PARECER nº:

MPTC/1927/2011

PROCESSO nº:

RPA 05/04116088    

ORIGEM:

Secretaria de Estado da Fazenda

INTERESSADO:

Antônio Carlos Vieira

ASSUNTO:

Representação de Agente Público acerca de supostas irregularidades no Edital n. 006/2005-SEF/SC - Pregão Eletrônico e Contrato n. 018/2005

 

 

 

 

RELATÓRIO

Cuida-se de representação encetada pelo então deputado estadual Sr. Antônio Carlos Vieira, tendo por objeto o Pregão Eletrônico nº 006/2005, patrocinado pela Secretaria Estadual da Fazenda, com vistas a contratar empresa para prestar consultoria em planejamento estratégico.

Este Parquet manifestou-se nos autos por meio do Parecer nº 5101/2009 (fls. 355/358), cujo Relatório adoto para os eventos até então ocorridos.

Após isto, os autos seguiram para Exmo. Sr. Relator, que se manifestou por meio do Relatório e Voto nº 694/2010 (fls. 361/380).

Em 09/07/2010, a Secretaria Geral do Tribunal, para eventual sustentação oral, comunicou aos procuradores do Sr. Max Roberto Bornhold, arrolado como um dos responsáveis, que o processo seria apreciado na sessão do dia 26/07/2010 (fls. 381 e 386).

Da parte de Max Roberto Bornholdt foi juntada a procuração de fls. 384.

Em 19/07/2010 o Sr. Max Roberto Bornholdt, peticionou no sentido de que a representação devia ser julgada improcedente, pois seu objeto coincide com o da Ação Popular nº 023.05.044044-9, e esta rejeitou os pedidos formulados com base na ausência de prova e de não prejuízo ao erário.

Ressalta o peticionário que a fundamentação produzida pelo judiciário deu-se tanto na primeira instância quanto na segunda, tendo o feito transitado em julgado em 07/01/2010. (fl. 387/388).

Acompanharam o pedido os documentos de fls. 389/407.

O petitório foi analisado pelo Exmo. Sr. Relator, que emitiu o despacho de fls. 409/410.

O despacho de fls. 411/412 destacou que os autos foram levados à deliberação do Tribunal Pleno na sessão de 26/07/2010, ocasião em que houve sustentação oral por parte de Procuradores do Sr. Max Roberto Bornholdt, reiterando os termos da petição de 19/07/2010.

O processo foi retirado de pauta.

O Exmo. Sr. Relator solicitou que a Consultoria Geral do Tribunal examinasse a questão sob a ótica, principalmente da incidência, in casu, da “coisa julgada”.

O Corpo Técnico da Consultoria Geral manifestou-se por meio do Relatório nº 579/2010 (fls. 408/426).

O Exmo. Sr. Relator, por intermédio do despacho de fls. 427/428, determinou a remessa dos autos a este Ministério Público para manifestação.

 

PRELIMINARMENTE

Cumprindo seu mister o Corpo Técnico do Tribunal, após conhecida a representação e ofertada oportunidade do contraditório e ampla defesa aos responsáveis, concluiu pela existência de irregularidades atinentes ao Pregão Eletrônico nº 006/2005, nos seguintes termos (fls. 352/353):

 

4.1 De responsabilidade do Sr. Max Roberto Bornholdt:

4.1.1 Impossibilidade legal de contratação de serviço técnico especializado para consultoria em planejamento estratégico através de licitação na modalidade Pregão Eletrônico, em confronto ao artigo 2º da Lei Estadual n. 12.337/02, ao artigo 5º do Anexo I e o Anexo III do Decreto Estadual n. 105/03;

4.1.2 Formação de Planilha de Custo para contratação de consultoria com custo médio das propostas viciado, em razão de apresentadas por empresas inaptas para executar o objeto da licitação, portanto, sem condições de apresentarem valores, em afronta ao artigo 3º da Lei Federal n. 8.666/93 e ao artigo 7º do Decreto Federal 61.934/67;

4.1.3 Exigências de Qualificação Técnica descabidas e restritivas de competitividade em prol da empresa Donner e Prosper Consultoria em Gestão e Negócios, em prejuízo do artigo 3º, caput, § 1º, I, do artigo 30, caput, II, § 5º, da Lei Federal n. 8.666/93, do artigo 37, XXI, da Constituição Federal, dos artigos 16, caput, e 17, ambos da Constituição Estadual;

4.2 De responsabilidade do Sr. Aluísio Miranda Von Zuben:

4.2.1 Parecer jurídico atestando a legalidade do Edital n. 006/2005, apesar do objeto ser a contratação de prestação de serviço técnico especializado (consultoria), juridicamente impossível de ser contratado por Pregão Eletrônico, em confronto ao artigo 2º da Lei Estadual n. 12.337/02 e ao artigo 5º do Anexo I e ao Anexo III (classificação de serviços comuns) do Decreto Estadual n. 105/03.

 

No Parecer nº 5101/2009, de 21/09/2009, conclui pela existência das irregularidades e aplicação de multas aos responsáveis (fls. 355/358).

Depois disto, em 19/07/2010, o Sr. Max Roberto Bornholdt, requereu fosse julgada improcedente a representação, ante o advento do instituto da “coisa julgada”.

Isto porque na Ação Popular nº 023.05.044044-9, onde o requerente figurou como réu, o Poder Judiciário reconheceu, em primeira e segunda instâncias, “a ausência de prova de qualquer ilegalidade e de verdadeiro prejuízo ao erário” (fls. 387/388), tendo-se dado o trânsito em julgado do processo.

Os documentos de fls. 390 a 407, comprovam a existência da citada Ação Popular, que o peticionário integrou o polo passivo e que esta transitou em julgado em 29/01/2010.

Portanto, constato que o caso concreto preenche os requisitos do art. 467[1] do Código de Processo Civil, devendo a sentença prolatada no Poder Judiciário produzir efeitos no tocante à coisa julgada.

Destaco que o presente caso não trata de julgamento de contas de administrador e demais gestores públicos, cuja competência é privativa do Tribunal de Contas[2], mas sim de determinado ato administrativo, consubstanciado nos procedimentos atinentes ao Pregão Eletrônico nº 006/2005.

Nesta senda, Jorge Jacoby[3] aduz que:

 

Pode ocorrer, contudo, que a conduta do agente tenha ensejado, independentemente das contas, um exame judicial estrito e, nessa hipótese, caberá à Corte de Contas, em nome da segurança das relações jurídicas e pela prevalência da decisão judicial, encerrar o processo.

 

O Supremo Tribunal Federal aponta no mesmo sentido indicado pela doutrina apresentada:

 

EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. APOSENTADORIA. REGISTRO. VANTAGEM DEFERIDA POR SENTENÇA TRANSITADA EM JULGADO. DISSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. DETERMINAÇÃO À AUTORIDADE ADMINISTRATIVA PARA SUSPENDER O PAGAMENTO DA PARCELA. IMPOSSIBILIDADE. 1. Vantagem pecuniária incluída nos proventos de aposentadoria de servidor público federal, por força de decisão judicial transitada em julgado. Impossibilidade de o Tribunal de Contas da União impor à autoridade administrativa sujeita à sua fiscalização a suspensão do respectivo pagamento. Ato que se afasta da competência reservada à Corte de Contas (CF, artigo 71, III). 2. Ainda que contrário à pacífica jurisprudência desta Corte, o reconhecimento de direito coberto pelo manto da res judicata somente pode ser desconstituído pela via da ação rescisória. Segurança concedida.[4]

 

Questão semelhante foi enfrenta no âmbito do Tribunal de Conta Catarinense, com decisão que não diverge dos posicionamentos antes apresentados.

Neste sentido, colaciono ementa do voto[5] apresentado nos autos do processo REC/0800088018, que foi integralmente acolhido pelo Acórdão nº 0001/2010, proferido na sessão de 03/02/2010:

 

Decisão judicial. Coisa julgada. Tribunal de Contas. Oponibilidade.

É passível de oponibilidade ao Tribunal de Contas a decisão judicial transitada em julgado, acerca de matéria que também constitui objeto de processo que tramita na Corte de Contas, a qual não dispõe, constitucionalmente, de poder para rever sentença judicial amparada pela res judicata. Precedentes do Supremo Tribunal Federal.

Exame de atos e contratos. Coisa julgada. Vinculação. 

O pronunciamento judicial transitado em julgado não vincula o entendimento do Tribunal de Contas nos demais processos, relacionados ao exame de editais de concorrência e respectivos contratos, realizados pelos gestores públicos que estão sob sua jurisdição, ou seja, a decisão do Poder Judiciário é válida apenas para o ato que foi submetido à sua apreciação.

 

Reconhecida a incidência do instituto da coisa julgada no presente processo, resta auferir a extensão de seus efeitos.

Nelson Nery ensina que o conjunto formado pelo pedido (parte final da petição inicial) e o dispositivo (parte final da sentença) é alcançado pela coisa julgada material[6].

Há identidade entre o pedido deduzido na Ação Popular [declarar nulo (não válido)[7] o contrato e condenar os réus no integral ressarcimento do dano (fl. 390)] e o apresentado nesta Representação [apurar a validade da licitação realizada (fl. 6)].

Por seu turno, a parte final da sentença ficou assim consignada “... no mérito, rejeito os pedidos formulados pelos autores populares, com fundamento no art. 269, I do mesmo diploma legal”.

Os pedidos foram rejeitados sob a seguinte justificativa apresentada pelo juiz sentenciante: “não restou demonstrada qualquer ilegalidade, e, via de consequência, lesividade ao erário ou ao patrimônio o público”.

Desta forma, ante o trato genérico dado à questão no Judiciário, e com supedâneo nos artigos 471, caput e 474[8] do Código de Processo Civil, entendo que os efeitos da coisa julgada material abarcam todas as restrições levantadas nesta representação.

Assim, o processo deve ser extinto sem apreciação do mérito com base no art. 267, V do Estatuto Processual Civil.

 

CONCLUSÃO

Ante o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108 da Lei Complementar nº 202/2000, manifesta-se pelo CONHECIMENTO da Representação, extinguindo-a, sem apreciação do mérito, com base no art. 267, V do Código de Processo Civil, ante a superveniência de coisa julgada material.

Florianópolis, 30 de maio de 2011.

 

 

Mauro André Flores Pedrozo

Procurador-Geral do Ministério Público

junto ao Tribunal de Contas

 



[1] Art. 467 Denomina-se coisa julgada material a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário.

[2] FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tribunais de Contas do Brasil: jurisdição e competência. 2ª ed. Belo Horizonte: Fórum, 2005. 345 p.

[3] Ibidem, p. 603.

[4] MS 23665/DF, Relator: Min. Maurício Corrêa. Julgamento: 05/06/2002. Órgão julgador: Tribunal Pleno.

[5] Conselheiro Relator: Wilson Rogério Wan-Dall.

[6] NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado. 11ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. 732 p.

[7] Acrescido pelo autor do Parecer.

[8] Art. 471 Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas, relativas à mesma lide, salvo:

Art. 474 Passada em julgado a sentença de mérito, reputar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e defesas, que a parte poderia opor assim ao acolhimento como à rejeição do pedido.