PARECER nº:

MPTC/57953/2018

PROCESSO nº:

TCE 15/00116014    

ORIGEM:

Secretaria de Estado da Educação

INTERESSADO:

Eduardo Deschamps

ASSUNTO:

TCE instaurada em face das irregularidades apontadas no Relatório de Auditoria nº 036/10, da Gerência de Auditoria de Atos de Pessoal da DIAG/SEF, em relação à contratação de professores ACTs pela 27ª Gerência Regional de Educação de Lages

 

Número Unificado: MPC-SC 2.2/2018.1230

 

 

Trata-se de Tomada de Contas Especial instaurada pela Secretaria de Estado da Educação (SED), por meio da Portaria n. 43/2013, em face das supostas irregularidades apontadas no Relatório de Auditoria n. 036/2010, elaborado pela Gerência de Auditoria de Atos de Pessoal da Diretoria de Auditoria Geral da Secretaria de Estado da Fazenda (SEF), com o objetivo de apurar dano ao erário em razão do recebimento indevido de valores em conta corrente advindos da contratação irregular de professores admitidos em caráter temporário na 27ª Gerência Regional de Educação de Lages, no período de janeiro de 2004 a dezembro de 2006.

A Tomada de Contas Especial instaurada no âmbito interno da Secretaria de Estado da Educação e toda a documentação que lhe diz respeito foi juntada às fls. 3-852 dos presentes autos.

Diante das considerações delineadas na conclusão do Relatório e Certificado de Auditoria n. 0023/2014 (fls. 846-848) – certificando a irregularidade das contas até ulterior deliberação por essa Corte de Contas – a Diretoria de Controle de Atos de Pessoal, após a juntada dos documentos de fls. 853-854, elaborou o Relatório de Instrução n. DAP-5631/2016 (fls. 856-859v), em cuja conclusão sugeriu a definição de responsabilidade solidária dos responsáveis – Sra. Zilda Terezinha Furlan Figueiredo, Professora à época dos fatos, Sr. Helio Diniz Furlan, Gerente da SEDR de Lages à época dos fatos, Sr. Abel Varela, Assessor da SEDR de Lages à época dos fatos, e Sra. Lindalva Silveira Mosna, Gerente Regional de Educação da 27ª GERED no período de ocorrência dos fatos – e suas respectivas citações para apresentação de alegações de defesa diante do dano ao erário apurado no montante de R$ 231.663,33 (atualizado até 30.03.2014), em virtude do recebimento indevido de valores por professores ACT’S que não tiveram a prestação dos respectivos serviços  comprovados na circunscrição da Gerência Regional de Educação de Lages (27ª GERED), no período de janeiro de 2004 a dezembro de 2006, em afronta aos princípios da legalidade e da moralidade insculpidos no art. 37, caput, da CRFB/88, bem como ao art. 63 da Lei n. 4.320/64, e ao art. 9º, inciso I, da Lei n. 8.429/92.

Após a juntada do documento de fl. 860, o Relator exarou o Despacho de fl. 861, acolhendo as sugestões apresentadas pela área técnica e determinando o retorno dos autos à Diretoria para que procedesse à citação dos responsáveis, deixando “a definição da responsabilidade solidária para momento posterior, após a apresentação de justificativas”.

Em atenção à determinação do Relator, foram expedidos os ofícios de fls. 862-865 aos responsáveis, com a juntada dos respectivos Avisos de Recebimento às fls. 866-867.

A Sra. Lindalva Silveira Mosna apresentou suas justificativas de defesa às fls. 871-881, com juntada de documentos às fls. 882-1023.

A Sra. Zilda Terezinha Furlan Figueiredo apresentou suas justificativas de defesa às fls. 1026-1038, com juntada de documentos às fls. 1039-1055.

O Sr. Helio Diniz Furlan apresentou suas justificativas de defesa às fls. 1056-1069, com juntada de documentos às fls. 1070-1074.

O Sr. Abel Varela requereu, inicialmente, a prorrogação do prazo para apresentação de defesa (fls. 1078-1081), a qual foi deferida pelo Relator (fl. 1081). Posteriormente, o responsável apresentou suas justificativas de defesa (fls. 1086-1094).

Após a juntada das alegações de defesa retro mencionadas, a Diretoria de Controle de Atos de Pessoal elaborou o Relatório de Reinstrução n. DAP-062/2018 (fls. 1097-1107), em cuja conclusão sugeriu julgar irregulares as contas pertinentes à presente Tomada de Contas Especial, com a imputação de débito aos Srs. Helio Diniz Furlan e Abel Varela, na medida de suas respectivas responsabilidades, nos seguintes termos (fls. 1106-1106v):

3.1 - JULGAR IRREGULARES, com imputação de débito, na forma do artigo 18, inciso III, alínea “d”, c/c o artigo 21, caput da Lei Complementar nº 202/2000, as contas pertinentes à presente Tomada de Contas Especial, no tocante ao recebimento de valores em conta corrente  de servidora da SED à época, para pagamento a servidores que não comprovaram a contraprestação dos serviços na Secretaria de Estado de Desenvolvimento Regional (SDR) de Lages, nos períodos de janeiro de 2004 a abril de 2004, de julho de 2004 a março de 2005 e de junho de 2005 a dezembro de 2006, e condenar os responsáveis a seguir discriminados ao pagamento de débitos de sua responsabilidade, fixando-lhes o prazo de 30 (trinta) dias a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico do Tribunal de Contas para comprovarem, perante este Tribunal, o recolhimento do valor dos débitos aos cofres do Estado, atualizados monetariamente e acrescidos dos juros legais (artigos 40 e 44 da Lei Complementar n.º 202/2000), calculados a partir das datas de ocorrência dos fatos geradores do débitos até a data do recolhimento, ou interpor recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (artigo 43, II da Lei Complementar n.º 202/2000):

3.1.1. De responsabilidade individual, do Sr. Hélio Diniz Furlan, Gerente de Planejamento e Gestão (20/05/2003 a 01/04/2004) e Gerente de Programas e Ações (17/05/2005 a 31/12/2006) na Secretaria de Estado de Desenvolvimento Regional (SDR) de Lages, inscrito no CPF sob o nº 892.430.059-87, o dano ao erário no montante de R$ 58.177,43 (cinquenta e oito mil, cento e setenta e sete reais e quarenta e três centavos), valor original à época, o qual deverá ser devidamente atualizado, consistente no recebimento da referida importância advinda da conta corrente nº 64.933-9, agência 15, do então Banco BESC, a pretexto de serviços prestados ao Estado nos períodos de janeiro de 2004 a abril de 2004 e de junho de 2005 a dezembro de 2006, contudo, não restou efetivamente comprovada a contraprestação dos serviços, uma vez que não foram juntados aos autos documentos que evidenciassem o trabalho prestado pelo referido servidor à época, tampouco a comprovação de frequência ao serviço, em afronta ao art. 37, caput (princípios da legalidade e moralidade) da Constituição Federal e art. 63, da Lei Federal nº 4.320/64.

3.1.2. De responsabilidade individual, do Sr. Abel Varela, Assessor de Planejamento na Secretaria de Estado de Desenvolvimento Regional (SDR) de Lages à época dos fatos, inscrito no CPF sob o nº 295.967.009-44, o dano ao erário no montante de R$ 22.061,78 (vinte e dois mil, sessenta e um reais e setenta e oito centavos), valor original à época, o qual deverá ser devidamente atualizado, consistente no recebimento da referida importância advinda da conta corrente nº 64.933-9, agência 15, do então Banco BESC, a pretexto de serviços prestados ao Estado no período de julho de 2004 a março de 2005, contudo, não restou efetivamente comprovada a contraprestação dos serviços, uma vez que não foram juntados aos autos documentos que evidenciassem o trabalho prestado pelo referido servidor à época, tampouco a comprovação de frequência ao serviço, em afronta ao art. 37, caput (princípios da legalidade e moralidade) da Constituição Federal e art. 63, da Lei Federal nº 4.320/64.

3.2 - DAR CIÊNCIA deste Acórdão à Secretaria de Estado da Educação, à Secretaria de Estado da Fazenda e aos Responsáveis nominados nos itens 3.1.1 e 3.1.2 desta deliberação.

Vieram os autos, então, a este órgão ministerial para manifestação.

Note-se que a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial do órgão em questão está inserida entre as atribuições dessa Corte de Contas, consoante os dispositivos constitucionais, legais e normativos vigentes (arts. 70 e 71, inciso II, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988; arts. 58 e 59, inciso II, da Constituição Estadual; art. 1º, inciso III, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000; e art. 8° c/c o art. 6° da Resolução n. TC-06/2001).

Passa-se, assim, à análise das responsabilizações assinaladas pela Diretoria de Controle de Atos de Pessoal, não sem antes apresentar a devida contextualização do presente processo.

1. Contextualização

O presente processo teve início a partir da instauração de processo interno de Tomada de Contas originada de ação da Secretaria de Estado da Fazenda, decorrente do Programa de Auditoria n. 0002/2009, cujo objetivo era “promover auditoria permanente e concomitante na Folha de Pagamento, mediante utilização de consultas automatizadas” (fl. 10). Durante o transcurso da referida auditoria, constatou-se a geração de pagamentos a diversos servidores mediante crédito em uma conta corrente, estando tais servidores lotados ou na Secretaria de Estado da Educação ou em Secretarias de Estado do Desenvolvimento Regional.

No que tange aos presentes autos, foram identificadas as irregularidades apontadas no Relatório de Auditoria n. 0036/2010, elaborado pela Gerência de Auditoria de Atos de Pessoal da Diretoria de Auditoria Geral da Secretaria de Estado da Fazenda (SEF), com o objetivo de apurar dano ao erário em razão do recebimento indevido de valores em conta corrente[1] advindos da contratação irregular de professores admitidos em caráter temporário na 27ª Gerência Regional de Educação de Lages, no período de janeiro de 2004 a dezembro de 2006.

Diante de tais constatações, determinou-se a instauração de Tomada de Contas Especial pela Secretaria de Estado da Educação (SED), por meio da Portaria n. 43/2013.

Impende salientar que o objeto do presente processo também motivou a instauração nessa Corte de Contas do processo TCE n. 16/00065381. A Diretoria de Controle de Atos de Pessoal, por meio da Informação n. DAP-145/2016 (fls. 501-503 de tal processo), atentou para a pré-existência dos presentes autos, entendendo que “o processo TCE 15/00116014 reúne condições para ser caracterizado como principal [...] tendo em vista que contém anexo relatório técnico preliminar”. Por tal motivo, sugeriu ao Relator daquele processo o seu apensamento como processo conexo e dependente a esta TCE n. 15/00116014.

Por meio do Despacho n. GAC/LEC-1065/2016 (fl. 504 dos autos TCE n. 16/00065381), aquele Relator determinou à Secretaria Geral, com fulcro no art. 22, §§ 1º e 4º, da Resolução n. TC-09/2002, o apensamento dos referidos processos.

Após os trâmites legais próprios da fase interna da Tomada de Contas Especial, foram encaminhados a essa Corte de Contas os autos do processo referido contendo o Relatório Conclusivo da Comissão instaurada (fls. 798-821), bem como o Relatório e Certificado de Auditoria n. 0023/2014 (fls. 846-848) e o pronunciamento do Ordenador da Despesa (fl. 850).

O deslinde do processo seguiu, então, nos moldes já informados neste parecer, até a manifestação ulterior da Diretoria de Controle de Atos de Pessoal.

Passa-se, enfim, à análise da irregularidade que compõe o presente processo.

2. Dano ao erário no montante de R$ 231.663,33, atualizado até 30.03.2014, consistente no recebimento indevido de valores por professores ACT´S que não tiveram a prestação dos respectivos serviços comprovados na circunscrição da Gerência Regional de Educação de Lages (27ª GERED), no período de janeiro de 2004 a dezembro de 2006, conforme Tomada de Contas Especial oriunda da Secretaria de Estado da Educação, em afronta ao art. 37, caput (princípios da legalidade e moralidade), da CRFB/88, ao art. 63 da Lei n. 4.320/64, e ao art. 9º, inciso I, da Lei n. 8.429/92

A Diretoria de Controle de Atos de Pessoal relatou que a Tomada de Contas Especial sob exame objetivou apurar prejuízo ao erário em razão do recebimento de valores em conta corrente de servidora da Secretaria de Estado da Educação à época, para pagamento de servidores que não comprovaram a contraprestação dos serviços na Secretaria de Estado do Desenvolvimento Regional de Lages, bem como na área de abrangência da 27ª Gerência Regional de Educação de Lages, no período compreendido entre janeiro de 2004 e dezembro de 2006.

Segundo apurado, os servidores Helio Diniz Furlan, Abel Varela, Zenaide Costa Furlan e Zilda Terezinha Furlan Figueiredo teriam recebido valores provenientes da conta corrente n. 64.933-9, Agência 15 – BESC, de titularidade da servidora Zilda Terezinha Furlan Figueiredo, constando um total depositado indevidamente de R$ 121.996,75.

Ressalte-se que a Comissão de Tomada de Contas Especial promoveu a retirada da Sra. Zenaide Costa Furlan do rol de responsáveis solidários pelo dano ao erário, por ter restado caracterizada a prestação de serviços de sua parte. Por outro lado, a Sra. Lindalva Silveira Mosna, Gerente Regional da 27ª GERED à época dos fatos, foi incluída no rol de responsáveis em função da omissão no exercício da sua competência fiscalizadora.

Houve, enfim, a quantificação de dano ao erário no montante de R$ 231.663,33, apurado até 30.03.2014, de responsabilidade solidária dos Srs. Zilda Terezinha Furlan Figueiredo, Helio Diniz Furlan, Abel Varela e Lindalva Silveira Mosna, os quais, devidamente citados mediante ofícios expedidos por esse Tribunal de Contas, apresentaram suas respectivas alegações de defesa.

2.1. Alegações de defesa – Sra. Lindalva Silveira Mosna

A Sra. Lindalva Silveira Mosna apresentou suas justificativas de defesa às fls. 871-881, com juntada de documentos às fls. 882-1023.

A responsável alegou, inicialmente, que em nenhum momento teria ficado clara sua participação na irregularidade noticiada, frisando que não existia qualquer vínculo ou responsabilidade de sua parte com as contratações da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Regional de Lages, mas apenas com a 27ª GERED daquele Município. Por tal motivo, pugnou pela carência da ação amparada na suposta ilegitimidade da parte.

Em seguida, a responsável questionou a metodologia utilizada pela Comissão de Tomada de Contas Especial, apontando que foram ouvidas determinadas servidoras sem motivação, deixando-se de lado a necessária oitiva das Sras. Zenaide Costa Furlan e Zilda Terezinha Furlan Figueiredo. Do mesmo modo, alegou que não se solicitou às escolas em que as servidoras prestavam serviços as cópias de seus contratos e documentos afins, prejudicando a apuração efetiva das responsabilidades.

Nesse sentido, argumentou que o processamento de tomada de contas foi instituído para o oferecimento de acusação de fato certo, cuja autoria e materialidade já estariam definidas, questionando a razão de a Comissão não expor elementos fáticos constitutivos da falta disciplinar imputada, com a apresentação das declarações e dos documentos necessários para comprovar a existência ou não dos fatos. Nessa linha, asseriu que o processo não pode ser um mero instrumento de perseguição da sua vida funcional, tampouco servir como pretexto para punir mediante acusações montadas artificialmente.

Referindo-se à documentação trazida aos autos, a responsável afirmou haver a comprovação dos períodos trabalhados pela servidora Zilda Terezinha Furlan Figueiredo. No que tange aos servidores Abel Varela e Helio Diniz Furlan, destacou que foram eles contratados pela SEDR, de modo que não teve acesso aos respectivos contratos, declarações de trabalho ou cartões de ponto, cabendo à Secretaria de Estado do Desenvolvimento Regional efetuar tais comprovações.

Após relacionar toda a documentação apresentada de maneira anexa, referente aos vínculos demonstrados pela servidora Zilda Terezinha Furlan Figueiredo com o CEDUP – Renato Ramos da Silva, em Lages, a responsável alegou que as contratações efetuadas foram legais, tendo sido observadas todas as normas atinentes, com a correspondente prestação de serviços pelos pagamentos efetuados.

Quanto aos depósitos efetuados na conta corrente n. 064.933-9, agência 0015-9, informou que tanto a Sra. Zilda Terezinha Furlan Figueiredo como a Sra. Zenaide Costa Furlan forneceram essa conta para crédito de seus salários, alegando que os dados são fornecidos diretamente pelas contratadas e inseridos em seus cadastros, não existindo qualquer norma que exija a comprovação de sua titularidade, ressaltando que em virtude da falta de oitiva das referidas servidoras, não teria meios para melhor elucidar a questão posta pela Comissão.

Relativamente à inobservância ao art. 9º, inciso I, da Lei n. 8.429/92 anotada pela área técnica, a responsável refutou veementemente a hipótese de prática de conduta caracterizadora de improbidade administrativa por sua parte, alegando que sempre se pautou pelos princípios constitucionais balizadores da conduta administrativa, de forma alguma locupletando-se às custas do erário. Enfatizou que é servidora há 27 anos, não havendo nada que desabone sua conduta.

Diante de todas as justificativas, argumentos e documentos apresentados, a responsável pugnou pela sua exclusão do polo passivo, bem como pela improcedência do processo, com o afastamento de sua responsabilidade. Pleiteou, ainda, pela realização de diligências junto à ADR Lages (antiga SEDR), para apresentação de toda a documentação reputada como necessária ao esclarecimento da situação sob exame, bem como as intimações do Secretário de Estado atuante à época dos fatos e da Secretaria de Estado da Educação para juntar ao processo a documentação pertinente à contratação e prestação de serviços da Sra. Zilda Terezinha Furlan Figueiredo. Por fim, pugnou pelo deferimento da juntada de toda a documentação encaminhada e pela produção de todos os meios de prova em direito admitidos, inclusive o depoimento pessoal e a oitiva de testemunhas.

A Diretoria de Controle de Atos de Pessoal, ao efetuar a reanálise da questão em cotejo com as justificativas e documentos apresentados pela responsável, entendeu assistir razão a Sra. Lindalva Silveira Mosna, considerando que restou comprovado que ela respondia somente pela 27ª Gerência Regional de Educação de Lages à época dos fatos, não detendo qualquer competência de fiscalização no âmbito da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Regional de Lages. A área técnica acrescentou em sua análise não haver indícios de que a servidora tenha se beneficiado irregularmente de valores pagos a pretexto da contratação de ACT’S. Em face de tais ponderações, sugeriu a exclusão da Sra. Lindalva Silveira Mosna do rol de responsáveis pela irregularidade analisadas nestes autos.

De fato, compulsando-se os autos, verifico que assiste razão à Sra. Lindalva Silveira Mosna.

Consoante se extrai dos documentos encaminhados às fls. 884-885, a servidora em comento fora nomeada para exercer, inicialmente, o cargo de Coordenadora Regional de Educação – Lages, nível DGS-2, da Secretaria de Estado da Educação, e, posteriormente, o cargo de Gerente de Educação e Inovação, nível DGS-3, da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Regional de Lages. Tais informações permitem vislumbrar a verossimilhança do alegado, na medida em que nenhum dos cargos ocupados pela defendente têm relação direta com a gestão de pessoas ou a fiscalização no âmbito da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Regional de Lages.

Ora, não se desconhece a necessidade de responsabilizar os detentores de cargos de chefia por irregularidades praticadas no âmbito de sua competência, seja por conta de suas atribuições legalmente estipuladas, seja por conta das chamadas culpa in eligendo e culpa in vigilando, conforme exaustivamente pontuado por esta representante ministerial nos mais variados processos que tramitam nessa Corte de Contas.

Todavia, entendo insuficiente alegar que à Gerente Regional de Educação “cabia à responsabilidade de fiscalizar a estrita observância dos professores e demais servidores que atuam nas Unidade Escolares”[2], como se esta competência tivesse sido mais relevante para a configuração do débito que os próprios procedimentos falhos de pagamento do setor de recursos humanos da Secretaria de Estado da Educação, por exemplo. Assim, havendo toda uma cadeia hierárquica de responsáveis pelo pagamento indevido dos valores sob análise que em nenhum momento foram considerados na tramitação interna do presente processo, não se mostra razoável responsabilizar exclusivamente a Sra. Lindalva Silveira Mosna por supostamente falhar – sozinha – em seu dever de fiscalização e proporcionar o cometimento da irregularidade em questão.

Somando-se tais considerações à ausência completa de apropriação dos valores ora discutidos por parte da responsável – até porque a própria Tomada de Contas Especial instaurada no âmbito da Secretaria de Estado da Educação deixou claro que a responsabilidade da servidora estaria limitada à omissão em apurar a irregularidade diante do cargo que ocupava –, verifica-se pertinente a sugestão apresentada pela Diretoria de Controle de Atos de Pessoal.

Logo, entendo pela exclusão da Sra. Lindalva Silveira Mosna do rol de responsáveis pela irregularidade objeto de análise nos presentes autos.

2.2. Alegações de defesa – Sra. Zilda Terezinha Furlan Figueiredo

A responsável Sra. Zilda Terezinha Furlan Figueiredo apresentou suas justificativas de defesa às fls. 1026-1038, com juntada de documentos às fls. 1039-1055.

A responsável arguiu, em sede de preliminar de mérito, a total ilegalidade dos fatos que embasaram o relatório da área técnica, bem como a prescrição da matéria versada nos autos. Basicamente, argumentou que a prescrição quinquenal prevista no art. 23, inciso I, da Lei n. 8.429/92 incide no presente caso, considerando-se que fora afastada do cargo em 20.12.2006.

No que se refere ao mérito, informou que foi contratada pelo Estado para exercer a função de professora junto ao CEDUP Renato Ramos da Silva, em Lages, salientando que sempre exerceu suas funções em estrito cumprimento das disposições legais, éticas e morais. Explicou que se submeteu a todas as formalidades para contratação pelo Estado, bem como prestou os serviços para os quais foi contratada.

Relativamente à questão da conta corrente informada para recebimento dos salários, a responsável trouxe os seguintes esclarecimentos (fl. 1029):

Para o recebimento de sua remuneração mensal, a Requerida informou um conta que era de sua titularidade junto ao Banco BESC, na época Estatal.

A referida Instituição Bancária era exigida pelo Estado para que fossem realizados os pagamentos dos vencimentos de todos os servidores, não sendo realizado nenhum pagamento em outra instituição financeira.

A mãe da requerida, a Sra. Zenaide Costa Furlan, também havia sido contratada pelo regime ACT pelo Estado para exercer o cargo de serviços gerais, lotada no CEDUP, Colégio Industrial de Lages/SC.

Todavia, a Sra. Zenaide não possuía conta bancária junto ao BESC, e assim, foi solicitado ao Estado que o pagamento fosse realizado na conta da Requerida, o qual foi aceito, tanto que todos os pagamentos foram efetuados de forma correta.

Na época, a Requerida perguntou se haveria algum problema em sua mãe receber os seus vencimentos em sua conta, e lhe foi afirmado pelo estado que não teria problema algum.

Logo, se oi pagamento das remunerações dos servidores não pudesse ser realizado na mesma conta bancária para mais que um servidor, o Estado, pelo setor responsável, deveria ter advertido os servidores, o que não ocorreu, pelo contrário, o próprio Estado aceitou tanto que realizou os pagamentos dessa forma.

Assim, se há alguma irregularidade administrativa se denota que decorreu somente em ordem burocrática, não havendo prejuízo financeiro algum ao erário, e se houve erro, foi cometido tão somente pelo servidor responsável pelo cadastro e pagamento dos servidores, que resta comprovado que não era a Requerida, ora manifestante.

Adiante em sua defesa, a responsável questionou a informação de que o Sr. Aldo Spessatto era Diretor do CEDUP Renato Ramos da Silva à época, afirmando que ele, na verdade, é o atual Diretor, sendo que à época, era o Sr. Antônio Ives de Oliveira quem ocupava tal Diretoria.

Em outro ponto, a responsável alegou que, apesar de ter registrado sua frequência em sistema de ponto eletrônico, ao diligenciar junto à unidade para obtenção de cópia dos seus registros teria sido informada pela atual Diretora de que não há quaisquer registros da época em nome de qualquer servidor, em razão de problema no sistema.

Embasando-se em documentação encaminhada de maneira anexa, a responsável arrolou os seguintes períodos de tempo de efetivo exercício de atividades: 03.02.2003 a 30.12.2003, 16.02.2004 a 30.12.2004, 01.02.2005 a 30.12.2005, 01.03.2006 a 31.07.2006 e 01.08.2006 a 20.12.2006. Diante disso, afirmou que todos os valores recebidos se trataram de remuneração pelos serviços prestados. Ademais, alegou que sua contratação ocorreu de maneira regular, consoante disposto nos documentos anexados às alegações de defesa.

Considerando todas as justificativas e os documentos que lhes dão suporte, a responsável contestou a possibilidade de seu enquadramento em qualquer dispositivo referente a improbidade administrativa, sobretudo diante do argumento de que não há nos autos nenhuma prova que demonstre conduta causadora de prejuízo ao erário. Ainda nesse sentido, asseverou que sempre se pautou pela probidade e boa-fé, não auferindo qualquer vantagem no desempenho de suas funções.

Ao final, pugnou pela designação de audiência para oitiva de testemunhas, pelo acolhimento da arguição da prescrição, pela exclusão de sua responsabilidade, com a improcedência do feito e consequente arquivamento dos autos, bem como pela produção de todas as provas em direito admitidas, especialmente a testemunhal.

A Diretoria de Controle de Atos de Pessoal, reanalisando a matéria à luz dos argumentos e documentos encaminhados pela responsável, entendeu (fls. 1099-1100v) pela sua exclusão do rol de responsáveis pelo dano causado ao erário em virtude da irregularidade sob análise nestes autos.

Note-se que a área técnica salientou, em suas considerações, que o titular de conta corrente é responsável pelas movimentações financeiras de sua conta bancária, sendo que ao abri-la, torna-se ciente de que seu uso é pessoal e intransferível. Ainda nesse sentido, considerou que a disponibilização da conta corrente para pagamento de outros servidores revela-se inadequada, ainda que a utilização tenha sido efetiva por outro servidor.

Apesar disso, a área técnica mencionou o seguinte rol de documentos que ensejaram o afastamento da responsabilidade da Sra. Zilda Terezinha Furlan Figueiredo (fls. 1100-1100v):

1- Declaração de 10/03/2014 (fl. 1.021), firmada pelo Sr. Aldo Spessatto, Diretor Geral do CEDUP Renato Ramos da Silva à época, informando:

[...] conforme busca em todos os arquivos desta Unidade Escolar, encontramos parcialmente o registro de ponto de alguns meses referente a 2004, bem como relação de nome de servidores desta Unidade Escolar nos anos de 2003, 2005 e 2006. Segundo relato de servidores da época, afirmam que Zilda Terezinha Furlan Figueiredo matrícula 352897901 atuou de 2003 a 2006, a mesma fazia parte e atuava no quadro administrativo. [...] existia um programa onde os funcionários passavam o cartão eletrônico como certificado de ponto; só que por motivo desconhecido os arquivos foram perdidos e nem feito backup do sistema, e nenhum relatório foi arquivado de todos os servidores que atuaram neste período nesta unidade escolar. [...] (grifo nosso)  

2- Relações de funcionários do CEDUP de Lages, referentes aos exercícios de 2003, 2005 e 2006, nas quais consta o nome da Sra. Zilda Terezinha Furlan Figueiredo (fls. 997/1.020);

3- Cartões de ponto da Sra. Zilda Terezinha Furlan Figueiredo, referentes aos meses de junho a outubro de 2004 (fls. 1.047/1.051);

4- Atestado de tempo de serviço fornecido pelo CEDUP Renato Ramos da Silva, de 23/10/2012 (fl. 1.052), declarando que a Sra. Zilda Terezinha Furlan Figueiredo exerceu atividades de magistério, no cargo de Professora, referente aos períodos:

a- 03 de fevereiro de 2003 a 30 de dezembro de 2003;

b- 16 de fevereiro de 2004 a 30 de dezembro de 2004;

c- 01 de fevereiro de 2005 a 30 de dezembro de 2005;

d- 01 de março de 2006 a 31 de julho de 2006, e

e- 01 de agosto de 2006 a 20 de dezembro de 2006.

5- Depoimento prestado pela Sra. Lindalva Silveira Mosna, Gerente Regional de Educação da 27ª GERED/Lages, à época dos fatos, na fase interna da Tomada de Contas Especial (fl. 808):

[...] perguntado: de acordo com o Relatório de Auditoria 0036/2010, os servidores Abel Varela, Hélio Diniz Furlan, Zenaide Costa Furlan, Zilda Terezinha Furlan Figueiredo receberam seus vencimentos em uma única conta corrente [...] e supostamente não prestaram serviços para o Estado nos períodos citados [...] a Senhora efetuou ou mandou efetuar estas contratações; respondeu: que não mandou efetuar e não efetuou estas contratações exceto das servidoras Zenaide Costa Furlan e Zilda Terezinha Furlan Figueiredo [...]

Portanto, no caso sob exame, entende-se pela exclusão da Sra. Zilda Terezinha Furlan Figueiredo do rol de responsáveis por danos causados ao erário.     

De fato, extrai-se das informações coligidas e dos documentos apresentados que não houve qualquer benefício direto ou indireto por parte da Sra. Zilda Terezinha Furlan Figueiredo que evidenciassem liame subjetivo fático com a irregularidade sob exame.

Na linha do que referido pela área técnica, entendo que apesar de o recebimento de valores por mais de um servidor numa mesma conta corrente ser, em tese, inadequado, não se pode, no presente caso concreto, imputar a responsabilidade por tal fato à servidora, eis que a situação fática, tal como narrado, não permite conduta diversa.

Ademais, toda a documentação que compõe a fase interna do presente processo, bem como no que se refere aos documentos apresentados pela Sra. Lindalva Silveira Mosna (fls. 886-1023) e pela ora responsável (fls. 1043-1055), demonstram os vínculos alegados pela servidora, de modo que a sugestão apresentada pela área técnica merece acolhimento.

Assim, entendo pela exclusão da Sra. Zilda Terezinha Furlan Figueiredo do rol de responsáveis pela irregularidade objeto de análise nos presentes autos.

2.3. Alegações de defesa – Sr. Helio Diniz Furlan

O responsável Sr. Helio Diniz Furlan apresentou suas justificativas de defesa às fls. 1056-1069, com juntada de documentos às fls. 1070-1074.

O responsável arguiu, em sede de preliminar de mérito, a prescrição da matéria versada nos autos. Basicamente, argumentou que a prescrição quinquenal prevista no art. 23, incisos I e II, da Lei n. 8.429/92 incide no presente caso, considerando-se que fora afastado do cargo em janeiro de 2007.

Ainda a título de preliminares, o responsável defendeu a tese de invalidade do processo administrativo, argumentando que fora chamado para prestar depoimento sem que lhe fosse assegurado o direto ao contraditório e à ampla defesa, de modo que caracterizados vícios insanáveis provocadores da “nulidade absoluta de todo o procedimento”.

Adentrando propriamente o mérito, afirmou que o apontamento de ato de improbidade calcado na utilização de uma única conta corrente para o pagamento de remuneração a quatro servidores seria equivocado, considerando-se a existência de “provas indubitáveis de que os servidores prestaram serviços ao Estado, cada um na condição em que foi admitido, não havendo, em nenhuma hipótese prejuízo ao erário ou pagamento indevido” (fl. 1059).

O responsável, detalhando o contexto fático examinado nestes autos, informou que exerceu a função de Gerente de Planejamento e Gestão junto à SEDR de Lages de maio de 2003 a maio de 2005, passando ao cargo de Gerente de Programas e Ações até janeiro de 2007. Explicou que, nesse mister, não detinha qualquer poder de ingerência junto à seção de recursos humanos do Estado, responsável pela folha de pagamento do funcionalismo público.

Nesse sentido, esclareceu que “não teve qualquer influência e não praticou nenhum ato que culminasse na contratação de sua irmã, Zilda Terezinha Furlan Figueiredo, para o cargo de professora mediante contratos ACT’S com o Estado” (fl. 1060). Ainda nessa linha, aduziu que (fls. 1060-1060v):

[...] resta evidente que esse tipo de contratação ocorre anualmente mediante prova e inscrição dos candidatos diretamente em cada Instituição de Ensino, o que desvincula de qualquer ato que pudesse ser praticado pelo Requerido no exercício de suas funções.

Conforme já restou comprovado o Requerido não tinha acesso, com sua matrícula e senha, para lançar qualquer ato referente às contratações efetuadas pelo Estado no âmbito da GERED ou SDR, ademais, a função do Requerido não permitia essa prática.

O fato indubitável no caso apresentado a lume é de que tanto o Requerido, quanto os demais indiciados, prestaram os serviços a que foram contratados de maneira regular, bem como, obedeceram às normas de contratação exaradas pelo próprio Estado, pois caso contrário, sequer poderiam assumir os seus cargos.

Quanto à utilização da conta da Sra. Zilda Terezinha Furlan Figueiredo, irmã do Requerido, para o pagamento de sua remuneração insta elucidar que foi o próprio Estado que permitiu a realização dos pagamentos da forma em que foram.

O Requerido não possuía conta bancária ativa na época para efetuar os recebimentos dos seus pagamentos, pois estava com a conta de sua titularidade bloqueada em virtude de pendências financeira com o BESC.

O Estado, na época, exigia que o pagamento dos servidores fosse realizado através do BESC, de natureza jurídica estatal naquele tempo.

Ademais, era um ato corriqueiro por parte do Estado não exigir que o pagamento dos servidores fosse realizado em conta bancária própria, principalmente pela ausência de norma reguladora do assunto, tanto que ocorreu no RH da Gerência de Educação, nos dois CEDUP’s, e na própria SDR, ou seja, era um ato aceito desde a admissão do servidor.

O Requerido não possuía conta bancária plausível de movimentação na época, assim como a sua mãe, Sra. Zenaide Costa Furlan, e o Sr. Abel, que assumiu o cargo ocupado pelo Requerido quando do seu afastamento, e solicitaram ao Estado que os pagamentos fossem realizados na conta da servidora Zilda.

Diante desses esclarecimentos, o responsável argumentou que se o pagamento das remunerações dos servidores mencionados não pudesse ser realizado numa mesma conta bancária, o Estado, através do setor responsável, deveria ter feito advertência nesse sentido, acrescentando que se deu o inverso: o Estado aceitou e efetuou os pagamentos da forma verificada.

Nessa medida, o responsável ponderou que eventual irregularidade administrativa seria de ordem meramente burocrática, não importando em prejuízo financeiro ao erário. No que tange à afirmação feita perante a Comissão, no sentido de que a conta era de sua titularidade, limitou-se a explicar que se tratou de um equívoco.

Em seguida, discorreu acerca das atividades que desempenhou enquanto Gerente de Planejamento de Orçamento e Gestão na SEDR de Lages, enfatizando que não havia qualquer ligação com a GERED de Lages, assim como não possuía autonomia para efetuar nenhuma contratação, fosse de professor, auxiliar de serviços gerais ou qualquer outra.

Em outro tópico, defendeu que todas as verbas que lhe foram destinadas correspondiam ao trabalho prestado, juntando cálculo demonstrativo para demonstrá-lo.

Considerando todas as justificativas e os documentos que lhes dão suporte, o responsável contestou a possibilidade de seu enquadramento em qualquer dispositivo referente a improbidade administrativa, sobretudo diante do argumento de que não há nos autos nenhuma prova que demonstre conduta causadora de prejuízo ao erário. Ainda nesse sentido, asseverou que sempre se pautou pela probidade e boa-fé, não auferindo qualquer vantagem no desempenho de suas funções.

Ao final, pugnou pela instrução processual com a designação de audiência para a oitiva das testemunhas arroladas, pelo acolhimento da prejudicial de mérito arguida e pela preliminar de nulidade, pela exclusão de sua responsabilidade, com a improcedência do feito e consequente arquivamento dos autos, bem como pela produção de todas as provas em direito admitidas, especialmente a testemunhal.

Inicialmente, impende esclarecer que não existe previsão legal no Regimento Interno e nem na Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina no sentido de se admitir a produção de prova testemunhal, de modo que tal pleito do responsável resta prejudicado de plano[3]. Na linha do que referenciado pela área técnica (fl. 1101v), na ocasião do julgamento ou apreciação dos autos, será oportunizada ao responsável a sustentação oral, em observância ao prescrito no art. 148 da Resolução n. TC-06/2001 (Regimento Interno dessa Corte de Contas).

Relativamente à tese prescricional aventada pelo responsável, em que pesem os argumentos referidos, o raciocínio não merece prosperar, uma vez que a responsabilização ressai de dano ao erário, cuja ação de ressarcimento é imprescritível, consoante já amplamente apontado por este órgão ministerial[4].

O constitucionalista José Afonso da Silva[5], discorrendo acerca do tema, ensina que

A prescritibilidade, como forma de perda da exigibilidade de direito, pela inércia de seu titular, é um princípio geral de direito. Não será, pois, de estranhar que ocorram prescrições administrativas sob vários aspectos, quer quanto às pretensões de interessados em face da Administração, quer quanto às desta em face de administrados. Assim é especialmente em relação aos ilícitos administrativos. Se a Administração não toma providência à sua apuração e à responsabilização do agente, a sua inércia gera a perda do seu ius persequendi. É o princípio que consta do art. 37, § 5º, que dispõe: “A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízo ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento”. Vê-se, porém, que há uma ressalva ao princípio. Nem tudo prescreverá. Apenas a apuração e punição do ilícito, não, porem, o direito da Administração ao ressarcimento, à indenização, do prejuízo causado ao erário. É uma ressalva constitucional e, pois, inafastável, mas, por certo, destoante dos princípios jurídicos, que não socorrem quem fica inerte (dormientibus non sucurrit ius). Deu-se assim à Administração inerte o prêmio da imprescritibilidade na hipótese considerada (grifei).

Já a professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro[6] traça a seguinte explanação:

A prescrição da ação de improbidade está disciplinada no artigo 23, que distingue duas hipóteses: pelo inciso I, a prescrição ocorre em cinco anos após o término do exercício de mandato, cargo em comissão ou de função de confiança; para os que exercem cargo efetivo ou emprego, o inciso II estabelece que a prescrição ocorre no mesmo prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares puníveis com demissão a bem do serviço público. São, contudo, imprescritíveis, as ações de ressarcimento por danos causados por agente público, seja ele servidor público ou não, conforme estabelece o artigo 37, §5°, da Constituição. Assim, ainda que para outros fins a ação de improbidade esteja prescrita, o mesmo não ocorrerá quanto ao ressarcimento do dano (grifei).

O administrativista José dos Santos Carvalho Filho[7] trilha no mesmo sentido, afirmando que:

Consequentemente, no que concerne à pretensão ressarcitória (ou indenizatória) do Estado, a Constituição assegura a imprescritibilidade da ação. Assim, não há período máximo (vale dizer: prazo prescricional) para que o Poder Público possa propor a ação de indenização em face de seu agente, com o fito de garantir o ressarcimento pelos prejuízos que o mesmo lhe causou.

A jurisprudência dos tribunais superiores caminha no mesmo sentido. Veja-se o posicionamento historicamente adotado pelo Supremo Tribunal Federal:

“(...) 2. O Pleno do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do MS 26.210, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, DJ 10.10.2008, fixou entendimento no sentido da imprescritibilidade da ação de ressarcimento de dano ao erário” (AI 848.482 AgR, 1ª T., rel. Min. Luiz Fux, j. 27.11.2012, DJ 21.02.2013)

A mesma orientação sempre fora adotada pelo Superior Tribunal de Justiça:

“Claro, a demora, sobretudo quando medida em anos, na proposição da ação reparatória (foram treze ou catorze neste caso), causa desconforto no juiz, quando não revolta com a morosidade da Administração em cobrar aquilo que, segundo seu pensamento, foi subtraído, indevidamente, dos cofres públicos, por comportamento ativo ou passivo de pessoas, em especial as que são pagas para por eles zelarem.

O retardamento pode e deve merecer o repúdio dos juízes e cidadãos, mas não a ponto de, em seu nome, justificar o enfraquecimento, ou mesmo o afastamento, da garantia social da imprescritibilidade do dano ao patrimônio público. [...]

E, demorados dez anos, a Constituição de 1988 fez uma clara opção em favor da cidadania lesada, mas em desfavor dos que atacam os cofres públicos. Ao assim proceder, inverteu a ordem tradicional da prática judicial. A segurança jurídica agora é dos cidadãos, no sentido de que, tarde o que tardar, a Justiça deverá se manifestar acerca do que foi abocanhado ilegalmente” (REsp 1.105.059/SP, 2ª T., trecho do voto-vista do Min. Herman Benjamin, rel. Min. Eliana Calmon, j. 24.08.2010, DJe 02.02.2011).

“A exegese do art. 37, § 5º, da Constituição Federal, em relação ao ressarcimento ao erário, consolidada nesta Corte Superior de Justiça, está cingida ao reconhecimento da imprescritibilidade. Precedentes: REsp 928.725/DF, rel. Min. Denise Arruda, rel. p/ Acórdão Min. Teori Albino Zavascki, 1ª T., DJe 5.8.2009; Resp 1.069.723/SP, rel. Min. Humberto Martins, 2ª T., DJe 02.04.2009; REsp 1.067.561/AM, rel. Min. Eliana Calmon, 2ª T., DJe 27.2.2009; REsp 705.715/SP, rel. Min. Francisco Falcão, 1ª T., DJe 14.05.2008” (AgRg no RMS 25.763, 2ª T., rel. Min. Humberto Martins, j. 02.09.2010, DJe 24.09.2010.

“A ação de ressarcimento dos prejuízos causados ao erário é imprescritível (art. 37, § 5º, da CF/1988)” (Resp 1.187.297/RJ, 2ª T., rel. Min. Eliana Calmon, j. 02.09.2010, DJe 22.09.2010)

O Tribunal de Contas da União, igualmente, segue nesta mesma senda, por meio da Súmula n. 282, a qual prescreve que “As ações de ressarcimento movidas pelo Estado contra os agentes causadores de danos ao erário são imprescritíveis”.

Por sua vez, destaca-se que o responsável traz argumentos e precedentes relacionados à prescrição de ações de improbidade administrativa, as quais de fato prescrevem, inclusive por expresso texto de lei. Todavia, recorda-se que o julgamento de atos de improbidade é de competência exclusiva do Poder Judiciário, não se confundido com a atribuição dessa Corte de Contas no presente processo de Tomada de Contas Especial, que nada se relaciona à questão da improbidade[8].

Dessa maneira, a arguição de prescrição aventada pelo responsável não merece prosperar. 

No que diz respeito aos questionamentos trazidos à baila pelo responsável acerca da suposta inobservância dos princípios da ampla defesa e do contraditório, cabe esclarecer que os mesmos, por força do art. 5º, inciso LV, da CRFB/88, são corolários do princípio do devido processo legal, que deve ser assegurado a todos em âmbito judicial ou administrativo.

Essa verdadeira garantia das liberdades públicas não pode ser utilizada, no entanto, como pretexto para atrasar as decisões judiciais ou administrativas e provocar infinitas revisões processuais, uma vez que também faz parte da ideia de devido processo legal a existência de prazos e procedimentos que devem ser respeitados de forma a conferir segurança jurídica às partes de determinado processo e à sociedade em geral.

Isto posto, cumpre destacar a observância de todas as normas atinentes ao devido processo legal nos presentes autos, não havendo cerceamento de defesa por parte desse Tribunal de Contas de Santa Catarina.

Rememore-se que o processo administrativo de Tomada de Contas Especial conduzido pela Secretaria de Estado da Educação meramente subsidiou a formação dos presentes autos, tanto que na parte conclusiva do Relatório e Certificado de Auditoria n. 0023/2014, a Comissão de Tomada de Contas Especial certifica a irregularidade das contas até ulterior deliberação pelo Tribunal de Contas. Tanto é assim que, na parte introdutória deste parecer, faz-se referência à análise de supostas irregularidades, ou seja, parte-se do pressuposto de que há, tão somente, indícios do cometimento de algum tipo de irregularidade que esteja inserida no espectro de competências das Cortes de Contas.

Nessa medida, verifica-se que o contraditório e a ampla defesa restaram plenamente observados nos presentes autos, uma vez que os responsáveis identificados foram cabalmente notificados dos fatos e instados a apresentarem suas alegações de defesa frente à irregularidade que lhes foi atribuída. Ademais, o espectro de atribuições e atividades dos Tribunais de Contas é diverso daquele contido no âmago do controle interno das Unidades Gestoras, de modo que dissociados entre si, não havendo que se falar em qualquer tipo de codependência ou dependência entre esferas de controle.

No que toca especificamente ao mérito, impende esclarecer que apesar da argumentação elaborada pelo responsável acerca do contexto fático que demandou a utilização da conta de titularidade de sua irmã e da ausência de influência em sua nomeação, tais condutas não figuram como objeto determinante na análise da irregularidade debatida no presente processo.

Deve-se observar que, consoante referido no item anterior, o recebimento de valores por mais de um servidor numa mesma conta corrente é, em tese, inadequado, mas não necessariamente implica em irregularidade caracterizadora de dano ao erário. Tampouco se atribuiu ao responsável qualquer responsabilidade relativamente à nomeação da Sra. Zilda Terezinha Furlan Figueiredo para o desempenho de funções na 27ª GERED de Lages.

Por outro lado, verifica-se que as justificativas apresentadas pelo responsável carecem de substrato probatório, na medida em que foram juntados de forma anexa apenas documentos formais inerentes ao desenvolvimento processual e meramente uma declaração unilateral de terceiro corroborando o alegado, sem quaisquer maiores informações, tais como depoimentos, folhas de ponto, registros de atividades, etc.

Nesse sentido, a Diretoria de Controle de Atos de Pessoal delineou as seguintes considerações acerca da conjuntura fática evidenciada (fls. 1103-1103v):

Frise-se que o responsável recebeu o montante de R$ 58.177,43 (cinquenta e oito mil, cento e setenta e sete reais e quarenta e três centavos), na conta corrente nº 64.933-9, agência 15, do então Banco BESC, a pretexto de serviços prestados ao Estado nos períodos de janeiro de 2004 a abril de 2004 e de junho de 2005 a dezembro de 2006, contudo, não restou efetivamente comprovada a contraprestação dos serviços, uma vez que não foram juntados aos autos documentos que evidenciassem o trabalho prestado pelo referido servidor à época, tampouco a comprovação de frequência ao serviço.

O Sr. Hélio Diniz Furlan, em seu depoimento (fls. 8410/811), asseverou que a conta corrente nº 64.933-9, agência 15, do então BESC, era de sua titularidade, para pagamento de servidores por serviços prestados, contudo, ficou comprovado que era de titularidade de Zilda Terezinha Furlan Figueiredo (fl. 198).

Extrai-se, ainda, do Relatório Conclusivo da Comissão de Tomada de Contas Especial (fl. 816):

Quanto ao valor de R$ 58.177,43 (cinquenta e oito mil, cento e setenta e sete reais e quarenta e três centavos), creditados na mesma conta, por supostos serviços prestados ao Estado, nos meses de janeiro a abril de 2004 e junho a dezembro de 2005 [2006], em nome de Hélio Diniz Furlan, fatos não comprovados, uma vez que Portarias não comprovam trabalho prestado [...] Há de se considerar ainda, que o Termo de Declaração assinado pela Senhora Marilene de Abreu Arruda Amarante, fls. 176/177, quando declara que o Senhor Hélio Diniz Furlan, no início do Governo Luiz Henrique da Silveira, se apossou da cadeira de Gerente de Educação, lá permanecendo por curto período, sem que houvesse ato administrativo para tanto e que este em certa oportunidade compareceu naquela GERED, quando Gestora a Senhora Lindalva Silveira Mosna, exigindo que esta contratasse certos professores e que diante da recusa, partiu para a baixaria chutando até lixeiras. Diante deste lamentável episódio, dito pela declarante e confirmado perante a Comissão pela própria Gerente Lindalva Silveira Mosna, resta a certeza da irregularidade. (grifo nosso)

Conclui-se, portanto, que houve afronta ao art. 37, caput, da Constituição Federal/88 (princípios da legalidade e moralidade), que determina:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência [...]

Outrossim, houve infração ao art. 63, da Lei Federal nº 4.320, de 17 de março de 1964, que estabelece: 

Art. 63. A liquidação da despesa consiste na verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito.

§ 1° Essa verificação tem por fim apurar:

I - a origem e o objeto do que se deve pagar;

II - a importância exata a pagar;

III - a quem se deve pagar a importância, para extinguir a obrigação.

§ 2º A liquidação da despesa por fornecimentos feitos ou serviços prestados terá por base:

I - o contrato, ajuste ou acôrdo respectivo;

II - a nota de empenho;

III - os comprovantes da entrega de material ou da prestação efetiva do serviço. (grifo nosso)

Por todo o exposto, haja vista a irregularidade apurada que acarretou dano ao erário, entende-se pela responsabilização individual do Sr. Hélio Diniz Furlan, por afronta ao art. 37, caput (princípios da legalidade e moralidade) da Constituição Federal e art. 63, da Lei Federal nº 4.320/64 (grifei).

Verifica-se, assim, que o responsável não logrou êxito em demonstrar a correspondente prestação de serviços indispensável ao recebimento de valores depositados em conta corrente, diversa da sua, inclusive, configurando, portanto, burla aos princípios da legalidade e moralidade insculpidos no art. 37, caput, da CRFB/88, bem como, em certa medida, afronta ao art. 63 da Lei n. 4.320/64.

Logo, o responsável em momento algum obteve êxito em demonstrar a regularidade financeira dos valores recebidos a título de remuneração, de modo que a imputação de débito é medida que se impõe, no valor correspondente ao que o responsável recebeu em seu nome na conta bancária sob debate, conforme disposto na conclusão deste parecer.

2.4. Alegações de defesa – Sr. Abel Varela

O responsável Sr. Abel Varela apresentou suas justificativas de defesa às fls. 1086-1094.

Em sede de preliminares, o responsável alegou a incidência da prescrição quinquenal da pretensão punitiva do Estado, em virtude de que os depósitos objeto de análise foram efetuados de julho de 2004 a março de 2005, ao passo que a primeira auditoria somente fora realizada em maio de 2010, a segunda em setembro de 2013, e a notificação formal administrativa em março de 2014, enquanto que a notificação desse Tribunal de Contas ocorreu em março de 2017. O responsável embasou sua tese na dicção do art. 37, § 5º, da CRFB/88, nos dispositivos da Lei n. 8.429/92 que tratam do assunto, e em excertos jurisprudenciais colacionados.

Relativamente ao mérito, o responsável asseriu que o modus operandi classificado como conduta irregular pela instrução não aconteceu exclusivamente na Gerência Regional de Educação de Lages, mas também nas Gerências Regionais de Educação de São Miguel do Oeste, Araranguá, Criciúma, Laguna e São Joaquim, consoante registrado em documento da Consultoria Jurídica da Secretaria de Estado da Educação, enviado de maneira anexa.

No que diz respeito à irregularidade em si, alegou que entre julho de 2004 e março de 2005 não desempenhou atividade de professor ACT’s para o Estado, e muito menos encaminhou qualquer documento para ser contratado, de modo que não havia possibilidade de receber salário. Aduziu que foi professor ACT no CEDUP Renato Ramos da Silva, no curso técnico, apenas no período compreendido entre 20.07.2007 a 18.12.2007, conforme documentos anexos. Destacou, também nesse sentido, que dentre os anexos consta sua verdadeira conta bancária à época, n. 073.610-0, Agência 015. Sobre tal assertiva, argumentou o seguinte (fl. 1091):

O que se conclui é que alguém com acesso restrito na Gerência Regional de Educação de Lages inseriu indevidamente seus dados no sistema e beneficiou-se economicamente, pois conforme está constatado pela auditoria da Fazenda, sequer os valores foram depositados em uma conta de sua titularidade.

Portanto, não há nos autos mínimos elementos que indiquem ter o noticiado recebido qualquer valor ou ter participado a inserção de seus dados no sistema da Gered em Lages.

Em seguida, o responsável trouxe tópico relativo à ausência de comprovação efetiva de dolo ou má-fé de sua parte, ressaltando que diante dos documentos e justificativas carreados aos autos, não se vislumbraria qualquer conduta típica e antijurídica, tampouco má-fé ou dolo, requisitos indispensáveis para a responsabilização por improbidade administrativa. A fim de reforçar sua tese, transcreveu uma série de excertos doutrinários e jurisprudenciais acerca do tema.

Por fim, o responsável requereu o acatamento da preliminar prescricional quinquenal e que a presente Tomada de Contas Especial fosse julgada improcedente, com a oportunidade de produção de novas provas caso fosse esse o entendimento do Relator a fim de solucionar a questão.

Em que pesem as justificativas apresentadas, entendo não assistir razão ao responsável.

Inicialmente, no que diz respeito à arguição de prescrição, remeto ao que já explanado no item anterior, no sentido de que o dano ao erário é imprescritível, não se podendo confundir a atuação dessa Corte de Contas com o julgamento de atos de improbidade administrativa, de competência exclusiva do Poder Judiciário.

No mesmo sentido, a correta tramitação do presente processo – seja na Secretaria de Estado da Educação, seja nesse Tribunal de Contas –, e a impossibilidade de oitiva de testemunhas, são questões que já restaram debatidas no presente parecer

Ainda, importa atentar para o fato de que o responsável assenta parte de seus argumentos em documentos que não foram anexados às suas alegações de defesa, de modo que restam prejudicadas as informações e assertivas apresentadas. Ainda nesse tom, considerando a ausência de elementos probatórios hábeis a contraditar a irregularidade que lhe fora atribuída inicialmente, afigura-se plausível, de plano, a manutenção da responsabilização e, consequentemente, do débito imputado.

Acrescenta-se, também, quanto à alegação de ausência de dolo ou má-fé, que no que compete a esse Tribunal de Contas, não há qualquer dispositivo na Lei Complementar Estadual n. 202/2000 que exija comprovação de má-fé para com o imputável. Mais ainda, no âmbito do Direito Administrativo, não há que se indagar sobre a boa ou má-fé do agente, mas sim sobre sua voluntariedade ao ato de praticar a conduta, a qual se constata nesses autos, sob o aspecto da omissão.

Sobre o tema, destaco as palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello[9], que bem sintetiza esse entendimento:

11. (d) Princípio da exigência de voluntariedade para incursão na infração – O Direito propõe-se a oferecer às pessoas uma garantia de segurança, assentada na previsibilidade de que certas condutas podem ou devem ser praticadas e suscitam dados efeitos, ao passo que outras não podem sê-lo, acarretando conseqüências diversas, gravosas para quem nelas incorrer. Donde, é de meridiana evidência que descaberia qualificar alguém como incurso em infração quando inexista a possibilidade de prévia ciência e prévia eleição, in concreto, do comportamento que o livraria da incidência na infração e, pois, na sujeição às sanções para tal caso previstas. Note-se que aqui não se está a falar de culpa ou dolo, mas de coisa diversa: meramente do animus de praticar dada conduta.

Ademais, conforme bem salientado pela área técnica (fls. 1104-1104v):

Verificou-se ainda, contradição entre as alegações de defesa e o depoimento do Sr. Abel Varela.

Transcreve-se da defesa apresentada nos autos (fls. 786 e 1.091):

[...] houve, por parte do Requerido, a efetiva prestação de serviços junto à SDR de Lages [...] entre os dias 27/05/2004 a 14/03/2005.

Ora, se houve a prestação de serviços, não há que se falar em devolução de qualquer tipo de valor [...]

Quanto aos depósitos terem sido realizados em Conta Corrente de titularidade diversa da do Requerido [conta de titularidade de Zilda Terezinha Furlan Figueiredo], não autoriza a devolução dos valores por parte do Requerido [...] uma vez que, como afirmado acima, a efetiva prestação dos serviços ocorreu. (grifo nosso)

Extrai-se do depoimento do Sr. Abel Varela (fl. 813):

[...] perguntado: qual a função que exercia entre janeiro de 2004 e dezembro de 20096; respondeu: que no período de julho de 2004 a março de 2005 na SDR de Lages na função de Assessor de Planejamento, sendo que seus vencimentos eram custeados pela Empresa do Ramo da Construção Civil, não se lembrando do nome e que seus vencimentos eram depositados por esta empresa diretamente na conta corrente do Declarante, não se lembrando do Banco; [...] perguntado: qual a origem destes valores e porque foram creditados nesta conta corrente; respondeu: que desconhece a origem [...] perguntado: qual a razão do declarante e o Senhor Hélio  Diniz Furlan terem recebido seus vencimentos  na conta corrente nº 64.933-9, agência 15, do banco BESC; respondeu: que desconhece [...] (grifo nosso)

Conforme Relatório de Auditoria nº 036/2010, da Secretaria de Estado da Fazenda/Gerência de Auditoria de Atos de Pessoal (fl. 11) “Tanto Hélio Diniz Furlan quanto Abel Varela receberam suas remunerações na conta 64.933-9.” (grifo nosso)

Dessa forma, ficou evidenciado que o Sr. Abel Varela, Assessor de Planejamento na SDR/Lages à época, recebeu o montante de R$ 22.061,78 (vinte e dois mil, sessenta e um reais e setenta e oito centavos), por meio da conta corrente nº 64.933-9, agência 15, do então Banco BESC, de titularidade da Sra. Zilda Terezinha Furlan Figueiredo.  

Acrescenta-se, ainda, informação constante do Relatório Conclusivo da Comissão de Tomada de Contas Especial (fls. 815/816):

[...] Senhor Abel Varela [...] desconhece o titular da conta corrente nº 64.933-9, da agência 15 do então Banco do Estado de Santa Catarina, no município de Lages e apontados às fls. 10 do Relatório de Auditoria nº 0036/2010, fatos que pareceu ignorar ter declarado à Comissão quando da apresentação das alegações finais, ressaltando que não há comprovação do trabalho prestado pelo suposto servidor na SDR de Lages (grifei).   

Verifica-se, assim, que o responsável não logrou êxito em demonstrar a correspondente prestação de serviços indispensável ao recebimento de valores depositados em conta corrente, diversa da sua, inclusive, configurando, portanto, burla aos princípios da legalidade e moralidade insculpidos no art. 37, caput, da CRFB/88, bem como, em certa medida, afronta ao art. 63 da Lei n. 4.320/64.

Portanto, levando em consideração as peculiaridades inerentes à questão e a inexistência de documentos probatórios em sentido contrário, entendo pela manutenção da irregularidade e, consequentemente, do débito de responsabilidade do Sr. Abel Varela, conforme disposto na conclusão deste parecer.

3. Conclusão

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, manifesta-se:

3.1 pela IRREGULARIDADE das contas em análise nestes autos, na forma do art. 18, inciso III, alínea “d”, c/c o art. 21, caput, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, em razão do recebimento indevido de valores por professores ACT’S que não tiveram a prestação dos respectivos serviços  comprovados na circunscrição da Gerência Regional de Educação de Lages (27ª GERED), no período de janeiro de 2004 a dezembro de 2006, em afronta aos princípios da legalidade e da moralidade insculpidos no art. 37, caput, da CRFB/88, bem como ao art. 63 da Lei n. 4.320/64, consoante apontado nos itens 2.3 e 2.4 deste parecer (item 3.1 da conclusão do Relatório n. DAP-062/2018, às fls. 1106-1106v);

3.2. pela IMPUTAÇÃO DE DÉBITO aos responsáveis, sem o prejuízo da aplicação de multa proporcional ao dano, na forma do art. 18, inciso III, alínea “d”, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, nos seguintes moldes:

3.2.1. ao Sr. Helio Diniz Furlan, Gerente da SEDR de Lages à época dos fatos, no montante individualizado de R$ 58.177,43, devidamente atualizado e acrescido dos juros legais, diante do recebimento da referida importância advinda da conta corrente n. 64.933-9, agência 15, do então Banco BESC, em face de eventuais serviços prestados ao Estado nos períodos de janeiro de 2004 a abril de 2004 e de junho de 2005 a dezembro de 2006, sem que houvesse a respectiva comprovação da contraprestação dos serviços (item 3.1.1 da conclusão do Relatório n. DAP-062/2018, às fls. 1106-1106v);

3.2.2. ao Sr. Abel Varela, Assessor da SEDR de Lages à época dos fatos, no montante individualizado de R$ 22.061,78, devidamente atualizado e acrescido dos juros legais, diante do recebimento da referida importância advinda da conta corrente n. 64.933-9, agência 15, do então Banco BESC, em face de eventuais serviços prestados ao Estado nos períodos de julho de 2004 a março de 2005, sem que houvesse a respectiva comprovação da contraprestação dos serviços (item 3.1.2 da conclusão do Relatório n. DAP-062/2018, à fl. 1106v);

3.3. pela REMESSA DE INFORMAÇÕES contidas nestes autos ao Ministério Público do Estado de Santa Catarina, oficiando-se também ao Centro de Apoio Operacional da Moralidade Administrativa, em cumprimento ao disposto no art. 18, § 3º, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, para ciência dos fatos descritos nestes autos e adoção das providências cabíveis.

Florianópolis, 17 de agosto de 2018.

 

Cibelly Farias Caleffi

Procuradora



[1] Conta corrente n. 64.933-9, Agência 15, Banco do Estado de Santa Catarina – BESC.

[2] Como apontado pela Comissão da Tomada de Contas Especial instaurada na SED (fl. 819).

[3] Entendimento recentemente confirmado por esse Tribunal no voto condutor do Acórdão n. 0221/2016.

[4] Vide pareceres proferidos nos processos REC n. 15/00163799, REC n. 15/00429497, REC n. 15/00489201, REC n. 15/00489392, REC n. 15/00489473, TCE n. 09/00144130 e TCE n. 11/00031364.

[5] SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 673.

[6] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2006, p. 791.

[7] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2012, p. 580.

[8] Nesse sentido, destaca-se que a inclusão de dispositivo da Lei n. 8.429/92 na capitulação da irregularidade no relatório técnico inicial mostrou-se inoportuna, o que fora devidamente corrigido no relatório técnico final, não gerando, de qualquer forma, quaisquer prejuízos ao andamento do presente processo.

[9] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. Ed. Malheiros. São Paulo, 2012, p. 872.