Parecer
nº: |
MPC/49.961/2017 |
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Processo
nº: |
REC
16/00050350 |
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Origem: |
Imprensa
Oficial do Estado - IOESC |
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Assunto: |
Recurso
de Reconsideração da decisão exarada no processo TCE-01/01855184 |
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Numeração Única: |
MPC-SC 2.3/2017.811 |
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Trata-se
de Recurso de Reconsideração interposto pelo Instituto Euvaldo Lodi -
Departamento Regional de Santa Catarina em face do acórdão nº 1.163/2014,
exarado nos autos do processo nº TCE 01/01855154, que tratou da dispensa de
licitação nº 003/2001 e do contrato nº 003/2001, cujo objeto foi a implantação
do Diário Oficial Eletrônico do Estado de Santa Catarina e do Diário de Justiça
Eletrônico.
Após
analisar as razões recursais, a Diretoria de Recursos e Reexames divergiu quanto
ao mérito do apelo. Para o Auditor Fiscal de Controle Externo Theomar Aquiles
Kinhirin deve ser dado provimento parcial ao recurso, nos seguintes termos:
3.1. Conhecer do Recurso
de Reconsideração interposto nos termos do art. 77 da Lei Complementar nº 202,
de 15 de dezembro de 2000, contra a Deliberação nº 1163/2014, exarada na Sessão
Ordinária de 16/12/2014, nos autos do Processo nº TCE – 01/01855184, e no
mérito dar provimento parcial para:
3.1.1. Cancelar
a responsabilização solidária do Instituto Euvaldo Lodi S/C, relativa ao débito
de R$ 1.203.989,00 (um milhão duzentos e três mil reais), constante do item 6.2
da Deliberação Recorrida.
3.1.2. Modificar o montante
do débito de R$ 1.203.989,00 (um milhão duzentos e três mil reais), imputado ao
responsável, Senhor Eduardo de Souza Hening, constante do item 6.2 da
Deliberação Recorrida, para o valor do pagamento da 5ª parcela do contrato
003/2001, firmado pela IOESC com o Instituto Euvaldo Lodi S/C.
3.1.3. Cancelar
a responsabilização solidária do Senhor Fernando dos Santos e do Instituto
Euvaldo Lodi S/C, com relação ao débito de R$ 273.750,00 (duzentos e setenta e
três mil setecentos e cinquenta reais), mantendo o valor do débito em relação
ao Senhor Eduardo de Souza Heinig.
3.1.4. Ratificar
os demais termos da Deliberação Recorrida.
3.2. Dar ciência da
Decisão, ao Instituto Euvaldo Lodi de Santa Catarina, seus procuradores e à
Imprensa Oficial do Estado - IOESC.
Já
a Coordenadora (Valéria Patrício) e a Diretora da Diretoria de Recursos e
Reexames (Maria de Lourdes Silveira Sordi) sugeriram conhecer do apelo e, no
mérito, negar provimento, ratificando na íntegra a deliberação recorrida:
1. Conhecer
do Recurso de Reconsideração interposto nos termos do art. 77 da Lei
Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000, contra a Deliberação nº
1163/2014, exarada na Sessão Ordinária de 16/12/2014, nos autos do Processo nº
TCE 01/01855184, e no mérito negar provimento, ratificando na íntegra a
Deliberação recorrida.
2. Dar ciência da
Decisão Dar ciência da Decisão, ao Instituto Euvaldo Lodi de Santa Catarina,
seus procuradores e à Imprensa Oficial do Estado - IOESC.
É
o relatório.
1. Da necessidade de redistribuição
dos autos a um novo Relator
Saliente-se,
em primeiro lugar, que o caderno processual deve ser redistribuído a um novo Relator,
uma vez que o Conselheiro César Filomeno Fontes está impedido legalmente de conduzir
os presentes autos.
Com
efeito, convém explicar que o referido Conselheiro atuou como Procurador do
Ministério Público de Contas no feito principal[1] e,
em razão disso, não deve relatar o recurso em apreço.
Para
reforçar essa linha de raciocínio, anote-se a previsão constante no Código de
Processo Civil:
Art. 144.
Há impedimento do juiz,
sendo-lhe vedado exercer suas funções no processo:
I - em que interveio como
mandatário da parte, oficiou como perito, funcionou como membro do Ministério
Público ou prestou depoimento como testemunha;
II - de
que conheceu em outro grau de jurisdição, tendo proferido decisão;
III -
quando nele estiver postulando, como defensor público, advogado ou membro do
Ministério Público, seu cônjuge ou companheiro, ou qualquer parente,
consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau,
inclusive;
IV -
quando for parte no processo ele próprio, seu cônjuge ou companheiro, ou
parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau,
inclusive;
V -
quando for sócio ou membro de direção ou de administração de pessoa jurídica
parte no processo;
VI -
quando for herdeiro presuntivo, donatário ou empregador de qualquer das partes;
VII - em
que figure como parte instituição de ensino com a qual tenha relação de emprego
ou decorrente de contrato de prestação de serviços;
VIII - em
que figure como parte cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge,
companheiro ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o
terceiro grau, inclusive, mesmo que patrocinado por advogado de outro
escritório;
IX -
quando promover ação contra a parte ou seu advogado.
[...]
(Grifou-se)
À
luz dessa orientação normativa, pugna-se, desde já, pela redistribuição do
apelo a um novo Conselheiro, com vistas a dar efetividade ao princípio do
devido processo legal.
Seguindo
essa mesma linha, acrescente-se que o raciocínio aqui formulado estende-se, por
corolário lógico, à votação em Plenário, pois aquele que é impedido de relatar
um processo também não possui a imparcialidade necessária para julgar.
2. Dos requisitos de
admissibilidade
Ressalte-se, neste ponto, que o recurso de
reconsideração é o meio processual cabível para atacar decisões proferidas pelo
Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina em processos de prestação e
tomada de contas[2].
Com efeito, cabem ter presentes os
pressupostos de admissibilidade do recurso em tela: a) cabimento; b) adequação;
c) legitimidade; d) tempestividade; e) singularidade.
Assentados esses requisitos, saliente-se que
o apelo é cabível e adequado ao presente caso, já que visa à reforma da decisão
proferida em processo de tomada de contas especial.
Quanto à legitimidade, cumpre salientar que o
Instituto Euvaldo Lodi foi condenado, de forma solidária, à restituição de
valores aos cofres públicos, o que demonstra que o requisito em análise está
preenchido.
A singularidade, por sua vez, também foi
respeitada, já que o recurso de reconsideração foi interposto uma única vez
pelo recorrente.
No que diz respeito à tempestividade,
impõe-se anotar que a publicação da decisão ocorreu em 12.01.2015 e o recurso
em apreço foi protocolizado em 26.01.2016. Importante explicar, no entanto, que
em 28.01.2015 foram interpostos embargos de declaração, os quais suspenderam o
prazo recursal. A decisão dos aclaratórios foi publicada em 17.02.2016, reiniciando-se,
a partir de tal data, a contagem do prazo para a interposição do recurso de
reconsideração.
Tendo em vista que o presente apelo foi
protocolizado antes mesmo da publicação da decisão dos embargos, entende-se,
assim, que está preenchido o requisito da tempestividade, nos moldes do § 4º,
do art. 218, do Código de Processo Civil[3].
Assim, conclui-se que o recurso merece ser conhecido.
3. Das razões recursais
3.1. Da prescrição
Registre-se
que o recorrente, em sede de preliminar, arguiu a prejudicial de mérito da
prescrição, sob a justificativa de que a Corte de Contas catarinense deixou de
aplicar os mandamentos contidos na Lei Complementar Estadual nº 588/2013.
Em
seu apelo, o Instituto Euvaldo Lodi pontuou que o processo ficou em tramitação
por treze anos (2001-2014), o que, no seu entender, vai de encontro às
orientações previstas na norma supracitada.
Com
o devido respeito às considerações lançadas pelo recorrente, mas o seu
raciocínio está equivocado, pois são imprescritíveis as ações que têm por finalidade
o ressarcimento ao erário.
Nesse
passo, eis a disposição constante na Constituição da República:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de
qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
[...]
§ 5º A lei estabelecerá
os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor
ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de
ressarcimento.
[...] (Grifou-se).
Dando
efetividade à norma constitucional, o TCE/SC, através de processo de relatoria
do Conselheiro Substituto Cleber Muniz Gavi, exarou a seguinte ementa:
RECURSO
DE RECONSIDERAÇÃO. CONHECER. NÃO-PROVER.
Prescrição.
Tribunal de Contas.
A
hipótese de ressarcimento de prejuízo causado ao erário não se submete ao
instituto da prescrição, consoante determina a parte final do § 5º do art. 37
da Constituição Federal.
Tribunal
de Contas. Procedimentos instaurados pelo Ministério Público Estadual
O
dever-poder conferido pelo texto constitucional aos Tribunais de Contas não
está jungido aos procedimentos investigatórios instaurados pelo Ministério
Público Estadual.
Matéria de Fato. Prova.
É
importante rememorar que, nos termos da Resolução nº TC 100/2014, a Lei
Complementar Estadual nº 588/2013 (de questionável constitucionalidade por
vício de iniciativa) não deve ser empregada quando constatada a ocorrência de
dano ao erário, senão vejamos:
Art. 3° A aplicação do art. 24-A da Lei
Complementar (estadual) n. 202/2000 será afastada nas seguintes hipóteses:
I - incidência do art. 37, §5°, da
Constituição Federal nos processos em que for caracterizado dano ao erário,
conforme dispõem os arts. 15, §3°, 18, inciso lll e §2°, e 32 da Lei
Complementar (estadual) n. 202/2000;
II - apreciação de
processo de atos para fins de registro, de que trata o inciso III do art. 59 da
Constituição do Estado. (Grifou-se)
A
par disso, cumpre assinalar que as irregularidades vislumbradas nos autos culminaram
em prejuízos vultosos ao erário e, por corolário legal, houve a devida e
necessária condenação ao ressarcimento.
É
digno de nota, oportunamente, que o TCE/SC não imputou qualquer penalidade de
multa aos responsáveis, o que poderia, em tese, ensejar a aplicação da Lei Complementar
Estadual nº 588/2013.
A norma invocada pelo recorrente não é destinada aos casos em que
é constatado dano aos cofres públicos, razão pela qual deve ser fulminada a
pretensão invocada no apelo em sede de prejudicial.
3.2. Do mérito recursal
Destaque-se,
ao adentrar no mérito do recurso, que a Imprensa Oficial do Estado de Santa
Catarina e o Instituto Euvaldo Lodi firmaram, em 28.03.2001, o contrato nº 03/2001,
tendo por objeto o fornecimento de ferramenta tecnológica, com vistas a
automatizar o Diário Oficial do Estado e o Diário de Justiça de forma
eletrônica, com todas as funcionalidades pertinentes.
A
propósito, extrai-se do aludido instrumento:
Cláusula Segunda – Do objeto
2.1. O objeto do
presente contrato consiste em consultoria e elaboração de projeto, com
respectiva implantação, para desenvolvimento institucional da CONTRATANTE,
incluída a reestruturação dos procedimentos pertinentes a publicações,
orçamentos de serviços gráficos e de atendimento ao público e aos clientes, com
implantação de rotinas que permitam agilização dos procedimentos, através de tecnologia
de informação, especialmente no tocante à edição do Diário Oficial e do Diário
da Justiça, de forma a possibilitar, ainda, a descentralização do recebimento
de matérias, conforme descrito e especificado no ANEXO I, parte integrante do
presente Contrato. (Grifos no original)
Cabe
aqui mencionar que as partes convencionaram o valor inicial do ajuste em R$
1.203.989,00. No entanto, a referida importância foi aditada em R$ 273.750,00, totalizando,
assim, o montante de R$ 1.477.739,00.
Vale
destacar, oportunamente, que a contratação ocorreu através de dispensa de
licitação, sob a justificativa de que o caso enquadrava-se na previsão
constante no inciso VIII, do art. 24, da Lei nº 8.666/1993[4].
Lançadas
essas informações iniciais, sublinhe-se que foi instaurada uma tomada de contas
especial internamente no âmbito da Secretaria de Estado da Administração, pois
restaram constatadas irregularidades gravíssimas na contratação do Instituo
Euvaldo Lodi e na execução do objeto contratual.
Ao
finalizar os trabalhos afetos à fiscalização, a comissão apresentou as
seguintes conclusões: i) a contratação direta foi ilegal, uma vez que não foram
preenchidos os requisitos elencados na Lei nº 8.666/1993; ii) houve a subcontratação
do objeto, de forma indevida; iii) existência de dano ao erário, em decorrência
da não contraprestação dos serviços, ou seja, em virtude da não entrega da
ferramenta tecnológica com todas as funcionalidades necessárias.
Remetidos
os autos ao TCE/SC, procedeu-se à instrução processual, com a devida citação
dos responsáveis, de modo a propiciar o contraditório. Contudo, os argumentos invocados
nas contestações foram insuficientes para evitar a condenação.
Em
16.12.2014, o Tribunal Pleno, acolhendo a proposta de voto apresentada pelo
Conselheiro Relator, exarou o seguinte acórdão:
6.1.
Julgar irregulares, com imputação de débito, na forma do art. 18, inciso III,
alínea "c", c/c o art. 21, caput, da Lei Complementar (estadual) n.
202/2000, as contas referentes à presente Tomada de Contas Especial, que trata
de irregularidades relacionadas à Dispensa de Licitação n. 003/2001 da IOESC, e
contrato pertinente, que tinha como objeto a contratação de consultoria e
elaboração de projeto, com respectiva implantação, para desenvolvimento
institucional da contratante, incluída a reestruturação dos procedimentos
pertinentes a publicações, orçamentos de serviços gráficos e de atendimento ao
público e aos clientes, com implantação de rotinas que permitam agilização dos
procedimentos, através de tecnologia de informação, especialmente no tocante à
edição do Diário Oficial Eletrônico do Estado e do Diário de Justiça
Eletrônico, de forma a possibilitar, ainda, a descentralização do recebimento
de materiais.
6.2.
Definir a RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA do Sr. EDUARDO DE SOUZA HEINIG - CPF n.
179.349.319-72, e, com fulcro no art. 18, inciso III, §2º, alínea
"b", da Lei Complementar (estadual) n. 202/2000, do INSTITUTO EUVALDO
LODI DE SANTA CATARINA - IEL/SC -, CNPJ n. 83.843.912/0001-52, e condená-los ao
recolhimento da quantia de R$ 1.203.989,00 (um milhão duzentos e três mil e
novecentos e oitenta e nove reais), referente ao pagamento/recebimento sem a
devida comprovação da contraprestação de serviços para o ente público,
contrariando os arts. 2º, parágrafo único, 3º, 66, 69 e 70 da Lei (federal) n.
8.666/93 e 62 e 63 da Lei (federal) n. 4.320/64, fixando-lhes o prazo de 30
(trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial
Eletrônico do TCE - DOTC-e -, para comprovarem, perante este Tribunal, o
recolhimento do valor do débito ao Tesouro do Estado, atualizado monetariamente
e acrescido dos juros legais, a teor dos arts. 21 e 44 da Lei Complementar
(estadual) n. 202/2000, ou interporem recurso na forma da lei, sem o quê, fica
desde logo autorizado o encaminhamento de peças processuais ao Ministério
Público junto ao Tribunal de Contas para que adote providências à efetivação da
execução da decisão definitiva, consoante art. 43, inciso II, da Lei
Complementar (estadual) n. 202/2000.
6.3.
Definir a RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA dos Srs. EDUARDO DE SOUZA HEINIG - já
qualificado, e FERNANDO LUIZ DOS SANTOS - CPF n. 178.598.329-68, e, com fulcro
no art. 18, inciso III, §2º, alínea "b", da Lei Complementar
(estadual) n. 202/2000, do INSTITUTO EUVALDO LODI DE SANTA CATARINA - IEL/SC -
já qualificado, e condená-los ao recolhimento da quantia de R$ 273.750,00
(duzentos e setenta e três mil setecentos e cinquenta reais), referente ao
pagamento/recebimento sem a devida comprovação da contraprestação de serviços
para o ente público, contrariando os arts. 2º, parágrafo único, 3º, 66, 69 e 70
da Lei (federal) n. 8.666/93 e 62 e 63 da Lei (federal) n. 4.320/64,
fixando-lhes o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão
no Diário Oficial Eletrônico do TCE - DOTC-e -, para comprovar, perante o
Tribunal, o recolhimento do valor do débito ao Tesouro do Estado, atualizado
monetariamente e acrescido dos juros legais, a teor dos arts. 21 e 44 da Lei
Complementar (estadual) n. 202/2000, ou interporem recurso na forma da lei, sem
o quê, fica desde logo autorizado o encaminhamento de peças processuais ao
Ministério Público junto ao Tribunal de Contas para que adote providências à
efetivação da execução da decisão definitiva, consoante art. 43, inciso II, da
Lei Complementar (estadual) n. 202/2000.
6.4.
Determinar à IOESC que observe, nas contratações fundamentadas no art. 24,
XIII, da Lei n. 8.666/93, o preenchimento das condições previstas em lei, bem
como o caráter intuito personae do contrato administrativo.
6.5.
Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam,
bem como do Relatório de Reinstrução DLC n. 623/2013 e do Parecer MPjTC n.
26.751/2014, aos Responsáveis nominados no item 3 desta deliberação, ao
Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, à Auditoria Interna da
Secretaria de Estado da Fazenda, à Procuradoria-geral do Estado e à Secretaria
de Estado da Administração.
À
vista do exposto, denota-se que a Corte de Contas catarinense julgou
irregulares as contas em razão de terem sido efetuados os pagamentos à empresa
contratada, sem que houvesse, entretanto, a contraprestação dos serviços.
Irresignado
com o acórdão prolatado, o recorrente apresentou o recurso em tela, com os
seguintes argumentos: i) a perícia realizada foi parcial, razão pela qual deve
ser decretada a nulidade dos atos processuais; ii) houve o recebimento dos
serviços contratados; iii) o objeto contratual foi dividido em cinco etapas,
cujos termos de aceite dando quitação de recebimento pelos serviços prestados
foram firmados pelos representantes da IOESC; iv) os depoimentos constantes nos
autos revelam que o sistema contratado foi entregue sem problemas.
Registradas
as razões recursais, convém aqui lembrar que a equipe da Diretoria de Recursos
e Reexames divergiu quanto ao desfecho deste apelo.
Após
analisar atentamente os argumentos expostos nas razões do recurso e no parecer
técnico, tenho para mim que a conclusão adotada pela Coordenadora e pela Diretoria
da DRR é a mais acertada, devendo o acórdão prolatado, portanto, manter-se
incólume.
Com
efeito, faz-se necessário salientar, primeiramente, que a contratação do Instituto
Euvaldo Lodi já possuía vícios graves em sua origem, uma vez que foi realizada
a dispensa de licitação sem que estivessem presentes os requisitos legais
autorizadores.
Não
bastasse isso, percebe-se que houve a subcontratação do objeto entabulado, o
que agrava ainda mais a situação fática. Notadamente, a hipótese de
subcontratação prevista no art. 72 da Lei nº 8.666/1993 não se aplica aos casos
de contrato por dispensa de licitação firmado em função da pessoa do contratado.
Os
fatos acima relatados, no entanto, não constituíram objeto de apontamento e não
foram abordados na decisão exarada pelo TCE/SC, razão pela qual não
aprofundarei essa discussão. Não obstante, tais informações mostram-se
pertinentes, a fim de demonstrar que a contratação já ocorreu de forma ilegal
e, mais ainda, o contratado não respeitou as cláusulas da avença ao realizar a
subcontratação.
Anotadas
essas observações, acrescente-se que os fundamentos invocados pelo recorrente e
pelo Auditor Fiscal de Controle Externo, com o devido respeito, não são
suficientes para afastar a imputação de débito, pois restou demonstrado que não
houve a contraprestação dos serviços nos moldes pactuados.
Na
oportunidade, impõe-se lembrar que o objeto do contrato consistia na
consultoria, na elaboração do projeto (com a respectiva implantação) e, ainda, na
reestruturação dos procedimentos pertinentes a publicações, orçamentos de
serviços gráficos e de atendimento ao público e aos clientes, com a implantação
de rotinas que permitissem a agilização dos procedimentos, através de
tecnologia de informação, especialmente no tocante à edição do Diário Oficial e
do Diário de Justiça, de forma a possibilitar, ainda, a descentralização do
recebimento de matérias.
Com
base nos termos firmados, entende-se que o Instituto Euvaldo Lodi deveria
entregar os programas atinentes à edição do Diário Oficial e do Diário de
Justiça em pleno funcionamento, com todas as ferramentas necessárias para a
utilização dos sistemas. No entanto, não foi isso que ocorreu.
Importante
assinalar que a entrega parcial de um projeto, somada à sua ineficiência, é
causa suficiente para a restituição integral dos valores aos cofres públicos,
uma vez que o projeto compreendia um conjunto de ações que deveria ser
desempenhado pela empresa contratada, de modo a dar concretude ao objeto da
avença.
Nesse
sentido, eis a orientação exarada pelo Tribunal de Contas da União:
TOMADA DE CONTAS
ESPECIAL. CONVÊNIO. DISPÊNDIO DA
TOTALIDADE DOS RECURSOS REPASSADOS. EXECUÇÃO PARCIAL DO OBJETO. PAGAMENTO POR
SERVIÇOS NÃO PRESTADOS. IMPRESTABILIDADE TOTAL DA FRAÇÃO EXECUTADA. FRUSTRAÇÃO
COMPLETA DOS OBJETIVOS DO CONVÊNIO. RESPONSABILIZAÇÃO PELA TOTALIDADE DOS RECURSOS
REPASSADOS. IRREGULARIDADE.
1 - Os responsáveis devem responder pela
totalidade dos recursos repassados quando a fração executada do objeto for
absolutamente imprestável e houver completa frustração dos objetivos do
convênio[5].
(Grifou-se)
Seguindo
essa linha de raciocínio, sublinhe-se que não basta executar parte do sistema e
deixá-lo sem operacionalidade. É imprescindível que o objeto contratado seja
entregue em perfeitas condições de funcionamento e de acordo com aquilo que foi
ajustado previamente entre as partes.
Existem
vários elementos de prova que demonstram que o projeto não atingiu a sua
finalidade, como o depoimento das testemunhas e a perícia contratada pela
comissão da tomada de contas especial. Além disso, o projeto era imprestável para
o fim pretendido.
Para
corroborar, oportuno transcrever excerto do relatório exarado pela perícia
contratada para auxiliar nos esclarecimentos dos fatos:
[...] constatou-se a
adoção de diferentes tecnologias para o mesmo software. Isso representa alto custo
de manutenção na medida que aumenta a complexidade da solução enquanto diminui
proporcionalmente a performance, escalabilidade e reusabilidade do software.
Comprometendo desta forma, sua aderência aos requisitos reais de negócio e
produção da IOES.
Acreditamos que o
investimento realizado no projeto DOE (de acordo com auditoria anterior), foi
suficiente para que o fornecedor contratado realizasse um trabalho de altíssima
qualidade. Contudo verificamos, que este trabalho infelizmente não foi realizado
de maneira tecnicamente correta.
O que podemos afirmar,
é que a IOESC não possui uma solução que garanta a Integridade e confiabilidade
de suas informações.
Vale ressaltar que o
problema de segurança apresentado pela aplicação é grave, resultando de um projeto
mal formulado e um processo de tomada de decisão mal orientado pelo fornecedor.
Isso caracteriza-se uma ação de irresponsabilidade técnica do fornecedor, que
expõe a imagem e a credibilidade da IOESC perante suas responsabilidade com o
Governo do Estado de Santa Catarina.
[...]
O produto final de
todo esse processo é um software de diferentes tecnologias, arquitetura
deficiente, mal implementado, mal documentado, com alto custo de gerenciamento
e evolução, que compromete a segurança das informações a automatiza de maneira
insuficiente o processo[6].
Como
se vê, concluiu-se que o projeto era eivado de falhas que dificultavam a sua
funcionalidade, aumentavam consideravelmente o seu custo de manutenção e
comprometiam a segurança das informações.
A
par disso, faz-se necessário comentar acerca do suposto vício alegado pelo recorrente,
o qual asseverou que a perícia foi realizada unilateralmente pelo Estado,
culminando, no seu entender, em uma nulidade processual.
Acerca
do assunto, convém explicar que tal fato não macula o procedimento, até mesmo
porque o interesse do Estado, através da comissão de tomada de contas especial,
é elucidar a conjuntura. É digno de nota que não existem partes antagônicas no
processo de tomada de contas especial, cuja finalidade exclusiva é esclarecer
os fatos, identificar os responsáveis e quantificar o dano.
De
mais a mais, o próprio recorrente reconhece que foi notificado para apresentar
quesitos e que houve a formulação de questionamentos. O fato de não ter sido
informado a respeito da data da perícia não é motivo para nulidade, até mesmo
porque o trabalho técnico certamente não foi realizado em um único dia, já que
o objeto contratual incluía vários serviços e etapas.
Some-se
a isso, ainda, o fato de que a condenação não se baseou somente na prova
pericial, mas em todo o contexto fático-probatório.
Superado
este ponto, anote-se que a existência de termos de aceite assinados pelo gestor
da Imprensa Oficial do Estado não é o suficiente para afastar a
responsabilização da empresa contratada.
Como
é sabido, o processo administrativo é regido pelo princípio da verdade real,
também denominado de verdade material. Ao explicar o aludido princípio, Odete
Medauar[7]
aduz:
O princípio da verdade material ou real,
vinculado ao princípio da oficialidade, exprime que a Administração deve tomar
as decisões com base nos fatos tais como se apresentam na realidade, não se
satisfazendo com a versão oferecida pelos sujeitos. Para tanto, tem o
direito e o dever de carrear para o expediente todos os dados, informações,
documentos a respeito da matéria tratada, sem estar jungida aos aspectos
considerados pelos sujeitos. Assim, no tocante a provas, desde que obtidas por
meios lícitos (como impõe o inciso LVI do art. 5º da CF), a Administração detém
liberdade plena de produzi-las.
Nessa
linha de argumentação, cumpre pontuar que não é possível basear-se somente
naquilo que consta no termo, mas sim em todas as provas produzidas nos autos. É
importante consignar, a propósito, que os termos estão em dissonância com as
demais provas; são, portanto, extremamente frágeis para o fim almejado pelo recorrente.
No
tocante à diminuição do valor da condenação, tenho para mim que não prospera o
pedido formulado. Conforme já citado alhures, a entrega de um projeto ineficiente
e que não atende aos objetivos da instituição enseja a devolução total dos
recursos públicos.
A
alegada omissão do acordão recorrido em analisar algumas provas, de igual modo,
não prospera. Em primeiro lugar, registre-se que a omissão, quando realmente
existir, deve ser combatida com o recurso de embargos de declaração; em segundo
lugar, anote-se que, à luz do princípio do livre convencimento motivado, o
julgador tem liberdade para firmar o seu posicionamento, desde que o faça de
forma fundamentada, o que ocorreu no caso em apreço.
No
que diz respeito à prova testemunhal, também estou convencido de que a decisão
não merece qualquer reparo, pois está embasada em vários testemunhos, senão
vejamos:
►Senhor Gustavo
Barata Gomes – testemunha – “foram instalados módulos do programa em todos os
órgãos do judiciário, mas estes módulos não enviaram as matérias para a IOESC,
sendo que os tribunais encaminhavam as matérias por e-mail; o diário da justiça
foi utilizado dessa maneira precária até 2005.” (fl. 3708 dos autos).
►Senhor Gilvan
Lobato de Souza – servidor do TRE – “que em 2004 ou 2005 passou a encaminhar as
publicações através de e-mail; que por volta de 2006/2007 surgiu paralelamente
ao diário em papel o diário oficial eletrônico do Estado” (fl. 3708).
►Poder
Judiciário – “o módulo de captação de
matérias da IOESC não atendia as necessidades do órgão” (fl. 3707) e “que o
módulo nunca foi utilizado pelo Poder Judiciário, que encaminhava as matérias
para veiculação no Diário Oficial Eletrônico através de outras ferramentas de
informática, que não as fornecidas pelo IEL.” (fl. 3701).
►Relatório
sobre o Módulo de Captação de Matérias da IOESC – “23/04/2002 – Segundo o Chefe
da Seção de Publicações, (...), o módulo
de captação de matérias é um sistema com muitas falhas, o que vem deixando
muito a desejar, pois em vez de agilizar os trabalhos da Seção, está atrasando”. (fl. 3677)
►Diretor-Geral
do Judiciário, Senhor Alberto Pizzolatti do Grupo de Trabalho de Padronização
de Documentos para Publicação no DJE – “Foi apresentado pelo Diretor de
Informática da TJSC, Giovanni Moresco, relatório substanciado do módulo de
integração dos sistemas TJSC/IOESC. Apontadas
diversas e sérias deficiências
.
do sistema, desde a
inadequada visualização das telas até a questão de segurança no envio das
matérias, constatou-se que a ferramenta EXCEL, na qual baseado o módulo de
integração, não se mostrou adequado ao volume de matérias a serem enviadas pelo
Poder Judiciário (em torno de 350/dia). Deliberou-se, então, que a IOESC apresentaria
nova versão do módulo” (fl. 3677)
►Senhor
Maurício Walendowsky Sprícigo, do mesmo grupo de trabalho, “não foi entregue o novo módulo, conforme
estipulado na reunião anterior, sendo apresentada apenas uma proposta de
desenvolvimento do protótipo..” (fl. 3680)
►Relatório
sobre o Diário da Justiça em 06.11.2002 – “(...)verificou-se que o novo módulo de integração proposto pelo IOESC
permanecia inalterado, não atendendo às necessidades do Poder Judiciário. Por
esse motivo, o Senhor Fernando Luiz Santos, Diretor Industrial da Imprensa
Oficial, solicitou a suspensão dos trabalhos e definições, pois ocorrera
alteração do escopo proposto, incumbindo-se de agendar oportunamente nova
reunião, fato que, até a presente data não ocorreu. (fl. 3685)
Consta no “Relatório
sobre o Diário da Justiça”, de autoria do então Juiz Corregedor Paulo Henrique
Moritz M. da Silva, em 19.11.2002:
► “Infere-se,
ante o acima exposto, bem como os documentos em anexo, que a IOESC:
a) Não
está apta a desenvolver o módulo de integração com os sistemas do TJSC nos
prazos e moldes propostos;
b) Não
está em condições de editorar as matérias enviadas para publicação por meio
eletrônico satisfatoriamente, advindo prejuízos de origem legal às partes, e à
imagem do Poder Judiciário;
c) Furta-se
ao cumprimento das obrigações estabelecidas, atribuindo ao Poder Judiciário
falhas e incorreções que são oriundas deste órgão.
d)
Deliberadamente e sem consultar o
Tribunal de Justiça, aplicou o módulo PRM na editoração do Diário da Justiça a
partir de 29/10, módulo já rejeitado pelo Grupo de Trabalho de Padronização,
por se mostrar incabível para os serviços do Poder Judiciário, retornando ao
estado de problemas anteriormente descritos.” (fls. 3686 a 3687)
Por fim, o Ofício nº
1556/02 GP datado de 09.12.2002 e assinado pelo Presidente do Tribunal de
Justiça, Desembargador Amaral e Silva, destinado ao Diretor da Imprensa Oficial
de Santa Catarina, que dispõe:
►”Reitero, ainda, pedido para que não mais
sejam utilizados recursos tecnológicos que se mostrem incompatíveis com a
sistemática de informatização aprovada pelo Poder Judiciário – em especial o
módulo denominado PRM ainda não suficientemente seguro e confiável para o fim a
que se destina, tanto que responsável por inúmeros erros de publicação”
(fl. 3687).
Constou ainda, à fl.
3690 dos autos, a observação do Diretor-Geral do Judiciário, Senhor Alberto
Pizzolatti, que “o último registro
acerca do módulo PRM é datado de 05.03.2004, onde é constatado, mais uma vez, a
incompatibilidade deste com os sistemas e necessidades do TJSC”[8].
(Grifos no original)
Como
se pode notar, os elementos de provas acima reproduzidos demonstram que o
projeto era totalmente ineficiente e não cumpriu a sua finalidade. A propósito,
os depoimentos revelam uma realidade totalmente diferente daquela defendida
pelo recorrente, o qual se valeu do depoimento do Sr. Eduardo de Souza Heinig
no intuito de demonstrar que o sistema contratado foi entregue sem quaisquer problemas.
Lembra-se,
todavia, que o Sr. Eduardo de Souza Heinig também foi condenado à restituição
dos valores, justamente por autorizar o pagamento de um produto ineficiente e
que não atendeu à sua função. Sua declaração, portanto, deve ser avaliada com cuidado,
pois é do seu interesse que o débito seja afastado.
Afigura-se
oportuno comentar, ainda, que o recorrente não apresentou qualquer elemento
novo que pudesse rechaçar a condenação, haja vista que se valeu tão somente de
argumentos já invocados durante a instrução do processo principal.
Desse
modo, infere-se que a decisão deve ser mantida em seu inteiro teor, eis que
demonstrado que o objeto do contrato não foi cumprido integralmente e que os
sistemas não atingiram a finalidade almejada. Não bastasse isso, restou
demonstrado que o temo aditivo foi firmado indevidamente, o que agrava ainda
mais a situação fática.
Ante
o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida
pelo art. 108, incisos I e II, da Lei Complementar nº 202/2000, manifesta-se:
1. Pela
redistribuição dos autos a um novo Relator, ante o impedimento legal do
Conselheiro César Filomeno Fontes.
2. Por
conhecer do Recurso de Reconsideração interposto pelo Instituto Euvaldo Lodi -
Departamento Regional de Santa Catarina em face da deliberação nº 1163/2014
(processo TCE 01/01855184)
exarada pelo TCE/SC e, no mérito, negar provimento, ratificando na íntegra a
decisão recorrida.
3. Por
dar ciência da decisão ao recorrente, aos procuradores devidamente constituídos
nos autos e à Imprensa Oficial do Estado.
Florianópolis,
03 de outubro de 2017.
Diogo Roberto Ringenberg
Procurador do
Ministério
Público de Contas
[1] Fl. 35 e fl. 227 do processo nº TCE
01/01855184.
[2] O art. 77, da Lei
Complementar Estadual nº 202/2000, prescreve: “Cabe Recurso de Reconsideração
contra decisão em processo de prestação e tomada de contas, com efeito
suspensivo, interposto uma só vez por escrito, pelo responsável, interessado ou
pelo Ministério Público junto ao Tribunal, dentro do prazo de trinta dias
contados da publicação da decisão no Diário Oficial Eletrônico do Tribunal de
Contas”.
[3] O Art. 218, § 4º, do CPC prescreve: “Art. 218. Os atos
processuais serão realizados nos prazos prescritos em lei. [...] § 4o Será
considerado tempestivo o ato praticado antes do termo inicial do prazo”.
[4] A Lei nº 8.666/1993, em seu art. 24,
inciso VIII, dispõe: Art. 24. É
dispensável a licitação: [...] VIII - para a aquisição, por
pessoa jurídica de direito público interno, de bens produzidos ou serviços
prestados por órgão ou entidade que integre a Administração Pública e que tenha
sido criado para esse fim específico em data anterior à vigência desta Lei,
desde que o preço contratado seja compatível com o praticado no mercado; [...].
[5] BRASIL, Tribunal de Contas da União.
Acórdão 3.881/2008 - Segunda Câmara. Rel: Aroldo Cedraz. J. em: 30 set. 2008.
Disponível em: www.tcu.gov.br. Acesso em:
08 ago. 2017.
[6] Fls. 3.670-3.671 dos autos nº TCE
01/01855184.
[7] MEDAUAR, Odete. Direito
administrativo moderno. 11 ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2007.
[8] Fl. 4.298 dos autos nº TCE
01/01855184.