Parecer
nº: |
MPC/54.304/2018 |
Processo
nº: |
REP 15/00319985 |
Origem: |
Município de Guaramirim |
Assunto: Numeração
Única: |
Irregularidades
concernentes ao Convite nº 12/2013, contrato e aditivos decorrentes, para
serviços de assessoria contábil nos exercícios de 2013 a 2015. MPC-SC 2.3/2018.650 |
Trata-se de representação autuada por
ordem do Conselheiro Supervisor da Ouvidoria do Tribunal de Contas, com origem
na Comunicação nº 135/2015 (fl. 02), versando acerca de supostas
irregularidades no processo licitatório Convite nº 12/2013, que
resultou no Contrato nº 05/2013, celebrado entre o Município de Guaramirim e a
empresa SCPLANEJ Consultoria e Assessoria Pública Ltda.
A Diretoria de Licitações e Contratações, por
meio do relatório nº 330/2015, sugeriu conhecer a representação e realizar a
audiência do responsável para se manifestar acerca: i) da utilização de
modalidade licitatória inadequada para contratação de serviços de assessoria e
consultoria em contabilidade pública; ii) da prorrogação indevida do contrato
oriundo desta; iii) da contratação de serviços de assessoria e consultoria na
área contábil sem a realização de processo licitatório (fls. 589-597).
Em seguida, manifestei-me no sentido de
acompanhar parcialmente o encaminhamento proposto pela Diretoria, acrescentando
a necessidade de realizar audiência do responsável em relação à contratação de
pessoal para a prestação de serviços de contabilidade, que deveriam ser
desempenhados por servidores do quadro municipal (fls. 599-603).
O Relator, na sequência, decidiu pelo
conhecimento da representação e determinou a audiência do responsável, apenas
ressalvando a impossibilidade de apuração da irregularidade apontada por este
órgão ministerial, tendo em vista o disposto no art. 65, § 2º, c/c art. 66, ambos
da Lei Complementar nº 202/00[1]
(fls. 604-607).
Devidamente notificado, o responsável juntou
as suas justificativas às fls. 612-625.
Após, a Diretoria de Controle de Licitações e
Contratações elaborou o relatório de reinstrução nº 298/2016, com as seguintes
sugestões ao Relator (fls. 627-632):
3.1. Considerar procedente, nos termos do art. 27, Parágrafo
Único, da IN nº TC – 0021/2015, o mérito da representação, que trata de
irregularidades no Convite 12/2013 (Contrato nº 05/2013 e aditivos dos exercícios
de 2013 e 2014), da Prefeitura Municipal de Guaramirim.
3.2. Aplicar multa ao Sr. Lauro Fröhlich, Prefeito Municipal
de Guaramirim, CPF nº 247.165.969-15, com endereço na Rua 28 de Agosto, 2042 -
Centro, CEP: 89270-000, Guaramirim, SC, com fundamento no art. 70, II, da Lei
Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000, c/c o art. 109, II, do
Regimento Interno (Resolução nº TC-06, de 28 de dezembro de 2001), fixando-lhe
o prazo de 30 dias a contar da publicação do Acórdão no Diário Oficial
Eletrônico - DOTC-e, para comprovar ao Tribunal de Contas o recolhimento ao
Tesouro do Estado da multa cominada, sem o que, fica desde logo autorizado o
encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts.
43, II, e 71 da citada Lei Complementar em face de:
3.2.1. Utilização de modalidade licitatória
inadequada para contratação de empresa especializada para prestação de
assessoria e consultoria em contabilidade pública, nos exercícios de 2013 a
2014 pela Prefeitura Municipal de Guaramirim, Convite 12/2013, Contrato 05/2013
e Aditivos, cuja soma ultrapassou o limite para a modalidade realizada,
contrariando os arts. 8º; 15, §7º, II; e 23, §§ 3º e 5º, da Lei 8666/93. (item
2.1 deste relatório)
3.2.2. Prorrogação indevida do Contrato 05/2013,
atinente à Contratação de empresa especializada para prestação de assessoria e
consultoria em contabilidade pública, com fulcro na categoria de serviços de
natureza continuada, em desacordo ao disposto no art. 57, II, da Lei nº
8.666/1993 (item 2.2 deste relatório)
3.2.3. Realização de despesas com Assessoria - da
empresa SCPLANEJ – Consultoria e Assessoria Pública Ltda., no montante de R$
106.584,64, sem a realização de processo licitatório, evidenciando afronta à
Constituição Federal, artigo 37, XXI, e ao artigo 2º da Lei 8666/93. (item 2.3
deste relatório).
É
o relatório.
1.
Das
alegações do responsável
Em
sua defesa, o responsável sustentou que, ao assumir a gestão do Município de
Guaramirim em 2013, encontrou diversas dificuldades, salientando o alto nível
de endividamento e a contabilidade atrasada. Discorreu sobre a existência de
desentendimentos com a gestão anterior, especialmente em relação ao servidor
efetivo responsável pelo setor contábil durante aquele período.
Por
conta disso, passou a tratar sobre a contabilidade do Município com outra
servidora, também efetiva no cargo de contador. Contudo, o responsável entendeu
que a servidora concursada não possuía experiência suficiente para atender a
todas as necessidades da Administração, sobretudo por se encontrar no período
de estágio probatório.
Diante
desses fatos e da necessidade de apresentação do Projeto da Lei de Diretrizes
Orçamentárias à Câmara Municipal, o responsável resolveu proceder à contratação
de empresa especializada por meio do Convite nº 012/2013.
Em
adição, disse que a deflagração do procedimento licitatório e a prorrogação do
contrato celebrado foram corroboradas por pareceres jurídicos oriundos da
Procuradoria-Geral do Município de Guaramirim[2].
Acerca
da prorrogação do Contrato nº 05/2013, o responsável justificou a sua decisão,
novamente, arguindo a falta de experiência da servidora no cargo público de
contador e em virtude de desentendimentos com o outro servidor do setor
contábil, assim se manifestando (fls. 615-616):
Experiência não se
adquire em um pequeno espaço temporal. Chegada à fase final da vigência
contratual, constatou-se que os trabalhos realizados pela Servidora Fernanda
ainda não eram suficientes para o bom andamento da administração municipal.
Diga-se que o outro
contador, causador de atraso dos serviços contábeis e outros fatos, estava
sendo submetido ao trabalho de levantamento de responsabilidades que culminou
com o encaminhamento de Tomada de Contas Especial. Evidente que não teria com
confiar no trabalho de tamanha importância e responsabilidade a este (ocupante
do quadro de pessoal permanente deste Munícipio).
Ora, também sabemos
que os servidores municipais contam com o advento da estabilidade e qualquer
ato em sentido contrário, ensejaria a elaboração de processos administrativos
específicos e demorados. Surge evidente e comprovado que não tinha naquele
momento possibilidade de contar de forma adequada com os serviços dos
servidores do quadro efetivo, surgindo nossa necessidade de continuação dos
serviços e não caracterizada a afronta ao art. 37, incisos II e V da
Constituição Federal/88.
Ainda,
argumentou que a prorrogação do contrato somente ocorreu após pesquisa de
mercado, por meio da realização de três orçamentos. No mais, alegou que os
serviços prestados eram de natureza contínua e a sua interrupção poderia
comprometer a continuidade das atividades essenciais para a Administração
Municipal.
Em
relação à modalidade de licitação escolhida, afirmou que não se pode utilizar a
soma dos valores despendidos com o contrato e os seus termos aditivos para
classificá-la como imprópria.
Nesse
sentido, destacou que observou a orientação do TCE divulgada do XVI Ciclo de
Estudos de Controle Público da Administração Municipal, que assim dispõe:
1.13 OS ACRÉSCIMOS
CONTRATUAIS ESTÃO LIMITADOS AO VALOR RELACIONADO COM A MODALIDADE LICITATÓRIA
DO CONTRATO?
Não há ressalva legal
ou doutrinária nesse sentido. Os acréscimos no valor inicial autorizado do
contrato não estão limitados em função da modalidade licitatória.
Ressalta-se, contudo,
que a necessidade de acréscimo contratual deve ter surgido depois de finalizado
o procedimento licitatório, de modo a não caracterizar deficiência de
planejamento.
Quanto
às despesas realizadas pelos Fundos de Saúde e de Assistência Social do Município
com a contratação da empresa SCPLANEJ, argumentou que se trata de unidades
gestoras específicas e que possuem autonomia orçamentária e financeira.
Em
razão disso, segundo o responsável, os valores desembolsados por esses entes
não podem ser somados ao montante despendido pela Prefeitura Municipal de
Guaramirim para aferir o cumprimento dos limites das modalidades de licitação
previstas na Lei nº 8.666/93.
Por
fim, ressalvou que, ao contrário do que consta no item 2.3 do relatório técnico
nº 330/2015, a despesa efetuada pelos Fundos não abrangeu o serviço de
assessoria jurídica, mas a contratação de empresa especializada em assessoria e
consultoria em contabilidade pública.
Por
oportuno, registre-se que, de fato, as possíveis irregularidades não abrangem a
realização de despesa com serviços de assessoria jurídica, estando apenas
relacionadas à contratação de empresa especializada na área contábil.
2.
Dos
apontamentos restritivos examinados
2.1.
Da
utilização de modalidade licitatória inadequada para contratação de empresa
especializada na prestação de consultoria e assessoria em contabilidade
pública, nos exercícios de 2013 e 2014
Ao
compulsar os autos, observo que o Edital de Convite nº 12/2013 está eivado de
irregularidades que vão desde a incorreção na escolha da modalidade licitatória
até a falta de motivação idônea para respaldar o lançamento do certame.
Ainda
que o Relator tenha se posicionado no sentido de não conhecer o apontamento
formulado por este órgão ministerial acerca de possível irregularidade caracterizada
pela terceirização de serviços de contabilidade, cabe tecer alguns comentários
sobre o assunto.
A
irregularidade ora em análise cinge-se a verificar se os valores totais
despendidos pelo Município de Guaramirim para a contratação de serviços especializados
em contabilidade estão em consonância com a modalidade licitatória escolhida.
Ocorre
que, no meu entender, não só é inadequada a modalidade de licitação, como
também é despropositado deflagrar esse tipo de procedimento para contratação de
serviços que deveriam ser prestados pelo quadro de pessoal próprio do
Município, formado a partir de concurso público, nos termos do art. 37, II, da
Constituição Federal.
No
meu sentir, portanto, a irregularidade não se resume à modalidade inadequada
para realizar o certame, representando também verdadeira burla ao instituto do
concurso público.
Aliás,
o Município de Guaramirim tem ciência do mandamento constitucional e dispõe de
servidor público efetivo na área contábil – fato confirmado pelo próprio
responsável.
No
entanto, o gestor público alegou, como motivação para o lançamento do Convite
nº 12/2013, que enfrentou dificuldades com o quadro de pessoal da Prefeitura
Municipal de Guaramirim.
Nesse
rumo, a justificativa foi de que um dos servidores da área contábil estava no
período de estágio probatório, não dispondo da experiência necessária para a
prestação do serviço, e o outro servidor, ocupante da mesma função, possuía
desentendimentos com a atual Administração do Município.
A
meu ver, os fundamentos apresentados de forma alguma autorizam a contratação de
empresa para prestação de serviços que fazem parte das atribuições basilares da
Administração Pública.
A
propósito, admite-se apenas em situações excepcionais e temporárias a
contratação de terceiros para o desenvolvimento de atividade fim da
Administração Pública; porém, nenhuma dessas hipóteses está presente no caso
concreto, já que a Prefeitura Municipal de Guaramirim possui no seu quadro ao
menos dois servidores especializados na área contábil.
O
alegado desentendimento com o servidor efetivo deve ser resolvido no âmbito
administrativo. Inclusive, se necessário, por meio de Processo Administrativo
Disciplinar, no caso de haver indícios de descumprimento do seu dever
funcional.
Em
relação à servidora efetiva, o fato de estar no período de estágio probatório,
no meu sentir, não se traduz em empecilho para o desempenho de suas obrigações
a ponto de exigir a contratação de empresa especializada, até porque ela passou
por um processo rigoroso de seleção para ocupar um cargo afeto à sua área de
formação.
Feitas
essas considerações e ressalvada a impossibilidade de aplicação de multa ao
responsável – tendo em vista que tal apontamento não foi objeto de audiência –
importa examinar a questão relativa à modalidade licitatória adotada.
A
Prefeitura Municipal de Guaramirim deflagrou processo licitatório,
materializado por meio do Convite nº 12/2013, para a contratação de assessoria
e consultoria em contabilidade pública, nos exercícios de 2013 e 2014.
Nesse
contexto, a empresa SCPLANEJ – Consultoria e Assessoria Pública Ltda.
apresentou a proposta mais vantajosa à Administração Pública, a qual foi
homologada, culminando na celebração do Contrato nº 05/2013, em 07/03/2013[3].
O
valor do objeto inicialmente contratado respeitou os limites estabelecidos para
a modalidade de licitação escolhida, conforme o preceituado no art. 23, II, a,
da Lei nº 8.666/93.
Contudo,
no decorrer da execução do contrato, dois termos aditivos foram firmados,
representando um aumento expressivo no valor devido pelo Município de
Guaramirim à empresa vencedora, sendo empenhado em seu favor, durante os
exercícios de 2013 e 2014, o montante de R$ 158.284,64[4].
Cumpre
destacar que o primeiro termo aditivo foi celebrado em 20/12/2013, no valor de
R$ 59.000,00[5], e o
segundo, firmado em 19/09/2014, gerou nova despesa no montante de R$ 62.749,32[6].
Ademais,
à época da elaboração do primeiro relatório técnico, apurou-se que houve o
empenho do valor de R$ 129.284,64[7]
pela unidade gestora Prefeitura Municipal, do montante de R$ 15.100,00 pela
unidade gestora Fundo de Saúde e da quantia de R$ 13.900,00 pela unidade
gestora Fundo Municipal de Assistência Social.
Feitas
as devidas considerações e após examinar as justificativas apresentadas pelo
responsável, entendo que estas não são suficientes para afastar o apontamento.
Isso
porque o valor total despendido pela Administração Pública Municipal superou em
muito o limite previsto para a modalidade de licitação escolhida (convite).
Salienta-se,
ademais, que o responsável deveria ter considerado as possíveis prorrogações do
contrato no momento da escolha da modalidade de licitação.
Nesse
sentido, a propósito, é o entendimento do Tribunal de Contas da União:
O valor a ser
considerando para definir a modalidade de licitação é o valor total do
contrato, incluindo-se as possíveis prorrogações.[8]
Dessa
forma, conclui-se que o valor total do objeto contratado é incompatível com a
modalidade licitatória eleita pelo gestor público.
No
tocante à orientação do Tribunal de Contas Estadual citada pelo responsável,
cabe esclarecer que a matéria discutida naquela oportunidade não se confunde
com a analisada neste feito.
O
aludido entendimento dispõe sobre a hipótese de alteração qualitativa ou
quantitativa do contrato dentro dos limites estabelecidos pelo art. 65, § 1º,
da Lei nº 8.666/93[9]. Isto é,
são alterações dos valores no curso da execução do contrato, autorizadas tão
somente nas hipóteses previstas no citado dispositivo.
Portanto,
como bem assinalou a área técnica, a orientação trazida pelo responsável não se
aplica ao caso concreto, uma vez que a irregularidade em comento versa
especificamente sobre a incompatibilidade entre a modalidade de licitação
escolhida e o valor total do objeto contratado, incluindo suas prorrogações, as
quais se mostraram, inclusive, indevidas.
Nesse
sentido, tem-se a orientação disposta no Prejulgado nº 1354:
1. A definição da
modalidade licitatória, utilizando-se do critério econômico da contratação,
deve considerar o valor total a ser despendido pela Administração Pública com o
bem ou a utilidade (serviço), ainda que sua execução ultrapasse o exercício
financeiro.
2. Nos contratos de
prestação de serviços de natureza continuada ou aluguéis, em que se aplica o
art. 57, II e IV, da Lei Federal nº 8.666/93, a escolha da modalidade deve
levar em consideração o total da contratação, incluídas as possíveis
prorrogações previstas no edital e na minuta do contrato.
[...]
Por
fim, é consabido que a presença de pareceres técnicos para sustentar a
legalidade da licitação não exclui a responsabilidade do gestor público.
O
Tribunal de Contas da União, inclusive, compartilha do mesmo posicionamento,
conforme demonstra o seguinte enunciado:
Os pareceres técnico
e jurídico favoráveis a determinado ajuste não retiram a responsabilidade do
administrador público pela prática de ato irregular, uma vez que cabe ao
gestor, em última instância, decidir sobre a legalidade, a conveniência e a
oportunidade de efetivar as avenças sob sua administração, especialmente
aquelas que vão gerar pagamentos em favor do particular.[10]
Desse
modo, concluo que as justificativas apresentadas pelo responsável não são o
bastante para afastar o apontamento de restrição em comento.
2.2.
Prorrogação
indevida do Contrato nº 05/2013, com fundamento no art. 57, II, da Lei nº
8.666/93 - serviço de natureza continuada
O
responsável justificou a prorrogação do Contrato nº 05/2013 com base nas
seguintes razões: a) falta de experiência da servidora efetiva da área contábil
do Município; b) desentendimentos com o outro servidor efetivo ocupante do
cargo de contador; c) parecer jurídico favorável à prorrogação; e d) serviço de
natureza continuada.
Quanto
aos três primeiros argumentos, reitero que estes não são suficientes para
justificar a celebração do contrato, tampouco a sua prorrogação, conforme
explicitado no tópico acima.
No
que tange à última justificativa, o responsável alega que a prorrogação do
contrato é permitida em decorrência da natureza contínua das atividades
desenvolvidas, enquadrando-se a situação em tela no disposto no art. 57, II, da
Lei nº 8.666/93.
Ademais,
acrescentou que a interrupção dos serviços após o término do período contratual
poderia comprometer a continuidade das atividades essenciais desenvolvidas pela
Administração Pública Municipal.
Todavia,
entendo que os serviços de consultoria contábil não permitem a prorrogação
contratual realizada pelo responsável.
Aliás,
corroborando a impossibilidade de prorrogação dos termos contratuais em
serviços dessa natureza, colaciona-se o seguinte Prejulgado do Tribunal de
Contas Estadual:
Prejulgado nº 923:
1. Nos termos do art.
57, II, da Lei Federal nº 8.666/93, com redação da Lei 9.648/98, a prorrogação
sucessiva de contratos administrativos, por até 60 meses, quando expressamente
previsto no instrumento convocatório, só é permitida para os contratos de
serviços contínuos, neles não se
enquadrando os serviços de consultoria jurídica, de assessoria administrativa ou de auditoria. [...]
Em
que pese o dispositivo fazer menção apenas à consultoria jurídica, entendo que
o mesmo raciocínio se aplique à consultoria contábil.
Ademais,
pondero que o término do contrato celebrado não prejudicaria a continuidade dos
serviços, notadamente porque o Município de Guaramirim conta com quadro de
pessoal devidamente constituído para o desenvolvimento das atividades
relacionadas à assessoria contábil.
Assim,
reitera-se que, muito embora não seja objeto de apuração no presente feito, a
meu ver, houve irregularidade na própria contratação de pessoal, sem prévio concurso
público, para o desempenho das referidas atividades.
Para
arrematar, caso fosse realmente imprescindível o lançamento de edital de
licitação para a contratação dos serviços em comento, o gestor público deveria
ao menos ter definido os objetivos e, sobretudo, delimitado o prazo para a
realização dos trabalhos.
Logo,
concluo que as justificativas do responsável não são capazes de rechaçar a
restrição apontada pela área técnica.
2.3.
Realização
de despesa pelos Fundos de Saúde e de Assistência Social do Município de
Guaramirim, em decorrência dos termos aditivos relativos ao Contrato nº
05/2013, não abarcados inicialmente pelo objeto do procedimento licitatório nº
12/2013, caracterizando contratação sem licitação
Inicialmente,
cabe frisar que o valor total despendido com a contratação da Empresa SCPLANEJ
alcançou o montante de R$ 158.284,64, tendo em vista a celebração do Contrato
nº 05/2013 e de dois termos aditivos.
Os
dados extraídos do Sistema e-Sfinge e do Portal da Transparência do Município
de Guaramirim[11]
evidenciaram que parte do valor que saiu dos cofres públicos, especialmente em
relação aos aditivos contratuais, foi absorvido pela receita orçamentária
destinada aos Fundos Municipais de Saúde e de Assistência Social.
Houve,
especificamente, o empenho de R$ 15.100,00 pelo Fundo Municipal de Saúde e de
R$ 13.900,00 pelo Fundo Municipal de Assistência Social em favor da empresa
SCPLANEJ.
Ao
contrário do que sustenta o responsável, entendo que os referidos fundos estão
vinculados à Administração Direta do Município, notadamente pelo fato de não
possuírem personalidade jurídica própria.
Com
base nessa premissa, a gestão dos Fundos não pode ser considerada independente.
As decisões tomadas por esses entes despersonalizados são de responsabilidade
do então Prefeito Municipal, não configurando, de modo algum, atos próprios.
Aliás,
o fato de o então Prefeito Municipal ter assinado os termos aditivos reforça a
sua responsabilidade no caso concreto.
Corroborando
esse raciocínio, colhe-se do Tribunal de Contas de Santa Catarina os seguintes
Prejulgados:
Prejulgado nº 1725
1. Os Fundos
Municipais de Saúde, que não possuem personalidade jurídica própria, não podem
instituir comissão de licitação ou presidi-la, cabendo tal função ou
competência à entidade instituidora.
Prejulgado nº 2099
1. A inscrição do
Fundo Municipal de Saúde no CNPJ, tanto na condição de matriz como na condição
de filial, não confere personalidade jurídica ao fundo, seja pelo conjunto
normativo constitucional e infraconstitucional no qual está inserido o fundo,
seja pelo que se depreende do art. 41 do Código Civil, segundo o qual a criação
de pessoa jurídica de direito público interno deve se dar mediante lei;
2. Tendo em vista que
a exigência de inscrição dos fundos no CNPJ não lhes confere personalidade
jurídica, o Fundo Municipal de Saúde pode utilizar a estrutura administrativa
do ente ao qual é subordinado tanto no que se refere ao quadro de pessoal como
no concernente a licitações e contratações; [...]
Logo,
a despesa total com a contratação da empresa SCPLANEJ não pode ser dividida
entre a Prefeitura Municipal de Guaramirim e os Fundos de Saúde e de
Assistência Social com o objetivo de demonstrar que os limites da Lei nº
8.666/93 foram atendidos.
Além disso, mesmo que considerados somente os
empenhos efetuados pela Prefeitura Municipal (excluídos os fundos), no valor de
R$ 129.284,64, o limite previsto para a adoção da modalidade convite acabou
superado do mesmo modo, subsistindo, portanto, o apontamento restritivo
concernente à modalidade inadequada.
Registradas
essas observações, cabe pontuar que a ausência de personalidade jurídica não
autoriza que a Prefeitura Municipal, por meio de termos aditivos, estenda o
objeto contratual oriundo do Convite nº 12/2013 aos Fundos. Assim, no que concerne
aos serviços executados que ultrapassaram os limites previstos no edital,
restou caracterizada a contratação sem licitação.
Nesse
contexto, na hipótese de ser imprescindível a contratação de empresa da área
contábil (o que não se defende no presente caso), o instrumento convocatório
deveria abarcar os fundos, apresentando ainda a devida justificativa da
contratação, com a delimitação do objeto e o prazo para o seu cumprimento.
Não
se pode olvidar que a situação retratada acima é permitida apenas em situação
excepcional, pois, conforme já assinalado, os serviços dessa natureza fazem
parte das atribuições da Administração Pública Municipal, que deve realizar a
contratação de pessoal mediante concurso público.
Forçoso
concluir, portanto, que está configurada a irregularidade em decorrência dos
Fundos de Saúde e de Assistência Social terem suportado despesa para a
prestação de serviços de assessoria e consultoria em contabilidade pública sem
que houvesse procedimento licitatório dando respaldo à contratação.
3.
Da necessidade
de remessa das informações contidas nestes autos ao Ministério Público Estadual
- MPSC
Em
virtude de duas situações que exsurgiram após a análise do caso concreto,
entende-se que as informações contidas nestes autos devem ser encaminhadas ao
Ministério Público Estadual - MPSC.
A
primeira delas diz respeito às restrições imputadas ao Sr. Lauro Fröhlich neste
feito, que são passíveis de configurar hipoteticamente conduta criminosa
prevista na Lei nº 8.666/93, bem como ato de improbidade administrativa
disposto na Lei nº 8.429/92.
Nesse
contexto, cabe destacar os dispositivos da Lei nº 8.666/93 que tipificam, ao
menos em tese, as ações perpetradas pelo responsável:
Art. 89. Dispensar ou
inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar
as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade:
Pena - detenção, de 3 (três) a
5 (cinco) anos, e multa.
Art. 90. Frustrar ou fraudar,
mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo
do procedimento licitatório, com o intuito de obter, para si ou para outrem,
vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação:
Pena - detenção, de 2 (dois) a
4 (quatro) anos, e multa.
Art. 92. Admitir,
possibilitar ou dar causa a qualquer modificação ou vantagem, inclusive
prorrogação contratual, em favor do adjudicatário, durante a execução dos
contratos celebrados com o Poder Público, sem autorização em lei, no ato
convocatório da licitação ou nos respectivos instrumentos contratuais, ou,
ainda, pagar fatura com preterição da ordem cronológica de sua exigibilidade,
observado o disposto no art. 121 desta Lei:
Pena - detenção, de dois a
quatro anos, e multa.
Em
relação ao ato de improbidade administrativa, a conduta do responsável pode, em
tese, ser enquadrada no seguinte dispositivo da Lei nº 8.429/92:
Art. 11. Constitui
ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da
administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de
honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e
notadamente: [...]
A
segunda situação decorre das empresas que participaram do processo licitatório
Convite nº 12/2013. A começar pela SCPLANEJ Consultoria e Assessoria Pública
Ltda., de propriedade do Sr. Rubens Tives, que se sagrou vencedora do certame.
Atualmente,
o proprietário da referida empresa é parte na Ação Civil Pública nº 0900105-38.2017.8.24.0025,
proposta pelo Ministério Público Estadual perante a 2ª Vara Cível de Gaspar, para
apurar a prática de ato de improbidade administrativa, caracterizado pela burla
a procedimentos licitatórios deflagrados em diversos Municípios catarinenses.
Conforme
o Termo de Informação redigido por este órgão ministerial e que instruiu parte
da demanda judicial citada acima, a possível fraude apurada na Justiça Comum
ocorreu a partir do conluio formado entre as empresas Tives Consultoria e
Assessoria Pública Ltda. (atual SCPLANEJ Consultoria e Assessoria Pública Ltda.),
ACP Assessoria Controle e Planejamento Contábil Ltda. ME e a LLN Consultoria
Governamental Ltda., que participaram de forma simultânea de pelo menos 26
certames, entre os anos de 2006 e 2011.
Ao
analisar com cautela a documentação relativa ao Convite nº 12/2013, deflagrado
pelo Município de Guaramirim, verifico que as três empresas participantes do certame
são exatamente as mesmas que, ao lado dos respectivos proprietários, também estão
no polo passivo da Ação Civil Pública movida pelo Ministério Público Estadual na
Comarca de Gaspar.
Sublinhe-se
que, dentre outros documentos, a participação das empresas em questão está
registrada na Ata de Abertura e Julgamento de Propostas (fl. 316).
Posto
isso, a meu ver, existem indícios contundentes de que um possível conluio entre
as respectivas empresas também ocorreu no processo licitatório ora em análise.
Por
essa razão, concluo ser imperioso proceder ao encaminhamento das informações
contidas nestes autos ao Ministério Público Estadual – MPSC, a fim de que possa
tomar as providências que entender cabíveis tanto em relação às condutas
perpetradas pelo Sr. Lauro Fröhlich como também em face da possível fraude
praticada pelas empresas participantes do Convite nº 12/2013.
Ante
o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida
pelo art. 108, incisos I e II, da Lei Complementar no 202/2000,
manifesta-se por:
1)
considerar procedente o mérito da
representação e aplicar multas ao Sr. Lauro Fröhlich, ex-Prefeito Municipal de
Guaramirim, em razão da:
1.1)
utilização de modalidade de licitação
incompatível com o valor do objeto para a contratação de empresa especializada
na prestação de assessoria e consultoria em contabilidade pública, em afronta
aos arts. 8º, 15, § 7º, II e 23, §§ 3º e 5º, da Lei nº 8.666/93;
1.2)
prorrogação do Contrato nº 05/2013 em
desacordo com o art. 57, II, da Lei nº 8.666/93;
1.3)
realização de despesas com serviços de
assessoria e consultoria na área contábil, por meio de Fundos pertencentes ao
Município de Guaramirim, sem estar previsto no procedimento licitatório
deflagrado, caracterizando contratação sem licitação, em afronta ao art. 37,
XXI, da CRFB/88 e ao art. 2º da Lei nº 8.666/93;
2)
pela
remessa imediata das informações que instruem estes autos ao Ministério Público
Estadual - MPSC, possibilitando àquele órgão tomar as providências que entender
cabíveis, especialmente em face da possível prática de crimes previstos na Lei
nº 8.666/93, bem como de ato de improbidade administrativa preceituado no art.
11 da Lei nº 8.429/92, nos termos analisados no item 3 deste parecer.
Florianópolis, 26 de março de 2018.
Diogo Roberto Ringenberg
[1] Art. 65. Qualquer
cidadão, partido político, associação ou sindicato é parte legítima para
denunciar irregularidades ou ilegalidades perante o Tribunal de Contas do
Estado.
[...]
§ 2º Nos processos de denúncia, a ação
do Tribunal de Contas restringir-se-á à apuração do fato denunciado,
fundamentando-se na documentação disponível no Tribunal de Contas ou coletada
in loco, e na legislação vigente à época do fato.
[...]
Art. 66. Serão recepcionados pelo
Tribunal como representação os expedientes formulados por agentes públicos
comunicando a ocorrência de irregularidades de que tenham conhecimento em
virtude do exercício do cargo, emprego ou função, bem como os expedientes de
outras origens que devam revestir-se dessa forma, por força de lei específica.
[2] Fls. 234 e 398-399
[3] Fls. 324-331
[4] Destaca-se que a área
técnica, à época, apurou o montante de R$ 165.584,64 a partir dos dados
extraídos do Sistema e-Sfinge do Tribunal de Contas do Estado de Santa
Catarina. No entanto, o corpo instrutivo considerou no seu cálculo o valor de
R$ 7.300,00, referente a serviços de consultoria de apoio ao controle interno,
prestados pela mesma empresa. Entendo, no entanto, que esses serviços não se
confundem com o objeto do presente feito, que trata do exame de contratação de
serviços de consultoria na área de contabilidade.
[5] Fls. 236-237
[6] Fls. 347-349
[7] Desconsiderando-se o
valor de R$ 7.300,00, referente aos serviços especializados no apoio ao
controle interno municipal, prestados pela mesma empresa que celebrou o
Contrato nº 05/2013.
[8] BRASIL, Tribunal de
Contas da União. Acórdão nº 1625/2009. Plenário. Rel. José Jorge. J. em: 22 jul. 2009. Disponível em: www.tcu.gov.br.
[9] Art. 65. Os contratos
regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos
seguintes casos:
[...]
§ 1o O
contratado fica obrigado a aceitar, nas mesmas condições contratuais, os
acréscimos ou supressões que se fizerem nas obras, serviços ou compras, até 25%
(vinte e cinco por cento) do valor inicial atualizado do contrato, e, no
caso particular de reforma de edifício ou de equipamento, até o limite de 50%
(cinqüenta por cento) para os seus acréscimos.
[10] BRASIL, Tribunal de
Contas da União. Acórdão nº 9912/2016. Segunda Câmara. Rel. Marcos
Bemquerer. J. em: 30 ago. 2016.
Disponível em: www.tcu.gov.br.