PARECER nº:

MPTC/48944/2017

PROCESSO nº:

REP 16/80278794    

ORIGEM:

Prefeitura Municipal de São José

INTERESSADO:

Observatório Social de São José

ASSUNTO:

Irregularidades no edital de Pregão Presencial n. 087/2016, visando o registo de preços para eventual contratação de serviços de roçada em locais de responsabilidade da Fundação Municipal de Cultura e Turismo.

 

 

 

Trata-se de representação com pedido de medida cautelar encaminhada pelo Observatório Social de São José (OSSJ), pessoa jurídica de direito privado, devidamente qualificada nos autos, na qual relata supostas irregularidades no edital do Pregão Presencial n. 087/2016, lançado pela Prefeitura Municipal de São José, visando ao registro de preços para a contratação de empresa especializada para eventual prestação de serviços de roçada destinados à manutenção dos locais de responsabilidade da Fundação Municipal de Cultura e Turismo do Munícipio de São José.

A petição inicial e os documentos remetidos pela representante foram acostados às fls. 3-31v.

A Diretoria de Controle de Licitações e Contratações, por meio do Relatório de Instrução n. DLC-571/2016 (fls. 32-45), posicionou-se pelo conhecimento da representação e pelo indeferimento da medida cautelar que objetivava a suspensão da abertura do Edital de Pregão Presencial n. 087/2016, por não atender ao requisito do fumus boni juris, sugerindo, quanto ao mérito, considerar improcedente a representação quanto aos itens 3.3.1 a 3.3.8 de sua conclusão, com o consequente arquivamento dos autos.

O Relator acolheu o posicionamento da área técnica na Decisão Singular n. GAC/HJN-052/2016 (fls. 46-48), determinando, assim, o conhecimento da representação; o indeferimento da medida cautelar pleiteada, em razão da ausência de ameaça de lesão ao direito dos licitantes; e a adoção das medidas dispostas nos itens 3.1 a 3.4 da referida decisão à Secretaria Geral deste Tribunal de Contas.

A não concessão da medida cautelar foi ratificada em Sessão Ordinária do dia 03.10.2016 (fl. 48).

Posteriormente, este Ministério Público de Contas manifestou-se, no Parecer n. MPTC/46097/2016 (fls. 52-63), pela audiência da responsável, Sra. Adeliana Dal Pont, Prefeita Municipal de São José, para que apresentasse justificativas em face das irregularidades ali apontadas.

Em seguida, o Relator, por meio do Despacho n. GAC/HJN-123/2016 (fls. 64-64v), decidiu de acordo com a sugestão desse Ministério Público de Contas, determinando à Diretoria de Controle de Licitações e Contratações pela realização de audiência da responsável.

Após a devida notificação (fls. 65-66), a Sra. Adeliana Dal Pont apresentou as alegações de defesa e os documentos de fls. 68-74.

Ante a manifestação da responsável, a Diretoria de Controle de Licitações e Contratações elaborou o Relatório de Instrução Despacho n. DLC-006/2017 (fls. 76-78), sugerindo o saneamento dos autos através da realização de nova audiência, em razão de a Sra. Vera Suely de Andrade, Secretária de Administração à época dos fatos, ter subscrito o Edital do Pregão n. 087/2016, não implicando, todavia, em isenção de responsabilidade da Sra. Adelina Dal Pont, que deve responder solidariamente, em razão da culpabilidade in eligendo e in vigilando.

O Relator manifestou-se em seguida, concordando com a realização de nova audiência (fl. 78).

Devidamente notificada (fls. 79-80), a responsável Sra. Vera Suely de Andrade apresentou suas justificativas às fls. 83-90.

Por fim, a Diretoria de Controle de Licitações e Contratações emitiu o Relatório de Reinstrução Plenária n. DLC-077/2017 (fls. 91-97), em cuja conclusão sugeriu a ratificação da Conclusão do Relatório n. DLC-571/2016 e a determinação de arquivamento do processo. Impende destacar que a Diretora em exercício da DLC, Sra. Denise Regina Struecker, manifestou-se de acordo com a instrução, tecendo as seguintes considerações (fl. 97):

De acordo com a instrução. Contudo, apenas no que tange ao item 2.4 deste relatório, reitera-se o entendimento que devem ser estabelecidos os critérios de aceitabilidade das propostas, nos termos do art. 3º, III, da Lei Federal n. 10.520/02 c/c o art. 40, X, Lei Federal n. 8.666/93. Assim, muito embora o gestor possa optar quanto à fixação de preço estimado ou preço máximo, tanto no pregão como nas demais modalidades de licitação há que ser fixado algum parâmetro de julgamento para as propostas.

Por outro lado, considerando que a unidade tem comprovado em processos similares a existência de pesquisa de preços efetuada anteriormente ao lançamento do edital, atendendo o disposto do inciso III, do artigo 3º, da Lei Federal nº 10.520/02 e do §1º do artigo 15 da Lei Federal nº 8.666/93, sugere-se que essa providência seja objeto de determinação para os futuros certames.

Encaminhem-se os Autos à elevada consideração do Exmo. Sr. Relator Herneus De Nadal, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.

Ato contínuo, remeteram-se os autos a este Ministério Público de Contas.

Passa-se, assim, à análise das irregularidades remanescentes atribuídas ao edital referente ao Pregão Presencial n. 087/2016 da Prefeitura Municipal de São José.

1.     Da exigência de cadastro prévio e a identificação da pessoa física ou jurídica interessada em participar do certame para retirada do Edital, em ofensa ao princípio da impessoalidade, previsto no art. 3º, caput, da Lei n. 8.666/93

Em face da restrição, a responsável  Sra. Adeliana Dal Pont alegou (fl.69) que o preenchimento de cadastro prévio e identificação de pessoa física e jurídica para retirada de edital seria prática recorrente pelos órgãos licitantes, tendo por objetivo principal dispor de programas próprios para acesso ao edital, bem como comunicar os interessados em caso de alterações. Aduziu ainda que não se utilizariam desse recurso para identificar interessados, não agindo de má-fé, nem mesmo com o propósito de ferir o princípio da impessoalidade. Destacou, por fim, que todas as licitações seriam amplamente divulgadas em todos os meios de publicação, com objetivo de obter o maior número de participantes.

A responsável Sra. Vera Suely de Andrade apresentou idêntica argumentação acerca desta restrição à fl. 84.

A área técnica, a respeito da exigência de cadastro prévio e identificação para retirada de edital, assim se posicionou em seu Relatório de Reinstrução Plenária n. DLC-077/2017 (fl. 92v):

Informa-se que o Tribunal exarou a Decisão Plenária nº 1.063/2013 nos autos da ELC 12/00424449, sobre o assunto, na qual entendeu, como irregular a: exigência de preenchimento de cadastro para “receber informações acerca de pedidos de esclarecimentos do Edital”, o que não encontra amparo na legislação, bem como se mostra temerária à transparência do certame, diante da possibilidade de conhecimento prévio dos licitantes, o que se mostra contrário aos princípios resguardados pelo art. 3º da Lei (federal) n. 8.666/93.

 

Anota-se que o sítio da Unidade foi alterado, no entanto, ainda se faz necessário o cadastro para efetuar o download do Edital

Portanto, a restrição permanece. No entanto, como já dito, no Relatório anterior, a questão, por si só, não seria causa de sustação do edital, até porque essa prática se repete na grande maioria dos órgãos licitantes. 

Com a devida vênia, as justificativas apresentadas pelas responsáveis e a argumentação da área técnica a respeito da presente restrição não merecem prosperar, haja vista que houve, sim, ofensa ao princípio da impessoalidade previsto no art. 3º, caput, da Lei n. 8.666/93, pois a exigência de cadastro prévio para obtenção de edital se afigura desnecessária para a participação do certame e, ainda, temerária quanto à transparência do procedimento, podendo identificar antecipadamente os participantes do processo.

Com efeito, diz o art. 3º, caput, da Lei n. 8.666/93:

Art. 3º - A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.

A doutrina de Hely Lopes Meirelles[1] assim define o princípio da impessoalidade:

O princípio da impessoalidade, referido na Constituição de 1988 (art. 37, caput), nada mais é que o clássico princípio da finalidade, o qual impõe ao administrador público que só pratique o ato para o seu fim legal. E o fim legal é unicamente aquele que a norma de Direito indica expressa ou virtualmente como objetivo do ato, de forma impessoal. (...) E a finalidade terá sempre um objetivo certo e inafastável de qualquer ato administrativo: o interesse público. Todo ato que se apartar desse objetivo sujeitar-se-á a invalidação por desvio de finalidade (...). Desde que o princípio da finalidade exige que o ato seja praticado sempre com finalidade pública, o administrador fica impedido de buscar outro objetivo ou de praticá-lo no interesse próprio ou de terceiros. (...) O que o princípio da finalidade veda é a prática de ato administrativo sem interesse público ou conveniência para a Administração, visando unicamente a satisfazer interesses privados, por favoritismo ou perseguição dos agentes governamentais, sob a forma de desvio de finalidade. Esse desvio de conduta dos agentes públicos constitui uma das mais insidiosas modalidades de abuso de poder (...).

O doutrinador José dos Santos Carvalho Filho[2] traz também importantes considerações acerca do princípio da impessoalidade, aliado ao princípio da finalidade:

O princípio objetiva a igualdade de tratamento que a Administração deve dispensar aos administrados que se encontrem em idêntica situação jurídica. Nesse ponto, representa uma faceta do princípio da isonomia. Por outro lado, para que haja verdadeira impessoalidade, deve a Administração voltar-se exclusivamente para o interesse público, e não para o privado, vedando-se, em consequência, sejam favorecidos alguns indivíduos em detrimento de outros e prejudicados alguns para favorecimento de outros. Aqui reflete a aplicação do conhecido princípio da finalidade, sempre estampado na obra dos tratadistas da matéria, segundo o qual o alvo a ser alcançado pela Administração é somente o interesse público, e não se alcança o interesse público se for perseguido o interesse particular, porquanto haverá nesse caso sempre uma autuação discriminatória.

Portanto, entendo que as justificativas e argumentos apresentados pelas responsáveis e pela área técnica não lograram êxito em afastar a responsabilidade das mesmas, razão pela qual sugiro a aplicação da pena de multa prevista no art. 70, inciso II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, com a determinação à Unidade Gestora de que em futuros certames não conste a exigência de prévio cadastro para obtenção de edital, conforme disposto na conclusão deste parecer.

2.     Da ausência de clareza do objeto do edital, especialmente com relação à quantidade de árvores que necessitam de poda e quanto aos serviços necessários (poda, corte, manutenção, roçada), em ofensa aos arts. 3º, caput, 14 e 15, todos da Lei n. 8.666/93 c/c os arts. 62 a 64 da Lei n. 4.320/64

Ante o apontamento, as responsáveis Sra. Adeliana Dal Pont (fl. 69) e Sra. Vera Suely de Andrade (fls. 84-85), alegaram, em suma, que o Termo de Referência (fls. 24v-26) contemplava todas as informações detalhadas do objeto a ser contratado e que seria redundante colocar essas informações no espaço onde é formulado o objeto do edital.

As justificativas apresentadas pelas responsáveis não têm o condão de sanar a irregularidade, na medida em que se limitam a informar que o Termo de Referência contemplava todas as informações necessárias, o que não é verdade.

Apesar de não vislumbrar a irregularidade quanto à indefinição do objeto do certame, a área técnica, em seu Relatório de Reinstrução Plenária n. DLC-077/2017, destacou (fls. 93v-94) que a Unidade poderia melhorar a descrição do objeto, através da medição de cada local, bem como descrever cada local e a quantidade de árvores e metragens de grama ou mato, ou até colocar fotos dos locais da prestação dos serviços.

Entretanto, conforme já mencionado na manifestação ministerial anterior, entendo que a restrição permanece e as informações ora apresentadas em nada alteram o fato de que, realmente, o objeto não está devidamente definido.

Nesse sentido, reitero o posicionamento defendido às fls. 58-59v do Parecer n. MPTC/46097/2016, o qual transcrevo in verbis:

[...]

Ora, embora o Anexo I do Edital mencione a quantidade de 60.000m² e o Termo de Referência contenha a indicação dos lugares nos quais deverão ser realizados os serviços de “capinação, corte de grama, poda de árvore, limpeza dos pátios, entre outras atividades” (fl. 25), percebe-se que não há um memorial descritivo das atividades a serem desenvolvidas, bem como a indicação da frequência necessária de cada serviço.

A título ilustrativo, colaciono trecho do edital do Pregão Presencial 061/2014, do Município de Rosana/SP – que tinha como objeto a “contratação de empresa especializada na prestação dos serviços de manutenção, conservação e limpeza de áreas públicas no Distrito de Primavera, Município de Rosana, compreendendo os serviços de capina manual, roçada manual, roçada mecanizada, intervenção de poda de árvores e arbustos e limpeza de bueiros e boca de lobos, com o fornecimento de mão de obra, insumos, ferramentas e equipamentos, conforme especificações técnicas, planilha de quantidades e preços” –que prevê detalhadamente o serviço a ser prestado, além da frequência mínima necessária:

2. Capina Manual

Consiste do corte e erradicação de vegetação rasteira, mato, ervas daninhas etc, visando o melhoramento e o aspecto de vias ruas e avenidas, e logradouros públicos, canteiros, calçadas, meio fio, sarjetas praças, instituições de ensino, instituições de saúde, enfim todos os locais públicos e ou indicados pela contratante. As operações de capina serão efetuadas de modo a minimizar os danos aos locais pavimentados. Toda vegetação existente na superfície deverá ser erradicada. O material removido será amontoado e lançado em local apropriado, evitando a obstrução do sistema de drenagem e danos ambientais. Em nenhuma hipótese o material removido deverá ser queimado.

Frequência: mínima 04 (quatro) vezes ao ano.

Essa frequência poderá aumentar de acordo com a necessidade dos locais e determinação da fiscalização. Poderá haver um aumento ou redução desta frequência/condicionada à qualidade do solo, peculiaridade do clima ou determinação da FISCALIZAÇÃO DA PREFEITURA MUNICIPAL.

3. ROÇADA MANUAL/MECANIZADA

DEFINIÇÃO Roçada é o procedimento de corte e retirada da vegetação de pequeno porte existentes nas vias, logradouros públicos, praças, escolas, estabelecimentos de saúde, hospitais, estabelecimentos educacionais, áreas verdes, terrenos públicos, canteiros etc, do Distrito de Primavera, dando-lhes melhor aspecto e condições de visibilidade ao usuário e, ao mesmo tempo, evitar a ocorrência de incêndios e animais peçonhentos, tais como cobras, aranhas e escorpiões, etc.

3.1 Roçada Manual

Aparo de vegetação rasteira e gramado com utilização de roçadeiras mecânicas portáteis, manuais á gasolina ou elétricas os serviços de roçada deverá ser feito em canteiros centrais de avenidas, canteiros dos passeios públicos, rótulas, taludes, junto ao meio-fio, nos interstícios da pavimentação, faixa de domínio de estradas, passeios públicos não pavimentados, passarelas, praças, terrenos públicos ou quaisquer áreas verdes, escolas públicas, centros de saúde, hospitais, centros educacionais e/ou outros estabelecimentos públicos. Os serviços de poda de gramado deverão ser executados utilizando-se máquinas manuais a gasolina, ou elétrica (roçadeira lateral). No caso de utilização de máquinas movidas por motores elétricos, a CONTRATADA não poderá servir-se das tomadas de força existente na área.

[...]

Frequência: 5 a 6 vezes ao ano.

Poderá haver um aumento ou redução desta frequência/condicionada à qualidade do solo, peculiaridade do clima ou determinação da FICALIZAÇÃO DA PREFEITURA MUNICIPAL.

[...]

3.2 Roçada Mecanizada

Aparo de vegetação rasteira e gramado com utilização detrator com roçadeira apropriada, os serviços de roçada deverá ser feito em canteiros centrais de avenidas, canteiros dos passeios públicos, rótulas, taludes, faixa de domínio de estradas, passeios públicos não pavimentados, passarelas, praças, terrenos públicos ou quaisquer áreas verdes, escolas públicas, centros de saúde, hospitais, centros educacionais e/ou outros estabelecimentos públicos.

[...]

Frequência: 5 a 6 vezes ao ano. Poderá haver um aumento ou redução desta frequência/condicionada à qualidade do solo, peculiaridade do clima ou determinação da FISCALIZAÇÃO DA PREFEITURA MUNICIPAL (grifei).

Além disso, não se sabe a área individualizada de cada um dos lugares indicados no Termo de Referência, e se a metragem quadrada das edificações foi considerada ou não no cálculo.

Diante da indefinição do objeto a ser licitado houve violação aos arts. 3º, caput, 14 e 15, da Lei n. 8.666/93, bem como aos arts. 62 a 64 da Lei n. 4.320/64, conforme segue:

Lei n. 8.666/93

Art. 3º - A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.

Art. 14 - Nenhuma compra será feita sem a adequada caracterização de seu objeto e indicação dos recursos orçamentários para seu pagamento, sob pena de nulidade do ato e responsabilidade de quem lhe tiver dado causa.

Art. 15. As compras, sempre que possível, deverão:     

I - atender ao princípio da padronização, que imponha compatibilidade de especificações técnicas e de desempenho, observadas, quando for o caso, as condições de manutenção, assistência técnica e garantia oferecidas;

II - ser processadas através de sistema de registro de preços;

III - submeter-se às condições de aquisição e pagamento semelhantes às do setor privado;

IV - ser subdivididas em tantas parcelas quantas necessárias para aproveitar as peculiaridades do mercado, visando economicidade;

V - balizar-se pelos preços praticados no âmbito dos órgãos e entidades da Administração Pública.

 

Lei n. 4.320/64

 

Art. 62. O pagamento da despesa só será efetuado quando ordenado após sua regular liquidação.

Art. 63. A liquidação da despesa consiste na verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito.

§ 1° Essa verificação tem por fim apurar:

I - a origem e o objeto do que se deve pagar;

II - a importância exata a pagar; 

III - a quem se deve pagar a importância, para extinguir a obrigação.

§ 2º A liquidação da despesa por fornecimentos feitos ou serviços prestados terá por base:

I - o contrato, ajuste ou acordo respectivo;

II - a nota de empenho;

III - os comprovantes da entrega de material ou da prestação efetiva do serviço.

Art. 64. A ordem de pagamento é o despacho exarado por autoridade competente, determinando que a despesa seja paga.

 

Desta forma, posiciono-me pela manutenção da presente irregularidade, com a consequente aplicação de multas – previstas no art. 70, inciso II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000 – às responsáveis, Sra. Adeliana Dal Pont e Sra. Vera Suely de Andrade, conforme disposto na conclusão deste parecer.

3.     Da inexistência de orçamento estimado em planilhas de quantitativos e preços unitários, não constando no Edital de Pregão Presencial n. 087/2016, em ofensa ao art. 40, §2º, inciso II, da Lei n. 8.666/93

Em face da presente restrição, as responsáveis Sra. Adeliana Dal Pont (fl. 69) e a Sra. Vera Suely de Andrade (fls. 85-87), instadas a se manifestar, alegaram, em síntese, que em todos os processos licitatórios lançados pela Prefeitura Municipal de São José ocorreria a devida instrução processual, com a busca de orçamentos para balizar a precificação do certame.

Destacaram ainda que o Tribunal de Contas da União possui entendimento de que o órgão licitante deverá informar aos interessados, no ato convocatório, os meios para averiguação dos orçamentos, não sendo obrigatório constar no edital o orçamento e planilhas estimando o custo da contratação, mas tão somente no processo licitatório, conforme preconizado na Lei n. 10.520/2002 e no Decreto n. 3.555/00.

A área técnica manifestou-se em seu Relatório de Reinstrução Plenária n. DLC-077/2017 (fl. 95), aduzindo que a ausência do orçamento no edital não teria sido óbice para que 23 (vinte e três) empresas apresentassem propostas, situação que, em seu entendimento, teria o condão de afastar a restrição inicialmente apontada.

Contudo, entendo que os argumentos apresentados pelas responsáveis, bem como a conclusão adotada pela Área Técnica não merecem prosperar.

Ratifico, oportunamente, os argumentos apresentados no Parecer n. MPTC/46097/2016(fls. 55v-58), quando destaquei que a exigência do art. 7º, § 2º, inciso II, da Lei n. 8.666/93[3], igualmente disposta no art. 40, § 2º, inciso II, também da Lei das Licitações[4], deve sim ser aplicada aos pregões, diante da importância do preceito e da ausência de norma específica na chamada Lei do Pregão, não se podendo, assim, afastar tal cobrança em razão da singela – e genérica – disposição do art. 3º, inciso III, da Lei n. 10.520/2002[5].

Acerca da matéria, cita-se lição do autor Joel de Menezes Niebuhr[6] que trata da matéria, de cujo título já se extrai sua firme posição:

7.5.1 Planilha orçamentária é anexo obrigatório ao edital de pregão

O inciso II do §2º do artigo 40 da Lei nº 8.666/93 prescreve, de modo geral, que o orçamento estimado em planilha é anexo obrigatório e parte integrante do edital de licitação. Logo, dentro da sistemática da Lei nº 8.666/93, não há dúvida que o orçamento estimado deve acompanhar todos os editais de licitação, tal qual ocorre com o projeto básico. Entretanto, discute-se se o inciso II do §2º do artigo 40 da Lei nº 8.666/93 – que exige o orçamento estimado como anexo obrigatório ao edital – aplica-se ou não subsidiariamente em relação à modalidade pregão.

Ocorre que a Lei nº 10.520/02 não trata especificamente da necessidade ou não de divulgar o orçamento estimado. O inciso III do artigo 3º da Lei nº 10.520/02 prescreve que nos autos do procedimento do pregão deve constar orçamento, elaborado pelo órgão ou entidade promotora da licitação. Na mesma linha, o inciso II do artigo 8º do Decreto Federal nº 3.555/00 prescreve que o orçamento deve ser juntado ao termo de referência, bem como a alínea “a” do inciso II do mesmo artigo prescreve à autoridade competente definir o objeto do certame e o seu valor estimado em planilhas. No entanto, insista-se, nada é dito, na lei ou no decreto do pregão, a respeito da necessidade ou não de se divulgar tal orçamento estimado como anexo ao edital. Quem exige que o orçamento estimado seja anexo e parte integrante do edital é o inciso II do §2º do art. 40 da Lei nº 8.666/93.

Logo, a discussão é se o referido dispositivo aplica-se subsidiariamente, por força do artigo 9º da Lei nº 10.520/02, ao pregão. O ponto é que se poderia defender a tese de que a divulgação do orçamento estimado seria incompatível, ainda que de modo implícito, com a sistemática da Lei nº 10.520/02.

Sucede que, de acordo com o inciso XVII do artigo 4º da Lei nº 10.520/02, é dada ao pregoeiro a possibilidade de estabelecer negociação com o licitante autor da melhor proposta. Nesse sentido, poder-se-ia argumentar que, se o orçamento estimado fosse divulgado aos licitantes, estar-se-ia frustrada a possibilidade de negociação, porquanto os licitantes, uma vez interpelados pelo pregoeiro poderiam se recusar peremptoriamente a reduzir os seus preços ao argumento de que eles já estão abaixo do valor estimado. Assim, uma das fases do pregão, que introduz novidade em relação à sistemática da Lei nº 8.666/93, seria frustrada.

Dessa forma, recusar-se-ia a aplicação subsidiária do inciso II do §2º do artigo 40 da Lei nº 8.666/93 ao pregão. Seguindo essa ideia, o orçamento estimado deveria ser realizado na fase interna, como demanda o próprio inciso III do artigo 3º da Lei nº 10.520/02, no entanto ele não deveria ser divulgado, pelo menos não até que o procedimento do pregão fosse ultimado.

Todavia, há de se tratar da amplitude desse poder dado ao pregoeiro de estabelecer negociação com os licitantes. Acontece que negociação, em princípio, é procedimento estranho ao Direito Administrativo, haja vista o princípio da indisponibilidade do interesse público. Ora, os agentes administrativos, entre os quais o pregoeiro, não atuam com liberdade, tal qual atuam em relação aos seus assuntos particulares. Eles estão sujeitos à série de restrições e formalidades prestantes a preservar a coisa pública, a evitar que ela seja deturpada, utilizada para atender ilegitimamente a interesses privados.

E o ponto é que a negociação abre flancos perigosos para a deturpação da coisa pública, que logo pode se transfigurar em negociata, agasalhando a corrupção. Não que isso ocorra necessariamente. Mas, há de se reconhecer, pode vir a ocorrer.

A negociação encampada pelo pregoeiro deve ser inteiramente motivada. Ela pode abranger tanto a redução do preço quanto outros aspectos da proposta, como prazo de entrega, prazo de pagamento, etc.

Cabe indagar a respeito de quais as consequências do ato do licitante em recusar a proposta de negociação realizada pelo pregoeiro. Imagine-se que o pregoeiro propõe redução do preço e o licitante a recusa. O que acontece?

O pregoeiro não agrega poderes para forçar ninguém a reduzir os preços. Se o licitante quiser reduzir o seu preço, o pregoeiro não poderá penalizá-lo. O pregoeiro poderá desclassificar a proposta apresentada pelo licitante ao argumento de que ele não aceitou a proposta de negociação somente nos casos em que o preço proposto por ele apresentar-se acima do praticado no mercado, tudo motivadamente.

Ademais, até mesmo por força do princípio da moralidade administrativa e da boa-fé, não cabe ao pregoeiro, na qualidade de agente administrativo, blefar, levando o licitante a crer que o preço ofertado corre o risco de ser desclassificado, porque considerado acima do mercado. É fundamental para a Administração manter relação de estrita confiabilidade com os seus fornecedores, para que possa exigir tratamento recíproco.

Sob essas considerações, percebe-se que a divulgação do orçamento estimado não frustra a fase de negociação, porque ela, por sua natureza, apresenta contundentes limitações. Se o preço do licitante realmente é compatível com os do mercado, a recusa dele em aceitar negociação não pode redundar na desclassificação de sua proposta. E, insista-se, não cabe ao pregoeiro blefar, pressionar ou ameaçar os licitantes, bem como ocultar informações acerca da licitação. Por tudo e em tudo, o inciso II do §2º do artigo 40 da Lei nº 8.666/93 deve ser aplicado subsidiariamente ao pregão, impondo-se à Administração divulgar o preço estimado, por meio de planilha (grifei).

Em sentido oposto, a área técnica reproduziu entendimento do Tribunal de Contas da União, constante nas alegações da Sra. Vera Suely de Andrade, no qual se assevera que a divulgação do orçamento previamente elaborado pela Administração seria facultativa nos editais de pregão.

Ora, não obstante a importância das orientações da Corte de Contas Federal, deve-se salientar que o Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina não é subordinado àquela Corte de Contas, sendo que ambos detêm competências distintas, bem delimitadas constitucionalmente. Assim, este órgão ministerial defende que as orientações do Tribunal de Contas da União devem ser ponderadas e, sempre que possível, seguidas.

Isso não quer dizer, entretanto, que determinada orientação da Corte de Contas Federal não possa ser objeto de uma interpretação divergente no âmbito desse Tribunal de Contas Estadual. Com efeito, pelos mesmos motivos expostos acima, transcreve-se mais uma vez a – irreparável, no ponto – lição de Joel de Menezes Niebuhr[7]:

Sem embargo, o Tribunal de Contas da União vem analisando a questão e, em sentido oposto ao defendido neste estudo, decidiu que o preço estimado não é anexo obrigatório às licitações promovidas sob a modalidade pregão. Leiam-se os seguintes excertos: [...]

Pelo que se depreende das decisões supracitadas, o Tribunal de Contas da União entende que a Administração goza de discricionariedade para anexar o orçamento estimado no edital do pregão ou não. No entanto, o orçamento estimado é obrigatório e, se não for anexado ao edital, sobretudo em razão do Acórdão nº 1.925/2006, ele deve fazer parte do processo de licitação e ser disponibilizado aos licitantes interessados que assim o requererem.

As supracitadas decisões do Tribunal de Contas da União, com o devido respeito, atraem críticas, porquanto, como já exposto, no entendimento do subscritor deste estudo, o orçamento estimado deve ser anexo obrigatório em todos os editais de licitação, inclusive os de pregão.

De todo modo, não há sentido autorizar que o orçamento estimado não seja divulgado com o edital e determinar que, caso requerido, a Administração seja obrigada a disponibilizá-lo a qualquer interessado. Ora, a única justificativa para a não inclusão do orçamento estimado como anexo ao edital é a necessidade ou a conveniência de sigilo. É, justamente, evitar que os licitantes tenham ciência dos preços estimados pela Administração, o que, supostamente, poderia inibir a competição e, especialmente, a fase de negociação prevista para a modalidade pregão.

Sem embargo, o referido argumento, que defende o sigilo, cai por terra se a Administração disponibiliza o orçamento estimado para aqueles que o requererem. Ora, se a Administração é obrigada a disponibilizar o orçamento estimado, que o faça para todos os licitantes, tratando todos com igualdade e, pois, anexando-o ao edital.

A orientação do Tribunal de Contas da União – de que o orçamento estimado não deve obrigatoriamente acompanhar o edital, mas ser disponibilizado a todos que o requererem – induz tratamento desigual. Por suposição, alguns licitantes, conhecedores dessa particularidade, por certo requererão a divulgação do orçamento estimado e colherão benefícios, enquanto que os outros, talvez não tão experientes em licitação, não a requererão e, pois, não serão informados a respeito do aludido orçamento, o que prejudica a elaboração das suas propostas.

Por força constitucional, a Administração sujeita-se ao princípio da publicidade, viés inafastável para que todos sejam tratados com igualdade. Nesse sentido, todos os atos praticados durante o curso do processo de licitação devem ser públicos, disponibilizados a todos, para que todos sejam tratados com igualdade. A Administração deve orçar corretamente, em harmonia com a realidade de mercado, e divulgar o orçamento com o edital, aplicando-se o §2º do artigo 40 da Lei nº 8.666/93 para todas as modalidades de licitação, inclusive para o pregão. Não é razoável disponibilizar o orçamento somente para alguns, para os que o requererem. Se o orçamento for disponibilizado – e deve sê-lo em razão do princípio da publicidade –, que o seja para todos, como anexo obrigatório ao edital.

Ainda neste contexto, destaca-se, também, o recente precedente desse Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, a exemplo do que restou decidido no Acórdão n. 0433/2016, exarado no processo RLA n. 11/00358010[8], no sentido de se aplicar multa ao subscritor de edital de pregão destituído de planilha de custos unitários para definição dos preços, nos seguintes termos:

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos arts. 59 da Constituição Estadual e 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:

6.1. Conhecer do Relatório de Instrução DLC n. 138/2015, que trata da auditoria realizada na Prefeitura Municipal de Caçador tendo por objetivo a análise, por amostragem, de processos licitatórios realizados nos exercícios de 2010 e 2011, bem como de contratos vigentes na data da auditoria, que se deu no período de 30/05/2011 a 03/06/2011.

6.2. Aplicar aos Responsáveis a seguir identificados, com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar (estadual) n. 202/2000 c/c o art. 109, II, do Regimento Interno deste Tfribunal, as multas adiante relacionadas, fixando-lhes o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovarem a este Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, ou interporem recurso na forma da lei, sem o quê, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, inciso II, e 71, da citada Lei Complementar:

6.2.1. ao Sr. SAULO SPEROTTO, já qualificado nos autos, as seguintes multas: [...]

6.2.1.2. R$ 2.000,00 (dois mil reais), haja vista a ausência de planilha de custos unitários para definição dos respectivos preços estabelecidos em processos licitatórios, em afronta ao art. 7º, §2º, II, c/c a alínea "f" do inciso IX do art. 6º, bem como ao inciso II do §2º do art. 40, todos da Lei n. 8.666/93; [...]

O voto do Relator de tal processo é paradigmático para a presente discussão, conforme se depreende do seguinte excerto:

Na auditoria realizada, a DLC verificou a ausência de planilha de custos unitários em alguns processos licitatórios – Pregões Presenciais ns. 07/2010, 11/2010, 14/2010, 45/2010, 76/2010 e 77/2010.

O responsável alega que não se aplica à licitação realizada na modalidade pregão o art. 7º, § 2º, inciso II, da Lei Federal n. 8.666/93, que determina que as obras e serviços só poderão ser licitados se existir orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os seus custos unitários.

Conforme salientou a DLC, não assiste razão ao responsável, pois a própria Lei Federal n. 10.520/2002, em seu art. 3º, incisos I e III, prescreve que dos autos do procedimento relativo à fase preparatória do pregão deve constar orçamento, elaborado pelo órgão ou entidade promotora da licitação, dos bens e serviços a serem licitados, conforme segue:

Art. 3º A fase preparatória do pregão observará o seguinte:

I – a autoridade competente justificará a necessidade de contratação e definirá o objeto do certame, as exigências de habilitação, os critérios de aceitação das propostas, as sanções (...)

III – dos autos do procedimento constarão a justificativa das definições referidas no inciso I deste artigo e os indispensáveis elementos técnicos sobre os quais estiverem apoiados, bem como o orçamento, elaborado pelo órgão ou entidade promotora da licitação, dos bens ou serviços a serem licitados.

Esta Corte de Contas, inclusive, sequer discute a obrigatoriedade ou não de uma planilha de custos nos editais de pregão, já que é uma consequência lógica do próprio orçamento, citando, como exemplo, o Acórdão n. 0418/2015 - Processo n. REP-12/00219276 -, de minha relatoria, in verbis:

6. Acórdão n.: 0418/2015

[...]

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113, da Constituição do Estado e art. 1º, da Lei Complementar n. 202/2000:

6.1. Conhecer da Representação e, no mérito, considerá-la parcialmente procedente e, com fundamento no art. 36, §2º, a, da Lei Complementar (estadual) n. 202, de 15 de dezembro de 2000, considerar irregulares os atos relativos ao Processo Licitatório n. 170/2009 referente ao Pregão Presencial n. 04.070.2009 da Prefeitura Municipal de Itapema.

6.2. Aplicar ao Sr. [...], com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202, de 15 de dezembro de 2000, c/c o art. 109, II, do Regimento Interno deste Tribunal (Resolução n. TC-06/2001, de 28 de dezembro de 2001), as multas abaixo elencadas, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico - DOTC-e, para comprovar a este Tribunal de Contas o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, ou interpor recurso na forma da lei, sem o quê, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da citada Lei Complementar.

6.2.1. R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais), diante da insuficiente pesquisa de mercado a fim de justificar o valor pago pela Administração por meio do Pregão Presencial n. 04.070.2009, em desacordo com os arts. 40, X, e 43, IV, da Lei n. 8.666/93. (item 2.1 do Relatório de Reinstrução DLC n. 535/2013 e Voto do Relator);

6.2.2. R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais), pela ausência de planilha de custos unitários, em contrariedade ao art. 7º, §2º, II, da Lei n. 8.666/93 (item 2.2 do Relatório DLC e Voto do Relator);

[...].

Esse também é o entendimento pacífico do Tribunal de Contas da União:

[...]

2. Na licitação na modalidade pregão, o orçamento estimado em planilhas de quantitativos e preços unitários deverá constar obrigatoriamente do Termo de Referência, ficando a critério do gestor, no caso concreto, a avaliação da oportunidade e conveniência de incluir tal Termo de Referência ou o próprio orçamento no edital ou de informar, no ato convocatório, a disponibilidade do orçamento aos interessados e os meios para obtê-lo.’ (Acórdão 1.925/2006).

Por oportuno, destaco ainda que a ausência do devido detalhamento prejudica a elaboração das propostas pelos licitantes e a fiscalização da Administração, no que tange à verificação da adequação dos preços ofertados com o mercado, o que pode levar tanto à inexequibilidade da proposta como à contratação com sobrepreço, devendo ser mantida a restrição, conforme pareceres da área técnica e do MPTC.

A responsabilidade acerca da presente restrição deve ser imputada ao Sr. Saulo Sperotto, ex-prefeito Municipal, e subscritor dos editais em apreço (grifado originariamente).

Assim, contrariamente ao posicionamento adotado pela área técnica, entendo pela manutenção da irregularidade, com a consequente aplicação de penalidade de multas – previstas no art. 70, inciso II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000 –  às responsáveis, Sra. Adeliana Dal Pont e Sra. Vera Suely de Andrade, conforme disposto na conclusão deste parecer.

4.     Da ausência de cláusula a respeito do critério de aceitabilidade dos preços unitários e global, em afronta ao expressamente determinado pelo art. 40, inciso X, da Lei n. 8.666/93

Em razão da presente restrição, a responsável Sra. Adeliana Dal Pont aduziu (fls. 69-70) que a Prefeitura Municipal de São José realizaria pesquisa de preços para se obter um orçamento, dando suporte ao cumprimento do inciso XI do art. 4º da Lei Federal n. 10.520/02. Mencionou que a não divulgação dos preços no pregão não ofenderia a lei e ainda apresentaria algumas vantagens, como a de não influenciar os licitantes a ofertar lances próximos ao valor orçado.

A responsável Sra. Vera Suely de Andrade alegou (fls. 87-89) que na modalidade Pregão não haveria obrigatoriedade da apresentação do valor de referência, colacionando decisões do TCU a respeito da facultatividade da divulgação do valor orçado, e se for o caso, do preço máximo.

A área técnica manifestou-se em seu Relatório de Reinstrução Plenária n. DLC-077/2017 (fl. 96), justificando que a ausência do critério de aceitabilidade de preços no edital não teria sido óbice para que 23 (vinte e três) empresas apresentassem resposta, desconsiderando a restrição.

Com a devida vênia, novamente os argumentos apresentados pelas responsáveis e pelo relatório técnico não merecem prosperar.

Em hipóteses semelhantes, vê-se que esse Tribunal de Contas tem aplicado sanções pecuniárias em face da mesma irregularidade, o que confirma a sua gravidade, conforme pode se verificar nos acórdãos abaixo transcritos:

Acórdão n. 515/2012, processo LCC n. 10/00664292, julgado em 16/05/2012:

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:

6.1. Conhecer dos Relatórios DLC ns. 48/2011, 1124/2011 e 578/2011, para considerar, com fundamento no art. 36, § 2º, “a”, da Lei Complementar n. 202/2000, irregulares a Tomada de Preços n. 251/2007 e o Contrato n. 254/2008, da Prefeitura Municipal de Biguaçu, que trata da prestação de serviços de aerolevantamento, cartografia, levantamento cadastral e implantação de sistema de informações geográficas executados no perímetro urbano do Município.

6.2. Aplicar ao Sr. Alessandro Garbelotto - ex-Secretário Municipal de Administração, CPF n. 788.584.029/87, com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 109, II, do Regimento Interno, as multas abaixo relacionadas, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovar ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos artigos 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000:

[...]

6.2.5. R$ 1.000,00 (mil reais), em face da não inclusão no edital de critério de aceitabilidade de preços unitários máximos, conforme exigência do art. 40, X, da Lei n. 8.666/93 (item 2.3 do Relatório DLC n. 48/2011).

Acórdão n. 061/2011, processo TCE n. 07/00604286, julgado em 23/02/2011:

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:

6.1. Julgar irregulares, sem imputação de débito, na forma do art. 18, III, alínea “b”, c/c o art. 21, parágrafo único, da Lei Complementar n. 202/2000, as contas pertinentes à presente Tomada de Contas Especial, que trata de irregularidades constatadas quando da auditoria realizada na Prefeitura Municipal de Jaraguá do Sul, com abrangência sobre o exame dos controles e procedimentos relacionados à execução de obras e serviços de engenharia, referentes ao exercício de 2007.

6.2. Aplicar ao Sr. Moacir Antônio Bertoldi - Prefeito Municipal de Jaraguá do Sul em 2007, CPF n. 310.551.339-68, com fundamento no art. 69 da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 108, parágrafo único, do Regimento Interno, as multas abaixo relacionadas, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovar ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, sem o quê, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000:

[...]

6.2.2. R$ 800,00 (oitocentos reais), pela ausência dos critérios de valor máximo global e aceitabilidade dos preços máximos unitários nos editais analisados, em descumprimento ao previsto no art. 40, X, da Lei nº 8.666/93 (item 2.4 do Relatório DLC);

Acórdão n. 1.748/2011, processo TCE n. 06/00400760, julgado em 28/09/2011:

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos arts. 59 da Constituição Estadual e 1° da Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000, em:

6.1. Julgar irregulares, sem imputação de débito, na forma do art. 18, inciso III, alínea "b", c/c o art. 21, parágrafo único, da Lei Complementar n. 202, de 15 de dezembro de 2000, as contas pertinentes à presente Tomada de Contas Especial, que trata de irregularidades no processo licitatório e em aditamento do contrato concernentes à construção da “Arena Multiuso”, da Prefeitura Municipal de Jaraguá do Sul.

6.2. Aplicar aos Responsáveis adiante discriminados, com fundamento no art. 69 da Lei Complementar n? 202/2000 c/c o art. 108, parágrafo único, do Regimento Interno, as multas a seguir especificadas, fixando-lhes o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovarem ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, sem o quê, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos artigos 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000:

6.2.1. ao Sr. MOACIR ANTÔNIO BERTOLDI – ex-Prefeito Municipal de Jaraguá do Sul, CPF n. 310.551.339-68, as seguintes multas:

[...]

6.2.1.3. R$ 400,00 (quatrocentos reais), devido à não indicação, no Edital de Licitação n. 100/2005, dos critérios de aceitabilidade dos preços unitário e global, contrariando o disposto no art. 40, X, da Lei n. 8.666/93 (item 3.3 do Relatório DLC). (grifei)

Assim sendo, ratifico os termos do Parecer n. MPTC/46097/2016 (fls. 60v-61v) e opino pela manutenção da restrição, com a consequente aplicação de multas – previstas no art. 70, inciso II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000 – às responsáveis, Sra. Adeliana Dal Pont e Sra. Vera Suely de Andrade, conforme disposto na conclusão deste parecer.

5. Conclusão

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, manifesta-se:

5.1. pela PROCEDÊNCIA da presente REPRESENTAÇÃO encaminhada pelo Observatório Social de São José (OSSJ) em face da Prefeitura Municipal de São José;

5.2. pela IRREGULARIDADE do edital de Pregão Presencial n. 087/2016, da Prefeitura Municipal de São José, na forma do art. 36, § 2º, alínea “a”, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, em face dos atos descritos nos itens 5.2.1 a 5.2.4, conforme segue:

5.2.1. exigência de cadastro e a identificação da pessoa física ou jurídica interessada em participar do certame, em ofensa ao princípio da impessoalidade previsto art. 3º, caput, da Lei n. 8.666/93;

5.2.2. ausência de clareza do objeto do edital, especialmente com relação à quantidade de árvores que necessitam de poda e quanto aos serviços necessários (poda, corte, manutenção, roçada), em ofensa aos arts. 3, caput, 14 e 15 da Lei n. 8.666/93, c/c arts. 62 a 64 da Lei n. 4.320/64;

5.2.3. inexistência de orçamento estimado em planilhas de quantitativos e preços unitários, não constando no Edital do Pregão Presencial n. 087/2016, em ofensa ao art. 40, §2º, inciso II, da Lei n. 8.666/93;

5.2.4. ausência de cláusula a respeito do critério de aceitabilidade dos preços unitários e global, em afronta ao expressamente determinado pelo art. 40, inciso X, da Lei n. 8.666/93.

5.3. pela APLICAÇÃO DE MULTAS à Sra. Vera Suely de Andrade, Secretária de Administração do Município de São José à época dos fatos, e à Sra. Adeliana Dal Pont, Prefeita Municipal de São José à época dos fatos, na forma prevista no art. 70, inciso II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, em face das irregularidades contidas nos itens 5.2.1 a 5.2.4 deste parecer;

5.4. pela DETERMINAÇÃO à Prefeitura Municipal de São José, para que em futuros certames se abstenha de exigir dos participantes interessados em qualquer licitação a exigência de cadastro prévio de identificação, consoante disposto no item 1 deste Parecer.

Florianópolis, 31 de maio de 2017.

 

 

Cibelly Farias Caleffi

Procuradora

 



[1] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 27. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 90.

[2] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24ª. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 19.

[3] § 2º As obras e os serviços somente poderão ser licitados quando: [...] II - existir orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os seus custos unitários.

[4] § 2º Constituem anexos do edital, dele fazendo parte integrante: [...] II - orçamento estimado em planilhas de quantitativos e preços unitários.

[5] Art. 3º A fase preparatória do pregão observará o seguinte: [...] III - dos autos do procedimento constarão [...], bem como o orçamento, elaborado pelo órgão ou entidade promotora da licitação, dos bens ou serviços a serem licitados; e

[6] NIEBUHR, Joel de Menezes. Pregão presencial e eletrônico. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2011, p. 102-103.

[7] Ibid., p. 103-105.

[8] Não se desconhece que tal decisão é discutida no processo REC n. 16/00562920, o qual, entretanto, ainda nem sequer chegou a ser conhecido. De qualquer maneira, o caso provavelmente terá o mesmo desfecho do processo REC n. 15/00492938, o qual, na também recente sessão do dia 27.06.2016, confirmou a decisão do processo REP n. 12/00219276, mantendo, assim, a aplicação de multa idêntica à tratada no presente recurso.