Parecer nº:

MPC/42.000/2016

Processo nº:

TCE 11/00513865    

Un. Gestora:

Secretaria de Estado do Desenvolvimento Regional - Joinville

Assunto:

TCE NE n. 813/000, de 24/09/2009, no valor de R$ 30.000,00 - Projeto Feira do Livro Joinville

Numeração única:

MPC-SC 2.3/2017.862

 

 

 

 

Trata-se de Tomada de Contas Especial instaurada internamente pela Secretaria de Estado de Desenvolvimento Regional de Joinville (SDR), a fim de apurar eventuais irregularidades na utilização dos recursos do FUNCULTURAL transferidos ao Instituto da Cultura, Educação, Esporte e Turismo para a realização do projeto “6ª Feira do Livro de Joinville - 2009”.

A Tomada de Contas Especial encaminhada pela Unidade Gestora foi juntada às fls. 03-300.

Em seguida, a Diretoria de Controle da Administração Estadual sugeriu a realização de diligência à Sra. Beatriz Pereira e aos Srs. Alencar Schueroff, Pablo Pereira, Adi Kalinowski, Luiz Gustavo, Brandão Argenti, Rodrigo Schwarz e Bruno Vinícius Moreira (fls. 301-308v).

Em resposta, foram apresentados os documentos de fls. 321-352.

Ato contínuo, a Diretoria de Controle da Administração Estadual, sob o relatório de nº 420/2015, sugeriu a realização da citação dos responsáveis, ante as irregularidades evidenciadas nos autos (fls. 359-373v).

Diante da devolução dos ofícios de citação do Sr. Francisco José Mendonça e da Sra. Fernanda Brandão Argenti procedeu-se à citação editalícia destes.

Atendendo à citação, a Sra. Beatriz Pereira apresentou razões de defesa às fls. 398-440, o Instituto da Cultura, Educação, Esporte e Turismo às fls. 457-463 e a Sra. Fernanda Brandão Argenti às fls. 473-490.

O Sr. Manoel José Mendonça, mesmo devidamente citado (conforme atesta o documento de fl. 492), deixou de apresentar defesa.

Por fim, sobreveio novo exame da área técnica, sob o relatório de nº 00057/2016, com a seguinte conclusão (fls. 495-520):

 

5.1 Julgar irregulares com imputação de débito, na forma do art. 18, III, “b” e “c”, c/c o art. 21, caput da Lei Complementar Estadual nº 202/00, as contas de recursos transferidos para o INSTITUTO DA CULTURA, EDUCAÇÃO, ESPORTE E TURISMO, decorrente do empenho nº 813/000, de 24/09/2009, no valor de R$ 30.000,00 (recebido em 29/09/2009)[1].

5.2 Condenar solidariamente os responsáveis: SRA. FERNANDA BRANDÃO ARGENTI, inscrita no CPF sob o nº 060.758.139-50, presidente à época dos fatos do Instituto da Cultura, Educação, Esporte e Turismo, com endereço na Rua Max Colin, nº 284, apto 101, Bairro America, Joinville-SC, CEP 89204-040; a pessoa jurídica INSTITUTO DA CULTURA, EDUCAÇÃO, ESPORTE E TURISMO, inscrita no CNPJ sob o nº 07.229.473/0001-04, estabelecida na Rua Monsenhor Gercino, nº 127, sala 2B Bairro Itaum, Joinville-SC, CEP 89210-009; a SRA. BEATRIZ PEREIRA, prestadora de serviço, inscrita no CPF sob o nº 576.834.099-87 com endereço na Rua Iririú, 1080, Bairro Iririú, Joinville-SC, CEP 89.227-015;  o SR. MANOEL JOSÉ MENDONÇA, então Secretário de Estado de Desenvolvimento Regional de Joinville, inscrito no CPF sob o nº 081.789.669-15, com último endereço na Rua Guilherme Koch, nº 27, Bairro Santo Antônio, Joinville/SC, CEP 89.218-220; ao recolhimento da quantia de até R$ 27.940,00 (vinte e sete mil, novecentos e quarenta reais), em face da não comprovação da boa e regular aplicação dos recursos, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias a contar da publicação do Acórdão no Diário Oficial Eletrônico do TCE – DOTC-e, para comprovar, perante este Tribunal, o recolhimento dos valores do débito ao Tesouro do Estado, atualizado monetariamente e acrescido dos juros legais (arts. 21 e 44 da Lei Complementar Estadual n.º 202/00), calculados a partir de 29/09/2009, sem o que fica, desde logo, autorizado o encaminhamento de peças processuais ao Ministério Público junto ao Tribunal de Contas para que adote providências à efetivação da execução da decisão definitiva (art. 43, II, da Lei Complementar Estadual nº 202/00), conforme segue:

5.2.1 De responsabilidade solidária da SRA. FERNANDA BRANDÃO ARGENTI e da INSTITUTO DA CULTURA, EDUCAÇÃO, ESPORTE E TURISMO, já qualificados, sem prejuízo de aplicação de multa prevista no art. 68 da Lei Orgânica deste Tribunal, em face da:

5.2.1.1 solicitação e utilização de recursos públicos para evento realizado em data anterior à aprovação do projeto e à celebração do contrato de apoio financeiro, no montante de R$ 27.940,00, em desacordo com o que dispõe o art. 43, VIII, do Decreto Estadual nº 1.291/08 e o art. 144, § 1º da Lei Complementar Estadual nº 381/07 (item 2.1.1 do Relatório de Instrução DCE/CORA/DIV.2 Nº420/2015 e item 3.1.1 deste Relatório);

5.2.1.2 ausência de comprovação do efetivo fornecimento dos materiais ou prestação dos serviços, aliado a descrição insuficiente das notas fiscais apresentadas e agravado pela não juntada de outros elementos de suporte, no valor de R$ 7.060,00 (dez mil quatrocentos e sessenta reais), já incluído no item 5.2.1.1 desta conclusão, em afronta ao disposto no art. 70, § 1º do Decreto Estadual nº 1.291/2008, nos arts. 49 52, II e III e 60, II e III, todos da Resolução TC nº 16/1994 e no art. 144, § 1º da Lei Complementar nº 381/2007 (item 2.2.1.1 do Relatório de Instrução DCE/CORA/DIV.2 Nº420/2015 e item 3.2.1.1 deste Relatório);

5.2.1.3 indevida realização de despesas intrínsecas à capacidade operacional da entidade proponente para a realização do projeto incentivado, no valor de R$ 2.500,00, sendo o valor total já incluído no item 5.2.1.1, desta conclusão, contrariando o disposto no art. 1º, § 2º do Decreto Estadual nº 1.291/2008, bem como o art. 37, caput da Constituição Federal e o art. 16, caput da Constituição do Estadual (item 2.2.1.2 do Relatório de Instrução DCE/CORA/DIV.2 Nº420/2015 e item 3.2.1.2 deste Relatório);

5.2.1.4 comprovação de despesa com documento inidôneo, no valor de R$ 2.440,00, já incluído no item 5.2.1.1 desta conclusão, contrariando o disposto arts. 49 e 52, III da Resolução TC nº 16/1994 e no art. 144, § 1º da Lei Complementar Estadual nº 381/2007 (item 2.2.1.4 do Relatório de Instrução DCE/CORA/DIV.2 Nº420/2015 e item 2.2.1.4 deste Relatório).

5.2.2 De responsabilidade do SR. MANOEL JOSÉ MENDONÇA, já qualificado, sem prejuízo de aplicação de multa prevista no art. 68 da Lei Orgânica deste Tribunal, por irregularidades que concorreram para a ocorrência do dano, em face de(a):

5.2.2.1 repasse irregular de recursos para evento sabidamente realizado em data anterior à aprovação do projeto e à celebração do contrato de apoio financeiro, no montante de R$ 27.940,00, em desacordo com o que dispõe o art. 43, VIII, do Decreto Estadual nº 1.291/08 e o art. 144, § 1º da Lei Complementar Estadual nº 381/07 (item 2.2.1 do Relatório de Instrução DCE/CORA/DIV.2 Nº420/2015 e item 3.1.1 deste Relatório).

5.2.3 De responsabilidade da Sra. BEATRIZ PEREIRA, já qualificada, sem prejuízo de aplicação de multa prevista no art. 68 da Lei Orgânica deste Tribunal, em face da:

5.2.3.1 emissão de nota fiscal inidônea, haja vista a ausência de comprovação da efetiva prestação do serviço, no valor de R$ 2.440,00, nos termos dos arts. 49 e 52, II e III, da Resolução TC 16/94, vigente à época, e do art. 144, ª 1º, da Lei Complementar Estadual nº 381/07 (item 2.4 do Relatório de Instrução DCE/CORA/DIV.2 Nº420/2015 e (item 3.3 deste Relatório).

5.3 Aplicar à SRA. FERNANDA BRANDÃO ARGENTI, já qualificada, multa prevista no artigo 70, inciso II, da Lei Complementar Estadual nº 202/00, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias a contar da publicação do Acórdão no DOTC-e, para comprovar perante este Tribunal o recolhimento dos valores ao Tesouro do Estado, sem o que fica, desde logo, autorizado o encaminhamento de peças processuais ao Ministério Público junto ao Tribunal de Contas para que adote providências à efetivação da execução da decisão definitiva (art. 43, II e 71 (ambos) da Lei Complementar nº 202/00), em face da:

5.3.1 Realização de despesas sem comprovação de três orçamentos ou justificativas da escolha, contrariando o disposto no art. 48, I e II do Decreto Estadual nº 1.291/2008 (item 2.4 do Relatório de Instrução DCE/CORA/DIV.2 Nº420/2015 e item 3.2.2 deste Relatório);

5.3.2 Movimentação dos recursos por meio de cheques não cruzados, em desobediência ao art. 58, § 2º do Decreto Estadual nº 1.291/2008 (item 2.2.3 do Relatório de Instrução DCE/CORA/DIV.2 Nº420/2015 e item 3.2.3 deste Relatório); e

5.3.3 ausência de demonstração de todas as receitas e despesas envolvidas na realização do projeto, contrariando ao art. 70, inciso XIII do Decreto Estadual nº 1.291/2008, bem como o art. 37, caput da Constituição Federal e o art. 16, caput da Constituição Estadual (item 2.2.4 do Relatório de Instrução DCE/CORA/DIV.2 Nº420/2015 e item 3.2.4 deste Relatório).

5.4 REPRESENTAR, com envio de cópia integral deste processo, ao MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, para a apuração de possível ato de improbidade administrativa, conforme estabelece a Lei Federal nº 8.429/92, a fim de sejam tomadas as providências que entender necessárias (item 2.5 do Relatório de Instrução DCE/CORA/DIV.2 Nº420/2015 item 4 deste Relatório).

5.5 Declarar o INSTITUTO DA CULTURA, EDUCAÇÃO, ESPORTE E TURISMO e a Sra. FERNANDA BRANDÃO ARGENTI impedidos de receber novos recursos do Erário, consoante dispõe o art. 16 da Lei nº 16.292/2013 c/c o art. 1º, § 2º, inciso I, alíneas “b” e “c” da Instrução Normativa TC nº 14/2012 e o art. 61 do Decreto Estadual nº 1.309/2012.

5.5 Dar ciência da Decisão, do Relatório e Voto do Relator que a fundamentam ao Instituto da Cultura, Educação, Esporte e Turismo, a Sra. Fernanda Brandão Argenti, ao Sr. Manoel Mendonça, a Sra. Beatriz Pereira e à Agência de Desenvolvimento Regional - Joinville.

 

É o relatório.

 

1. Das preliminares – da realização do projeto e da arguição de decadência e prescrição administrativa

 

O Instituto da Cultura, Educação, Esporte e Turismo, por meio de seus procuradores, alegou que houve a realização do projeto denominado “6ª Feira do Livro de Joinville – 2009” e ainda suscitou a possível incidência da decadência e da prescrição.

Em relação à realização do projeto, o responsável argumenta que as formalidades que envolvem o processo de prestação de contas não podem ter maior relevância que a finalidade do repasse. Justifica ainda que o acessório (prestação de contas) não pode se sobrepor ao principal, que é a aplicação do dinheiro no projeto proposto.

Informa que o evento foi realizado e que esse fato já é suficiente para afastar o pedido de imputação de débito correspondente ao valor integral do repasse financeiro.

Como bem destacado pela área técnica, a mera comprovação da realização do evento proposto não é suficiente para que a Corte de Contas considere as contas como regulares.

É necessário que se comprove que o objeto foi realizado com os recursos que foram repassados para sua consecução e o nexo existente entre a aplicação dos recursos, sua movimentação financeira e a execução do projeto, o que não ocorreu no presente caso.

Observou-se que o evento foi realizado cinco meses antes do repasse financeiro, contrariando o que estabelece o art. 43, VIII do Decreto Estadual nº 1.291/2008.

No tocante à prescrição, para o responsável o presente caso deveria ter sido analisado no prazo de cinco anos, nos termos dos arts. 1º, §1º e 54 da Lei Federal nº 9.784/99[2].

Em tempo, destaque-se que a citada Lei não se aplica ao presente caso, eis que o normativo federal está adstrito tão somente ao âmbito da União.

Ainda, o Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina adota entendimento no sentido de se firmar a prescrição em 10 (dez) anos contados da ocorrência do ato tido como irregular, em conformidade com o estabelecido no Código Civil.

Ademais, não há que se falar em prescrição, pois foi observada a ocorrência de dano ao erário.

Cabe apontar que a matéria acerca da prescrição tem sido constantemente tratada no âmbito do TCE/SC.

Seguindo a orientação formulada pelo Supremo Tribunal Federal, a Corte de Contas catarinense, em diversas ocasiões, já assinalou que o dano ao erário é imprescritível, nos termos do art. 37, § 5º, da Constituição da República[3], reiterado pelo art. 3º, I, da Resolução TC – 0100/2014[4].

Por outra banda, reconheço a existência da Lei Complementar Estadual nº 588/2013 (de questionável constitucionalidade por vício de iniciativa), a qual versa sobre a prescrição aplicada aos processos em trâmite no Tribunal de Contas catarinense.

Mesmo adotando o prazo previsto na mencionada Lei, resta afastada a incidência da prescrição, nos termos já discutidos pela área técnica.

Afastadas as preliminares, passa-se ao exame de mérito.

2. Das irregularidades no processo de concessão de recursos

 

2.1. Do repasse irregular de recursos para evento realizado em data anterior à aprovação do projeto e à celebração do contrato de apoio financeiro

 

Ao cotejar os autos, denota-se que a solicitação de recursos para a realização do projeto “6ª Feira do Livro de Joinville – 2009” foi autuada em 25/08/09[5] pela SDR de Joinville. O Contrato de Apoio Financeiro, por sua vez, foi firmado em 23/09/09[6] e o recurso transferido em 29/09/09. Por fim, todos os comprovantes de despesa foram emitidos nos meses de setembro e outubro de 2009.

Entretanto, a Feira do Livro ocorreu no mês de abril de 2009.

Nesse contexto, verifica-se que a liberação dos recursos ocorreu em grave descumprimento às normas aplicáveis à matéria (art. 43, VIII, do Decreto Estadual nº 1.291/08 e § 1º do art. 144 da Lei Complementar Estadual nº 381/07).

Seguindo a orientação da norma citada, a Corte de Contas catarinense manifestou-se sobre o assunto através do prejulgado nº 0613, o qual dispõe:

 

É regular e legítimo que entidade de direito privado comprove a aplicação de recursos financeiros recebidos a título de subvenções sociais, também com documentos (recibos, notas fiscais, folha de pagamento, guia de encargos sociais e de tributos, entre outros), cuja data de emissão seja anterior a do recebimento dos valores conveniados, mas coincidente com o período de vigência do acordo e desde que posterior à extração da nota de empenho respectiva. Na hipótese da associação civil ter desembolsado antecipadamente dinheiro seu para realizar gastos vinculados ao convênio (constatada a precedente emissão da nota de empenho pelo órgão ou entidade pública), o uso dos comprovantes destas despesas, no processo regular de prestação de contas, permitirá a consequente devolução aos cofres da associação dos valores que lhe pertencem; deverá, porém, ficar claramente evidenciado a que dispêndios se refere cada valor transposto da conta bancária vinculada ao convênio para a conta própria da associação. [Grifou-se].

 

No presente caso, verificou-se que o evento ocorreu antes da própria constituição dos autos de concessão de recursos.

No caso em foco, diante da omissão do concedente, o Sr. Manoel José Mendonça (Secretário de Estado de Desenvolvimento Regional de Joinville à época) foi notificado para apresentar justificativas, contudo deixou o prazo transcorrer sem se manifestar nos presentes autos, incidindo os efeitos da revelia.

Em tempo, destaque-se que na condição de ordenador da despesa, o Sr. Manoel tinha a obrigação funcional de controlar, supervisionar, impugnar, sustar ou determinar a sustação de atos administrativos que contrariassem dispositivos constitucionais e legais.

À vista disso, denota-se que agiu com liberalidade na aprovação do projeto, sem se ater às normas aplicáveis à espécie.

Em vista dos fatos narrados, deve ser mantida a sua responsabilidade solidária, vez que a sua conduta contribuiu efetivamente para a ocorrência do dano ao erário.

O Instituto da Cultura, Educação, Esporte e Turismo e a Sra. Fernanda Brandão Argenti também foram apontados como responsáveis pelo dano acarretado.

Alegaram, em síntese, que requereram o repasse de recursos no mês de janeiro de 2009, antes de ocorrer o evento.

Na oportunidade, salientaram que, após o recebimento da confirmação de que o referido projeto seria aprovado, realizaram todos os preparativos para concretização do evento.

Entretanto, os recursos não foram liberados, o que levou o Instituto a apresentar um novo projeto, o qual foi aceito, tendo sido liberada a verba em setembro de 2009, após a realização do evento.

Como bem pontuado pela área técnica, a aprovação do projeto pelo Conselho de Desenvolvimento Regional, datada de 19/02/09 (conforme ata de fls. 102-123), não afasta o apontamento em análise, visto que o processo físico de concessão dos recursos somente foi atuado em 25/08/09. Pelo contrário, indica uma possível montagem do processo, com vistas a conferir legalidade ao repasse efetuado.

Ademais, em nenhum momento os responsáveis comprovaram que requereram o repasse de recurso na época oportuna, ou seja, antes da realização da Feira do Livro em abril de 2009.

Por oportuno, cabe mencionar que a entidade deveria ter esperado pela aprovação formal e efetiva do projeto antes de realizar os preparativos para a concretização do evento.

Haja vista que a aprovação do projeto e a celebração do contrato de apoio financeiro ocorreram após a realização do evento, perfilho o posicionamento da área técnica e concluo que deve ser imputado débito no valor de R$ 27.940,00[7] ao Sr. Manoel José Mendonça, solidariamente com o Instituto da Cultura, Educação, Esporte e Turismo e sua Presidente à época, Sra. Fernanda Brandão Argenti, bem como deve ser cominada a penalidade de multa, ante a violação das normas aplicáveis à espécie.

 

3. Das irregularidades no processo de prestação de contas

 

3.1. Da não comprovação da boa e da regular aplicação dos recursos públicos

 

Ao analisar a prestação de contas apresentada pela Sra. Fernanda Brandão Argenti (Presidente à época do Instituto da Cultura, Educação, Esporte e Turismo), a equipe técnica verificou que não foram juntados aos autos todos os documentos necessários a certificar a boa e regular aplicação dos recursos públicos.

Não é demais comentar que todo aquele que recebe dinheiro oriundo do erário deve comprovar a boa e regular aplicação dos recursos públicos que lhes foram confiados.

Nessa direção, posicionou-se o Tribunal de Contas da União:

 

TCE. APLICAÇÃO IRREGULAR DE PARTE DE RECEITAS ORIUNDAS DE CONVÊNIO COM ENTIDADE FEDERAL. CITAÇÃO. REVELIA. CONFIGURAÇÃO DE DANO AO ERÁRIO, EM DECORRÊNCIA DE ATO DE GESTÃO ILEGÍTIMO OU ANTIECONÔMICO. CONTAS IRREGULARES. DÉBITO. MULTA. RECURSO DE REVISÃO. CONHECIMENTO. NÃO-PROVIMENTO. CIÊNCIA AOS INTERESSADOS.

1. A configuração de dano ao Erário, em decorrência de ato de gestão ilegítimo ou antieconômico, importa no julgamento pela irregularidade, na condenação em débito e na aplicação de multa.

2. Nos processos de contas que tramitam nesta Casa, compete ao gestor o ônus da prova da boa e da regular aplicação dos recursos públicos que lhe são confiados, o que independe da comprovação de ter se configurado o crime de improbidade administrativa, da ocorrência de enriquecimento ilícito ou de locupletamento por parte do recorrente[8]. (Grifou-se)

 

No mesmo sentido, tem-se o entendimento do Tribunal de Contas de Santa Catarina:

 

TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE RECURSOS ANTECIPADOS DO FUNCULTURAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA BOA E REGULAR APLICAÇÃO DOS RECURSOS. AUTORREMUNERAÇÃO. PAGAMENTOS À FAMILIARES. DESPESAS ILEGAIS E INJUSTIFICADAS. IRREGULARIDADE DAS CONTAS. DANO AO ERÁRIO. OMISSÕES DO PODER CONCEDENTE. MULTA.

1. Nos processos de contas o onus probandi é do gestor dos recursos públicos, que é pessoalmente responsável pela boa e regular aplicação dos recursos repassados e tem o ônus de provar a execução do objeto pactuado, das despesas vinculadas ao mesmo e trazer à colação elementos que demonstrem o atendimento ao interesse público e a inexistência de lesão ao patrimônio público.

2. A aplicação de recursos públicos impõe a observância de regramentos que garantam sua destinação única e exclusiva a finalidades que correspondam ao interesse público. Despesas que caracterizam autorremuneração e pagamento a familiares devem ser considerados ilegais quando atenderem a interesses exclusivamente particulares e não atingirem à finalidade pública.

3. Os atos e omissões que revelam irregularidades na aprovação de projetos para financiamento no âmbito do SEITEC, por inobservância aos dispostivos legais e regulamentares que regem a matéria, são sujeitos à aplicação de multa[9]. [Grifou-se]

 

No caso em apreço, o apontamento restritivo teve por base as seguintes irregularidades: a) ausência de comprovação do efetivo fornecimento dos materiais ou prestação dos serviços, aliada à descrição insuficiente das notas fiscais apresentadas e agravada pela não juntada de outros elementos de suporte; b) realização de despesas intrínsecas à capacidade da entidade proponente para a execução do projeto incentivado; c) indevida realização de despesas com autorremuneração de membro da entidade e favorecimento familiar; d) comprovação de despesas com documento inidôneo; e) realização de despesas sem comprovação de três orçamentos ou justificativas de escolha; f) movimentação dos recursos por meio de cheques não cruzados e; g) ausência de demonstração de todas as receitas e despesas envolvidas na realização do projeto

Abaixo, passa-se a analisar individualmente os apontamentos.

 

3.1.1. Da ausência de comprovação do efetivo fornecimento dos materiais ou prestação dos serviços, aliada à descrição insuficiente das notas fiscais apresentadas e agravada pela não juntada de outros elementos de suporte

 

Ao compulsar os autos, denota-se que as notas fiscais apresentadas pela entidade proponente não comprovam satisfatoriamente as despesas realizadas, uma vez que são genéricas.

A propósito, impõe-se aqui rememorar que a Resolução nº TC 16/1994, vigente à época, prescrevia que a nota fiscal, para fins de comprovação da despesa pública, deve ser devidamente discriminada.

Nesse sentido, eis a dicção do texto normativo:

 

Art. 60 - A nota fiscal, para fins de comprovação de despesa pública, deverá indicar :

I - A data de emissão, o nome e o endereço da repartição destinatária;

II - A discriminação precisa do objeto da despesa, quantidade, marca, tipo, modelo, qualidade e demais elementos que permitam sua perfeita identificação;

III -Os valores, unitário e total, das mercadorias e o valor total da operação.

Parágrafo único - As notas fiscais relativas a combustíveis, lubrificantes e consertos de veículos, conterão ainda, a identificação do número da placa e a quilometragem registrada no hodômetro, adotando-se procedimento análogo nas despesas em que seja possível aplicar controle semelhante.

 

À luz dessa orientação, assinale-se que as notas fiscais de nºs 4, 34, 125 e 152331 – no montante de R$ 10.460,00 – não contêm a discriminação precisa do objeto de despesa, tal como a quantidade de pessoas envolvidas, horas de trabalho, valor unitário e total, assim como especificação e detalhamento dos serviços prestados e dos produtos entregues, contrariando os artigos 49, 52, e 60, todos da Resolução nº TC - 16/1994.

Nota-se ainda que a Nota Fiscal nº 04, arrolada à fl. 280, refere-se a uma apresentação teatral na cerimônia de abertura do evento, a qual foi emitida pela empresa Movimento Lazer Recreação e Eventos LTDA ME, sediada em Joinville/SC.

Entretanto, retira-se de informação online, estampada no Jornal A Notícia, que quem efetivamente realizou a apresentação na abertura do evento foi a Companhia Mototóti, sediada em Porto Alegre/RS (fls. 247 e 493).

Objetivando afastar a restrição, os responsáveis alegaram que não foi possível a apresentação da referida Cia. no evento, de modo que a mesma foi substituída pela empresa Movimento Lazer Recreação e Eventos LTDA ME.

Refutam-se as justificativas apresentadas pelos responsáveis, uma vez que, conforme já destacado acima, foi a Companhia Mototóti quem participou da abertura da Feira do Livro de Joinville.

A nota fiscal nº 125 (fl. 228), referente ao “Cachê de Palestra”, emitida por CEP Consultoria, encontra-se incompleta, pois não consta o nome do palestrante, assim como não há referência a este no contrato de prestação de serviço (fl. 290).

As alegações de defesa são no sentido de que a despesa se refere ao pagamento de palestra proferida por Cristovao Tezza, realizada no dia 08/04/2009, conforme contrato de fls. 290.

Ante a impossibilidade de uma análise mais apurada a respeito dos serviços contratados, contrariando desse modo a norma legal – a qual determina que a discriminação do objeto deve ser precisa –, entendo que não devam ser aceitos os argumentos dos responsáveis.

Também no tocante à nota fiscal nº 34, emitida por Vox Comunicação e Proc. de Dados LTDA ME, referente ao pagamento da despesa com assessoria de imprensa (fl. 217), não há detalhamento dos serviços realizados pela empresa, impossibilitando dessa forma fiscalizar e controlar os gastos públicos efetuados com recursos do FUNCULTURAL.

Os responsáveis alegaram que esta nota se refere ao serviço de assessoria de impressa para o evento “6ª Feira do Livro de Joinville”, conforme contrato de fls. 282-283, e que referido serviço foi devidamente prestado, visto que o evento teve ampla cobertura da impressa.

As justificativas apresentadas não prosperam, visto que a celebração do contrato com a empresa Vox se deu em 20/09/2009, enquanto o evento ocorreu entre 01 a 09 de abril de 2009.

Os demais documentos de suporte, constantes às fls. 414-429, não prestam para afastar a restrição, pois são unilaterais e de fácil produção, eis que desprovidos de timbre, data ou assinatura.

Para arrematar, a nota fiscal nº 152331 (fl. 221), referente ao serviço de “Coordenação de equipe de execução da Feira do Livro de Joinville” prestado pelo Sr. Luis Gustavo Brandão Argenti, está descrita de forma genérica.

Como se pode perceber, nenhum dos argumentos acima afasta a irregularidade, a qual, a meu ver, é incontestável.

Assim, resta concluir pela responsabilização da Presidente à época do Instituto da Cultura, Educação, Esporte e Turismo, Sra. Fernanda Brandão Argenti, solidariamente com a entidade, em virtude da não comprovação do efetivo fornecimento dos materiais ou prestação dos serviços, aliada à descrição insuficiente das notas fiscais apresentadas e agravada pela não juntada de outros elementos de suporte.

 

3.1.2. Da realização de despesas intrínsecas à capacidade da entidade proponente

 

Neste ponto, destaque-se que a proponente efetuou pagamento à Sra. Adi Kalinowski e ao Sr. Luís Gustavo Argenti Brandão, no montante total de R$ 4.560,00, referente a despesas com coordenação e organização do objeto proposto.

Tal prática constitui violação ao artigo 1º, § 2ª do Decreto Estadual nº 1.291/2008[10], bem como ao Prejulgado nº 2161 da Corte de Contas.

Os responsáveis admitem que foram realizadas despesas com coordenação do evento, no entanto alegam que não houve irregularidade no referido pagamento pois a rubrica foi autorizada pela SDR.

Na oportunidade, informaram que o valor recebido pelo Sr. Luis Gustavo Brandão já foi devidamente corrigido e devolvido aos cofres públicos.

As razões expostas pelos responsáveis não merecem ser acolhidas.

A realização de despesas a título de coordenação e organização do evento contraria o disposto no art. 144, § 1º da Lei Complementar Estadual nº 381/2007, bem como os princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, razoabilidade, economicidade e eficiência, nos termos do art. 37, caput da Constituição da República.

Ademais, como bem apontado pelo corpo instrutivo, se a proponente não possuía capacidade de realizar aquilo a que se propôs, a transferência de recursos públicos não se justificaria.

Em tempo, destaque-se que o valor de R$ 2.060,00, restituído ao erário pelo Sr. Luis Gustavo Brandão[11] deve ser afastado do débito imputado.

Assim, somente o valor de R$ 2.500,00 referente ao pagamento da Sra. Adi Kalinowsk deve ser restituído aos cofres públicos.

 

3.1.3. Da indevida realização de despesas com autorremuneração de membro da entidade e favorecimento familiar

 

Ao examinar os autos, verifica-se que a Sra. Fernanda Brandão Argenti utilizou verbas públicas para remunerar serviços prestados pelo Sr. Luis Gustavo Brandão Argenti, membro do Conselho Fiscal do Instituto da Cultura, Educação, Esporte e Turismo (cargo de 2º tesoureiro) e irmão da Sra. Fernanda, Presidente da entidade à época.

É indiscutível que condutas dessa natureza violam os princípios aplicáveis à administração pública, em especial os princípios da impessoalidade e da moralidade, aos quais a proponente está submetida, visto que recebeu recursos públicos.

Ademais, há expressa vedação a esse tipo de despesa no art. 44, II[12] do Decreto Estadual nº 1.291/2008.

No intento de afastar a restrição, a Sra. Fernanda informou que a irregularidade foi sanada, visto que os valores pagos ao Sr. Luis Gustavo Brandão Argenti foram corrigidos e devolvidos aos cofres públicos.

A devolução desses valores, de fato, afasta a imputação de débito. No entanto, ante a inobservância das normas legais, impõe-se a cominação de multa à Sra. Fernanda.

 

3.1.4. Da comprovação de despesa com documento inidôneo

 

A área técnica apontou, conforme atesta a nota fiscal nº 152441 (fl. 207), que a Sra. Beatriz Pereira teria recebido o valor de R$ 2.440,00 pela prestação do serviço de curadoria na “6ª Feira do Livro de Joinville – 2009”.

No entanto, percebe-se no material de divulgação do evento, juntado às fls. 249-252, que a “6ª Feira do Livro de Joinville – 2009” teve como curador o Sr. Joel Gehlen, então Gerente de Turismo, Cultura e Esporte da SDR de Joinville, não havendo qualquer menção acerca da participação da Sra. Beatriz Pereira no evento.

A Sra. Beatriz, em resposta à diligência realizada pela equipe técnica, informou que é formada em Letras pela Universidade de Joinville e que como curadora do evento ficou responsável por fazer o levantamento dos autores que as escolas da cidade gostariam de assistir na Feira e de criar e organizar a programação do evento. Admitiu, ainda, que recebeu o valor de R$ 2.440,00 pelos serviços prestados (fl. 324).

Em relação à emissão extemporânea da nota fiscal de nº 152441 (em 01/10/2009), alegou que agiu de acordo com a orientação recebida pelo Instituto da Cultura, Educação, Esporte e Turismo, uma vez que os recursos prometidos pela SDR para a realização do evento não foram liberados no mês de abril de 2009, mas apenas em setembro daquele ano (fl. 459).

O Instituto da Cultura, Educação, Esporte e Turismo e a Sra. Fernanda Brandão Argenti alegaram que foi por um lapso do responsável pelo marketing que o nome do Sr. Joel Gehlen constou na qualidade de curador do evento, e que este exerceu a função de curador de forma gratuita.

Ante a inexistência de outros elementos de suporte que comprovem a efetiva participação da Sra. Beatriz como curadora da Feira do Livro, aliada à notícia de que o Sr. Joel Gehlen foi quem exerceu a referida função, opino no mesmo sentido da área técnica, que sugeriu a imputação de débito e cominação de multa proporcional ao dano à Sra. Fernanda Brandão Argenti, à Sra. Beatriz Pereira e ao Instituto da Cultura, Educação, Esporte e Turismo, no montante de R$ 2.440,00.

 

3.1.5. Da realização de despesas sem comprovação de três orçamentos ou justificativa da escolha

 

Neste ponto, destaque-se que a proponente não demonstrou qual foi o critério usado na seleção e qualificação dos prestadores de serviços contratados por meio das notas fiscais listadas na Tabela 4, à fl. 512, de modo a justificar os valores pagos.

Para rechaçar o apontamento restritivo, a Sra. Fernanda Brandão Argenti justificou que foram feitas diversas cotações e selecionados fornecedores que, além do melhor preço, apresentavam expertise para o desenvolvimento dos respectivos serviços (fl. 483).

Como bem apontado pela área técnica, à exceção das palestras e do serviço de curadoria, as demais atividades realizadas na consecução do projeto proposto não demandavam a necessidade de expertise na área, razão pela qual os argumentos apresentados pela proponente não têm o condão de afastar a irregularidade.

Ademais, a proponente não apresentou as cotações de preço que alega ter feito.

A tal fato soma-se a alegação feita pela Sra. Fernanda por ocasião da análise da prestação de contas, quando informou que “por se tratar de um evento único na cidade, buscamos os fornecedores que tem conhecimento e habilidade técnica específica para o desenvolvimento das tarefas, não sendo possível orçar com outros fornecedores” (fl. 270).

A par disso, sigo o entendimento exarado pela equipe técnica, a qual concluiu pela aplicação de multa à responsável.

 

3.1.6. Da movimentação dos recursos por meio de cheques não cruzados

 

Da análise dos autos, verifica-se que a proponente não efetuou o cruzamento dos cheques utilizados para efetuar o pagamento das despesas constantes nas prestações de contas apresentadas, o que demonstra, de forma flagrante, a violação ao art. 58, § 2º do Decreto Estadual nº 1.291/2008.

Para afastar a irregularidade, a Sra. Fernanda aduziu que todos os cheques estão nominais aos credores, que o fato de não ter cruzado alguns dos cheques é mero erro formal que não traz qualquer prejuízo ao erário público.

Como se vê, sem razão a responsável.

A movimentação correta dos recursos provenientes do erário é imprescindível para a verificação da boa e da regular aplicação dos recursos públicos, facilitando a fiscalização feita pelos órgãos de controle externo.

Assim, entende-se que deve ser imposta a penalidade de multa à responsável, já que transgrediu, novamente, as normas relativas à prestação de contas.

 

3.1.7. Da ausência de demonstração de todas as receitas e despesas envolvidas na realização do projeto

 

Ao analisar os documentos que compõem a prestação de contas da entidade, denota-se a presença de diversos patrocinadores (Prefeitura Municipal de Joinville, Jornal ANEscola, SESC, RBS TV, Fundação Municipal de Cultura e Ministério da Cultura - Lei Rouanet) para a consecução da Feira do Livro, contudo o Instituto não prestou contas de todos os valores envolvidos. 

Observa-se que em relação aos recursos recebidos via Lei Rouanet, a entidade, por ocasião da prestação de contas, sequer mencionou ter recebido qualquer valor.

Sobre o assunto, vale mencionar o Decreto Estadual nº 1.291/2008, cujo teor dispõe:

 

Art. 70 As prestações de contas de recursos antecipados, compostas de forma individualizada de acordo com a finalidade da despesa e no valor da parcela, conterão os seguintes documentos, no que couber, conforme o objeto do instrumento legal:

[...]

XIII - demonstração de todas as despesas e receitas envolvidas, no caso de evento aberto ao público, inclusive aquelas auferidas por meio de outros patrocínios e bilheteria, as quais deverão ser integralmente aplicadas no objeto do contrato, não podendo gerar lucro ao contratado; [Grifou-se].

 

Em suas razões de defesa, a Sra. Fernanda aduziu que as entidades mencionadas não repassaram recursos financeiros, apenas deram apoio para divulgação e cobertura do evento.

Em tempo, asseverou ter recebido apoio financeiro através da Lei Rouanet, cujos recursos teriam sido utilizados na contratação de infraestrutura para o evento (fl. 270).

Os esclarecimentos apresentados pela responsável não vieram acompanhados de provas, razão pela qual deve ser mantido o apontamento restritivo, nos termos delineados pela área técnica.

 

4. Da responsabilidade solidária da pessoa jurídica

 

Cabe apontar que a matéria acerca da responsabilidade solidária da pessoa jurídica, atualmente, não gera quaisquer dúvidas no âmbito do TCE/SC.

Seguindo a orientação formulada pelo Tribunal de Contas da União, a Corte de Contas catarinense, em diversas ocasiões, já assinalou que ocorre a responsabilidade solidária entre a pessoa jurídica e o seu dirigente quando estes derem causa a dano ao erário na execução de avença celebrada com o poder público com vistas a atender a uma finalidade pública.

Para corroborar, trago à baila o Incidente de Uniformização de Jurisprudência do Tribunal de Contas da União - Acórdão nº 2763/2011, in verbis:

 

TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. DIVERGÊNCIAS ENCONTRADAS NO EXAME DE PROCESSOS EM QUE OS DANOS AO ERÁRIO TÊM ORIGEM NAS TRANSFERÊNCIAS VOLUNTÁRIAS DE RECURSOS FEDERAIS A ENTIDADES PRIVADAS. NA HIPOTÉSE EM QUE A PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO E SEUS ADMINISTRADORES DEREM CAUSA A DANO AO ERÁRIO NA EXECUÇÃO DE AVENÇA CELEBRADA COM O PODER PÚBLICO FEDERAL COM VISTAS À REALIZAÇÃO DE UMA FINALIDADE PÚBLICA, INCIDE SOBRE AMBOS A RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA PELO DANO AO ERÁRIO. ARTIGOS 70, PARÁGRAFO ÚNICO, E 71, INCISO II, DA CF/88 (...)[13]

 

À luz dessa orientação, entendo que o Instituto da Cultura, Educação, Esporte e Turismo deve responder juntamente com a Presidente da entidade pela devolução de valores em decorrência dos prejuízos causados ao erário.

 

5. Indícios de improbidade administrativa

 

 

Infere-se dos autos que o Sr. Joel Gehlen, Gerente de Turismo, Cultura e Esporte da SDR de Joinville, emitiu parecer favorável ao projeto em questão na data de 08/09/09 (fl. 139), mesmo sabendo que a “6ª Feira do Livro de Joinville – 2009” já havia sido realizada no mês de abril daquele ano, haja vista que exerceu a função de curador naquele evento (fls. 249, 250, 252 e 256).

Com efeito, cabe mencionar que o Sr. Joel fez parte do Conselho Fiscal do Instituto da Cultura, Educação, Esporte e Turismo até 20/08/09 (fl. 87), ou seja, até 18 dias antes de emitir manifestação favorável à aprovação do projeto em análise. 

Sobre esse fato, os responsáveis asseveraram que a SDR tinha conhecimento de que o evento já havia sido realizado, visto que a entidade havia apresentado um projeto no primeiro semestre, e que o evento foi executado no mês de abril sob a promessa da SDR de liberar os recursos (fls. 411 e 486).

Diante das incongruências verificadas, a equipe técnica sugeriu que fosse realizada representação ao Ministério Público do Estado de Santa Catarina, em virtude da possível caracterização de ato de improbidade administrativa.

Por oportuno, importante lembrar a previsão constante na Lei nº 8.429/1992:

 

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:

 

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;

 

Deve-se ressaltar que outros apontamentos também são passíveis de análise por parte do MPSC, notadamente aqueles que concernem à utilização de documentos fiscais inidôneos e ao favorecimento de familiares.

Assim, ratifico a necessidade de ser feita a remessa imediata de cópia dos autos ao Ministério Público Estadual, para que este órgão promova as medidas que entender cabíveis.

 

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II, da Lei Complementar nº 202/2000, manifesta-se por acompanhar as sugestões exaradas no relatório nº 00057/2016, acrescentando a necessidade de aplicação de multa à Sra. Fernanda Brandão Argenti pela realização de despesas com autorremuneração de membro da entidade, em afronta ao art. 44, II do Decreto Estadual nº 1.291/2008.

Florianópolis, 24 de agosto de 2017.

 

 

Diogo Roberto Ringenberg

Procurador do Ministério

Público de Contas

 



[1] Fl. 259.

[2] Art. 1º Esta Lei estabelece normas básicas sobre o processo administrativo no âmbito da Administração Federal direta e indireta, visando, em especial, à proteção dos direitos dos administrados e ao melhor cumprimento dos fins da Administração.

§ 1º Os preceitos desta Lei também se aplicam aos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário da União, quando no desempenho de função administrativa.

Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.

§ 1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.

§ 2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.

[3] O art. 37, § 5º, da Constituição da República prevê: “§ 5º A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento”.

[4] Art. 3° A aplicação do art. 24-A da Lei Complementar (estadual) n. 202/2000 será afastada nas seguintes hipóteses:

I - incidência do art. 37, §5°, da Constituição Federal nos processos em que for caracterizado dano ao erário, conforme dispõem os arts. 15, §3°, 18, inciso lll e §2°, e 32 da Lei Complementar (estadual) nº 202/2000;

[5] Processo SDR23 00028087/2009 à fl. 68.

[6] Fl. 160-165.

[7] Considerando que houve a devolução do valor de R$ 2.060,00 pelo Sr. Luis Gustavo Brandão, devidamente atualizado e corrigido.

[8] BRASIL, Tribunal de Contas da União. TC 013.473/2004-9, do Plenário. Rel. José Jorge. J. em: 27 fev. 2013. Disponível em: www.tcu. gov.br. Acesso em: 17 maio 2016.

[9] SANTA CATARINA, Tribunal de Contas. TCE 10/002299497, do FUNCULTURAL. Rel. Cleber Muniz Gavi. J:19 ago. 2015.

[10] Art. 1º, § 2º: A descentralização da execução de programas de governo e ações dos Fundos da cultura, turismo e esporte, através do Instrumento Legal, somente se efetivará para proponentes que comprovem capacidade profissional, administrativa e financeira para realizá-lo e tenham atribuições regimentais ou estatutárias relacionadas com este objeto. [Grifou-se].

 

[11] Consoante comprovam os documentos de fls. 438-439.

[12] Art. 44. É vedada, ainda, a aprovação de projetos cujo objeto ou despesa consista na:

 I - realização de shows ou espetáculos que cobrem ingressos e que não revertam para a finalidade do projeto; e

II - auto-remuneração do proponente. [Grifou-se].

 

[13] Incidente de Uniformização de Jurisprudência. Acórdão 2763/2011 - Plenário. Processo n.º 006.310/2006-0. Ata 43/2011. DOU 19/10/2011.