PARECER       nº:

MPC/54066/2018

PROCESSO      nº:

REP-16/00302340

ORIGEM          :

Prefeitura de Palhoça

RESPONSÁVEL     :

Sr. Camilo Nazareno Pagani Martins

ASSUNTO         :

Irregularidades concernentes a alterações orçamentárias no exercício de 2015

NÚMERO UNIFICADO:

MPC-SC/2.1/2018.100

 

 

 

 

 

1 – RELATÓRIO

Trata-se de representação oriunda de encaminhamento, pela Ouvidoria do Tribunal de Contas, à Diretoria de Controle dos Municípios – DMU, da Comunicação nº 464/2016, relatando supostas irregularidades nas alterações orçamentárias efetuadas no Município de Palhoça, no exercício de 2015 (fl. 5).

Auditores da DMU, após análise inicial, sugeriram autuação de processo específico para apuração dos fatos (fls. 3/4), sendo autuado este processo conforme determinação do Exmo. Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall – supervisor da ouvidoria da Corte de Contas (fl. 2-v).

Da análise dos fatos representados, foi determinada a realização de audiência[1] (fl. 73-v).

A audiência foi realizada, com informações colacionadas às fls. 93/114 (fl. 96).

Por derradeiro, auditores da DMU sugeriram decisão de irregularidade de um dos atos examinados, com aplicação de multa ao responsável (fls. 116/119).

Vieram-me os autos.

 

2 – MÉRITO

A Representação versa sobre possíveis irregularidades nas alterações orçamentárias efetuadas no Município de Palhoça, no exercício de 2015.

Conforme auditores da Diretoria de Controle dos Municípios - DMU, a Representação recai sobre dois pontos, a saber: - abertura de crédito adicional especial sem autorização específica; - abertura de crédito adicional suplementar por meio de transposição, remanejamento ou transferência de recursos sem autorização específica.

 

2.1 – Abertura de crédito adicional especial sem autorização legislativa específica

Por meio de consulta no Sistema e-Sfinge, auditores da DMU constataram que o Município de Palhoça realizou a abertura de crédito adicional especial, no montante de R$ 137.218,41, por meio do Decreto nº 1.769/2015, utilizando recursos de anulação de dotações orçamentárias.

Contudo, detectaram que não consta no referido sistema o texto relativo à alteração orçamentária, o que inviabiliza a verificação do seu fundamento legal, em atenção do disposto no art. 167, V, da Constituição.

O responsável, por meio de seus advogados, apresentou os seguintes esclarecimentos (fls. 93/95): - a abertura do crédito especial se deu por conta do saldo existente de crédito adicional aberto pela Lei nº 4.107, no final do exercício de 2014; - a utilização do referido saldo encontra guarida no art. 18 da Lei Orçamentária Anual - LOA do Município para o exercício de 2015.

O requerente encaminhou cópia dos documentos citados (fls. 97/114).

No tocante ao assunto, o art. 167, V, da Constituição estabelece o seguinte:

 

Art. 167. São vedados:

[...]

V - a abertura de crédito suplementar ou especial sem prévia autorização legislativa e sem indicação dos recursos correspondentes;

 

No caso em questão, o chefe do Poder Executivo do Município de Palhoça, por meio da Lei nº 4.107, de 26 de setembro de 2014,[2] ficou autorizado a abrir crédito especial, no montante de R$ 3.947.645,59, no orçamento do Instituto de Previdência daquele Município.

Para isso, indicou a importância, espécie do crédito e classificação da despesa, em consonância aos termos do art. 46 da Lei nº 4.320/64.[3]

No início do exercício de 2015, por meio do Decreto nº 1.769, de 4 de fevereiro de 2015, foi novamente aberto crédito adicional especial, no valor de R$ 137.218,41, por conta do saldo existente de crédito adicional aberto pela Lei nº 4.107/2014.

A Lei nº 4.320/64 dispõe que os créditos adicionais terão vigência adstrita ao exercício financeiro em que forem abertos, salvo expressa disposição legal em contrário, quanto aos especiais e extraordinários.[4]

No caso, a LOA do exercício de 2014,[5] em seu art. 18,[6] traz expressa autorização para a reabertura de créditos adicionais especiais e extraordinários no exercício seguinte.

Em face da comprovação de autorização legislativa para a abertura de crédito adicional especial por meio do Decreto nº 1.769/2015, resta afastado o apontamento.

 

2.2 - Abertura de crédito adicional suplementar, no montante de R$ 30.700.790.08, por meio de transposição, remanejamento ou transferência de recursos, sem autorização legislativa específica

Por meio de consulta aos dados do Sistema e-Sfinge, auditores do Tribunal verificaram a abertura de crédito adicional suplementar pelo Município de Palhoça, no exercício de 2015, utilizando recursos de anulação de dotações orçamentárias.

Para isso, foi utilizado transposição, remanejamento ou transferência de recursos orçamentários no montante de R$ 30.700.790,08, sem autorização legislativa, em contrariedade ao disposto no art. 167, VI, da Constituição.

O responsável alegou que a abertura do referido crédito adicional possui amparo na Lei nº 4.153/2014 – LOA de 2015, em seus arts. 1º e 17 (fls. 93/95):

 

Art. 1º Esta Lei estima a receita e fixa a despesa do Município de Palhoça para o Exercício Financeiro de 2015 na forma apresentada nos anexo, em R$ 545.243.250,00 (Quinhentos e quarenta e cinco milhões, duzentos e quarenta e três mil e duzentos e cinquenta reais), nos termos do art. 165, § 5º, da Constituição Federal, Lei Complementar nº 101 e da Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO, Lei nº 4.152, de 16 de dezembro de 2014, para o exercício de 2015 - e do PPA, Lei nº 3923/2013, Quadriênio 2013 a 2017, compreendendo:

I - O Orçamento Fiscal e da Seguridade Social do Município de Palhoça, referente aos Poderes, Legislativo e Executivo, incluídos os das Fundações, dos Fundos, e das Autarquias.

Parágrafo Único - A importância correspondente a 15% (quinze por cento) do total previsto no "caput" deste artigo, fica disponível para Abertura de Créditos Adicionais Especiais e Suplementares, a que se refere o artigo 17, em atendimento às necessidades da Prefeitura, dos Fundos, Autarquias e Fundações, em até 15% (Quinze por cento), da receita estimada consolidada do Município.

[...]

Art. 17 Fica o Chefe do Poder Executivo autorizado, mediante Decreto, a suplementar/remanejar dotações Orçamentárias, criar elementos de despesas, transferir de uma categoria econômica para outra, de um projeto/atividade para outro, de uma unidade/entidade para outra, abrir Créditos Adicionais Especiais e Suplementares, em atendimento às necessidades de suplementações e anulações do orçamento da Prefeitura, dos Fundos, Fundações, autarquias e Legislativo, em até 15% (quinze por cento), do total da receita estimada consolidada do Município, aprovada no Orçamento Fiscal e da Seguridade Social, para o exercício de 2015.

 

Auditores da DMU consideraram os argumentos apresentados insuficientes para afastar a irregularidade, sugerindo aplicação de multa ao responsável (fl. 118).

Os créditos suplementares destinam-se ao reforço de dotação orçamentária já existente.[7] Sua abertura depende da prévia existência de recursos disponíveis, sendo autorizados por lei e abertos por decreto executivo.[8]

A lei orçamentária poderá conter autorização para abertura de créditos suplementares até determinado limite.[9]

Quanto à transposição, remanejamento ou transferência de recursos, o art. 167, VI, da Constituição dispõe o seguinte:

 

Art. 167. São vedados:

[...]

VI - a transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para outro, sem prévia autorização legislativa;

 

Por categoria de programação entende-se a função, subfunção, programa, projeto/atividade/operação especial e as categorias econômicas de despesas.[10]

O mecanismo de créditos adicionais difere dos procedimentos de transposição, remanejamento e transferência de recursos orçamentários.

O fundamento para a abertura de créditos adicionais é a necessidade da existência de recursos; para a transposição, remanejamento ou transferência de recursos de uma dotação para outra ou de um órgão para outro, é a reprogramação por repriorização das ações governamentais.[11]

Trata-se da mudança na vontade do poder público no estabelecimento das prioridades na aplicação dos recursos públicos.

É indispensável para a transposição, remanejamento ou transferência de dotação que tudo ocorra por lei especial.

A metodologia no uso dos créditos adicionais não possui a mesma conotação e conceitos das transposições, remanejamentos e transferências por terem objetivos completamente diversos, ainda que tenham a realocação de recursos orçamentários como característica comum.[12]

A via do crédito adicional suplementar não possui restrição quando proveniente de recursos oriundos de superávit financeiro, excesso de arrecadação ou operações de crédito.[13]

O problema existe somente quando se faz realocação de recursos resultantes de anulação parcial ou total de dotações orçamentárias,[14] questão abordada no Processo nº CON-02/04993296 da Corte de Contas, que resultou no Prejulgado nº 1.312.[15]

O responsável alegou que as alterações orçamentárias realizadas possuíam prévia autorização legislativa, eis que amparadas na LOA para o exercício de 2015.

Todavia, na realidade, ocorreram transposições de recursos e não abertura de crédito suplementar (muito embora tenha se utilizado dessa nomenclatura na edição dos decretos à altura das fls. 6/71 dos autos).

A lei orçamentária anual, por força do art. 165, §8º, da Constituição, não pode conceder autorização para que o Executivo proceda a transposições, remanejamentos ou transferências.

A prévia autorização legal, a que se refere o art. 167, VI, da Constituição, deve ser concedida em cada caso em que seja necessária a transposição de recursos.

Assim, resta caracteriza a irregularidade do ato examinado.

 

3 – CONCLUSÃO

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas de Santa Catarina, com amparo na competência conferida pelo art. 108 da Lei Complementar nº 202/2000, manifesta-se pela adoção das seguintes providências:

3.1 - DECISÃO de IRREGULARIDADE, nos termos do art. 36, § 2º, a, da Lei Complementar nº 202/2000, do seguinte ato:

3.1.1 – Abertura de créditos adicionais suplementares no exercício de 2015 por meio de transposição, remanejamento ou transferência de recursos orçamentários de uma categoria de programação para outra, no montante de R$ 30.700.790,08, sem autorização legislativa específica, em desacordo com o disposto no art. 167, VI, da Constituição.

3.2 - APLICAÇÃO de MULTA ao Sr. Camilo Nazareno Pagani Martins, prefeito no exercício de 2015, nos termos do art. 70, II, da Lei Complementar nº 202/2000, pela prática da irregularidade acima descrita.

Florianópolis, 27 de março de 2018.

 

Aderson Flores

Procurador



[1] Ofício nº 10.397/2016 (fl. 85)

[2] Fls. 97/98.

[3] Art. 46. O ato que abrir crédito adicional indicará a importância, a espécie do mesmo e a classificação da despesa, até onde for possível.

[4] Art. 45

[5] O Responsável invocou a Lei nº 4.153/2014 (LOA para o exercício de 2015), mas no caso aplica-se a Lei nº 3.933, de 26 de dezembro de 2013 (LOA para o exercício de 2014).

[6] Art. 18 Os saldos provenientes dos créditos adicionais especiais e extraordinários, abertos nos últimos 4 (quatro) meses do exercício, podem ser reabertos para o exercício seguinte, mediante ato do Chefe do Poder Executivo Municipal, conforme dispositivos da Lei Federal nº 4.320/64.

[7] Art. 41, I, da Lei nº 4.320/64.

[8] Art. 42 c/c art. 43 da Lei nº 4.320/64.

[9] Art. 7º, I, da Lei nº 4.320/64.

[10] Portaria nº 42, de 14 de abril de 1999.

[11] MACHADO JR, José Teixeira; REIS, Heraldo da Costa. A Lei 4.320 comentada. 30ª ed. Rio de Janeiro: IBAM, 2000/2001.

[12] MACHADO JR, José Teixeira; REIS, Heraldo da Costa. A Lei 4.320 comentada. 30ª ed. Rio de Janeiro: IBAM, 2000/2001.

[13] Art. 43, § 1º, I, II e IV, da Lei nº 4.320/64.

[14] Art. 43, § 1º, III, da Lei nº 4.320/64.

[15] Prejulgado: 1312

1. Os créditos suplementares e especiais necessitam de autorização legislativa através de lei de iniciativa do Chefe do Poder Executivo, devendo a abertura se dar através de decreto do Executivo, mediante prévia exposição justificativa e indicação da origem dos recursos correspondentes. Pode haver autorização na Lei Orçamentária Anual, conforme arts. 165, §8º, da Constituição Federal e 7º, I, da Lei nº 4.320/64, somente para as hipóteses de superávit financeiro do exercício anterior, excesso de arrecadação e operações de crédito, sendo irregulares as autorizações na Lei Orçamentária Anual para as suplementações cujos recursos sejam resultantes de anulação parcial ou total de dotações orçamentárias, de que trata o art. 43, III, da Lei nº 4.320/64.

2. A transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para outro, de que trata o art. 167, VI, da Constituição Federal, devem ocorrer mediante prévia autorização legislativa específica, sendo incabível previsão neste sentido na Lei Orçamentária Anual.