Parecer
nº: |
MPC/DRR/62.260/2019 |
Processo
nº: |
REP 16/00366403 |
Origem: |
Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - CASAN |
Assunto: |
Irregularidades no contrato decorrente do Edital Pregão Presencial nº 009/2016, referente à contratação de caminhão-pipa para o serviço de transporte de água tratada. |
Número Unificado: MPC-SC 2.3/2019.1625
Trata-se de representação protocolada pela empresa Ilha Limpeza e Serviços Ltda. – EPP, para noticiar irregularidades no Pregão Presencial nº 009/2016, relacionadas à ocorrência de suposto conluio e fraude entre os participantes do certame.
Após a regular instrução do feito, a área técnica formulou a seguinte proposta de voto ao relator (fls. 366-379):
3.1. CONSIDERAR PARCIALMENTE PROCEDENTE, nos termos do parágrafo único do art. 27 da
Instrução Normativa nº TC-021/2015, o mérito da Representação, que trata de
supostas irregularidades no Pregão nº 009/2016, para contratação de transporte
de água tratada, lançado pela Casan.
3.3. APLICAR MULTA
à sra. Sabrina de Abreu, Pregoeira da Casan, inscrita no CPF/MF sob o nº
074.939.509-81, que na condição de subscritora do edital de convocação do
Pregão Presencial nº 009/2016 não exigiu junto ao referido certame, para fins
de comprovação da regularidade fiscal, a prova de inscrição no cadastro de
contribuintes pertinentes ao seu ramo de atividade e compatível com o objeto
contratual, violando o inciso II do art. 29 da Lei Federal nº 8.666/93 (item
2.2.2. deste Relatório).
3.4. APLICAR MULTA
ao sr. Renaldo Domingos Ramos, Gerente de Licitações da Casan, inscrito no
CPF/MF sob o nº 252.286.689-34, por ter aprovado a
realização de mandato entre a empresa Contratada ST Veículos e Locações Ltda –
ME e o sr. Murilo Silveira de Souza, ocasionando a transferência da gestão do
Contrato de Prestação de Serviços nº 742/2016, decorrente do Pregão Presencial
nº 009/2016, e a tácita subcontratação da Recap do Brasil, nome fantasia da
empresa Silveira & Souza Ltda. ME, de propriedade do mandatário,
contrariando os princípios da moralidade administrativa, eficiência e dever
geral de licitar, violando os arts. 2º e 72 da Lei nº 8.666/93 c/c e item 2.5
do Contrato nº 742/2016 (item 2.7.1. deste Relatório).
3.5. RECOMENDAR à Companhia Catarinense de Águas e Saneamento, na
pessoa do sr. Valter Gallina, e especialmente à Gerência de Licitações, na
pessoa do sr. Renaldo Domingos Ramos e da sra. Sabrina de Abreu, que estejam
alertas e adotem providências compatíveis ao menor indício de atuação combinada
entre licitantes, com vistas à prevenção de fraudes e a se evitar práticas de
conluio em certames da Companhia.
3.6. ALERTAR as
empresas BBB Pré-Moldados EIRELI ME, na pessoa do sócio administrador sr.
Marcelo Ribeiro Borghezan, ST Veículos e Locações Ltda. ME na pessoa do sócio
administrador sr. Rafael Santos Sousa, Pavsul Asfaltos e Pavimentações Ltda.
EPP na pessoa da sócia gerente sra. Cristina Santos de Sousa Lima, Murilo
Silveira de Souza ME, na pessoa do sr. Murilo Silveira de Souza e Recap do
Brasil (Silveira & Souza Ltda. ME) também na pessoa do sr. Murilo Silveira
de Souza, acerca da previsão do art. 90 da Lei nº 8.666/93, de que configura-se
como crime, com detenção de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa, “Frustrar ou
fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter
competitivo do procedimento licitatório, com o intuito de obter, para si ou
para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação”.
3.7. REPRESENTAR ao
Ministério Público de Santa Catarina, para os devidos fins e para conhecimento
dos fatos, por força do art. 99 da Resolução nº TC-06/2011 (Regimento Interno).
3.8. DAR CIÊNCIA
deste Relatório e da Decisão à Representante, aos Responsáveis e ao órgão de
controle interno da Casan.
É o relatório.
1.
Apontamentos mantidos pela área técnica no
relatório nº 187/2017
Inicialmente, no que diz respeito às irregularidades em que a área técnica sugeriu a aplicação da pena de multa, acompanharei o seu posicionamento, especialmente porque as justificativas apresentadas não foram suficientes para afastá-las.
Aos responsáveis Sr. Arnaldo Venício de Souza, Diretor Administrativo da CASAN, e Sra. Sabrina de Abreu, pregoeira, e ambos subscritores do Pregão Presencial nº 009/2016, foi imputada a irregularidade abaixo descrita:
Por sua vez, o Sr. Renaldo Domingos Ramos, Gerente de Licitações da CASAN, respondeu pelo seguinte apontamento:
- por ter aprovado a realização de mandato entre a empresa Contratada ST Veículos e Locações Ltda – ME e o sr. Murilo Silveira de Souza, ocasionando a transferência da gestão do Contrato de Prestação de Serviços nº 742/2016, decorrente do Pregão Presencial nº 009/2016, e a tácita subcontratação da Recap do Brasil, nome fantasia da empresa Silveira & Souza Ltda. ME, de propriedade do mandatário, contrariando os princípios da moralidade administrativa, eficiência e dever geral de licitar, violando os arts. 2º e 72 da Lei nº 8.666/93 c/c e item 2.5 do Contrato nº 742/2016 (item 2.7.1. do relatório nº 187/2017).
Reitero que as alegações de defesa são frágeis e não foram o bastante para excluir a responsabilidade dos agentes acima mencionados.
Logo, este órgão de controle externo pugna pela aplicação de multas nos termos propostos nas conclusões do relatório técnico.
2. Apontamentos
afastados pela área técnica
2.1. Apontamentos atribuídos ao Sr. Arnaldo Venício
de Souza e à Sra. Sabrina de Abreu (itens 2.1.1, 2.1.3 e 2.2.1 do relatório nº
187/2017)
Verifica-se, por outro lado, que a área técnica considerou sanada a seguinte restrição em relação ao Sr. Arnaldo Venício de Souza e à Sra. Sabrina de Abreu:
- não exigir, para fins de qualificação técnica do
Pregão Presencial nº 009/2016, a comprovação da inscrição da licitante no
Conselho Regional de Química da sede da licitante, em desacordo com o inciso IV
do art. 30 da Lei nº 8.666/93 (itens 2.1.1. e 2.2.1. do relatório nº 187/2017);
Mais uma vez, acompanharei o entendimento do corpo instrutivo.
Com efeito, não há razão para exigir das interessadas a inscrição no Conselho Regional de Química na hipótese de o serviço a ser prestado ser apenas o de transporte de água, não compreendendo qualquer outra atividade relativa ao tratamento do produto durante o traslado.
Como bem pontuado pelo corpo instrutivo, os caminhões-pipa contratados para o transporte realizarão somente a distribuição da água fornecida pela CASAN. Por isso, recai sobre a empresa estatal a responsabilidade técnica pela qualidade do produto transportado.
Desse modo, estou de acordo com a conclusão da diretoria.
Adiante, em relação ao Sr. Arnaldo Venício de Souza, subscritor do edital, a diretoria técnica posicionou-se por afastar o seguinte apontamento:
- transferência da gestão do Contrato de Prestação de Serviços nº 742/2016, decorrente do Pregão Presencial nº 009/2016, ao Sr. Murilo Silveira de Souza, seguida de subcontratação à empresa Recap do Brasil (Silveira & Souza Ltda. ME), contrariando os princípios da moralidade administrativa, eficiência e dever geral de licitar, violando os arts. 2º e 72 da Lei nº 8.666/93 c/c e item 2.5 do Contrato nº 742/2016 (item 2.1.3. do relatório nº 187/2017).
Em que pese a gravidade da restrição, novamente acompanho o posicionamento do corpo instrutivo.
A irregularidade foi afastada pois não era atribuição do Sr. Arnaldo Venício de Souza realizar a gestão do contrato. Muito embora tenha sido subscritor do edital, ele não foi designado para atuar na fiscalização do contrato.
Portanto, eventuais irregularidades existentes a partir da execução do acordo não podem ser imputadas a ele.
Nada obstante, o Sr. Renaldo Domingos Ramos, Gerente de Licitações da CASAN, atuou diretamente para que houvesse a transferência da gestão do contrato, o que justifica a aplicação da pena de multa a ele, conforme sugerido no item supra.
Além do mais, exsurge dos autos a notícia de que houve a instauração de Inquérito Civil[1], no âmbito do Ministério Público Estadual (fl. 385), para apurar irregularidades no Pregão Presencial nº 009/2016.
Entende-se que o inquérito conduzido pelo MPSC permitirá aprofundar as investigações concernentes ao processo de licitação e à execução contratual, incluindo a averiguação sobre outros possíveis responsáveis pela transferência irregular da gestão do contrato.
2.2. Apontamento atribuído à Sra. Sabrina
de Abreu (item 2.2.3 do relatório nº 187/2017)
No que diz respeito à Sra. Sabrina de Abreu, o corpo instrutivo posicionou-se pela formulação de recomendação como consequência do seguinte apontamento:
Esse mesmo apontamento ainda foi objeto de audiência das empresas que participaram do certame.
Data venia, entendo que está caracterizada a irregularidade, justificando a aplicação de multa à responsável.
Em análise às suas alegações de defesa, a Sra. Sabrina de Abreu sustenta que, se houve conluio, não teve conhecimento e muito menos participação.
Acrescentou que o alegado conluio não poderia ser caracterizado somente pelo fato de duas empresas serem do mesmo município ou estarem estabelecidas no mesmo bairro.
Trouxe outras alegações no mesmo sentido, para concluir que os indícios são frágeis e que não poderia ser exigido dela o conhecimento sobre a fraude.
As empresas prestaram esclarecimentos e negaram a existência de irregularidade.
A área técnica então sintetizou o seu entendimento sobre o possível ajuste prévio entre as empresas: “a comprovação de conluio apenas com elementos e provas consignadas em documentos é de difícil comprovação. Nesta seara, torna-se ardiloso imputar responsabilidade a determinada empresa por este fato, visto a ausência de provas que garantam evidências à concertação de atos que supostamente foram articulados”.
Concorda-se com a área técnica quando diz que a comprovação de conluio é difícil.
Porém, considerando o modo como ocorre o ajuste espúrio, não se pode exigir provas demasiadamente eloquentes, como uma confissão, para que o Tribunal de Contas decida impor efetiva punição aos responsáveis.
Caso se espere por algo mais explícito, a aplicação de multa decorrente da comprovação de conluio em certames licitatórios torna-se praticamente inviável, fazendo com que a Corte de Contas não consiga punir com o rigor necessário uma das condutas mais prejudiciais à lisura do processo licitatório.
Por outro lado, a união de robustos indícios sobre o prévio ajuste entre as participantes, a meu ver, deve servir como alicerce para justificar a responsabilização do gestor público, no caso da Sra. Sabrina de Abreu, que atuou como pregoeira no certame e deveria ter agido perante tantos indícios.
A propósito, no caso concreto, a cronologia dos fatos, concatenada pela área técnica no relatório nº 464/2016, permite, sim, concluir que houve conluio entre as empresas, senão vejamos:
(a) ao permitir
que empresas que não tinham como atividade econômica a “Distribuição de água
por caminhões”, a Casan possibilitou que empresas com vínculo comercial
combinassem previamente as suas participações no certame;
(b) a empresa
BBB Pré-Moldados, cuja sede fica na mesma cidade das empresas ST Veículos e
Locações e Pavsul Asfaltos e Pavimentações (Tubarão), agiu como o “coelho”,
descrito anteriormente, ao mergulhar o preço inicial, excluindo do certame a
Representante e outra participante da combinação, Murilo Silveira de Souza.
Além do mais, mesmo com a “melhor proposta”, não se fez representar na fase de
lances, se auto excluindo da disputada. Veja-se que seu objetivo era justamente
esse;
(c) restaram na
“disputa” simulada apenas as empresas ST Veículos e Locações e Pavsul Asfaltos
e Pavimentações, que possuem como sócios em comum os srs. Fernando Martins
Cordeiro Rafael Santos Sousa, em que na quarta rodada a Pavsul não ofertou mais
lances.
(d) após ser
contratada, a empresa ST Veículos e Locações “transfere” a gestão do Contrato
ao sr. Murilo Silveira de Souza, conforme “Termo Particular de Mandato” (fls.
59-60). Este, por sua vez, contrata sua própria empresa, a Recap do Brasil,
para fazer o serviço, conforme fotos de fls. 50-51 e documentos fiscais de fls.
73-75 o qual transfere a execução para outra empresa, a Beatriz da Silva
Silveira de Souza.[2]
Pondero que não se pode tratar os fatos apurados a partir de documentos como meros elementos indiciários. A bem da verdade, é a união de fortes indícios que formam robusta prova no sentido de que houve conluio entre os participantes do certame.
Nesse sentido, colhe-se do Tribunal de Contas da União:
A caracterização de conluio exige a conjunção de
indícios vários e coincidentes que apontem para a ocorrência de fraude à
licitação, consubstanciada na prática de atos capazes de restringir o caráter
competitivo do procedimento licitatório e de promover o direcionamento do
certame.[3]
A meu ver, esses fartos elementos deveriam ter sido objeto de atenção da pregoeira à época da realização do certame. Até porque não era a primeira vez que a CASAN lançava um edital com o objeto idêntico e tampouco faltava experiência para a responsável, haja vista que atuava na função há quase quatro anos – como ela própria relatou.
Diante da gravidade dos fatos e da função desempenhada pela pregoeira, entendo que formular mera recomendação não é suficiente, razão pela qual pugno pela aplicação da pena de multa à Sra. Sabrina de Abreu.
Para arrematar, entendo que a recomendação – nos termos propostos pelo corpo instrutivo – deve ser convertida em determinação dirigida à CASAN e, especificamente, à Gerência de Licitações, para que fiquem alertas e adotem providências diante de indícios de atuação combinada entre licitantes, com o objetivo de prevenir fraudes e evitar práticas de conluio em certames da Companhia.
Ademais, entendo que os fatos devam ser comunicados ao MPSC, para fins de subsidiar o Inquérito Civil nº 06.2016.00007353-4, em trâmite na 26ª Promotoria de Justiça da Comarca da Capital.
Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar nº 202/2000, manifesta-se por:
1. Aplicar multa aos seguintes responsáveis:
1.1. Sr. Arnaldo Venício de Souza, Diretor Administrativo da CASAN, em decorrência da seguinte irregularidade:
1.1.1. não exigência junto ao referido certame, para fins de comprovação da regularidade fiscal, a prova de inscrição no cadastro de contribuintes pertinentes ao seu ramo de atividade e compatível com o objeto contratual, violando o inciso II do art. 29 da Lei Federal nº 8.666/93 (itens 2.1.2. do relatório nº 187/2017);
1.2. Sra. Sabrina de Abreu, Pregoeira da CASAN, em virtude das seguintes irregularidades:
1.2.1. não exigência junto ao referido certame, para fins de comprovação da regularidade fiscal, a prova de inscrição no cadastro de contribuintes pertinentes ao seu ramo de atividade e compatível com o objeto contratual, violando o inciso II do art. 29 da Lei Federal nº 8.666/93 (itens 2.2.2. do relatório nº 187/2017);
1.2.1. existência de conluio entre as empresas ST Veículos e Locações Ltda. EPP, BBB Pré-Moldados Ltdas. ME, Pavsul Asfaltos e Pavimentações Ltda. EPP e Murilo Silveira de Souza ME com vistas a fraudar o Pregão Presencial nº 009/2016, em violação ao disposto no inciso XXI do art. 37 e § 4º do art. 173, ambos da Constituição Federal c/c o caput do art. 3º da Lei nº 8.666/93 (item 2.2.3 no relatório nº 187/2017);
1.3. Aplicar multa ao Sr. Renaldo Domingos Ramos, Gerente de Licitações da CASAN, em decorrência da seguinte irregularidade:
1.3.1. por ter aprovado a realização de mandato entre a empresa Contratada ST Veículos e Locações Ltda – ME e o sr. Murilo Silveira de Souza, ocasionando a transferência da gestão do Contrato de Prestação de Serviços nº 742/2016, decorrente do Pregão Presencial nº 009/2016, e a tácita subcontratação da Recap do Brasil, nome fantasia da empresa Silveira & Souza Ltda. ME, de propriedade do mandatário, contrariando os princípios da moralidade administrativa, eficiência e dever geral de licitar, violando os arts. 2º e 72 da Lei nº 8.666/93 c/c e item 2.5 do Contrato nº 742/2016 (item 2.7.1. no relatório nº 187/2017);
2. Formular determinação à CASAN e, especificamente, à Gerência de Licitações, para que fiquem alertas e adotem providências diante de indícios de atuação combinada entre licitantes, com o objetivo de prevenir fraudes e evitar práticas de conluio em certames da Companhia;
3. Remeter cópia do presente feito ao Ministério Público de Santa Catarina, para fins de subsidiar o Inquérito Civil nº 06.2016.00007353-4, em trâmite na 26ª Promotoria de Justiça da Comarca da Capital.
Florianópolis, 02 de abril de 2019.
Diogo Roberto Ringenberg
Procurador de Contas
[1] Em consulta ao endereço eletrônico do MPSC, verifica-se que o Inquérito Civil nº 06.2016.00007353-4 encontra-se em andamento na 26ª Promotoria de Justiça da Comarca da Capital, tendo sido solicitado, no dia 13.02.2019, cópia destes autos para auxiliar nas investigações.
[2] Fl. 81-82v.
[3] BRASIL, Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 2649/2015. Plenário. Tomada de Contas Especial. Rel. André de Carvalho. Data da sessão: 21.10.2015. Disponível em: https://portal.tcu.gov.br/inicio/index.htm. Acessado em: 26.03.2019.