PARECER nº:

MPTC/48676/2017

PROCESSO nº:

REP 15/00350203    

ORIGEM:

Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina - IPREV

INTERESSADO:

Cibelly Farias Caleffi

ASSUNTO:

Irregularidades concernentes à negativa de concessão de certidões requeridas por pensionistas.

 

Trata-se de representação formulada por este Ministério Público de Contas acerca de possíveis irregularidades relacionadas à negativa de fornecimento, por parte do Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina (IPREV), da certidão “se vivo fosse” requerida por pensionistas, em afronta ao art. 5º, incisos XXXIII e XXXIV, da CRFB/88, c/c o art. 4º da Constituição do Estado de Santa Catarina e o art. 10 da Lei n. 12.527/11.

Após os trâmites regulares, este órgão ministerial, pelo Parecer n. MPTC/47073/2017 (fls. 182-188v), manifestou-se pela assinatura de prazo para que a Secretaria de Estado da Administração editasse norma para regulamentar o direito, a forma, o prazo, o local e os demais quesitos necessários quanto à obrigatoriedade do fornecimento de certidão “se vivo fosse”, para revisão de pensão por morte, pelas unidades gestoras do Poder Executivo, Fundações, Autarquias e demais Poderes, responsáveis pela sua elaboração; pela assinatura de prazo para que o Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina (IPREV) passasse a disponibilizar informações claras e precisas na internet e em balcão de atendimentos, para os pensionistas, indicando documentos, prazo, formulários, local e demais dados onde deva ser solicitada e retirada a certidão “se vivo fosse”; e pelas recomendações constantes no item 4 da conclusão daquele parecer (fl. 188v).

Na sequência, às fls. 189-189v, o Relator determinou o encaminhamento dos autos à Diretoria de Controle de Atos de Pessoal – DAP, para manifestação específica quanto ao direito à paridade pelos pensionistas.

Remetidos os autos à DAP, aquela área técnica assim concluiu, conforme relatório complementar DAP-797/2017 (fls. 190-195):

3.1 as pensões decorrentes de aposentadorias ocorridas anteriormente à Emenda Constitucional 41/2003, ou as concedidas com fundamento no art. 3º da Emenda Constitucional 41/2003, somente gozarão de paridade com os vencimentos dos servidores em atividade se o óbito do servidor ocorreu até 31/12/2003;

3.2 constituem exceção à regra e continuam gozando do benefício de paridade (regra de exceção a partir da edição da Emenda Constitucional 41/2003) as pensões civis originadas por óbitos ocorridos a partir de 1º/1/2004 e que sejam decorrentes de:

a) aposentadorias fundamentadas no art. 3º da Emenda Constitucional 47/2005, por força do parágrafo único desse mesmo artigo;

b) aposentadorias por invalidez, para servidores que tenham ingressado no serviço público até 31/12/2003, com base no parágrafo único do art. 6.º-A da Emenda Constitucional 41/2003, incluído pela Emenda Constitucional 70/2012, observados os efeitos financeiros estipulados no art. 2º da EC 70/2012;

3.3 ressalvadas as exceções anteriormente mencionadas nos itens 3.1 e 3.2 desta conclusão, para pensões decorrentes de óbitos posteriores a 31/12/2003, os benefícios serão reajustados no mesmo índice e data aplicáveis aos benefícios do RGPS; portanto sem paridade remuneratória.

No despacho de fl. 196, o Relator determinou o retorno dos autos a este órgão ministerial. 

É o relatório.

O Sr. Renato Luiz Hinnig, Presidente do IPREV, explicou (fls. 50-52) que nos casos em que houve a negativa da emissão da certidão “se vivo fosse”, os requerentes eram todos segurados em que o evento gerador do benefício da pensão por morte ocorreu depois da entrada em vigor da Emenda Constitucional n. 41/2003, que alterou a redação do art. 40, § 7º, da CRFB/88. Assim, acerca do mérito da paridade remuneratória[1], discorre o responsável:

É certo que, a modificação introduzida pela EC n. 41/03 visou exatamente moralizar o sistema remuneratório dos servidores públicos, desta forma, proibiu o pagamento de pensões integrais, bem como vedou a paridade para as pensões concedidas após a referida emenda. Com isso, mesmo que o IPREV pudesse fornecesse o documento denominado certidão “se vivo fosse”, os valores que o instituidor estaria recebendo não corresponderá ao valor atual da pensão por morte, uma vez que tais beneficiários não tem paridade.

Assim, as pensões instituídas com base no art. 40, §7º, I, da Constituição Federal terão por base os proventos dos instituidores na data do óbito, pois é desta forma que consta a redação do referido inciso, bem como de acordo com o §8º do mesmo artigo, ante a redação dada pela EC 41/03, e o reajustamento do benefício, para preserva-lhes, o valor real, será estabelecido conforme critérios da Lei.

Logo, as pensões instituídas após a EC 41/03 devem ser concedidas nos termos do art. 40, §7º e reajustadas conforme o §8º deste mesmo artigo, ambos da Constituição Federal de 1988. Então, não há mais paridade (grifei).

A Diretoria de Controle da Administração Estadual, então, no Relatório de Instrução DCE n. 282/2016 (fls. 165-180v), após discorrer sobre as alterações legislativas  relativas à paridade remuneratória (EC n. 41/2003, EC n. 47/2005) concluiu que o entendimento do IPREV sobre a matéria não encontra respaldo legal, porquanto “os pensionistas de servidores que ingressaram no serviço público antes da regra de transição de 31/12/2003 e que tenham evento morte após esta data, têm direito a paridade, porque foram alcançados pela EC nº 47/2005” (fl. 173). Assim, segundo a área técnica, os argumentos do Parecer n. 010R/2015/GECAD/IPREV (fls. 18-21) não podem servir de fundamento para a negativa de emissão da certidão “se vivo fosse”.

Após a emissão do Parecer n. MPTC/47073/2013 (fls. 182-188v), os autos foram encaminhados, por determinação do Relator (fls. 189-189v), à Diretoria de Controle de Atos de Pessoal que, por outro lado, consoante Relatório DAP-797/2017 (fls. 190-195), considerou correto o entendimento fixado no mencionado Parecer n. 010/R/2015/GECAD/IPREV no que se refere às regras que norteiam o direito de paridade dos pensionistas.

Em que pesem tais discussões, destaco que o mérito do presente processo diz respeito apenas ao direito de acesso à certidão ”se vivo fosse”, não se prestando a analisar a legalidade da paridade remuneratória, já que tal juízo de valor para fornecer ou não uma certidão não se coaduna com a lei de acesso a informação.

Conforme repetidamente defendido nos autos, tratam-se de direitos distintos – o direito à obtenção da certidão e o direito à paridade -, de modo que a paridade é matéria que pode vir a ser eventualmente apreciada e julgada no âmbito judicial, mediante ação promovida pelos pensionistas. Para tanto, é imprescindível a obtenção da informação negada, sendo esta negativa, por sua vez, o objeto dos presentes autos.

Apenas para ilustrar, é importante ressaltar que, não obstante o entendimento do IPREV e da DAP, a matéria não é pacífica – a exemplo do defendido pela DCE – e o pensionista pode submeter a matéria à apreciação do Poder Judiciário que, inclusive, já se manifestou contrariamente ao IPREV, conforme se colhe de decisão do Supremo Tribunal Federal, de 03.06.2015, de relatoria do Ministro Ricardo Lewandowski:

Os pensionistas de servidor falecido posteriormente à EC nº 41/2003 têm direito à paridade com servidores em atividade (EC nº 41/2003, art. ), caso se enquadrem na regra de transição prevista no art.  da EC nº 47/2005. Não tem, contudo, direito à integralidade (CF, art. 40§ 7º, inciso I). 

(STF, RE n. 603.580, Rel. Ministro Ricardo Lewandowski, j. Em 20.5.2015. DJE n. 107, de 3.6.2015.)

O Tribunal de Justiça de Santa Catarina, de igual modo, já se manifestou nesse sentido, defendendo que os pensionistas de servidores que ingressaram no serviço público antes de 31.12.2003, mesmo que tenham falecido após esta data, têm direito à paridade com os servidores ativos:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. PENSÃO POR MORTE. ALTERAÇÃO DO COEFICIENTE DE CÁLCULO DA PENSÃO.    DECISÃO QUE CONCEDEU A LIMINAR, DETERMINANDO QUE O BENEFÍCIO SEJA PAGO CONSOANTE O DISPOSTO NO ART. 40, § 7º, DA CF, TENDO COMO BASE DE CÁLCULO OS VALORES CORRESPONDENTES À TOTALIDADE DOS VENCIMENTOS OU PROVENTOS DO INSTITUIDOR, COMO SE VIVO FOSSE, COM O ACRÉSCIMO DAS VANTAGENS PESSOAIS, EXCLUÍDAS AS VERBAS DE NATUREZA INDENIZATÓRIA, OBSERVADO O LIMITE ESTABELECIDO PELA PREVIDÊNCIA SOCIAL E OS DEMAIS TERMOS LEGAIS.   RECURSO INTERPOSTO PELO IPREV. ÓBITO OCORRIDO POSTERIORMENTE AO ADVENTO DA EC Nº 41/03. APURAÇÃO QUE DEVE SER EFETIVADA COM AMPARO NA TOTALIDADE DOS PROVENTOS PERCEBIDOS PELO INSTITUIDOR DA PENSÃO. LIMITAÇÃO REMUNERATÓRIA INTRODUZIDA PELA EC Nº 47/05 QUE NÃO SE APLICA AO CASO. OBSERVÂNCIA AO TETO REMUNERATÓRIO PRECONIZADO NA EC Nº 68/13.    "[...] `De acordo com o disposto no art. 40, § 7º (com redação dada pela Emenda Constitucional n. 41/03), da Constituição Federal, o benefício da pensão por morte instituído após a vigência de tal Emenda corresponde ao valor do limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social, acrescido de 70% do que exceder a esse limite, levando-se em conta, para esse cálculo, a totalidade da remuneração ou dos proventos do servidor falecido. O art. 7º, da EC n. 41/03, com os esclarecimentos da EC n. 47/05, a pensão mensal devida à viúva do servidor público que já estava aposentado com proventos integrais na data da publicação daquela emenda guarda paridade com a remuneração que o instituidor teria na atividade, se vivo fosse, de modo que os reajustes dados aos vencimentos dos servidores em atividade, da mesma categoria, devem estender-se às pensionistas.´ (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2015.039378-1, da Capital, rel. Des. Jaime Ramos, j. 28/01/2016)". (TJSC, Agravo de Instrumento n. 0154305-74.2015.8.24.0000, da Capital, rel. Des. Carlos Adilson Silva, j. 17/05/2016).   RECLAMO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 0150369-41.2015.8.24.0000, da Capital, rel. Des. Luiz Fernando Boller, j. 26-07-2016) (grifei).

Desta forma, repiso que independentemente da legalidade ou não da paridade remuneratória – matéria que não é objeto da presente representação –, deve ser disponibilizado aos pensionistas o acesso à certidão “se vivo fosse” a fim de que estes, caso desejem, possam ingressar com os meios necessários para garantir os direitos que entendem lhes serem cabíveis.

Assim, reitero os argumentos do parecer anterior (fls.182-188v), a fim de determinar a fixação de prazo à Secretaria de Estado da Administração e ao Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina para adotar as providências descritas na conclusão deste parecer, bem como recomendar ao  IPREV o reexame do Parecer n. 010R/2015/GECAD/IPREV e a emissão de parecer jurídico individualizado para cada caso relativo aos requerimentos de revisão de pensão por morte, até que a questão seja devidamente regulamentada.

Dessa maneira, este Ministério Público de Contas ratifica as razões dispostas na peça inicial da presente representação (fls. 2-15) e nos Pareceres n. MPTC/36898/2015 (fls. 32-33) e n. MPTC/47073/2017 (fls. 182-188v), no sentido que deve o IPREV prestar todas as informações necessárias aos pensionistas para obtenção das certidões que entenderem necessárias ao exercício de quaisquer direitos.

E, considerando as divergências de entendimento acerca do tema relacionado à paridade, entendo pertinente também a permanência da recomendação para que o IPREV proceda a uma reanálise da matéria, inclusive com levantamento das mais recentes decisões judiciais sobre o assunto.

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, reitera os termos da conclusão do Parecer n. MPTC/47073/2017 (fls. 182-188v), manifestando-se:

1. pela ASSINATURA DE PRAZO para que a Secretaria de Estado da Administração edite norma para regulamentar o direito, a forma, o prazo, o local e os demais quesitos necessários quanto à obrigatoriedade do fornecimento de certidão “se vivo fosse”, para revisão de pensão por morte, pelas unidades gestoras do Poder Executivo, Fundações, Autarquias e demais Poderes, responsáveis pela sua elaboração, nos termos do art. 57, incisos I, V, VIII, XIV e § 1º da Lei Complementar Estadual n. 381/2007 c/c os arts. 3º, incisos XIII, XIV e XXIX, 5º, inciso I, 8º, 10, 11, 59, inciso II, alínea “a”, e 73, todos da Lei Complementar Estadual n. 412/2008, o art. 5º, incisos XXXIII e XXXIV, alíneas “a” e “b”, da CRFB/88, e os arts. 7º, inciso I, 10, § 3º e 11, da Lei n. 12.527/11, conforme a determinação sugerida no item 3.2 da conclusão do Relatório n. DCE-282/2016 (fls. 179v-180v);

2. pela ASSINATURA DE PRAZO para que o Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina (IPREV), na pessoa de seu Presidente, passe a disponibilizar informações claras e precisas na internet e em balcão de atendimentos, para os pensionistas, indicando documentos, prazo, formulários, local e demais dados onde deva ser solicitada e retirada a certidão “se vivo fosse”, na forma do art. 7º, inciso I, c/c o art. 5º, inciso XXXIV, alínea “b”, da Lei n. 12.527/11, consoante a recomendação sugerida no item 3.3.1 da conclusão do Relatório n. DCE-282/2016 (fls. 179v-180v);

3. pela RECOMENDAÇÃO ao Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina (IPREV), na pessoa de seu Presidente, para que adote as seguintes providências, de acordo com os itens 3.3.2 e 3.3.3 da conclusão do Relatório n. DCE-282/2016 (fls. 179v-180v):

3.1. o reexame do Parecer n. 010R/2015/GECAD/IPREV para que atenda e se adapte à realidade jurídica e constitucional pátrias, notadamente às decisões do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina e do Supremo Tribunal Federal;

3.2. a emissão de parecer jurídico individualizado para cada caso relativo aos requerimentos de revisão de pensão por morte, até que a questão seja devidamente regulamentada.

Florianópolis, 12 de maio de 2016.

 

 


Cibelly Farias Caleffi

Procuradora

 



[1] Destaca-se que tal entendimento é o mesmo exarado pela Diretoria Jurídica do IPREV pelo Parecer n. 010R/2015/GECAD/IPREV (fls. 18-21), utilizado para indeferir os pedidos de certidão “se vivo fosse”.