Valle Pereira, a Sra. Márcia Regina Alves Valle Pereira, ao Sr. Ronaldo Macedo
Rodrigues e à Secretaria de Estado
de Turismo, Cultura e Esporte (SOL). (Grifos no original)
É
o relatório.
1. Considerações iniciais
Ressalte-se,
inicialmente, que o Fundo Estadual de Incentivo ao Esporte repassou à
Associação dos Mesatenistas de Florianópolis o valor de R$ 30.000,00, em
16.12.2009, com vistas à execução do projeto denominado “Manutenção da Equipe
de Florianópolis”.
Nos
termos do plano de trabalho, o projeto tinha por escopo manter a equipe de
mesatenistas de Florianópolis e proporcionar melhores condições para o
desenvolvimento da modalidade (fl. 18).
A
propósito, cabe aqui mencionar as despesas previstas no aludido plano: a)
aquisição de bolas de tênis de mesa; b) aquisição de redes oficiais para mesa;
c) serviços de consultoria técnica; d) contratação de marceneiro especializado;
e) contratação de advogado desportista; f) contratação de psicólogo desportivo;
g) aluguel de micro-ônibus; h) hospedagem de atletas em viagem; i) alimentação;
j) aquisição de raquetes oficiais.
A
proponente solicitou o valor de R$ 80.000,00, montante aprovado pelo Fundo
Estadual de Incentivo ao Esporte. No entanto, repassou-se apenas a importância
de R$ 30.000,00, sem restar consignado nos autos, no entanto, o motivo que
culminou na redução do valor inicialmente aprovado.
A
par dos dispêndios preestabelecidos, anote-se que, a título de contrapartida,
restou acordado que a Associação dos Mesatenistas de Florianópolis realizaria
as seguintes ações sociais (fl. 17): a) promoção de 10 palestras com os
melhores mesatenistas da América do Sul; b) doação de 10 mesas para escolas da
rede pública estadual; c) realização de aulas gratuitas no ginásio municipal.
Presente
esse contexto, destaque-se que foram
constatadas as seguintes irregularidades no processo de concessão de recursos
públicos: a) ausência de documentos exigidos na tramitação inicial do projeto
para aprovação e liberação dos recursos; b) ausência do parecer técnico e
orçamentário emitido pelo SEITEC; c) ausência de julgamento pelo Conselho
Estadual de Esportes do projeto apresentado; d) intempestiva adoção das
providências administrativas e não instauração da tomada de contas especial.
Já no processo de prestação de contas,
apontou-se a ausência de comprovação da boa e da regular aplicação dos recursos
públicos, o que ficou evidenciado diante dos seguintes apontamentos
restritivos: a) ausência de comprovação
da realização do projeto proposto; b) ausência de comprovação do efetivo
fornecimento dos materiais ou prestação dos serviços, aliado à descrição
insuficiente das notas fiscais; c) comprovação indevida de despesas com
documentos não fiscais; d) realização de despesas intrínsecas à capacidade da
entidade proponente; e) realização de despesas sem comprovação de três
orçamentos ou justificativa da escolha; f) ausência de extrato bancário com
movimentação completa do período; g) indevida emissão de cheques não cruzados;
h) ausência de declaração do responsável nos documentos de despesas
certificando que o material foi recebido e/ou o serviço foi prestado; i)
ausência de balancete de prestação de contas de recursos antecipados; j) apresentação
das contas fora do prazo legal; k) ausência de comprovação da realização da
contrapartida social; l) não comprovação da divulgação e promoção do Fundo
Estadual de Esportes.
Feita essa introdução, passa-se à análise da
prejudicial de mérito arguida e, após, ao exame das irregularidades avistadas
nos autos.
2.
Da prejudicial de mérito da prescrição
Cabe
ter presente, em primeiro lugar, que o Sr. Gilmar Knaesel arguiu a prejudicial
de mérito da prescrição, no intento de afastar a sua responsabilização neste
caderno processual.
Para
o ex-Secretário de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, o caso trazido à baila
deveria ter sido julgado em até cinco anos a contar da data do repasse dos
recursos públicos - 16.12.2009.
Na
esteira do raciocínio formulado pelo gestor, ter-se-ia, portanto, até o ano de
2014 para a análise das contas e eventual imputação de débito.
Contudo,
sem razão a tese lançada.
Com
efeito, sabe-se que a matéria aqui ventilada - prescrição - já foi objeto de
muita discussão no âmbito do TCE/SC.
Seguindo
a orientação formulada pelo Supremo Tribunal Federal, a Corte de Contas
catarinense, em diversas ocasiões, já assinalou que o dano ao erário é
imprescritível, nos termos do art. 37, § 5º, da Constituição da República[1].
Para
corroborar, anote-se a ementa do voto proferido pelo Conselheiro Substituto
Cleber Muniz Gavi:
RECURSO
DE RECONSIDERAÇÃO. CONHECER. NÃO-PROVER.
Prescrição.
Tribunal de Contas.
A
hipótese de ressarcimento de prejuízo causado ao erário não se submete ao
instituto da prescrição, consoante determina a parte final do § 5º do art. 37
da Constituição Federal.
Tribunal
de Contas. Procedimentos instaurados pelo Ministério Público Estadual
O
dever-poder conferido pelo texto constitucional aos Tribunais de Contas não
está jungido aos procedimentos investigatórios instaurados pelo Ministério
Público Estadual.
Matéria de Fato. Prova.
A defesa
baseada em matéria de fato deve estar acompanhada de prova idônea[2].
Por
outra banda, reconheço, notadamente, a existência da Lei Complementar Estadual
nº 588/2013 (de questionável constitucionalidade por vício de iniciativa), a
qual versa sobre a prescrição intercorrente.
Contudo,
é importante rememorar que, nos termos da Resolução nº TC 100/2014, a Lei
Complementar Estadual nº 588/2013 não deve ser empregada quando constatada a
ocorrência de dano ao erário, senão vejamos:
Art. 3° A aplicação
do art. 24-A da Lei Complementar (estadual) n. 202/2000 será afastada nas
seguintes hipóteses:
I - incidência do art. 37, §5°, da Constituição Federal
nos processos em que for caracterizado dano ao erário, conforme dispõem os
arts. 15, §3°, 18, inciso lll e §2°, e 32 da Lei Complementar (estadual) n.
202/2000;
II - apreciação de
processo de atos para fins de registro, de que trata o inciso III do art. 59 da
Constituição do Estado. (Grifou-se)
A
par disso, cumpre assinalar que as irregularidades vislumbradas no presente
caso são ensejadoras de imposição de débito, em razão do dano causado ao
erário, e, ainda, aplicação de multa, ante a violação de dispositivos legais.
É
necessário, portanto, fazer a subsunção do fato à norma, a fim de verificar se
ocorreu a prescrição das irregularidades passíveis de multa.
Nesse
contexto, convém anotar o conteúdo normativo da Lei Complementar Estadual nº
588/2013:
Art.
24-A É de 5 (cinco) anos o prazo para análise e julgamento de todos os
processos administrativos relativos a administradores e demais responsáveis a
que se refere o art. 1º desta Lei Complementar e a publicação de decisão
definitiva por parte do Tribunal, observado o disposto no § 2º deste
artigo.
§
1º Findo o prazo previsto no caput
deste artigo, o processo será considerado extinto, sem julgamento do mérito,
com a baixa automática da responsabilidade do administrador ou responsável,
encaminhando-se os autos ao Corregedor-Geral do Tribunal de Contas, para apurar
eventual responsabilidade.
§
2º O prazo previsto no caput
deste artigo será contado a partir da data de citação do administrador ou
responsável pelos atos administrativos, ou da data de exoneração do cargo ou
extinção do mandato, considerando-se preferencial a data mais recente.” (NR)
Art.
2º O disposto no art. 24-A da Lei Complementar nº 202, de 2000,
aplica-se, no que couber, aos processos em curso no Tribunal de Contas, da
seguinte forma:
I
- os processos instaurados há 5 (cinco) ou mais anos terão, a partir da
publicação desta Lei Complementar, o prazo de 2 (dois) anos para serem
analisados e julgados;
II
- os processos instaurados há pelo menos 4 (quatro) anos e menos de 5 (cinco)
anos terão, a partir da publicação desta Lei Complementar, o prazo de 3 (três)
anos para serem analisados e julgados;
III
- os processos instaurados há pelo menos 3 (três) anos e menos de 4 (quatro)
anos terão, a partir da publicação desta Lei Complementar, o prazo de 4
(quatro) anos para serem analisados e julgados; e
IV
- os processos instaurados há menos de 3 (três) anos terão, a partir da
publicação desta Lei Complementar, o prazo de 5 (cinco) anos para serem
analisados e julgados.
Para
uma melhor compreensão dos dispositivos citados acima, trago à colação os
ensinamentos do Conselheiro Substituto Cleber Muniz Gavi, o qual tratou, com
propriedade, sobre a aplicação da referida lei e sobre as regras de transição:
Atendo-se
à redação conferida ao dito art. 24-A da Lei Complementar n. 202/2000,
verifica-se que, dentre os dois marcos fixados para contagem dos prazos,
considera-se “... a data de citação
do administrador ou responsável pelos atos administrativos, ou da data de exoneração do cargo ou
extinção do mandato, considerando-se preferencial a data
mais recente”.
Em consulta aos autos do processo PCA 07/00178910, verifico
que a responsável fora citada em data de 26.09.2011, conforme se comprova às
fls. 51 daquele caderno processual. Desta forma, tem-se que o prazo final para julgamento do
feito seria em 26 de novembro de 2016. Portanto, não há prejuízo ao julgamento do feito quanto a
este aspecto. E na concepção deste subscritor, neste ponto se encerra a
questão.
Inevitável, entretanto, o surgimento de interpelações
suscitando a disciplina do art. 2° da LC 588/2013. Assim, para correto
equacionamento da matéria, adito as razões pelo qual defendo sua
inaplicabilidade para esta hipótese.
O art. 2º da LC 588/2013 trata das regras de transição,
aplicáveis aos processos que, face à novidade da norma, poderiam ser arquivados
sem que o Tribunal de Contas tivesse tempo oportuno para adaptação à nova
disciplina de temporalidade processual. Desta forma, se a regra geral do novo
art. 24-A não vier a prejudicar a atuação desta Corte Administrativa em curto
prazo (como é o caso), não se justifica o uso da regra transitória.
Para maior aprofundamento da questão, atente-se para o fato
de que o art. 2°
expressamente se
reporta ao disposto no art. 24-A e menciona que
sua aplicabilidade dar-se-á no que
couber. (“Art. 2º O disposto no
art. 24-A da Lei Complementar nº 202, de 2000,
aplica-se, no que couber, aos processos em curso no Tribunal de Contas, da
seguinte forma:”). Cabe também
enfatizar que os marcos temporais são totalmente distintos num e noutro artigo:
um faz uso da data da citação ou término do exercício do cargo ou mandato
(regra geral); outro, menciona a data da instauração do processo (regra
transitória).
Então, vale repisar, a disciplina do art. 2° só será útil e
aplicável quando o imediato alcance do art. 24-A inviabilizar o julgamento de
processos mais antigos.
Para melhor esclarecimento, tratemos dos seguintes
exemplos:
1) Suponha-se que na data de publicação da lei (15.01.2013)
fosse identificado um processo no qual, há 05 anos ou mais, foi efetuada a
citação da parte responsável e findou o exercício do seu cargo ou mandato.
Neste caso, a disciplina do recém-criado art. 24-A impediria, desde logo, a
emissão de julgamento. O art. 2° surge, então, como norma de transição para
assegurar que por mais 02 anos (atenuando os efeitos inovadores da lei) possa o
Tribunal de Contas prosseguir na instrução e julgamento do feito, conforme o
seguinte texto:
[...]
2) Suponha-se, agora, que tenha sido identificado um processo que, embora instaurado há mais de 05 anos, não tenha se amoldado completamente ao marco temporal do art. 1°. Cogite-se, por exemplo, que a citação neste processo tenha sido efetuada em ocasião mais recente, menos de 02 anos; ou que o exercício do cargo ou do mandato tenha se encerrado neste mesmo prazo. Para tal hipótese, não se faz necessário o uso da norma de transição, já que a regra geral ainda permitirá a atuação do Tribunal de Contas, conforme a redação do §2° do art. 24-A: “O prazo previsto no ‘caput’ deste artigo será contado a partir da data de citação do administrador ou responsável pelos atos administrativos, ou da data de exoneração do cargo ou extinção do mandato, considerando-se preferencial a data mais recente.” (ou seja, não importa se o processo em si tem mais de 05 anos).
Todos os incisos do art. 2° da LC n. 588/2013 seguem a
mesma lógica, qual seja: só possuem aplicabilidade nos casos em que a pronta
aplicação da regra geral do art. 24-A obstar a análise de mérito dos processos
em trâmite no Tribunal de Contas, de acordo com os prazos ali mencionados. Caso
contrário, a disciplina ad futurum deste último
basta por si só (art. 24-A).
Cabe explicitar que esta é a única interpretação lógica
possível, considerando-se a redação que foi dada ao art. 2° e a regra
hermenêutica de que a lei não contém palavras inúteis. Tamanha engenhosidade
seria dispensada caso o legislador apenas tivesse preceituado que “os processos
em curso no Tribunal de Contas observaram a seguinte disciplina: (...)”. Entretanto,
por meio de redação de alcance e aplicabilidade bem mais complexa, prescreveu
que “o disposto no art. 24-A da Lei
Complementar nº 202, de 2000 aplica-se, no que couber, aos
processos em curso no Tribunal de Contas, da seguinte forma: (...)”.
Tal linha interpretativa também evitará incoerências
futuras, traduzidas no fato de que os jurisdicionados com processos mais
recentes não usufruiriam dos mesmos benefícios concedidos àqueles cujos
processos foram autuados em data anterior a publicação da LC n. 588/2013.
Para melhor didática, vamos recorrer a outro exemplo: a
análise mais simplista do art. 2º da LC n. 588/2013 (com a qual não
concordamos) nos induziria a pensar que todos os processos anteriores a
15.01.2013 teriam 05 anos, no máximo, para serem julgados, independentemente da
disciplina do art. 24-A. Mas então se questiona: qual será o tratamento dado
aos processos instaurados após a publicação da lei?
Se o marco temporal do art. 24-A da Lei Orgânica (regra
geral para contagem dos cinco anos) é constituído apenas pela data da citação
ou do término do exercício do cargo ou função, é bem possível que um processo
futuro tenha mais de 15 anos e ainda assim esteja em condições de ser julgado.
Basta, por exemplo, que a citação tenha ocorridos nos últimos dois anos. Neste
caso, não haveria uma incoerência normativa? Os jurisdicionados submetidos à
regra de transição não teriam obtido um tratamento privilegiado,
considerando-se a regra geral que passa a vigorar? Não se estaria adotando
referências totalmente distintas para determinar o arquivamento dos processos,
ou seja, para aqueles autuados até 15.01.2013 a referência seria a data da
autuação (mais favorável), enquanto para os posteriores, a data da citação ou
término do exercício do cargo ou mandato?
Por certo, a linha interpretativa que preserva a coerência,
evita a distinção entre situações jurídicas idênticas e reverencia o caráter
perene das disposições normativas, constitui o melhor norte a ser seguido. Não
é demais lembrar que uma norma de transição se presta a flexibilizar eventuais
rupturas decorrentes de uma nova regra jurídica. Mas se a interpretação do seu
alcance conduz a criação de regra totalmente distinta da norma principal e com
ela não compatível, impõe-se a revisão do processo interpretativo, com o escopo
de conciliar a norma de transição com a nova disciplina geral que fundamentou
sua existência.
[...]
Reconhece-se não haver obviedades no raciocínio ora adotado. Mas é importante advertir que a lei da qual estamos tratando por si só representa um grande desafio à lógica. Um artigo subsidia a aplicação do outro, mas se valendo de referência que, a princípio, os tornaria inconciliáveis. E há diversas outras peculiaridades da norma colocando à prova a flexibilidade do intérprete, sem caber a este voto o esgotamento da matéria. O que deve ficar claro é que qualquer tentativa de compreensão demandará múltiplas leituras, um olhar clínico sobre todos os termos da lei e, sobretudo, redobrado esforço para lhes emprestar um sentido e coerência. (Grifos no original)
À
vista dessas considerações, pode-se concluir que as irregularidades passíveis
de multa não estão prescritas, uma vez que o Sr. Gilmar Knaesel foi citado em
13.03.2015 (fl. 168) e em 01.12.2015 (fl. 299).
Logo,
a prejudicial de mérito arguida deve ser afastada, uma vez que o argumento
levantado é insuscetível de obstar a análise de mérito neste feito.
3.
Das irregularidades avistadas no processo de concessão de recursos públicos
3.1. Ausência de documentos
exigidos na tramitação inicial do projeto
Sabe-se que a concessão de recursos públicos
está condicionada ao cumprimento de diversos requisitos, sendo um deles a
apresentação dos documentos listados no anexo V do Decreto Estadual nº
1.291/2008 no momento da apresentação do projeto.
A propósito, registrem-se os documentos
exigidos pela norma supracitada:
1) ofício dirigido ao
Secretário de Estado da Cultura, Turismo e Esporte ou ao Secretário de Estado
de Desenvolvimento Regional, solicitando o recurso;
2) declaração firmada
pelo gerente do Banco Estadual de Santa Catarina informando o número da conta
corrente vinculada ao projeto, o da agência, sua denominação e o seu CNPJ/MF;
3) plano de trabalho
devidamente preenchido e assinado pelo representante legal da
instituição;
4) ficha cadastral de
entidade sem fins lucrativos completamente preenchida na forma do Anexo II;
5) projeto cultural,
esportivo ou turístico;
6) Certidão Negativa
de Débitos em relação à prestação de contas de recursos anteriormente
transferidos e de regularidade junto às entidades previstas nos incisos I a VIII
do art. 43, obtida por meio de solicitação única no sítio eletrônico da
Secretaria de Estado da Fazenda http://www.sef.sc.gov.br;
7) Certificado de
Regularidade do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - CRF;8) Certidão
Negativa de Débitos – CND ou Certidão Positiva com Efeitos de Negativa – CPD-EN
junto à Previdência Social;
9) Certidão emitida
pelo Cartório de Registro de Imóveis comprovando a propriedade plena do imóvel
com data não superior a trinta dias, nos casos em que o contrato tiver como
objeto a execução de obras ou benfeitorias no mesmo, inclusive para a
contratação de projeto arquitetônico;
10) licença ambiental
prévia e, se for o caso, outras licenças expedidas pelos órgãos ambientais
competentes, quando o contrato envolver obras, instalações ou serviços que
exijam estudos ambientais, conforme previsto no Decreto Federal n° 99.274, de 6
de junho de 1990;
11) alvarás de
licença necessários à realização de obras, expedidos pelos órgãos competentes;
12) ata de eleição e
o comprovante de posse da sua atual diretoria;
13) cópia autenticada
do Cadastro de Pessoa Física (CPF) e da Carteira de Identidade do presidente da
entidade ou cargo equivalente;
14) declaração
assinada pela maioria absoluta dos membros do Conselho Deliberativo e do
Conselho Fiscal, se houver, com manifestação favorável à assinatura do
contrato;
15) estatuto
registrado em cartório;
16) certidão do
registro e arquivamento dos atos constitutivos no Cartório de Registro Civil de
Pessoas Jurídicas;
17) Certidão Negativa
de Débitos Estaduais, obtida no sítio eletrônico http://www.sef.sc.gov.br;
18) Certidão Conjunta
Negativa de Débitos relativos a Tributos Federais e à Dívida Ativa da União, obtida
no sítio eletrônico http://www.fazenda.gov.br;
19) certidão firmada
pelo Prefeito Municipal ou autoridade judiciária ou delegado de polícia da
Comarca ou do Município em que sediada, comprovando o seu funcionamento
regular;
20) ficha cadastral
devidamente preenchida na forma do Anexo III, acompanhada de cópia do CNPJ/MF com situação
cadastral ativa;
21) Cópia da Lei de
utilidade pública estadual e/ou municipal;
22) comprovante de
inscrição no Conselho Municipal de Assistência Social para os casos de
entidades e organizações de assistência social, conforme estabelece a Lei
Federal n° 8.742, de 7 de dezembro de 1993;
23) comprovação ou
certidão da Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina que atesta a
regularidade da entidade de utilidade pública quanto ao encaminhamento anual,
dos seguintes documentos:
a) relatório anual de
atividades;
b) balancete
contábil;
c) declaração da
entidade, registrada em cartório, consignando a data de todas as alterações
estatutárias e confirmando que não sejam remunerados, por qualquer forma, os
cargos de diretoria e que não distribua lucros, bonificações ou vantagens a
dirigentes, mantenedores ou associados.
24) Certificado de
Registro de Entidade Desportiva (CRED), no caso de projetos esportivos.
Na
ocasião, importa esclarecer que a apresentação do rol listado acima não garante
o deferimento do pedido de subvenção. Na verdade, tais documentos são
imprescindíveis para o exame preliminar do projeto, o qual deve passar,
necessariamente, por diversas fases até a decisão final.
No
caso trazido à baila, verifica-se que a Associação dos Mesatenistas de
Florianópolis não colacionou ao plano de aplicação diversos documentos, a
saber: a) ato de eleição e o comprovante de posse da atual diretoria; b) cópia
autenticada do Cadastro de Pessoa Física (CPF) e da Carteira de Identidade do
presidente da entidade ou cargo equivalente; c) certidão do registro e
arquivamento dos atos constitutivos do Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas;
d) certidão firmada pelo Prefeito Municipal ou autoridade judiciária ou
delegado de polícia da Comarca ou do Município em que está sediada, comprovando
o seu funcionamento regular; e) cópia da lei de utilidade pública estadual e/ou
municipal; f) comprovação ou certidão da Assembleia Legislativa do Estado de
Santa Catarina que atesta a regularidade da entidade de utilidade pública
quanto ao encaminhamento anual dos documentos listados no Decreto Estadual nº
1.291/20087; g) certidão do Registro de Entidade Desportiva (CRED), no caso de
projetos esportivos.
Anotados
os documentos ausentes, cumpre assinalar que a exigência imposta pelo Decreto
Estadual nº 1.291/2008 não se trata de mera formalidade, já que objetiva
averiguar se a proponente cumpre suas finalidades e está constituída de forma
regular.
Ao
encontro desse raciocínio, acrescente-se que os documentos previstos na
legislação auxiliam no exame técnico e jurídico do projeto proposto, a fim de
que o recurso público somente seja repassado à entidade que possui plenas
condições de executar aquilo que foi aventado no plano.
Dito
isso, acentue-se que o Sr. Gilmar Knaesel, em sua contestação, limitou-se a
tratar das dificuldades enfrentadas no momento da criação da Secretaria de
Estado de Turismo, Cultura e Esporte e a criticar o trabalho realizado pelo
corpo técnico da Corte de Contas catarinense.
Primeiramente,
afigura-se oportuno comentar que a área técnica do TCE/SC executou devidamente
as suas atribuições no caso em tela, com relatórios bem elaborados e
fundamentados, além de observar a regular tramitação do processo de contas.
Somado a isso, não se pode olvidar que a tomada de contas especial em apreço
teve origem no próprio Poder Executivo.
Quanto
às supostas dificuldades, convém pontuar que a Secretaria de Estado de Turismo,
Cultura e Esporte foi criada em 2003, através da Lei Complementar Estadual nº
243/2003; o Fundo Estadual de Incentivo ao Esporte, por sua vez, foi instituído
em 2005 por meio da Lei Estadual nº 13.336/2005. Lembra-se, no entanto, que o
repasse ora analisado ocorreu em dezembro de 2009, ou seja, quatro anos após a
criação do fundo.
Logo,
os argumentos suscitados pelo Sr. Gilmar Knaesel não podem ser acolhidos, pois
são desprovidos de fundamentos razoáveis e jurídicos, razão pela qual deve
haver a sua devida responsabilização.
3.2.
Ausência de parecer técnico e orçamentário
Destaque-se, neste ponto, que o processo de
concessão de recursos públicos deve passar por diversas análises até a emissão
da decisão final, o que inclui um exame técnico, jurídico e orçamentário.
Para corroborar a assertiva acima, anote-se a
previsão constante no Decreto Estadual nº 1.291/2008:
Art. 36.
Os projetos de cunho cultural, turístico e esportivo, de âmbito estadual ou regional, deverão obrigatoriamente
ser apresentados nas Secretarias de Estado de Desenvolvimento Regional do
domicílio do proponente, juntamente com a documentação necessária, e submetidos
à apreciação do Conselho de Desenvolvimento Regional.
[...]
§ 3° -
Todo projeto proposto deverá ser instruído jurídica e administrativamente pelas
Secretarias de Estado de Desenvolvimento Regional e pela Diretoria do SEITEC,
no caso dos projetos prioritários e especiais, devendo ser solicitados todos os pareceres jurídicos, técnicos e orçamentários que se fizerem
necessários para instruir o julgamento dos Conselhos e Comitês Gestores.
A par disso, impõe-se consignar que os
pareceres jurídicos, técnicos e orçamentários são de fundamental importância,
pois auxiliam na análise do projeto e contribuem, evidentemente, no julgamento
deste pelos Conselhos e Comitês Gestores.
No
caso em tela, constata-se a inexistência do parecer técnico-orçamentário, o que
demonstra que o projeto denominado “Manutenção
da Equipe de Florianópolis” foi aprovado sem que houvesse qualquer
análise por parte do órgão responsável.
Em sua contestação, o Sr. Gilmar Knaesel não
traz elementos que atenuem a sua responsabilidade, tampouco apresenta
justificativas que rechacem o apontamento restritivo. Ao contrário, pois afirma
que a ausência de parecer técnico-orçamentário ocorreu em todos os processos de
incentivos, sob o argumento de que os recursos eram oriundos de renúncia de
tributos.
Como se pode notar, tal argumento não afasta
a necessidade de elaboração do parecer, já que a legislação é cristalina quanto
à sua imprescindibilidade. Convém asseverar, em tempo, que a confecção do
aludido parecer poderia ter evitado as ilegalidades vislumbras neste feito e,
consequentemente, o recurso público não teria sido utilizado para satisfazer
interesses diversos.
Dessa feita, tenho para mim que o Sr. Gilmar
Knaesel deve ser responsabilizado, já que violou regras estatuídas no Decreto
Estadual nº 1.291/2008.
3.3. Ausência de
parecer do Conselho Estadual de Esporte
A
área técnica assinalou que não há qualquer manifestação do Conselho Estadual de
Esporte quanto ao mérito do projeto apresentado pela Associação dos Mesatenistas de Florianópolis.
Cotejando a legislação que disciplina o assunto
(Decreto Estadual nº 1.291/2008), vislumbra-se que é de competência do Conselho
Estadual de Esporte a definição dos projetos a serem encaminhados ao Comitê
Gestor, senão vejamos:
Art. 19.
Aos Conselhos de Cultura, de Turismo e de Esporte caberá, nos termos da Lei nº 14.367, de 25 de janeiro de 2008, a
definição dos projetos a ser encaminhados aos Comitês Gestores para aprovação
dos financiamentos solicitados, em conformidade com as prioridades das
políticas públicas governamentais.
Parágrafo
único. Na seleção dos projetos os Conselhos Estaduais deverão observar, além do
mérito, a viabilidade orçamentária, a exeqüibilidade dos prazos propostos e as
credenciais do proponente comprovando sua capacitação para execução do projeto.
Ao encontro disso, verifica-se que compete ao
Comitê Gestor aprovar os editais e os projetos propostos, o que somente
ocorrerá após o julgamento de mérito pelo Conselho Estadual, nos seguintes
moldes:
Art. 9º A administração superior de cada Fundo
será exercida por um Comitê Gestor, órgão
executivo subordinado à Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, e
será composto pelos seguintes membros:
[...]
§ 1º Os Comitês Gestores tomarão suas
decisões por maioria simples, competindo-lhes aprovar os editais e projetos
propostos, depois de julgados em seu mérito pelos respectivos Conselhos
Estaduais, em conformidade com as prioridades das políticas públicas
governamentais.
[...]
Art. 10.
Compete ao Comitê Gestor de cada Fundo:
[...]
II - homologar, de acordo com as
políticas governamentais e a capacidade orçamentária, os projetos a ser
financiados com recursos do Fundo, definidos pelos Conselhos Estaduais de
Cultura, de Turismo e de Esporte;
[...]
§ 2º Compete aos Comitês Gestores definir a
aprovação dos valores finais, considerando o impacto orçamentário e financeiro,
a ser aplicados em cada projeto ou programa, analisados previamente no mérito
pelos Conselhos Estaduais. (Grifou-se)
À luz de tais disposições normativas, pode-se
concluir que o Conselho Estadual possui relevante papel na análise dos
projetos, pois lhe compete discutir, deliberar e propor diretrizes da política
de esporte.
No intento de afastar o apontamento restritivo, o
Sr. Gilmar Knaesel alegou, novamente, que não havia estrutura na Secretaria de
Estado de Turismo, Cultura e Esporte para a realização dos trabalhos. Na ocasião,
acrescentou que os membros do Conselho reuniam-se apenas uma vez por mês e
trabalhavam de forma voluntária.
Como se pode perceber, as razões de defesa
apresentadas não afastam a irregularidade e apenas evidenciam que o repasse, de
fato, não deveria ter sido efetuado.
Vale ressaltar que o projeto deveria passar por
órgãos colegiados para ser aprovado, mas isso não ocorreu. Na prática, a
simples autorização do Secretário de Estado era suficiente para o repasse do
dinheiro público, o que demonstra, além da violação das leis, a inobservância
de princípios éticos e morais.
Frente ao exposto, entende-se que a
responsabilidade do Sr. Gilmar Knaesel pelo apontamento em tela deve ser
mantida.
4.
Da responsabilização do Sr. Gilmar Knaesel
Diante da importância do assunto, julguei
oportuno tratar, em ponto específico, a respeito da responsabilidade daquele
que repassa recursos públicos sem o preenchimento dos requisitos legais.
No meu sentir, as condutas praticadas pelo
Sr. Gilmar Knaesel fazem incidir a aplicação de multa e a imputação de débito,
de forma solidária, com aquele que recebeu os recursos públicos.
No entanto, sabe-se que, no âmbito da Corte
de Contas catarinense, muito se discute a respeito da responsabilização do Sr.
Gilmar Knaesel.
Nesse sentido, anote-se que, ao analisarmos
as decisões proferidas pelo TCE/SC, percebemos que algumas multas aplicadas ao
Sr. Gilmar Knaesel já foram afastadas - sob o argumento de que se tratava de
infração continuada - e débitos já foram rechaçados - sob a justificativa de
que não havia solidariedade.
Em face disso, faz-se pertinente acrescentar
as minhas considerações sobre o assunto, pois, a meu ver, as teses suscitadas
para afastar a responsabilização não prosperam.
Inicialmente, ater-me-ei aos fundamentos
utilizados para retirar o débito, os quais foram lançados nos autos nº TCE
11/00290548, através do voto divergente proferido pelo Conselheiro Wilson
Rogério Wan-Dall.
Para afastar a responsabilização solidária, o
Exmo. Conselheiro destacou, em síntese, os seguintes fundamentos: a) a
solidariedade não se presume - resulta da lei ou da vontade das partes; b) a
responsabilidade dos agentes por eventuais danos causados ao erário é de
caráter subjetivo; c) a responsabilidade subjetiva exige a conjunção do
ilícito, do dano, do nexo causal e da comprovação da culpabilidade do agente.
Após debater amplamente os pontos mencionados
acima, o Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall fez o seguinte questionamento no
intento de estabelecer o nexo de causalidade: se a análise do projeto tivesse
observado todas as formas prescritas na norma, o dano teria acontecido?
Em resposta, asseverou-se:
A resposta é sim, uma
vez que as irregularidades a seguir listadas dizem respeito à execução do
projeto, sendo de total responsabilidade da Entidade e não do órgão repassador:
a) ausência da
apresentação de documentos comprobatórios das despesas;
b) movimentação
incorreta da conta bancária; e
c) ausência de
comprovação do efetivo fornecimento ou da prestação dos serviços.
Para arrematar o seu posicionamento, o
Conselheiro acrescentou:
Para concluir,
entendo que para ocorrer à fixação de responsabilidade solidária, deve ficar
evidenciado nos autos a contribuição positiva ou negativa do Gestor para a
prática do ato, não sendo a ocorrência da prática, mesmo que reiterada, de atos
praticados com grave infração a norma legal ou regulamentar de natureza
contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, suficiente pra
isto.
Em que pese a respeitável motivação
consubstanciada acima, tenho para mim que não foi adotada a melhor conclusão
para a conjuntura fática.
Antes de adentrar no campo doutrinário e
jurisprudencial sobre o assunto, entendo oportuno contrapor a pergunta
formulada pelo Conselheiro com outra indagação: se não tivesse sido efetuado o repasse de recursos públicos ao
proponente, em decorrência dos diversos vícios constatados já na origem do
processo de repasse dos valores, o dano ao erário teria ocorrido?
Obviamente a resposta é negativa, o que me
faz perceber, desde já, que a responsabilização deve ser olhada sobre outro
prisma.
Nos autos do processo em discussão (TCE
11/00290548), o Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall salientou que as
irregularidades eram de total responsabilidade da entidade e não do órgão
repassador. Contudo, o referido Relator não se ateve aos demais apontamentos
restritivos vislumbrados naqueles autos, a saber: a) a
liberação de recursos com inconsistências no Plano de Trabalho; b) a ausência do parecer do Conselho Estadual de
Esporte; c) a ausência de Termo de Ajuste entre as partes; d) o repasse de
recursos após a concretização do projeto.
No meu sentir, não há dúvida de que as
irregularidades supracitadas são de responsabilidade daquele que efetuou o
repasse dos recursos, o que, consequentemente, atrai a responsabilidade de quem
estava à frente da Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte à época.
Feitas essas observações, ressalte-se que a
responsabilidade pode ser compreendida como o dever de assumir consequências
jurídicas, ante a violação de um dever jurídico originário.
Adotando-se a tese da responsabilidade
subjetiva, deve haver a conjunção dos seguintes requisitos: a) ato ilícito; b)
dano; c) nexo causal; d) dolo/culpa (em seus diversos níveis).
Sobre o assunto, Sérgio Cavalieri Filho[3] discorre:
Há primeiramente um
elemento formal, que é a violação de um dever jurídico mediante conduta
voluntária; um elemento subjetivo, que pode ser o dolo ou a culpa; e, ainda, um
elemento causal-material, que é o dano e a respectiva relação de causalidade.
Esses três elementos, apresentados pela doutrina francesa como pressupostos da
responsabilidade civil subjetiva, podem ser claramente identificados no art.
186 do Código Civil, mediante simples análise do seu texto, a saber: a) conduta
culposa do agente, o que fica patente pela expressão "aquele que, por ação
ou omissão voluntária, negligência ou imperícia"; b) nexo causal, que vem
expresso no verbo causar; e c) dano, revelado nas expressões "violar
direito ou causar dano a outrem".
Nesse mesmo caminho, o Tribunal de Contas da
União dispôs:
TOMADA DE CONTAS
ESPECIAL. CONTRATO. INEXECUÇÃO. PROCESSUAL. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DOS
GESTORES. IMPRUDÊNCIA E NEGLIGÊNCIA. FALTA DE CAUTELA E ZELO. CULPA IN
ELIGENDO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. CONTAS IRREGULARES E REGULARES COM
RESSALVA.
1. A inexecução
contratual da qual decorre dano ao erário federal só interessa ao TCU quando
estiver presente uma conduta dolosa ou culposa de algum agente público, havendo
responsabilidade solidária da entidade privada e dos agentes públicos
envolvidos.
2. A responsabilidade dos administradores de recursos
públicos segue a regra geral da responsabilidade civil, pois trata-se de
responsabilidade subjetiva, a despeito de o ônus de provar a correta aplicação
dos recursos caber àqueles[4]. (Grifou-se)
Fixada essa orientação, passo a averiguar se
estão presentes os elementos da responsabilidade subjetiva no caso do Sr.
Gilmar Knaesel.
O ato ilícito é evidente, pois resultou da
violação de diversos dispositivos legais, sendo o dano, também, incontestável,
já que houve prejuízos de elevada monta aos cofres públicos.
O nexo causal entre o ato ilícito e o dano
também está presente, pois se os recursos públicos não tivessem sido repassados
em afronta às normas legais não haveria prejuízos ao erário. A conduta daquele
que transferiu os recursos, portanto, foi fundamental para a construção de
todas as irregularidades evidenciadas, pois o vício do repasse já está
caracterizado na própria origem.
No tocante ao elemento subjetivo (dolo ou culpa),
convém assinalar que sempre defendi a ideia de que o Sr. Gilmar Knaesel foi, no
mínimo, imprudente ao conceder o repasse de verbas públicas quando ausentes
elementos autorizadores.
A partir da prisão do Sr. Gilmar Knaesel e
diante das conclusões exaradas nas investigações conduzidas pela Diretoria
Estadual de Investigações Criminais, passo a cogitar o posicionamento de que
tal responsável agia com dolo, ante a intenção de enriquecer ilicitamente
através dos cofres públicos.
Vale acentuar que, de acordo com a Diretoria
Estadual de Investigações Criminais, o Sr. Gilmar Knaesel é o mentor e o
principal beneficiário de manobras feitas por seus subordinados no esquema
fraudulento de repasse de recursos públicos[5].
Assim, não pairam dúvidas de que todos os pressupostos
da responsabilidade subjetiva estão devidamente demonstrados.
Dito isso, registre-se que, no âmbito do
Tribunal de Contas, a responsabilidade pode ser individual ou solidária, a
depender da conjuntura fática apresentada.
Com efeito, sublinhem-se duas previsões
normativas na Lei Orgânica do Tribunal de Contas de Santa Catarina que dispõem
sobre a aludida responsabilidade solidária:
Art. 10. A autoridade administrativa competente, sob
pena de responsabilidade solidária,
deverá imediatamente adotar providências com vistas à instauração de tomada de
contas especial para apuração de fatos, identificação dos responsáveis e
quantificação do dano, quando não forem prestadas as contas ou quando ocorrer
desfalque, desvio de dinheiro, bens ou valores públicos, ou ainda se
caracterizada a prática de qualquer ato ilegal, ilegítimo ou antieconômico de
que resulte prejuízo ao erário.
Art. 18. As contas serão julgadas:
I — regulares, quando expressarem, de forma
clara e objetiva, a exatidão dos demonstrativos contábeis, a legalidade, a
legitimidade e a economicidade dos atos de gestão do responsável;
II — regulares com
ressalva, quando evidenciarem impropriedade ou qualquer outra falta de natureza
formal de que não resulte dano ao erário; e
III — irregulares, quando
comprovada qualquer das seguintes ocorrências:
a) omissão no dever
de prestar contas;
b) prática de ato de
gestão ilegítimo ou antieconômico, ou grave infração à norma legal ou
regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional ou
patrimonial;
c) dano ao erário
decorrente de ato de gestão ilegítimo ou antieconômico injustificado; e
d) desfalque, desvio
de dinheiro, bens ou valores públicos.
§ 1º O Tribunal poderá julgar irregulares as
contas no caso de reincidência no descumprimento de determinação de que tenha
ciência o responsável, feita em processo de prestação ou tomada de contas.
§ 2º Nas hipóteses do
inciso III, alíneas c e d, deste artigo, o Tribunal, ao julgar irregulares as
contas, fixará a responsabilidade
solidária:
a) do agente público
que praticou o ato irregular e;
b) do terceiro que, como contratante ou parte
interessada na prática do mesmo ato, de qualquer modo, haja concorrido para a
ocorrência do dano apurado.
§ 3º Verificada a
ocorrência prevista no parágrafo anterior deste artigo, o Tribunal
providenciará a imediata remessa de cópia da documentação pertinente ao
Ministério Público Estadual, para ajuizamento das ações civis e penais
cabíveis.
Como se depreende, a responsabilidade
solidária pode ser invocada quando a autoridade administrativa deixa de adotar
imediatamente providências com vistas à instauração de tomada de contas
especial. Somado a isso, tem-se a aludida responsabilidade, nos casos de dano
ao erário e desfalque de bens e valores públicos, do agente que praticou o ato
irregular ou de terceiro que concorreu para a prática do prejuízo.
No presente caso, tem-se a incidência da
segunda hipótese, já que o Sr. Gilmar Knaesel, na condição de agente público,
praticou o ato irregular que contribui para a ocorrência de lesão ao erário
(art. 18, § 2º, ‘a’, da Lei Complementar Estadual nº 202/2000).
Dessa forma, entende-se que não há como
afastar a responsabilidade solidária do Sr. Gilmar Knaesel, pois sua conduta se
amolda ao dispositivo legal que versa sobre a responsabilização solidária.
E não há que se argumentar que se trata de
“mera formalidade”, por exemplo, a ausência de documentos considerados
imprescindíveis à análise do projeto.
Ora, a violação da lei não pode ser
compreendida como mera formalidade, pois, do contrário, não existiriam razões
para o princípio da legalidade ser considerado o instrumento condutor do gestor
público.
Lançada essa premissa, destaque-se que o
Tribunal de Contas de Santa Catarina, em situação semelhante, já reconheceu a responsabilidade
solidária do Sr. Gilmar Knaesel e o condenou à restituição dos valores, senão
vejamos:
ACORDAM
os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em
Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos
arts. 59 da Constituição Estadual e 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:
6.1.
Julgar irregulares, com fundamento no art. 18, III, “b” e “c”, c/c o art. 21,
caput, da Lei Complementar n. 202/2000, as contas pertinentes à presente Tomada
de Contas Especial, que trata da prestação de contas de recursos repassados,
através da NE n. 499, de 23/10/2008, no valor de R$ 100.000,00, P/A 4685,
elemento 33504301, fonte 0262, à Associação Comercial e Industrial de Chapecó
(ACIC) pelo FUNTURISMO.
6.2. Condenar,
SOLIDARIAMENTE, a pessoa jurídica ASSOCIAÇÃO COMERCIAL E INDUSTRIAL DE CHAPECÓ
(ACIC) e os Srs. VINCENZO FRANCESCO MASTROGIACOMO - Presidente daquela
Associação na gestão 2008/2009, e GILMAR KNAESEL - ex-Secretário de Estado da
Cultura, Turismo e Esporte - SOL -, ao recolhimento da quantia de R$ 100.000,00
(cem mil reais),
referente à nota de empenho acima citada, fixando-lhes o prazo de 30 (trinta)
dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico do TCE
– DOTC-e -, para comprovarem, perante este Tribunal, o recolhimento do valor do
débito ao Tesouro do Estado, atualizado monetariamente e acrescido dos juros
legais (arts. 21 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), calculados a partir da
data do fato gerador do débito, ou interporem recurso na forma da lei, sem o
quê, fica desde logo autorizado o encaminhamento de peças processuais ao
Ministério Público junto ao Tribunal de Contas para que adote providências à
efetivação da execução da decisão definitiva (art. 43, II, da citada Lei
Complementar), pela não comprovação da boa e regular aplicação dos recursos
públicos, nos termos em que determinam os arts. 58, parágrafo único, da
Constituição Estadual e 144, §1º, da Lei Complementar n. 381/2007, em face da:
[...][6].
(Grifou-se)
Como reforço argumentativo, anote-se excerto
da decisão supracitada, eis que aplicável perfeitamente ao caso:
Quanto à
co-responsabilização do Sr. Gilmar Knaesel, tem-se que, de acordo
com as razões expostas pelo corpo instrutivo (fls. 1.607v./1.612v.), a responsabilidade
solidária atribuída ao ex-Secretário de Turismo decorreria da prática de
conduta relacionada à inobservância de diversos requisitos previstos na
legislação que rege a matéria em enfoque. Segundo a DCE, a desobediência aos
dispositivos legais atrairia o ônus da responsabilidade ao agente público que,
no exercício de seu mister, teria contribuído para a ocorrência do dano ao
erário.
Neste ponto, cabem algumas explanações.
Em processos anteriores, nos quais restou
controvertida a hipótese de imputação de débito ao ordenador primário da
despesa, apresentei manifestação favorável ao reconhecimento da
responsabilidade solidária do Sr. Gilmar Knaesel, especialmente em face do
atraso na adoção de providências administrativas e na abertura de tomada de contas
especial para fins de apuração de irregularidades cometidas no repasse de
recursos públicos, nos moldes previstos no art. 146 da Lei Complementar estadual n. 381/2007. Entretanto, por ocasião do julgamento
da TCE 10/00424739 (Acórdão n. 680/2013), este Egrégio Plenário acompanhou, por
maioria, a divergência proposta pelo Exmo. Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall,
no sentido de que tal conduta deveria ensejar apenas a aplicação de multa ao
Secretário de Estado. No mesmo sentido, foi vencido o Exmo. Conselheiro Luiz Roberto Herbst no
recente julgamento da TCE 09/00537884
(Rel. p/ acórdão Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall).
É necessário observar, todavia, que os
elementos trazidos a estes autos se
distinguem do conjunto das
irregularidades ora apontadas daquele que outrora ocasionou a sanção pecuniária
e o afastamento da imputação de débito ao Sr. Gilmar Knaesel.
Não se trata, portanto, de divergência em
relação ao posicionamento pacificado em plenário, mas do reconhecimento da
existência de novos pressupostos fáticos que justificam a responsabilidade
solidário do então Secretário da SOL.
Com efeito, as violações aos textos
legais e regulamentares verificadas no caso em exame contribuíram para criar as
condições sem as quais não haveria o repasse de recursos ao proponente,
destacando-se aprovação do projeto
com parecer contrário quanto ao seu enquadramento no Plano Estadual da Cultura,
do Turismo e do Desporto do Estado de Santa Catarina – PDIL e ausência
de parecer técnico e orçamentário do SEITEC, do parecer do Conselho Estadual de Turismo e de termo de ajuste e/ou documento congênere.
Trata-se, portanto, de situação distinta
da verificada nos autos da TCE n. 10/00424739, pois, no
presente caso, houve, já na origem do processo de repasse dos
valores, a prática reiterada e contínua de atos irregulares que resultaram na liberação dos recursos públicos em circunstâncias incompatíveis com a lei de
regência. Pode-se mesmo afirmar que o repasse, em si, já constituiria ponto
passível de dano, pois destinado a projeto não compatível com a política de
incentivo do SEITEC. Tal conclusão, inclusive, decorre da apuração efetuada no
âmbito da própria SOL, tendo a comissão formada por servidores daquela
secretaria consignado que:
[...]
A
propósito da temerária atuação do ex-gestor da SOL, também se assoma o fato de
que, tendo sido o repasse posterior ao evento supostamente incentivado,
dever-se-ia ao menos aferir se existiam despesas idôneas e suficientemente
comprovadas para fazer frente ao montante de recursos públicos que seriam
repassados.
Desta forma, diante da existência destas
circunstâncias fáticas, subsistem fundamentos para responsabilização solidária do Sr. Gilmar Knaesel pelo débito
apurado. (Grifos no original)
Dessa maneira, não restam dúvidas de que o
Sr. Gilmar Knaesel deve ser responsabilizado no presente caso - multa e débito
-, uma vez que preenchidos os requisitos legais autorizadores.
Em tempo, entendo pertinente tecer, ainda,
algumas considerações a respeito da tese formulada pelo Conselheiro Adircélio
de Moraes Ferreira Júnior para afastar a multa quando já houver sido aplicada a
referida penalidade em momento pretérito e com base na violação do mesmo
dispositivo legal.
No meu entender, essa discussão faz-se
apropriada, pois é sabido que diversas penalidades de multa já foram aplicadas
ao Sr. Gilmar Knaesel em decorrência da violação das normas que disciplinam o
repasse de verbas públicas.
Pois bem.
No entender do Excelentíssimo Conselheiro, ao
verificar a situação acima mencionada, deve ser rechaçada a cominação de multa,
sob o fundamento de que se trata de infração continuada.
Nos autos nº REC 14/00251548, o qual foi
levado à sessão plenária em 26.08.2015, o Conselheiro Adircélio aduziu:
Este Relator,
analisando as razões recursais em confronto com os fundamentos lançados pela
Diretoria de Recursos e Reexames, expressos no Parecer DRR n. 108/2014, conclui
que, de fato, os argumentos do Recorrente, por si só, não autorizam a
modificação do acórdão rebatido, contudo, outros aspectos merecem ser analisados,
uma vez que, no entender deste Relator, a multa aplicada no item 6.3 do Acórdão
n. 030/2014 não merece ser mantida. Vejamos:
Este Relator, por
meio do Voto Divergente apresentado nos autos do processo PCR 08/00460294,
sustentou seu entendimento no sentido de que, diante da sistemática adotada por
esta Corte de Contas em analisar e julgar em processos distintos, atos de uma
mesma Unidade Gestora, referentes a um mesmo exercício, acaba por penalizar,
por vezes sobremaneira, o gestor responsabilizado por irregularidades que
poderiam ter sido analisadas conjuntamente em um mesmo processo, resultando
numa só penalidade (esta podendo ser agravada, considerando a infração como
continuada), se adotado, por exemplo, o critério de exame de atos por
exercício.
Entendo que, como no
caso dos autos, em que uma série de repasses efetuados pelo FUNCULTURAL foram
analisados de forma individual, em processos distintos, ocorreu que esta Corte
de Contas aplicou penalidades ao
então
Secretário, ora Recorrente, uma série de multas pela mesma conduta faltosa, no
caso, adoção de providências com vistas à
instauração de providências administrativas para a cobrança da prestação de
contas especial após o transcurso do prazo regulamentar.
Se considerarmos o
período da gestão do Recorrente frente ao Fundo Estadual de Incentivo à Cultura
– FUNCULTURAL, compreendido entre o dia 08/03/2005 a 31/03/2010, a
irregularidade acima descrita foi inúmeras vezes apontada por este Tribunal, em
processos autuados separadamente, ensejando, na maioria das vezes, imputação de
multa ao Responsável, pela mesma irregularidade.
[...]
Observando o acima
destacado, tem-se que, apenas em atos do exercício de 2006, o Recorrente foi
penalizado pela mesma irregularidade, no mínimo, cinco vezes, sendo que este Relator
elencou somente processos em que as multas foram mantidas, mesmo após a
interposição de recursos – o que, a meu ver, torna desproporcional a
penalização do agente.
[...]
Pelo
exposto, e considerando o caso em tela, entendo que não carreiam justiça as
sucessivas decisões que aplicaram repetidas sanções por idênticas razões
fáticas, inclusive no mesmo exercício financeiro, por possuírem traços de
infração continuada, propugno pelo cancelamento da multa constante do item 6.3
do acórdão ora recorrido.
Com a devida vênia, discordo do entendimento
exposto acima e, no intento de justificar minha posição quanto ao assunto,
passo a discorrer sobre a matéria.
Para iniciar, ressalte-se que o Código Penal,
ao tratar do concurso de crimes, dispõe que as penas de multa são aplicadas
distinta e integralmente[7].
Nessa senda, infere-se que, no âmbito penal,
a multa é empregada nos termos da regra estatuída para o concurso material,
isto é: quando o agente, mediante
mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não,
aplicam-se cumulativamente as penas.
No direito
administrativo, não há qualquer dispositivo legal que trate sobre infrações
continuadas, nos termos propostos pelo Conselheiro Adircélio.
Reconheço,
notadamente, que os princípios da seara penal podem ser utilizados
subsidiariamente no direito administrativo sancionador, mas tenho para mim que,
no silêncio da lei, devem ser adotadas as regras do cúmulo material em casos
dessa natureza.
Nessa direção,
Régis Fernandes de Oliveira[8]
leciona:
Em síntese, na hipótese de concurso de infrações, a
legislação pode discriminar o modo de aplicação da sanção (acumulação ou
absorção), prevalecendo, no silêncio da lei, a acumulação material. Isto
porque, sendo diversas as agressões no ordenamento jurídico, une as infrações
elo de repulsa, previsto nele próprio.
No mesmo
trilhar, eis a lição de Heraldo Garcia Vitta[9]:
O Direito Penal é especial, isto é, contém normas
particulares, próprias desse ramo jurídico; em princípio, não podem ser
estendidas além dos casos para os quais foram instituídas. De fato, não se
aplica uma norma jurídica senão à ordem de coisas para a qual foi estabelecida;
não se pode “por de lado a natureza da lei, nem o ramo do Direito a que
pertence a regra tomada por base do processo analógico. Na hipótese de concurso
de crimes, o legislador escolher os critérios específicos, próprios dessa ramo
do Direito. Logo, não se justifica a analogia das normas do Direito Penal no
tema concurso real de infrações administrativas.
A forma de sancionar é instituída pelo legislador, segundo
critérios de discricionariedade. Compete-lhe elaborar ou não regras a respeito
da ocorrência de infrações administrativas. No silêncio, o cúmulo material é de
rigor.
Para embasar o seu posicionamento, o Conselheiro
Adircélio valeu-se das palavras de Fábio Medina Osório, o qual entende ser
possível aplicar as regras da infração continuada na seara administrativa.
Ao ler a doutrina de Fabio Medina Osório,
vê-se que, embora o doutrinador mencione ser exequível essa analogia, não há
qualquer alusão de como essa regra deve ser aplicada no campo do direito
administrativo sancionador.
A propósito, anote-se a previsão legal do
crime continuado, nos termos do Código Penal:
Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou
omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de
tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes
ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos
crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer
caso, de um sexto a dois terços.
À luz do
exposto, extrai-se que são elementos do crime continuado: a) pluralidade de
condutas; b) crimes da mesma espécie; c) circunstâncias semelhantes de tempo,
lugar, modo de execução e outras.
No tocante à
circunstância de tempo, denota-se que a jurisprudência sedimentou o
entendimento de que o lapso temporal entre os crimes não deve ser superior a 30
dias.
No caso
específico do Sr. Gilmar Knaesel, não há como afirmar que as infrações que lhes
são imputadas foram cometidas no período de 30 dias, sobretudo porque o
responsável ficou à frente da Secretaria Estadual de Cultura, Turismo e Esporte
pelo período de 08.03.2005 a 31.03.2010 e, nesse longo ínterim, violou as
normas que disciplinam o repasse de verbas públicas inúmeras vezes.
Além disso, como
aplicar as circunstâncias de lugar e modo de execução previstas no Código Penal
ao presente caso, a fim de caracterizar a continuidade das infrações?
A meu ver, resta
frustrada essa possibilidade, pois não há como fazer uma relação entre a
conduta de um agente criminoso e aquela praticada por um gestor irresponsável.
Cabe mencionar,
outrossim, que, nos crimes de natureza continuada, o magistrado analisa
conjuntamente todos os fatos delituosos praticados para, ao final, aumentar a
pena de 1/6 a 2/3.
À vista disso,
pergunta-se: como aplicar essa regra no âmbito do direito administrativo
sancionador quando os processos são distintos?
Pela lógica da
tese proposta, ter-se-ia que reunir todos os cadernos processuais em que figura
como responsável o Sr. Gilmar Knaesel para, após, realizar a dosimetria da
pena.
Como se vê, essa
não é a medida mais acertada, até mesmo porque os processos não visam tão
somente à análise individual da conduta de cada responsável, mas sim à apuração
de determinado fato.
Por outra banda,
tenho conhecimento da existência da “teoria da continuidade delitiva
administrativa”, a qual pode ser aplicada pela Administração Pública ao exercer
o seu poder de polícia.
Para a jurisprudência, “há
infração continuada quando a Administração Pública, exercendo o seu poder de
polícia, constata, em uma mesma oportunidade, a ocorrência de múltiplas
infrações da mesma espécie, situação na qual deve ser considerado válido o
primeiro auto de infração lavrado”[10].
Nesse contexto, trago à baila o
entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça:
ADMINISTRATIVO - SUNAB - SANÇÃO ADMINISTRATIVA POR
INFRAÇÃO AO TABELAMENTO DE PREÇO - NATUREZA CONTINUADA.
1. A jurisprudência desta Corte, em
reiterados precedentes, tem entendido que há infração continuada quando a
Administração Pública, exercendo o poder de polícia, constata, em uma mesma
oportunidade, a ocorrência de infrações múltiplas da mesma espécie. A
caracterização da continuidade delitiva administrativa se dá em uma única
autuação (múltiplos
precedentes)[11].
2. Recurso especial provido. (Grifou-se)
Ainda:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. OFENSA AO ART.
53 DO CPC. PODER DE POLÍCIA. SUNAB. OFERECIMENTO DE SERVIÇOS POR PREÇOS
SUPERIORES AO TABELADO. INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA CONTINUADA. APLICAÇÃO DE MULTA
SINGULAR.
1. Inicialmente, impõe-se reconhecer não ter sido
caracterizada a violação ao art. 535 do CPC, pois a origem não incorreu em
nenhuma contradição no momento da apreciação da apelação interposta. É que, por
ocasião do julgamento deste recurso, entendeu-se que a caracterização da
infração continuada era suficiente para anular os autos de infração, mesmo que
a materialidade da infração restasse incontroversa.
2. No mais, é pacífica a orientação do Superior
Tribunal de Justiça no sentido de que há continuidade infracional quando
diversos ilícitos de mesma natureza são apurados durante mesma ação fiscal,
devendo tal medida ensejar a aplicação de multa singular. Precedentes.
3. Ao contrário do
afirmado pela parte recorrente, essa jurisprudência aplica-se com perfeição ao
presente caso, uma vez que a instância ordinária constatou que, em uma única
ação fiscal, a empresa recorrida havia oferecido serviços por preços superiores
ao tabelado a diversos associados (fls. 305/306), o que é suficiente para
caracterizar a continuidade delitiva administrativa. Rever tal conclusão requer revisitação do conjunto
fático-probatório, o que esbarraria na Súmula n. 7 desta Corte Superior.
4. Agravo regimental não provido[12].
(Grifou-se)
Como se
depreende, a aplicação da teoria supracitada exige que as infrações sejam
identificadas em um único momento, pois, caso contrário, torna-se impossível
aplicar a causa de aumento de 1/6 a 2/3.
Corroborando o
exposto, colaciono aos autos a manifestação exarada pelo Tribunal Regional
Federal da 4ª Região:
TRIBUTÁRIO. MULTA POR
DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO ACESSÓRIA. AUSÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DA DECLARAÇÃO
ESPECIAL DE INFORMAÇÕES RELATIVAS AO CONTROLE DO PAPEL IMUNE. MULTA. TEORIA DA
CONTINUIDADE DELITIVA ADMINISTRATIVA. INAPLICABILIDADE.
1. De acordo com a teoria da continuidade delitiva
administrativa, a sequência de várias infrações apuradas em uma única autuação
caracteriza a infração de natureza continuada, com aplicação de uma única
multa.
2. Não se aplica
esse entendimento se a cada três meses a empresa deixa de apresentar a
Declaração Especial de Informações Relativas ao Controle do Papel Imune, pois,
nessa hipótese, o que ocorre é a reincidência infratora.
3. Certas construções pretorianas não podem ser aplicadas
indistintamente em todos os ramos do Direito. Em se tratando de
obrigação tributária acessória, não cabe adotar a figura da continuidade
delitiva administrativa. No caso da Declaração Especial de Informações
Relativas ao Controle do Papel Imune, a redução do montante devido a título de
multa, através da supressão das multas autônomas, permitiria fosse ela
incorporada ao gasto empresarial, estimulando a infração reiterada à lei, o que
pode desestruturar o controle do Estado sobre a concessão do favor fiscal
relativo ao papel[13].
(Grifou-se)
Dessarte,
sublinhe-se que a teoria da continuidade delitiva administrativa não pode ser
utilizada, pois, no presente caso, o que ocorre é a reincidência da infração.
Ante essa linha
de raciocínio, estou convencido de que a tese proposta pelo Conselheiro
Adircélio não pode ser aplicada no âmbito da Corte de Contas, pois, além de
ausentes os requisitos da continuidade delitiva, não há supedâneo legal para
embasá-la.
Em arremate,
acrescente-se que o Excelentíssimo Conselheiro aplicou a tese da continuidade
das infrações somente para afastar a penalidade de multa, mas não fez qualquer
menção de como essa matéria poderia vir a ser empregada no âmbito do TCE/SC,
tampouco falou da causa de aumento que deve ser imposta às infrações de
natureza continuada.
Após essa
análise, tenho para mim que devem ser cominadas novas sanções pecuniárias ao
Sr. Gilmar Knaesel, independentemente dos resultados de outros processos julgados
anteriormente.
5. Da irregularidade
avistada nos autos após o repasse de recursos públicos e após a prestação de
contas
5.1. Atraso na adoção de
providências administrativas e atraso na instauração da tomada de contas
especial
Registre-se,
ao adentrar nesta irregularidade, que o Decreto Estadual nº 1.977/2008 dispõe
que, restando constatado que as contas não foram apresentadas no prazo legal, a
autoridade administrativa deve, em cinco dias, adotar providências
administrativas, as quais devem ser concluídas em 60 dias.
Não
logrando êxito nas medidas tomadas, deve, em sequência, instaurar a tomada de
contas especial no prazo de 30 dias a contar do término do lapso temporal para
a adoção de providências administrativas.
Nesse
passo, eis a previsão constante no Decreto Estadual nº 1.977/2008:
Art. 6º A autoridade administrativa competente
dará início às providências administrativas no prazo de 5 (cinco) dias a contar
da data:
I - em que foi constatada irregularidade ou ilegalidade na
aplicação de recursos públicos, ou em que deveria ter sido apresentada a
prestação de contas;
II - do
conhecimento de ocorrência relacionada a desfalque, desvio de dinheiro, bens ou
valores públicos, ou da caracterização de qualquer ato ilegal, ilegítimo ou
antieconômico de que resulte dano ao erário;
III - do
recebimento, pelo órgão ou entidade, da comunicação da decisão do Tribunal de
Contas do Estado - TCE, determinando a adoção de providências administrativas
ou a instauração de tomada de contas especial; e
IV - do
recebimento, pelo órgão ou entidade, de recomendação emanada da Diretoria de
Auditoria Geral - DIAG, da Secretaria de Estado da Fazenda - SEF, para adoção de providências e instauração
de tomada de contas especial.
§ 1º O prazo para a conclusão das
providências administrativas é de 60 (sessenta) dias.
Art. 7º A tomada de contas especial, de
caráter excepcional, somente será instaurada depois de esgotadas as
providências administrativas sem que ocorra a regularização da situação ou a
reparação do dano, observados os prazos do artigo anterior.
Art. 8º Quando ocorrer qualquer das hipóteses
previstas no art. 2º deste
Decreto, observado o disposto no art. 7º, a autoridade administrativa
competente, sob pena de responsabilidade solidária, deverá, no prazo de 30
(trinta) dias, instaurar a tomada de contas especial designando servidor ou
comissão para sua realização.
A par
disso, destaque-se que as contas somente foram apresentadas pela Associação dos
Mesatenistas de Florianópolis durante a instrução dos presentes autos de tomada
de contas especial. No entanto, tal entidade deveria ter protocolizado as
contas até 14.06.2010, já que o repasse dos recursos ocorreu em 16.12.2009.
Com base
nessas informações, percebe-se que as providências administrativas deveriam ter
sido empregadas até 21.06.2010, com conclusão em 20.08.2010. A partir de tal
data, a autoridade administrativa tinha até 21.09.2010 para determinar a
instauração da tomada de contas especial. Contudo, instituiu-se o processo de
contas somente em 31.03.2011.
Feita
essa cronologia fática, pode-se inferir que os prazos estatuídos na legislação
não foram respeitados, uma vez que a tomada de contas especial foi constituída
191 dias após o prazo regulamentar.
Para
responder pelo apontamento ora examinado, chamou-se aos autos o Sr. Valdir
Rubens Walendowsky (Secretário de Estado de Turismo, Cultura e Esporte entre o
período de 12.04.2010 a 30.12.2010) e, ainda, o Sr. César Souza Júnior
(Secretário de Estado de Turismo, Cultura e Esporte entre o período de
03.01.2011 a 15.01.2012).
Em sua
contestação, o Sr. César Sousa Júnior apresentou, em síntese, as seguintes
razões de defesa: a) as providências administrativas deveriam ter sido adotadas
por seus antecessores, uma vez que assumiu o cargo somente em 03.01.2011; b) a
instauração da tomada de contas especial foi determinada pelo Sr. César Souza
Júnior; c) não se pode exigir que um Secretário de Estado exerça controle
absolutamente rigoroso sobre processos logo nos primeiros meses de gestão; d)
não pode ser responsabilizado por procedimentos anteriores à sua gestão,
sobremodo em relação aos assuntos e projetos específicos geridos e conduzidos
por seus antecessores; e) o prazo para a conclusão das providências
administrativas já havia terminado quando assumiu a Secretaria; f) seria
humanamente impossível ao Secretário, no dia em que assumiu a Secretaria, ou
mesmo na semana seguinte, tomar conhecimento do conteúdo e da regularidade de
todos os procedimentos administrativos pendentes, bem como desde logo tomar as
providências cabíveis; g) a responsabilidade dos agentes públicos é sempre
subjetiva; h) o déficit de infraestrutura, pessoal e a extensa gama de
processos pendentes deixados pelas gestões passadas consubstanciam típicas
hipóteses de excludentes de responsabilidade; i) prazos veiculados em decreto
não podem gerar sanção.
Já o Sr.
Valdir Rubens Walendowsky, na maior parte da sua contestação, sustenta a
impossibilidade de condenação solidária e acrescenta ainda que: a) assumiu o
cargo de Secretário em 12.09.2010; b) adotou providências administrativas assim
que soube das irregularidades; c) não cabe o controle absoluto pelo gestor
público de todos os atos praticados por seus subordinados; d) não aprovou ou
autorizou o pagamento realizado à Associação dos Mesatenistas de Florianópolis;
e) não agiu de má-fé.
Após
analisar as defesas apresentadas pelos responsáveis, a Diretoria de Controle da
Administração Estadual afastou, um a um, os argumentos suscitados. Valho-me,
pois, dos fundamentos invocados pela área técnica para sustentar, de igual
modo, a mantença dos apontamentos restritivos.
Quanto à
consequência jurídica a ser aplicada, faz-se necessário deixar registrado,
desde já, que este órgão ministerial possui entendimento sedimentado de que a ausência de adoção de providências administrativas
e de instauração de tomada de contas especial enseja a responsabilização
solidária da autoridade administrativa, nos termos da Lei Complementar Estadual
nº 202/2000:
Art. 10. A autoridade
administrativa competente, sob pena de responsabilidade solidária, deverá
imediatamente adotar providências com vistas à instauração de tomada de contas
especial para apuração de fatos, identificação dos responsáveis e quantificação
do dano, quando não forem prestadas as contas ou quando ocorrer desfalque,
desvio de dinheiro, bens ou valores públicos, ou ainda se caracterizada a
prática de qualquer ato ilegal, ilegítimo ou antieconômico de que resulte
prejuízo ao erário.
Ao
encontro disso, para o Ministério Público de Contas, o atraso na adoção de providências administrativas bem como na
instauração da tomada de contas especial pode, também, ensejar a
responsabilidade solidária do gestor.
Com
efeito, cabe aqui mencionar que a lei supracitada é cristalina ao dispor que as
medidas devem ser empregadas imediatamente, o que contribui para o deslinde dos
fatos e, certamente, para a restituição do dinheiro público aos cofres estatais
de forma mais célere.
Lançado
esse posicionamento, ressalte-se, por outro lado, que não deve ser aplicada a
mesma consequência jurídica - imputação de débito - ao Sr. César Souza Júnior,
ao Sr. Valdir Rubens Walendowsky e ao Sr.
Gilmar Knaesel - o qual deve ser condenado de forma solidária à restituição dos
valores, pelos motivos já expostos.
Notadamente,
a única irregularidade cometida pelo Sr. César Souza Junior e pelo Sr. Valdir Rubens Walendowsky - atraso na adoção de
providências administrativas e na instauração de tomada de contas especial -
não pode ter o mesmo peso dos inúmeros apontamentos imputados ao Sr. Gilmar
Knaesel.
Nessa
linha de raciocínio, percebe-se que imputar o débito de forma solidária ao Sr.
César e ao Sr. Valdir não se mostra uma medida razoável no presente caso. É
importante lembrar que tais responsáveis, ainda que com atraso, adotaram
providências visando ao ressarcimento dos cofres públicos, conforme se
depreende das fls. 81-84 e das fls. 88-89.
A
toda evidência, a morosidade não pode ser desconsiderada, pois houve a violação
de normas que disciplinam o assunto e, consequentemente, afronta ao princípio
da legalidade.
Sugere-se,
assim, a aplicação da penalidade de multa ao Sr. César Souza Júnior e ao Sr. Valdir Rubens Walendowsky, a fim de que condutas
dessa natureza não sejam reiteradas.
Para
arrematar este ponto, faz-se necessário reafirmar que a medida aqui proposta
levou em consideração as particularidades do caso concreto, não servindo, pois,
como precedente a ser aplicado indiscriminadamente. Em regra, o atraso na
adoção das providências administrativas e na instauração de tomada de contas
especial enseja a responsabilidade solidária da autoridade administrativa,
mormente quando foi o mesmo gestor quem repassou verbas públicas sem a
observância dos requisitos legais.
6. Da prestação de contas
6.1.
Ausência de comprovação da boa e regular aplicação dos recursos públicos
Destaque-se
que, ao analisar a prestação de contas trazida à baila pelo Sr. Neri Antônio
Cataneo, a Diretoria de Controle da Administração Estadual verificou que não
foram juntados aos autos os documentos necessários a certificar a boa e a regular
aplicação dos recursos públicos.
Como
é sabido, todo aquele que recebe dinheiro oriundo do erário deve comprovar, de
forma ampla e robusta, a sua boa utilização.
Nesse
sentido, anote-se o teor do art. 140 da Lei Complementar Estadual nº 284/2005:
Art. 140. Prestará
contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize,
arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiro, bens e valores públicos, ou
pelos quais o Estado responsa, ou que, em nome deste, assuma obrigações de
natureza pecuniária.
§ 1º Quem quer que
utilize dinheiro público, terá de comprovar o seu bom e regular emprego, na
conformidade das leis, regulamentos e normas emanadas das autoridades
administrativas competentes.
Na oportunidade, sobreleva mencionar que o
ônus da prova da boa e da regular aplicação dos recursos públicos compete ao
gestor, conforme se depreende da jurisprudência sedimentada pelo Tribunal de
Contas da União:
TCE. APLICAÇÃO IRREGULAR
DE PARTE DE RECEITAS ORIUNDAS DE CONVÊNIO COM ENTIDADE FEDERAL. CITAÇÃO.
REVELIA. CONFIGURAÇÃO DE DANO AO ERÁRIO, EM DECORRÊNCIA DE ATO DE GESTÃO
ILEGÍTIMO OU ANTIECONÔMICO. CONTAS IRREGULARES. DÉBITO. MULTA. RECURSO DE
REVISÃO. CONHECIMENTO. NÃO-PROVIMENTO. CIÊNCIA AOS INTERESSADOS.
1. A
configuração de dano ao Erário, em decorrência de ato de gestão ilegítimo ou
antieconômico, importa no julgamento pela irregularidade, na condenação em
débito e na aplicação de multa.
2. Nos processos de contas que
tramitam nesta Casa, compete ao gestor o ônus da prova da boa e da regular
aplicação dos recursos públicos que lhe são confiados, o que independe da comprovação de ter se configurado o
crime de improbidade administrativa, da ocorrência de enriquecimento ilícito ou
de locupletamento por parte do recorrente[14].
(Grifou-se)
De
igual sorte, tem-se o entendimento do Tribunal de Contas de Santa Catarina:
TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE
RECURSOS ANTECIPADOS DO FUNCULTURAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA BOA E REGULAR
APLICAÇÃO DOS RECURSOS. AUTORREMUNERAÇÃO. PAGAMENTOS À FAMILIARES. DESPESAS
ILEGAIS E INJUSTIFICADAS. IRREGULARIDADE DAS CONTAS. DANO AO ERÁRIO. OMISSÕES
DO PODER CONCEDENTE. MULTA.
1. Nos processos de contas o onus probandi é do gestor dos recursos
públicos, que é pessoalmente responsável pela boa e regular aplicação dos
recursos repassados e tem o ônus de provar a execução do objeto pactuado, das
despesas vinculadas ao mesmo e trazer à colação elementos que demonstrem o
atendimento ao interesse público e a inexistência de lesão ao patrimônio
público.
2. A
aplicação de recursos públicos impõe a observância de regramentos que garantam
sua destinação única e exclusiva a finalidades que correspondam ao interesse
público. Despesas que caracterizam autorremuneração e pagamento a familiares
devem ser considerados ilegais quando atenderem a interesses exclusivamente
particulares e não atingirem à finalidade pública.
3. Os
atos e omissões que revelam irregularidades na aprovação de projetos para
financiamento no âmbito do SEITEC,
por inobservância aos dispostivos legais e regulamentares que regem a
matéria, são sujeitos à aplicação de multa[15].
(Grifou-se)
Fixada
essa premissa, anote-se que os
apontamentos restritivos atinentes à prestação de contas serão analisados de
forma conjunta no presente parecer, uma vez que os responsáveis não impugnaram
de forma específica cada irregularidade.
Oportuno comentar, outrossim, que o Sr. Ronaldo
Macedo Rodrigues e a Associação dos Mesatenistas de Florianópolis não
apresentaram defesa nos presentes autos, razão pela qual devem ser aplicados os
efeitos da revelia.
Passando à análise do processo de prestação de
contas, impõe-se registrar, de imediato, que não há no feito provas concretas e
efetivas da realização do objeto proposto pela Associação dos Mesatenistas de
Florianópolis, qual seja: Manutenção da Equipe de Florianópolis.
Ao cotejar o caderno processual, observam-se
notas fiscais dos seguintes dispêndios: a) serviços de consultoria técnica na
área de treinamento; b) serviços de consultoria técnica na área de montagem,
elaboração e cadastro de projeto; c) serviços de consultoria técnica; d)
aquisição de doze mesas; e) hospedagem dos atletas de Chapecó; f) alimentação;
g) aquisição de suporte para televisão e reforma de aparadores.
Como é sabido, notas fiscais, por si só, não têm
o condão de comprovar a regularidade das despesas, devendo estar acompanhadas
de outros elementos de prova.
Somado a isso, percebe-se que os documentos
fiscais referem-se a valores globais e não apresentam os preços unitários dos
produtos, as horas trabalhadas e tantos outros elementos necessários.
Ressalte-se, também, que não há provas de que as
supostas mesas adquiridas foram incorporadas ao patrimônio da entidade nos
registros contábeis.
No tocante aos dispêndios com alimentação e
hospedagem, cumpre assinalar que não consta no caderno processual a relação das
pessoas contempladas, tampouco há menção quanto aos supostos eventos de que os
atletas participaram.
Neste ponto, chama-se a atenção para os
documentos emitidos pela Panificadora Resseti Ltda., situada em Criciúma, a
qual lançou nota fiscal em 18.12.2009, referente a despesas com alimentação
(fls. 224-225). No mesmo dia, no entanto, a Cantina San Remo, localizada em
Porto União, também emitiu notas tendo por base despesas com alimentação (fl.
227).
Diante desse fato, coloca-se em dúvida a efetiva
realização de tais despesas, uma vez que os municípios de Criciúma e Porto
União ficam a uma distância de 460 quilômetros.
Quanto à aquisição do suporte de televisão,
registre-se que tal despesa não estava prevista no plano de trabalho. Além
disso, estranha-se o fato de o suporte ter sido destinado ao ginásio municipal,
conforme mencionado na nota fiscal.
Para comprovar os dispêndios com os serviços de
consultoria, utilizaram-se meras declarações, as quais não foram registradas em
cartório. É válido dizer, inclusive, que a declaração de fl. 218 sequer está
assinada.
Adicione-se a isso que os serviços de consultoria
técnica não deveriam ser arcados com recursos oriundos do erário, pois são
despesas intrínsecas à capacidade da entidade proponente. Ora, se a Associação
dos Mesatenistas de Florianópolis não possuía condições para executar aquilo a que
se propôs, a transferência da subvenção não se justifica.
Percebe-se, outrossim, que não foram juntados aos
autos os orçamentos prévios dos serviços contratados, o que viola o art. 48,
incisos I e II, do Decreto Estadual nº 1.291/2008.
No que toca à movimentação dos recursos públicos, denota-se
que os cheques não foram cruzados (art. 58, § 2º, do Decreto Estadual nº 1.291/2008),
além de não ter sido trazido à baila o extrato bancário com a movimentação
completa do período, conforme exigência contida no art. 70, inciso II, do
Decreto Estadual nº 1.291/2008.
Não
se vislumbra, ademais, a declaração do responsável certificando que os serviços
foram prestados e o material recebido em conformidade com as especificações
consignadas, o que vai de encontro ao art. 70, inciso XII, do Decreto Estadual
nº 1.291/2008.
A prestação de contas, por sua vez, além de ter sido protocolizada
mais de cinco anos após o prazo regulamentar, estava desacompanhada do balancete (art. 70, inciso VII, do Decreto Estadual nº
1.291/2008).
É digno de nota, ainda, que não restou comprovada
a realização da contrapartida social, conforme acordado entre partes, nem
restou demonstrado que houve a divulgação do Fundo Estadual de Incentivo ao
Esporte, conforme determinação contida no art. 25, inciso I, do Decreto
Estadual nº 1.291/2008.
Presente todo esse contexto, destaque-se que o
Sr. Neri Antônio Cataneo, no intuito de afastar as irregularidades, alegou em
síntese que: a) foi manipulado pelo Sr. João Augusto Freysleben Valle Pereira,
o qual se comprometeu a realizar o projeto; b) agiu de boa-fé; c) o Sr. João
Augusto cobrou o valor de R$ 10.000,00 para prestar assessoramento; d) o Sr.
João Augusto estava com a posse dos documentos concernentes à prestação de
contas, os quais somente lhe foram entregues após muita insistência; e) há
excesso de burocracia na comprovação da utilização regular dos recursos públicos;
f) ninguém sai pelo estado forjando notas fiscais para justificar a despesa, o
que pode ser aferido com um exercício de bom senso e não propriamente com
provas; g) o escopo do projeto era garantir a manutenção da equipe de tênis de
mesa, não havendo, pois, uma única finalidade; h) as despesas constantes nos
autos fecham perfeitamente com os valores recebidos.
Quanto aos argumentos apresentados, impõe-se
assinalar, de imediato, que as exigências contidas no Decreto Estadual nº
1.291/2008 não são excesso de burocracia, pois todo aquele que recebe dinheiro
oriundo dos cofres públicos deve comprovar de forma robusta e satisfatória a
sua regular utilização.
Não se pode olvidar, a propósito, que a
legislação à época da solicitação dos recursos já previa os requisitos
necessários a demonstrar a correta utilização do dinheiro público. Por
corolário lógico, o Sr. Neri Antônio Cataneo sabia, ou deveria saber, que a
inobservância das normas poderia acarretar-lhe consequências negativas.
Vale lembrar, ademais, que o proponente, ao
receber verbas do estado, sujeita-se às mesmas regras impostas ao gestor
público, o que inclui, evidentemente, a observância ao princípio da legalidade.
Sobre tal preceito, Helly Lopes Meirelles asseverou, com
maestria, que “na Administração Pública não há liberdade nem vontade pessoal.
Enquanto na administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe,
na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza”[16].
Em razão disso, não cabia outra conduta ao Sr. Neri Antônio
Cataneo a não ser cumprir integralmente as normas relativas à prestação de
contas, até mesmo porque tal responsável comprometeu-se, no contrato, a agir
dessa forma.
Nesse passo, extrai-se do contrato assinado pelo Sr. Neri
Antônio Cataneo (fl. 72):
CLÁUSULA
OITAVA – DA PRESTAÇÃO DE CONTAS
I. A
prestação de contas de recursos financeiros advindos do FUNDESPORTE, de que trata o presente Contrato, será elaborada de
acordo com o disposto na Lei nº 13.336/05 e demais legislações e normativos
vigentes.
[...]
IV.
As prestações de contas, compostas de forma individualizada de acordo com a
finalidade da despesa e no valor da parcela, deverão conter os documentos
comprobatórios no Manual de Prestação de Contas do SEITEC.
V.
Se o Contratado for entidade privada ou pessoa física deverá apresentar os
documentos comprobatórios de despesas em original. (Grifos no original)
Denota-se, outrossim, que no instrumento
contratual ficaram estipuladas, uma a uma, as responsabilidades do Sr. Neri
Antônio Cataneo (fls. 71-72).
Portanto, não se mostra razoável, neste momento,
alegar “excesso de burocracia”, pois tal responsável sabia, no momento de
receber os recursos, das obrigações advindas do repasse.
Aliado a isso, cabe ter presente que as
exigências contidas nas leis e nos decretos que disciplinam a prestação de
contas são necessárias para evitar que o dinheiro público seja empregado de
forma irresponsável pelos agentes. Notadamente, a legislação não iria autorizar
o repasse de subvenção social para que o proponente utilizasse o dinheiro
público de forma indiscriminada e sem a observância dos requisitos legais.
Oportuno aqui comentar, em direção oposta ao
alegado pelo Sr. Neri Antônio Cataneo, que já se constatou em outros feitos
empresas e pessoas que se dispuseram a emitir notas fiscais para comprovar
despesas inexistentes. Não se está aqui a afirmar que esse é o caso dos autos,
mas sim que essa é uma realidade em muitos processos que tramitam no âmbito dos
tribunais de contas.
Logo, não é questão de pensar com bom senso, conforme
alegado, uma vez que isso de fato ocorre.
Faz-se imprescindível, assim, apresentação de provas efetivas e
concretas da realização dos dispêndios.
Na esteira desse raciocínio, repise-se, mais uma
vez, que documentos fiscais desacompanhados de outros elementos de suporte são
insuficientes para comprovar a regularidades das despesas.
Dito isso, acrescente-se que, ao examinar as
particularidades do caso concreto, percebe-se que o responsável entusiasmou-se
com a possibilidade de auferir facilmente recursos públicos através das
artimanhas realizadas pelo Sr. João Augusto Freysleben Valle Pereira. No
entanto, o Sr. Neri Antônio não se atentou ao fato de que a utilização de
dinheiro público exige seriedade e transparência do proponente, sob pena de
devolução dos valores ao erário.
Note-se que o Sr. Neri Antônio poderia desconfiar
das intenções do Sr. João Augusto ao propor a negociata, pois este se
comprometeu a realizar o projeto e, em contrapartida, exigiu o valor de R$
10.000,00.
A alegada boa-fé, neste momento, não tem o condão
de afastar as consequências jurídicas que devem advir dos fatos irregulares,
haja vista que o responsável agiu, no mínimo, de forma culposa.
Na ocasião, impõe-se mencionar que imputar
responsabilidade a terceiro não afasta as obrigações assumidas pelo Sr. Neri
Antônio Cataneo, pois foi ele quem assumiu o compromisso de utilizar os
recursos públicos em consonância com os princípios e as normas aplicáveis à
espécie.
Quanto aos documentos apresentados pelo
responsável em sede de contestação (fls. 366-370), tenho para mim que estes não
alteram o raciocínio aqui formulado.
Às fls. 366-367, há uma relação com o nome e a
assinatura de algumas pessoas. Tal planilha, no entanto, não demonstra a sua
vinculação ao projeto proposto. Vale dizer, inclusive, que a tabela refere-se
aos meses de janeiro a novembro de 2009, sendo que o recurso público foi
repassado em dezembro de 2009.
As fotos de fls. 368-370, de igual modo, não
revelam nexo com o projeto aprovado, sobretudo porque as mesas estão instaladas
injustificadamente no Ginásio de Tênis de Mesa do Saco dos Limões.
Frente a todo o exposto, entende-se que não há no
caderno processual elementos para afastar a condenação do Sr. Neri Antônio
Cataneo, pois não restou demonstrada a regular utilização do dinheiro público.
Ao contrário, percebe-se que a verba foi aplicada sem a observância mínima dos
preceitos legais.
No tocante à responsabilidade do Sr. João Augusto
Freyesleben Valle Pereira, da Sra. Márcia Regina Alves Valle Pereira e do Sr.
Ronaldo Macedo Rodrigues, coaduno com a linha de pensamento firmada pela área
técnica.
Tais pessoas, importante dizer, foram contratadas
para supostamente prestar serviços de consultoria técnica para a Associação dos
Mesatenistas de Florianópolis. Para comprovar a despesa, emitiram meras
declarações (fls. 215-216 e fl. 218), as quais não possuem o valor probatório
necessário para certificar que houve, de fato, a execução dos serviços.
Afigura-se necessário rememorar, neste ponto, que
o Sr. Neri Antônio Cataneo afirma que foi ludibriado pelo Sr. João Augusto
Freyesleben Valle Pereira, o qual teria informado ao proponente sobre a
possibilidade de captação de recursos através do Fundo Estadual de Incentivo ao
Esporte. Naquela ocasião, segundo a defesa do Sr. Neri Antônio, o Sr. João
Augusto exigiu o montante de R$ 10.000,00 para executar a parte burocrática dos
serviços relacionados à obtenção da verba pública.
Em sua defesa, o Sr. João Augusto Freyesleben
Valle Pereira afirmou que a sua empresa – Floripa Prime Promoções e Eventos – não
prestou qualquer serviço à Associação dos Mesatenistas de Florianópolis, pois
realiza apenas promoção de eventos e não consultoria técnica. Acrescentou que,
na condição de pessoa física, prestou serviços à entidade proponente e, portanto,
fez jus ao recebimento dos valores pagos. Para arrematar, salientou que tem
conhecimento de que as mesas foram adquiridas pela associação e, ainda, que não
há fundamento legal para a sua responsabilização solidária.
A Sra. Márcia Regina Alves Valle Pereira, por sua
vez, alegou que executou serviços de digitação e formatação do projeto, motivo
pelo qual recebeu valores da Associação dos Mesatenistas de Florianópolis.
Dispõe, ainda, que não deve ser responsabilizada, pois não cometeu qualquer
irregularidade.
Com o devido respeito às defesas colacionadas aos
autos, mas não foram apresentados fundamentos jurídicos suficientes para
afastar a responsabilização sugerida pelo corpo técnico.
Em primeiro lugar, destaque-se que em nenhum
momento foi atribuída à empresa Floripa Prime Promoções e Eventos qualquer
responsabilidade pelos fatos, mas sim às pessoas físicas acima citadas.
Restando comprovado que o Sr. João Augusto
Freyesleben Valle Pereira, a Sra. Márcia Regina Alves Valle Pereira e o Sr.
Ronaldo Macedo Rodrigues receberam recursos públicos e, ainda, não havendo
provas de que efetivamente executaram qualquer serviço à Associação dos
Mesatenistas de Florianópolis, há sim fundamento legal para a respectiva
responsabilização.
Nesse sentido, eis a previsão constante na Lei
Complementar Estadual nº 202/2000:
Art. 18. As contas serão julgadas:
I — regulares, quando expressarem, de forma
clara e objetiva, a exatidão dos demonstrativos contábeis, a legalidade, a
legitimidade e a economicidade dos atos de gestão do responsável;
II — regulares com
ressalva, quando evidenciarem impropriedade ou qualquer outra falta de natureza
formal de que não resulte dano ao erário; e
III — irregulares, quando comprovada qualquer
das seguintes ocorrências:
a) omissão no dever
de prestar contas;
b) prática de ato de
gestão ilegítimo ou antieconômico, ou grave infração à norma legal ou
regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional ou
patrimonial;
c) dano ao erário decorrente de ato de gestão
ilegítimo ou antieconômico injustificado; e
d) desfalque, desvio de dinheiro, bens ou
valores públicos.
§ 1º O Tribunal
poderá julgar irregulares as contas no caso de reincidência no descumprimento
de determinação de que tenha ciência o responsável, feita em processo de prestação ou tomada de contas.
§ 2º Nas hipóteses do inciso III, alíneas c e
d, deste artigo, o Tribunal, ao julgar irregulares as contas, fixará a
responsabilidade solidária:
a) do agente público que praticou o ato
irregular e
b) do terceiro que, como contratante ou parte
interessada na prática do mesmo ato, de qualquer modo, haja concorrido para a
ocorrência do dano apurado.
Forçoso admitir, assim, que todo aquele que de
qualquer modo concorre para a efetivação do dano causado aos cofres públicos
está sujeito à condenação solidária.
Conclui-se, portanto, que a responsabilidade dos
agentes supracitados não pode ser excluída, pois, ainda que não tenham
percebido diretamente a subvenção social, receberam recursos públicos e não
comprovaram a execução do trabalho supostamente prestado à entidade.
Para encerrar, sublinhe-se que o Sr. João Augusto
Freyesleben Valle Pereira, a Sra. Márcia Regina Alves Valle Pereira e o Sr.
Ronaldo Macedo Rodrigues devem ser condenados, de forma solidária, ao valor do
suposto serviço prestado por cada um.
Ante
o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida
pelo art. 108, incisos I e II, da Lei Complementar nº 202/2000, manifesta-se:
1. Por julgar irregulares, com imputação de débito, na forma do art. 18, III, “b”
e “c”, c/c o art. 21, caput da Lei
Complementar Estadual nº 202/2000, as contas de recursos repassados à Associação dos
Mesatenistas de Florianópolis, no montante de R$ 30.000,00, referentes à
Nota de Empenho nº 2009NE000297, paga em 16/12/2009.
2. Por
condenar solidariamente, nos termos do art. 18, § 2º da Lei Complementar
Estadual nº 202/2000, o Sr. Neri Antônio Cataneo, a Associação dos Mesatenistas
de Florianópolis, o Sr. João Augusto Freyesleben Valle Pereira, a Sra. Márcia
Regina Alves Valle Pereira, o Sr. Ronaldo Macedo Rodrigues e o Sr. Gilmar
Knaesel ao recolhimento da quantia de
até R$ 30.000,00, com os devidos acréscimos legais, conforme segue:
2.1. De responsabilidade
solidária do Sr. Neri Antônio Cataneo e da Associação dos Mesatenistas de
Florianópolis o valor de R$ 30.000,00, sem prejuízo da aplicação da multa
proporcional ao dano, em face dos seguintes apontamentos:
2.1.1.
Ausência de comprovação material da efetiva realização do objeto constante no
projeto proposto e incentivado com recursos públicos;
2.1.2.
Ausência de comprovação material do efetivo fornecimento dos materiais e da
prestação dos serviços, aliado à descrição insuficiente das declarações e das
notas fiscais apresentadas, bem como pela ausência de outros elementos de
suporte;
2.1.3.
Indevida apresentação de comprovantes de despesas inábeis para atestar gastos
com recursos públicos, pois foram juntadas meras declarações dos serviços de
assessoria.
2.1.4. Indevida realização de despesas intrínsecas
à capacidade operacional da entidade proponente para a realização do projeto
incentivado;
2.1.5. Realização de despesas sem comprovação de
três orçamentos originais ou da exclusividade;
2.1.6.
Ausência de extrato da conta bancária específica, abrangendo a data do
recebimento da parcela até o último pagamento efetuado e conciliação bancária,
com vistas a verificar a movimentação dos recursos públicos repassados;
2.1.7. Não
emissão de cheques cruzados;
2.1.8.
Ausência de declaração do responsável, nos documentos comprobatórios da
despesa, certificando que o material foi recebido e o serviço prestado;
2.2. De
responsabilidade solidária do Sr. Gilmar Knaesel o valor de R$ 30.000,00, sem
prejuízo da aplicação da multa proporcional ao valor do dano causado ao erário,
em face dos seguintes apontamentos:
2.2.1. Aprovação do
projeto, assinatura do contrato e repasse de recursos mesmo diante da ausência
de documentos exigidos na tramitação inicial dos projetos;
2.2.2.
Aprovação do projeto, assinatura do contrato e repasse dos recursos mesmo
diante da ausência de Parecer Técnico e Orçamentário emitido pelo SEITEC;
2.2.3.
Aprovação do projeto, assinatura do contrato de apoio financeiro e repasse dos
recursos mesmo diante da ausência da avaliação, pelo Conselho Estadual de Esporte,
quanto ao julgamento do mérito do projeto apresentado pela entidade;
2.3. De
responsabilidade solidária do Sr. João Augusto Freyesleben Valle Pereira o
valor de R$ 4.375,91, sem prejuízo da aplicação da multa proporcional ao valor
do dano causado ao erário, em razão de não haver a comprovação da efetiva
prestação dos serviços de assessoria.
2.4. De
responsabilidade solidária da Sra. Márcia Regina Alves Valle Pereira o valor de
R$ 869,00, sem prejuízo de aplicação de multa proporcional ao dano causado ao
erário, em face da emissão de documento impróprio para comprovar o suposto
serviço prestado e tendo em vista, ainda, a ausência de provas da efetiva
realização das atividades declaradas.
2.5. De
responsabilidade solidária do Sr. Ronaldo Macedo Rodrigues o valor de R$
4.755,09, sem prejuízo da aplicação de multa proporcional ao dano causado ao
erário, em face da emissão de documento impróprio para comprovar o suposto
serviço prestado e tendo em vista, ainda, a ausência de provas da efetiva
realização das atividades declaradas.
3. Por
aplicar multa ao Sr. Neri Antônio Cataneo, com fulcro no art. 70, inciso II, da
Lei Complementar Estadual nº 202/2000, em face das seguintes irregularidades:
3.1.
Ausência do Balancete de Prestação de Contas de Recursos Antecipados;
3.2.
Atraso de 1.863 (um mil, oitocentos e sessenta e três) na apresentação das
contas;
3.3. Ausência
da comprovação da realização da contrapartida social;
3.4.
Ausência
de comprovação da divulgação e promoção do Estado de Santa Catarina e do Fundo
Estadual de Incentivo ao Esporte.
4. Por
aplicar multa ao Sr. Valdir Rubens Walendowsky (Secretário de Estado do
Turismo, Cultura e Esporte entre o período de 12.04.2010 a 30.12.2010), com
fulcro no art. 70, inciso II, da Lei Complementar Estadual nº 202/2000, em face
da intempestiva
adoção de providências administrativas preliminares e omissão na instauração de
tomada de contas especial;
5. Por
aplicar
multa ao Sr. César Souza Júnior (Secretário de Estado do Turismo, Cultura e
Esporte entre o período de 03.01.2011 a 15.01.2012), com fulcro no art. 70,
inciso II, da Lei Complementar Estadual nº 202/2000, em face da demora
injustificada na instauração de tomada de contas especial.
6. Por
declarar o Sr. Neri Antônio Cataneo e a Associação dos Mesatenistas de Florianópolis
impedidos de receber novos recursos do erário até a regularização do presente
processo, consoante dispõe o art. 16, § 3º da Lei Estadual nº 16.292/2013 c/c o
art. 1º, § 2º, inciso I, alíneas “b”
e “c” da Instrução Normativa TC nº
14/2012 e o art. 61 do Decreto Estadual nº 1.309/2012.
7. Por
dar ciência da decisão proferida pelo TCE/SC aos responsáveis, aos procuradores
devidamente constituídos nos autos e à Secretaria de Estado de Turismo, Cultura
e Esporte.
Florianópolis,
09 de maio de 2017.
Diogo
Roberto Ringenberg
Procurador
do Ministério
Público
de Contas
[1] O art. 37, § 5º, da Constituição da
República prevê: “§ 5º A lei
estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer
agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as
respectivas ações de ressarcimento”.
[2] SANTA CATARINA, Tribunal de Contas. REC 10/00029430, Câmara Municipal
de Otacílio Costa. J. em: 13 mar. 2013.
[3] CAVALIERI FILHO, Sério. Programa de Responsabilidade
Civil. 9 ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 105.
[4] BRASIL. Tribunal de Contas da União.
Acórdão 2343/2006, Plenário. Relator: Min. Benjamin Zymler. J. em: 06 dez.
2006. Disponível em: www.tcu.gov.br. Acesso em
16 dez. 2015.
[5] Nesse sentido:
http://dc.clicrbs.com.br/sc/noticias/noticia/2016/06/inquerito-aponta-gilmar-knaesel-psdb-como-mentor-de-fraudes-com-ongs-fantasmas-em-sc-6030228.html.
[6] SANTA CATARINA, Tribunal de Contas.
TCE 11/00340316, FUNTURISMO. Rel. Cleber Muniz Gavi. J. em: 18 fev. 2015.
[7] O art. 72, do Código Penal prevê: “Art. 72 - No concurso de crimes, as penas de multa são aplicadas distinta e integralmente”.
[8] OLIVEIRA, Régis Fernandes. Infrações
e sanções administrativas. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1985, p. 82.
[9] VITTA, Heraldo Garcia. A sanção do
direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 130.
[10] FEDERAL, Tribunal Regional (3ª
Região). Apelação Cível nº
0025078-68.2004.4.03.6100/SP. Rel. Cecilia Marcondes. J. em: 20 dez. 2013.
Disponível em: http://www.plenum.com.br/ac/TRF3/003/00250786820044036100.html. Acesso em: 01 set. 2015.
[11] BRASIL, Superior Tribunal de Justiça (2ª Turma). Resp nº 616412/MA. Rel. Eliana
Calmon. J. em: 29 nov. 2004. Disponível em: www.stj.jus.br. Acesso em: 01 set. 2015.
[12] BRASIL, Superior Tribunal de Justiça (2ª Turma). AgRg no Edcl no Resp nº 68479/PE.
Rel. Mauro Campbell Marques. J. em 27 abr. 2011. Disponível em: www.stj.jus.br. Acesso em: 01 set. 2015.
[13] FEDERAL, Tribunal Regional (4ª
Região). Embargos de Declaração na Apelação Cível nº 2006.71.04.001289-5/RS.
Rel. Marcelo de Nardi. J. em: 26 mar. 2009. Disponível em: file:///C:/Users/9684301/Downloads/de_jud_2009_03_31_a.pdf.
Acesso em: 01 set. 2015.
[14] BRASIL, Tribunal de Contas da União. TC 013.473/2004-9,
do Plenário. Rel. José Jorge. J. em: 27 fev. 2013. Disponível em: www.tcu.
gov.br. Acesso em: 08 dez. 2015.
[15] SANTA CATARINA, Tribunal de Contas.
TCE 10/002299497, do FUNCULTURAL. Rel. Cleber Muniz Gavi. J. em: 19 ago. 2015.
[16] MEIRELLES, Hely
Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 30. Ed. São Paulo: Malheiros, 2005.