Parecer nº:

MPC/DRR/59.404/2018

Processo nº:

REP 16/00305447    

Origem:

Município de Jaraguá do Sul

Assunto:

Irregularidades na prestação do serviço de transporte público coletivo aos portadores de necessidades especiais.

 

 

 

Número Unificado: MPC-SC 2.3/2018.1974

 

 

 

Trata-se de representação formulada pelo Ministério Público Estadual, Comarca de Jaraguá do Sul, noticiando possíveis irregularidades na prestação do serviço de transporte público coletivo do Município de Jaraguá do Sul aos portadores de necessidades especiais

A Diretoria de Controle de Licitações e Contratações, por meio do relatório de nº 341/2016 (fls. 26-29), sugeriu o conhecimento da representação e a realização de audiência do Prefeito Municipal de Jaraguá do Sul para se manifestar a respeito das irregularidades apuradas, sugestão acolhida pelo Relator (fls. 30-31).

Perfectibilizado o ato processual, o responsável apresentou justificativas às fls. 110-132 e acostou ao feito os documentos de fls. 133-338 e 340-399.

Neste ínterim, o Ministério Público Estadual juntou ao caderno processual documentos referentes ao Inquérito Civil n° 06.2013.00010323-3 (fls. 38-101) e novos documentos acerca de eventual continuidade das irregularidades (fls. 402-413).

Após, sobreveio novo exame da área técnica, sob o relatório de nº 096/2017 (fls. 415-421), com a seguinte sugestão:

 

3.1. Considerar improcedente a Representação, nos termos do artigo 26 da IN n. TC-0021/2015.

3.2. Recomendar ao Município de Jaraguá do Sul que adote as providências necessárias para evitar que o serviço denominado “Levabem” seja suspenso nas regiões do Município onde não se verifique que todas as linhas de transporte coletivo sejam totalmente atendidas por veículos dotados de plataforma elevatória veicular, mantendo as determinações do Termo de Ajustamento de Conduta firmado em 13/10/2013, até que esteja garantido o uso de veículos acessíveis a todas as pessoas, nos termos da Lei nº 13.146/2015, especialmente às pessoas com deficiência que fazem uso de cadeira de rodas.

3.3. Dar ciência do Relatório e da Decisão ao Representante Sr. Henrique da Rosa Ziesemer – Promotor de Justiça da Comarca de Jaraguá do Sul, ao atual Prefeito Municipal Sr. Antídio Aleixo Lunelli, à Procuradoria Jurídica da Prefeitura Municipal de Jaraguá do Sul e ao Controle Interno do Município.

 

OU, caso o Exmo. Sr. Relator entender por conhecer das novas informações juntadas pelo Sr. Henrique da Rosa Ziesemer – Promotor de Justiça da Comarca de Jaraguá do Sul:

3.1. Conhecer das novas informações juntadas pelo Sr. Henrique da Rosa Ziesemer – Promotor de Justiça da Comarca de Jaraguá do Sul – contra supostas irregularidades no sistema de transporte público coletivo quanto à acessibilidade aos portadores de necessidades especiais, no Município de Jaraguá do Sul, e arguir a seguinte irregularidade:

3.1.1. Ausência de acessibilidade nos pontos de parada e terminal urbano de transporte coletivo, considerados partes integrantes dos serviços de transporte coletivo, em afronta ao estabelecido nos arts. 46 e 48 da Lei n° 13.146/2015, conforme item 2.3 deste relatório.

3.2. Determinar audiência do Responsável, Sr. Antídio Aleixo Lunelli, Prefeito Municipal de Jaraguá do Sul, CPF 438.634.429-20, com endereço à Rua Walter Marquardt, nº 1111, Jaraguá do Sul-SC, no prazo de 30 (trinta) dias, nos termos do art. 29, § 1º, da Lei Complementar n. 202, de 15 de dezembro de 2000, para, no prazo que entender cabível, a contar do recebimento desta deliberação, com fulcro no art. 46, I, b, do mesmo diploma legal c/c o art. 124 do Regimento Interno (Resolução nº TC-06, de 28 de dezembro de 2001), apresentar alegações de defesa acerca das irregularidades apontadas no item 3.1, desta Conclusão, ensejadoras de aplicação de multa prevista no art. 70 da Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000.

3.3. Recomendar ao Município de Jaraguá do Sul que adote as providências necessárias para evitar que o serviço denominado “Levabem” seja suspenso nas regiões do Município onde não se verifique que todas as linhas de transporte coletivo sejam totalmente atendidas por veículos dotados de plataforma elevatória veicular, mantendo as determinações do Termo de Ajustamento de Conduta firmado em 13/10/2013, até que esteja garantido o uso de veículos acessíveis a todas as pessoas, nos termos da Lei nº 13.146/2015, especialmente às pessoas com deficiência que fazem uso de cadeira de rodas.

3.4. Dar ciência do Relatório e da Decisão ao Representante Sr. Henrique da Rosa Ziesemer – Promotor de Justiça da Comarca de Jaraguá do Sul, ao atual Prefeito Municipal Sr. Antídio Aleixo Lunelli, à Procuradoria Jurídica da Prefeitura Municipal de Jaraguá do Sul e ao Controle Interno do Município.

 

O Relator, mediante a Decisão Singular nº GAC/WWD – 336/2017 (fls. 422-423), conheceu das novas informações apresentadas pelo Ministério Público Estadual e determinou a realização de audiência do responsável para se manifestar quanto: a) à ausência de acessibilidade nos pontos de parada e terminal urbano de transporte coletivo, considerados partes integrantes dos serviços de transporte coletivo e; b) à suspensão do serviço denominado “Levabem” previsto no Termo de Ajustamento de Conduta firmado em 13/10/2013.

Efetuado o ato processual, o responsável solicitou e teve concedida a prorrogação de prazo (fl. 439) e, em seguida, apresentou alegações de defesa às fls. 441-444 e os documentos de fls. 445-447.

Por fim, a Diretoria de Controle de Licitações e Contratações, sob o relatório de nº 229/2017 (fls. 451-454), apresentou a seguinte conclusão:

 

3.1. CONSIDERAR PROCEDENTE a representação interposta pelo Sr. Henrique da Rosa Ziesemer – Promotor de Justiça da Comarca de Jaraguá do Sul, contra supostas irregularidades na prestação do serviço de transporte público coletivo quanto à acessibilidade aos portadores de necessidades especiais, no Município de Jaraguá do Sul, no que se refere à falta de adoção de medidas para garantir acessibilidade nos pontos de parada e terminal urbano de transporte coletivo, considerados partes integrantes dos serviços de transporte coletivo.

3.2. APLICAR MULTA ao Sr. Antídio Aleixo Lunelli, Prefeito Municipal de Jaraguá do Sul, CPF 438.634.429-20, com endereço à Rua Walter Marquardt, nº 1111, Jaraguá do Sul-SC, por deixar de cumprir o previsto nos arts. 46 e 48 da Lei n° 13.146/2015, face a falta de adoção de medidas para garantir acessibilidade nos pontos de parada e terminal urbano de transporte coletivo, considerados partes integrantes dos serviços de transporte coletivo (multa prevista no art. 70 da Lei Complementar Estadual nº 202/2000).

3.3. DETERMINAR ao Município de Jaraguá do Sul que adote as providências necessárias para garantir a acessibilidade aos serviços de transporte público para os usuários que fazem uso de cadeira de rodas, especialmente no que se refere à acessibilidade nos pontos de parada e terminal urbano de transporte coletivo, considerados partes integrantes dos serviços de transporte coletivo, nos termos da Lei nº 13.146/2015.

3.4. DAR CIÊNCIA do Relatório e da Decisão ao Representante Sr. Henrique da Rosa Ziesemer – Promotor de Justiça da Comarca de Jaraguá do Sul, ao Prefeito Municipal Sr. Antídio Aleixo Lunelli, à Procuradoria Jurídica da Prefeitura Municipal de Jaraguá do Sul e ao Controle Interno do Município.

 

É o relatório.

 

1. Da suspensão do serviço denominado “Levabem”

 

Colhe-se dos autos que, em dezembro de 2015, o sistema de transporte coletivo do Município de Jaraguá do Sul contava com 90 veículos, sendo 85 acessíveis. Destes, apenas 36 possuíam a plataforma elevatória veicular.

No relatório nº 96/2017, a área técnica havia pontuado que, nos termos da legislação aplicável, um veículo considerado acessível (característica que somente lhe é conferida após vistoria realizada por Organismo de Inspeção Acreditado pelo Inmetro) não precisa possuir, necessariamente, uma plataforma elevatória veicular.

Consta ainda do caderno processual que dos 05 veículos que não atendiam às normas de acessibilidade, dois eram do tipo “vans” adaptadas ao serviço “Levabem” e três eram microônibus que seriam desligados do sistema.

Neste ponto, cabe mencionar que o serviço “Levabem” foi instituído a partir do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC)[1] firmado em outubro de 2005 e que deveria ser prestado até que a frota de veículos estivesse totalmente acessível.

Cabe assentar que uma parcela considerável dos usuários do serviço “Levabem” são pessoas que fazem uso de cadeira de rodas e que, nessa situação, não teriam a acessibilidade ao transporte coletivo garantida, uma vez que nem todos os veículos do sistema de transporte coletivo possuíam plataforma elevatória, mesmo os caracterizados como acessíveis.

Diante da situação ora apontada, a área técnica sugeriu recomendar à Unidade Gestora que evitasse que o serviço denominado “Levabem” fosse suspenso nas regiões do Município onde as linhas de transporte coletivo não fossem totalmente atendidas por veículos dotados de plataforma elevatória veicular.

Instado a se manifestar, o responsável informou que a concessionária de transporte, à revelia de qualquer autorização da Administração e sob o argumento de que a frota já estava acessível, suspendeu o serviço “Levabem”.

Asseverou que ao tomar conhecimento de tal fato – ainda em março de 2017, antes mesmo da elaboração do Relatório nº DLC 96/2017 –, notificou a empresa Viação Canarinho Ltda. para que fosse dada continuidade ao serviço “Levabem”.

Para corroborar, acostou aos autos cópia da notificação enviada à empresa ordenando a continuidade imediata do serviço (fl. 445) e, ainda, mensagem eletrônica da engenheira Thais Henning, servidora pública que atua nas relações entre o Poder Público e a concessionária, informando que a empresa, após o recebimento da notificação, reestabeleceu os serviços nos moldes do TAC assinado em 2013 (fls. 446-447).

Considerando que o responsável adotou providências para que fosse dada continuidade ao serviço denominado “Levabem”, entendo que não deva ser cominada multa ao gestor.

Todavia, considero cabível formular determinação para que o Município continue a fiscalizar a execução do serviço denominado “Levabem”, de modo a garantir sua prestação enquanto não for assegurada a acessibilidade de todos os veículos do transporte coletivo.

 

2. Da ausência de acessibilidade nos pontos de parada e terminal urbano de transporte coletivo

 

Outra irregularidade noticiada pelo Ministério Público Estadual foi a falta de acessibilidade nos pontos de parada de ônibus e no terminal urbano do Município para os usuários que fazem uso de cadeira de rodas, em violação ao disposto no art. 46, § 1º e art. 48 da Lei nº 13.146/2015[2] - Estatuto da Pessoa com Deficiência.

No tocante a este apontamento, o responsável alegou dificuldade orçamentária para fazer frente aos encargos com acessibilidade.

Consoante assentou a equipe técnica, o Município poderia ao menos realizar adaptações para a acessibilidade nos pontos de parada próximos às residências dos usuários cadastrados com mobilidade reduzida, o que certamente não causaria desequilíbrio nas contas no Município.

Ademais, é preciso que os gestores parem de agir como se a acessibilidade fosse uma questão secundária. O direito à acessibilidade deve ser encarado como um direito fundamental, sob pena de se violar a dignidade de milhões de cidadãos com alguma deficiência ou com mobilidade reduzida. É preciso eliminar barreiras e promover a dignidade dessas pessoas por meio do acesso adequado a todos os direitos básicos de qualquer cidadão. 

Como a Unidade não adotou nenhuma medida para garantir a acessibilidade nos pontos de parada e no terminal urbano do Município, entende-se que a irregularidade subsiste, devendo haver, portanto, a aplicação de multa ao responsável.

Ademais, entendo pertinente a formulação de determinação ao Município de Jaraguá do Sul para que, no prazo de 60 dias, adote providências a fim de regularizar a situação em apreço.

 

 

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar no 202/2000, manifesta-se pelo acolhimento das conclusões do relatório nº 229/2017, acrescentando apenas a formulação de determinação ao Município para que continue a fiscalizar a execução do serviço denominado “Levabem”, de modo a garantir sua prestação enquanto não for assegurada a acessibilidade de todos os veículos do transporte coletivo.

Florianópolis, 12 de novembro de 2018.

 

 

Diogo Roberto Ringenberg

Procurador de Contas

 



[1] XII – O serviço ajustado no presente termo será gradualmente suspenso, na medida em que a frota de veículos da COMPROMISSÁRIA VIAÇÃO CANARINHO LTDA. Vinculada ao sistema de transporte coletivo urbano de Jaraguá do Sul for se adequando às regras de acessibilidade estabelecidas na legislação pertinente, sendo definitivamente suspenso a partir do momento em que toda a frota de veículos esteja totalmente acessível;

 

[2] Art. 46. O direito ao transporte e à mobilidade da pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida será assegurado em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, por meio de identificação e de eliminação de todos os obstáculos e barreiras ao seu acesso.

§ 1º Para fins de acessibilidade aos serviços de transporte coletivo terrestre, aquaviário e aéreo, em todas as jurisdições, consideram-se como integrantes desses serviços os veículos, os terminais, as estações, os pontos de parada, o sistema viário e a prestação do serviço.

[...]

Art. 48. Os veículos de transporte coletivo terrestre, aquaviário e aéreo, as instalações, as estações, os portos e os terminais em operação no País devem ser acessíveis, de forma a garantir o seu uso por todas as pessoas. (Grifou-se)