Parecer
nº: |
MPC/DRR/56.298/2018 |
Processo
nº: |
TCE 11/00135496 |
Origem: |
Fundo Municipal de Saúde de Lages |
Assunto: |
Auditoria sobre a regularidade das despesas realizadas com Ações e Serviços de Saúde no exercício de 2010 |
Número
Unificado: |
MPC-SC
2.3/2018.1163 |
Trata-se de Tomada de Contas Especial oriunda da conversão dos autos RLA 11/00135496, que foram formados a partir da realização de auditoria in loco no Fundo Municipal de Saúde de Lages, a fim de analisar as ações e serviços de saúde referentes ao exercício de 2010.
Após a regular instrução do feito, a área técnica sugeriu, mediante o relatório nº 4.501/2011, julgar irregulares, com imputação de débito, as contas referentes à presente Tomada de Contas Especial (fls. 538-589).
O Ministério Público de Contas, às fls. 591-596, seguiu o posicionamento da área técnica.
Na sequência, o Relator noticiou o falecimento do Sr. Renato Nunes de Oliveira, um dos envolvidos que figurava como responsável no presente feito, determinando o chamamento aos autos do seu espólio, na pessoa da inventariante, Sra. Juracy Terezinha Valcanaia, ante a possibilidade de imputação de débito ao então Prefeito Municipal de Lages. Em adição, determinou a citação dos demais responsáveis para que prestassem informações sobre as conclusões obtidas e as eventuais sanções aplicadas no processo de sindicância instaurado para apurar as irregularidades tratadas nestes autos (fls. 600-601).
Às fls. 623-979, o Sr. Francisco Ramos Martins veio aos autos e juntou novas justificativas.
Às fls. 997-1003, o Sr. Juliano Polese Branco e os representantes do espólio do Sr. Renato Nunes de Oliveira apresentaram razões de defesa.
O Município de Lages encaminhou a documentação de fls. 1009-1733.
Por meio do relatório nº 70/2017, a área técnica sugeriu ao Relator (fls. 1735-1746):
3.1 - CONHECER do
presente Relatório de Reinstrução, AVOCANDO-SE AS Razões de Decidir do
Relatório de Reinstrução nº 4.501/2011, ambos decorrente do Relatório de
Inspeção nº 1.158/2011, resultante da inspeção in loco realizada na Fundo
Municipal de Saúde de Lages/SC, para, no mérito:
3.2 - JULGAR IRREGULARES com débito, na forma do artigo 18, inciso III, alínea “c” c/c o
artigo 21 caput da Lei Complementar n.º 202/2000, as contas referentes à
presente Tomada de Contas Especial e condenar, caso a caso, os responsáveis, Sr. Renato Nunes de Oliveira, falecido, por seu espólio, na pessoa de sua
inventariante Sra. Juracy Terezinha
Valcanaia, CPF 384.519.809-53,
residente na Rua Paraguai nº 165, Bairro Frei Rogério, Lages, SC, CEP
88508-260; Sr. Juliano Polese Branco, Secretário de Saúde do Município de Lages no
exercício de 2010, CPF 944.911.519-20, residente à Rua Pará, nº 141, Ap 201,
Bairro São Cristóvão, Lages, SC; e Sr. Francisco Ramos
Martins, Controlador Interno
Municipal, CPF 003.949.479-91, residente na Rua Frei Justino, nº 140, Centro,
Lages, SC, ao pagamento das quantias abaixo relacionadas, fixando-lhe o prazo
de 30 (trinta) dias a contar da publicação do acórdão no Diário Oficial do
Estado para comprovar, perante este Tribunal, o recolhimento dos valores dos
débitos aos cofres públicos municipais, atualizados monetariamente e acrescidos
dos juros legais (artigos 40 e 44 da Lei Complementar n.º 202/2000), calculados
a partir da data da ocorrência até a data do recolhimento sem o que, fica desde
logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (artigo 43,
II, da Lei Complementar n.º 202/2000):
3.2.1 - Dos Srs. Renato
Nunes de Oliveira (por seu espólio), Juliano Polese Branco
e Francisco Ramos Martins, solidariamente, pelo fato que segue: 3.2.1.1 - Dano
ao erário municipal no montante de R$ 1.457.205,90, decorrente de diferença sobre os vencimentos pagos a
médicos prestadores informais de serviço, com efetivo exercício de funções
típicas e permanentes da Administração Pública, e os valores percebidos pelos
médicos do quadro efetivo municipal, caracterizando burla ao Concurso Público,
em descumprimento ao disposto no artigo 3º c/c 14 da Lei Complementar Municipal
nº 333/2009, artigo 37, incisos II e V da Constituição Federal e o art. 4º c/c
o art. 12, § 1º, da Lei nº 4.320/64 e passível de enquadramento no art. 1º,
incisos III, V e XIII, do Decreto-Lei nº 201/67 (item 4.1.1, do Relatório de
Reinstrução nº 4.501/2011).
3.2.2 – Do Sr. Juliano
Polese Branco, individualmente, pelo
fato que segue:
3.2.2.1 - Despesas que não se enquadram em Ações e
Serviços Públicos de Saúde, no montante de R$
32.078,39, contrariando o art. 198 da
CF, c/c art. 77 do ADCT, art. 18, da Lei nº 8.080/90, e Resolução nº 322/2003
do Conselho Nacional de Saúde, caracterizando-se, também, como despesas sem
evidenciação de interesse público (ilegítimas), em desacordo com o art. 4º c/c
12, § 1º da Lei Federal nº 4.320/64 (item 4.2, do Relatório de Reinstrução nº
4.501/2011).
3.3 - APLICAR multas,
caso a caso, ao Sr. Juliano Polese Branco, Secretário de Saúde do Município de Lages no
exercício de 2010, CPF 944.911.519-20, residente à Rua Pará, nº 141, Ap 201,
Bairro São Cristóvão, Lages,SC, José Vieira Proença, Contador, CPF 084.460.329-53, residente à Rua
Blumenau, nº 104, Bairro Petrópolis, Lages, SC, CEP 88505- 300 e Sr. Francisco Ramos Martins, Controlador Interno Municipal, CPF 003.949.479-91, residente na Rua
Frei Justino, nº 140, Centro, Lages, SC, conforme previsto no artigo 69 da Lei Complementar
n.º 202/2000, pelo cometimento das irregularidades abaixo relacionadas,
fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias a contar da publicação do acórdão no
Diário Oficial do Estado para comprovar ao Tribunal o recolhimento da multa ao
Tesouro do Estado, sem o que fica desde logo autorizado o encaminhamento da
dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos artigos 43, II, e 71 da
Lei Complementar n.º 202/2000:
3.3.1 - Aos Srs. Juliano
Polese Branco, José Vieira Proença e
Francisco Ramos Martins, pelo fato que segue:
3.3.1.1 - Pagamento das despesas com saúde sem
respeitar a Especificação da Destinação de Recursos utilizada no empenhamento,
em desatenção às orientações contidas nos Manuais da Receita e Despesa editados
pela Portaria Conjunta STN/SOF N. 3, de 14/10/2008, bem como em afronta aos
art. 8º, parágrafo único e art. 50 da Lei de Responsabilidade Fiscal e art. 85
da Lei nº 4.320/64 e arts. 3º e 4º da L.C. Estadual nº 202/2000 c/c IN TC nº
04/2004 (alterada pela IN TC nº 01/2005) (item 4.4 do Relatório de Reinstrução
nº 4.501/2011);
3.3.1.2 - Empenhos apresentando históricos
insuficientes, impossibilitando a perfeita identificação das despesas, em
descumprimento ao artigo 61 da Lei Federal nº 4.320/64 e artigo 56, I da
Resolução nº TC – 16/94 c/c art. 4º da Lei Complementar nº 202/2000 (item 4.5
do Relatório de Reinstrução nº 4.501/2011).
3.3.2 - Do Sr. Juliano
Polese Branco, pelo fato que segue:
3.3.2.1 - Despesas que não se enquadram em Ações e
Serviços Públicos de Saúde, no montante de R$ 27.690,30, contrariando o art.
198 da CF, c/c art. 77 do ADCT, art. 18, da Lei nº 8.080/90, e Resolução nº
322/2003 do Conselho Nacional de Saúde (item 4.3 do Relatório de Reinstrução nº
4.501/2011);
3.4 – DAR CIÊNCIA
da decisão com remessa de cópia do Relatório de Reinstrução n.º 4.501/2011 e do
Voto que a fundamentam aos responsáveis, Srs. Renato Nunes de Oliveira, através
de sua inventariante Sra. Juracy Terezinha Valcanaia, Juliano Polese Branco,
Francisco Ramos Martins e José Vieira Proença.
É o relatório.
Pontua-se, inicialmente, que as irregularidades passíveis de imputação de débito e as restrições com previsão de cominação de pena de multa já foram devidamente analisadas por meio do Parecer nº 10.486/2012, exarado pelo Parquet de Contas.
Na oportunidade, o Procurador de Contas Márcio de Sousa Rosa acompanhou integralmente o encaminhamento da área técnica, sugerindo a imputação de débito aos responsáveis, bem como a aplicação de multa em decorrência das irregularidades constatadas neste feito.
Por essa razão, entendo ser prescindível tratar novamente sobre essas questões, sobretudo porque também acompanho o posicionamento da área técnica no que tange à existência de irregularidades nas contas apresentadas, devendo haver a imputação dos débitos aos responsáveis conforme sugerido, assim como a cominação de multa.
Nada obstante, os autos retornaram a este órgão de controle externo após a juntada de novas manifestações por parte dos responsáveis.
Conforme já assinalado, o espólio do Sr. Renato Nunes de Oliveira foi instado a se manifestar pelo Relator acerca do dano causado ao erário no montante de R$ 1.457.205,90, decorrente da diferença existente entre a remuneração percebida pelos médicos contratados de modo irregular e o vencimento fixado em lei para servidores efetivos com as mesmas atribuições.
Em sede de preliminar, os seus representantes formularam o pedido para incluir no polo passivo da presente demanda os médicos contratados irregularmente que receberam remuneração em desacordo com a legislação.
Contudo, como bem assinalou a área técnica, não há de se falar no chamamento dos médicos contratados, porque o que se apura no presente feito é, na verdade, a responsabilidade pela ordenação da despesa e a ausência de efetiva fiscalização quanto à regularidade dos atos praticados.
A responsabilidade, a propósito, decorre da inobservância das regras legais relativas à liquidação da despesa, sobretudo quanto ao disposto no art. 63, § 2º, I, da Lei nº 4.320/64, o qual preceitua que a liquidação da despesa deverá ter como base o contrato, ajuste ou acordo respectivo.
Logo, justamente em razão de os responsáveis terem autorizado a liquidação de despesa referente à contratação procedida sem fundamento legal é que recai somente sobre eles a responsabilidade pelo apontamento.
No mérito, as justificativas apresentadas pelos representantes do espólio não têm o condão de modificar as conclusões da diretoria técnica.
Isso porque as alegações resumem-se a justificar os pagamentos pelo fato de os médicos contratados terem prestado os serviços, o que denotaria a ausência de dano ao erário.
Nestes autos, porém, não se apura a efetiva prestação dos serviços que ensejaram o pagamento de remuneração em contrapartida, mas, sim, a forma adotada para a contratação de pessoal, que ocorreu em total desconformidade com o art. 37, incisos II e V, da Constituição Federal e com a Lei Complementar Municipal nº 333/2009.
É preciso sublinhar, nesse contexto, que as questões que impediram a admissão via concurso público de modo algum autorizam a realização de contratação de pessoal sem observância às normas legais vigentes.
Aliás, as disposições da legislação municipal pertinente ao assunto, que trata especificamente sobre as contratações temporárias, não foram observadas em nenhum de seus aspectos, nem quanto à forma e ao período máximo de contratação, tampouco em relação à remuneração devida aos profissionais admitidos em caráter precário.
No tocante ao ressarcimento ao erário, a defesa sustenta que não seria cabível sob pena de configurar enriquecimento ilícito ao erário.
Pondero, no entanto, que o cálculo efetuado pela área técnica abrange apenas a diferença entre os vencimentos fixados por lei ao quadro efetivo de pessoal do Município de Lages e a remuneração percebida pelos médicos contratados.
Logo, não existe aqui a pretensão de ressarcimento total dos valores destinados ao pagamento dos médicos contratados irregularmente, mas tão somente da exorbitante diferença verificada entre os vencimentos efetivamente pagos e a remuneração prevista em lei para profissionais da saúde do Município de Lages com as mesmas atribuições.
Em face do exposto, acompanho o posicionamento da área técnica, no sentido de manter o presente apontamento, com a imputação de débito, nos termos expostos no relatório nº 4.501/2011, contra o espólio do Sr. Renato Nunes de Oliveira.
Acerca da segunda determinação do Relator, no sentido de que fossem encaminhadas as conclusões obtidas e as eventuais sanções aplicadas em consequência do processo de sindicância instaurado no âmbito interno do Fundo Municipal de Saúde de Lages, verifica-se a sugestão formulada pela comissão para o seu arquivamento, ante a inexistência da prática de ato ilegal que tenha gerado prejuízos ao erário.
No meu entendimento, as alegações contidas no relatório que sugeriu o arquivamento da sindicância não se traduzem em nenhuma explicação razoável para justificar as contratações realizadas, tratando-se apenas de argumentos similares aos apresentados pelos responsáveis ao longo da instrução do presente feito.
Por corolário lógico, tais conclusões não são capazes de influenciar na análise da restrição apurada nestes autos, motivo pelo qual reitero a necessidade de manter o apontamento e a consequente imputação de débito aos responsáveis.
Registro, por fim, que os responsáveis notificados novamente – para apresentarem a documentação referente ao processo de sindicância – trouxeram outra vez à baila os argumentos defensivos analisados anteriormente com o objetivo de afastar as respectivas responsabilidades.
Todavia, entende-se que não há espaço para acolher qualquer de seus argumentos, não só porque se encontra operada a preclusão consumativa em relação ao prazo para apresentação de justificativas, mas também porque as razões de defesa são frágeis.
Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar nº 202/2000, manifesta-se por acompanhar as conclusões exaradas no relatório técnico nº 070/2017.
Florianópolis, 28 de junho de 2018.
Diogo Roberto Ringenberg
Procurador
de Contas