PARECER nº:

MPTC/3607/2010

PROCESSO nº:

SPC-07/00494596    

ORIGEM:

Fundo Estadual de Saúde - FES

INTERESSADO:

Luiz Eduardo Cherem

ASSUNTO:

Referente a nota de empenho nº 31256, de 19/12/2006, elemento de despesa 334041.02, fonte de recursos 0100, no valor de R$ 1.000.000,00 em favor da Prefeitura de Criciúma.

 

 

1. HISTÓRICO

 

Tratam os autos da análise procedimental na utilização dos recursos oriundos do Convênio nº 20.254/2006-1, firmado entre a Secretaria de Estado da Saúde e o Município de Criciúma, objetivando o custeio e manutenção do Hospital Santa Catarina.

 

O Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina – TCE/SC, por intermédio da Diretoria de Controle da Administração Estadual, através da Requisição nº 069, de 23 de agosto de 2007, exigiu para a devida análise, a remessa do Processo de Prestação de Contas relativa à Nota de Empenho nº 31.256/06.

 

Em 30 de agosto de 2007, pelo Ofício nº GECOT 652/2007, a Secretaria de Estado da Saúde atendeu a determinação dessa e. Corte de Contas, a qual encaminhou Prestação de Contas original.

 

Do exame dos autos, a Diretoria de Controle da Administração Estadual apontou as seguintes irregularidades:

 

a)      Indevida substituição da Prestação de Contas;

Informa que após o envio da Prestação de Contas a esse Tribunal, a Secretaria de Estado da Saúde solicitou a sua substituição, no intuito de corrigir as incorreções apontadas sobre despesas e gastos com pessoal;

 

b)     Deficiência na atuação do órgão de controle interno;

Que em razão do requerimento para substituição de prestação de contas já realizada, a Secretaria de Estado da Saúde ensejou a atuação sem a devida prudência, presteza e efetividade, não sendo devidamente rigorosa e tempestiva, caracterizando deficiência e descumprimento de preceitos legais.

 

c)      Não movimentação dos recursos na conta em que ocorreu o repasse;

Repasse irregular do recurso para conta não especificada no convênio e pagamento de despesas efetuado através dessa conta.

 

d)     Indevido pagamento de despesas com propaganda e publicidade;

Pagamento de despesas com propaganda e publicidade.

 

e)      Indevido pagamento de despesas com multas e juros;

Pagamento de multa nas faturas de água;

 

f)       Não aplicação de parte dos recursos nas finalidades estabelecidas no convênio;

Utilização de parte dos recursos para aquisição de materiais de construção em outras unidades da saúde;

 

g)      Indevida utilização dos recursos para pagamento do pessoal ativo do convenente

Aplicação pelo Fundo Municipal da Saúde do Município de Criciúma de parte dos recursos do Convênio para pagamento de remuneração dos funcionários do Hospital Santa Catarina.

 

Ao rol de deficiências elencadas, a Diretoria de Controle da Administração Estadual, sugeriu:

 

a)        A citação do Senhor Ramon da Silva, Superintendente de Gestão Administrativa da Secretaria de Estado da Saúde, para apresentação de defesa quanto à substituição de prestação de contas e possível imposição de multa;

 

b)       A citação do Senhor Anderlei José Antonelli, Prefeito Municipal de Criciúma, para apresentação de defesa, passíveis de imputação de débito, dos seguintes apontamentos:

 

b.1) Pagamento irregular de R$ 22.388,59 (vinte e dois mil, trezentos e oitenta e oito reais e cinqüenta e nove centavos) com propaganda e publicidade;

 

b.2) Pagamento de 30,72 (trinta reais e setenta dois centavos) com multa e juros em fatura de água;

 

b.3) Pagamento irregular com despesas de pessoal no montante de R$ 824.075,44 (oitocentos e vinte e quatro mil, setenta e cinco reais e quarenta e quatro centavos);

 

b.4) Aplicação de multa em razão da substituição de prestação de contas, pela não movimentação dos recursos em conta bancária específica em que se deu o repasse e a indevida utilização de recursos em finalidade diversa do estabelecido no convênio.

 

Citados acerca do conteúdo da auditoria ordinária, os Gestores juntaram documentação e prestaram esclarecimentos, a saber:

 

1. O Superintendente da Secretaria da Saúde, Senhor Ramon da Silva alegou ilegitimidade passiva por não haver nos autos, argumentos fáticos ensejando pedido por ele ordenado, da substituição da prestação de contas.

 

2. O ex-Prefeito de Criciúma, Senhor Anderlei José Antonelli, em preliminar, trouxe aos autos os seguintes argumentos:

 

2.1. Que o administrador público não pode ficar atrelado aos mínimos detalhes da sua administração, ora em que delega tais poderes aos seus assessores;

 

2.2. Que houve a necessidade da construção de UTI neonatal para atender a demanda da região;

 

2.3. Pela falta de recursos próprios para o término da obra, o Ministério Público Estadual propôs um termo de ajuste de conduta obrigando a municipalidade a proceder à conclusão imediata da referida obra e dar início ao seu funcionamento.

 

2.4. Em razão da forçada conclusão da obra, permaneceu inúmeras deficiências que limitavam sua efetiva condução. Assim, firmou-se o convênio entre a Secretaria de Estado da Saúde e o Município com o objetivo de melhorar a qualidade no atendimento;

 

2.5. Que originariamente o Convênio deveria ter sido firmado entre a Secretaria de Estado da Saúde e o Fundo Municipal da Saúde do Município;

 

2.6. Que o Hospital Materno Infantil Santa Catarina, principalmente pela sua UTI Neonatal atende hoje toda a região, não somente aos municípios de abrangência da Associação dos Municípios da Região Carbonífera – AMREC, como os municípios pertencentes também à AMESC e a AMUREL, tratando-se neste caso de um contingente de mais de 500.000 habitantes;

 

Com relação às restrições, assim se manifesta:

 

1. Pagamento irregular com pagamento de publicidade: Alega que a Lei de Responsabilidade Fiscal obriga a divulgação dos atos de gestão do poder público e por essa razão, aplicou parte dos recursos em tal finalidade;

 

2. Pagamento irregular de juros na fatura de água: aduz que como ordenador de despesas, lhe é cabível a responsabilidade da restrição;

 

3. Pagamento irregular com pessoal: argumentou que a administração dos serviços ocorreu efetivamente na unidade autárquica (o Hospital Santa Catarina é autarquia), e utilizando a interpretação restritiva da Constituição Federal, seriam vedados somente os pagamentos de despesas com pessoal do Município e não de autarquias.

Que não houve aplicação indevida dos recursos, pois o mais importante é que os recursos foram gastos com a promoção da saúde no Município de Criciúma;

 

4. Duplicidade na prestação de contas: alega que nova prestação de contas foi encaminhada em virtude de solicitação da Secretaria de Estado da Saúde;

5. Não movimentação dos recursos em conta bancária específica: alega que ficou determinado que os recursos não utlizados deveriam ser aplicados em caderneta de poupança ou aplicação financeira de curto prazo e que assim procedeu;

 

6. Indevida utilização de recursos em finalidade diversa do estabelecido no convênio: requereu a substituição da prestação de contas dos valores aplicados indevidamente, sendo o referido valor ajustado na contrapartida no Município, sendo superior ao valor concedido.

 

Do exposto, a Diretoria de Controle da Administração Estadual, em reanálise processual, exarou parecer conclusivo, firmando o seguinte entendimento:

 

I. Que subsistem as irregularidades quanto à substituição da prestação de contas;

 

II. Que se afasta a responsabilidade do Senhor Ramon da Silva em face das alegações e documentos apresentados;

 

III. Que são insuficientes as alegações de defesa e os documentos apresentados pelo Senhor Anderlei José Antonelli para elidir as irregularidades.

 

Para tanto, sugere:

 

a) Julgar irregulares com imputação de débito dos recursos transferidos no montante de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) ao Senhor Anderlei José Antonelli;

 

b) dar quitação ao responsável da parcela de R$ 999.969,28 (novecentos e noventa e nove mil, novecentos e sessenta e nove reais e vinte e oito centavos);

 

c) Condenar o Responsável ao pagamento de R$ 30,72 (trinta reais e setenta e dois centavos) em face do indevido pagamento de despesas com multas/juros em faturas da CASAN/SC;

 

d) aplicar ao Responsável, multas e fixar prazo de 30 (trinta) dias para o devido recolhimento, em face das seguintes irregularidades;

 

d.1) indevida realização de despesas com propaganda e publicidade;

 

d.2) indevido pagamento de despesas de pessoal;

 

d.3) não movimentação dos recursos do convênio na conta bancária em que ocorreu o repasse;

 

d.4) não aplicação de parte dos recursos nas finalidades estabelecidas no convênio;

 

e) Determinar ao Coordenador da Comissão de Controle Interno e ao Gerente de Contabilidade da Secretaria de Estado da Saúde providências mais rigorosas e tempestivas nas ações de Controle Interno;

 

f) alertar a Comissão de Controle Interno e à Gerência de Contabilidade, da Secretaria de Estado da Saúde que o não cumprimento da determinação acima mencionada poderá cominar em sanções administrativas previstas na Lei Complementar nº 202/2000, e;

 

g) Cientificar os interessados do Acórdão dessa e. Corte de Contas.

 

É o relatório

 

2. DA ANÁLISE

 

A Diretoria de Controle de Contas, dessa e. Corte de Contas, em todo tempo, com destacado saber e minuciosa análise processual, opina pela imputação de débito, irregularidade na destinação dos recursos do Convênio nº 20.254/2006-1 e aplicação de multa ao Senhor Anderlei José Antonelli;

Da conclusão estampada no Relatório final daquela Diretoria, ouso divergir, em parte, pelos argumentos que passo a expor :

I – Condenar o Responsável ao pagamento de R$ 30,72 (trinta reais e setenta e dois centavos) em face do indevido pagamento de despesas com multas/juros em faturas da CASAN/SC;

 

No relatório de defesa apresetando pelo Senhor Anderlei José Antonelli enfatiza estar consciente de que, como ordenador de despesas, lhe é cabível a responsabilidade desta restrição.

 

Muito embora admitida tal imputação, percebe-se que o valor da condenação é ínfimo, e que, por economia estritamente processual, aferida pela demanda temporal e de custo operacional, tornar-se-á menos oneroso a não cobrança de tal débito.

 

Segundo o princípio da economia processual, entre múltiplas alternativas deve ser escolhida aquela que trouxer menos encargos para as partes ou para o Estado. Este princípio, imprime um resultado máximo na prestação jurisdicional à mínima utilização de atividades procedimentais.

 

Assim, movimentar o poder público para executar quantia irrisória afronta o princípio da economia processual e da proporcionalidade. Se porventura o débito tiver inscrição na dívida ativa, a execução fiscal de débito de valor irrisório pode causar prejuízo aos cofres públicos.

 

Temos ainda que vários juízes têm indeferido de plano, petição nas execuções de débitos de valores considerados insignificantes, sob o argumento de ausência de interesse de agir por parte da Fazenda exeqüente.

 

E o motivo principal dessas sentenças é o valor alto das despesas para tomar as medidas necessárias objetivando a cobrança forçada, com publicações, citações, intimações, dispêndios com oficial de justiça, superando o benefício econômico a ser alcançado com a satisfação do crédito.

 

No intuito de poupar qualquer desperdício na condução do processo bem como nos atos processuais, de trabalho, tempo e demais despesas, e por considerar o valor ínfimo, opino pela não cobrança do débito.

 

 

II – Aplicação de multa ao Responsável, em razão da indevida realização de despesas com propaganda e publicidade; o indevido pagamento de despesas de pessoal; não movimentação dos recursos do convênio na conta bancária em que ocorreu o repasse e da não aplicação de parte dos recursos nas finalidades estabelecidas no convênio.

A Carta Magna de 1988, incluiu no art. 37, o Princípio da Eficiência, que é o dever de executar a boa administração, a ser observado por toda entidade da Administração Direta e Indireta.

Assim, o agente público tem o dever de executar suas atividades com presteza, perfeição e rendimento funcional. Vai além do conceito do princípio da legalidade. Exige resultados positivos e satisfatório atendimento das necessidades públicas.

Entre outras coisas, subsume o controle de resultado; fortalece o sistema de mérito; sujeita a Administração Indireta à supervisão ministerial, quanto à eficiência administrativa.

O controle deverá abranger os aspectos qualitativos e quantitativos do serviço, avaliando seu rendimento efetivo, custo operacional, utilidade para a população e para a Administração. Envolve o aspecto administrativo, econômico e técnico.

Desta forma, há que se considerar dois principais deveres do administrador público, a saber: 

c)        Dever de probidade e moralidade

Refere-se à conduta do administrador de acordo com a ética, a moral. Postura honesta que legitima seus atos.

Com o advento da Carta Magna de 1988, a moralidade, conforme anota Hely Lopes Meirelles, não é idéia de moral comum e sim uma moral jurídica, e que vem configurada como principio de moralidade administrativa, abarcada no pressuposto de validade que integra a essência de todo ato administrativo.

Em resumo, para que não configure ofensa ao princípio da moralidade administrativa, sempre deve haver a verificação ante a Administração de que seu comportamento embora em consonância com a lei, não venha a ofender a moral, os bons costumes, os princípios de justiça e de eqüidade, a idéia comum de honestidade. Compreendem-se em seu âmbito os chamados princípios da lealdade e boa-fé.

O princípio da moralidade está intimamente ligado à idéia de probidade, a sua violação configura violação ao próprio direito, de conformidade com preceito instituído no art. 37, da Constituição Federal de 1988.

É comum confundir ato de improbidade administrativa com ato ilegal e lesivo ao patrimônio público. Os atos de improbidade estão relacionados com enriquecimento ilícito, prejuízos ao erário público, atentados aos princípios da Administração Pública.

Ante tais argumentos, não se verifica nos autos a intenção do gestor público em aplicar os recursos em proveito próprio, que não tivessem a precípua finalidade de atender o bem-estar comum ou na imperiosa necessidade de acesso à saúde pela população.

Atente-se ainda ao fato de que o Ministério Público Estadual ordenou, por intermédio de ajuste de conduta, a realização da obra com a máxima urgência, objetivando atender a expectativa da população na melhoria da qualidade do atendimento à saúde, que bem se sabe, extremamente frágil no nosso Estado.

d)       Dever de prestar contas

Todo aquele que administra interesses alheios, tem o dever de prestar contas ao proprietário. O Administrador Público tem um encargo com a comunidade. Exerce a gestão dos bens e interesses da população.

Todo agente político ou administrativo tem o dever de prestar contas dos seus atos, sejam atos de governo, administrativos, ou de gestão financeira. A regra aplica-se a todo aquele que gere dinheiro ou administra bens e interesses públicos, incluídos os particulares que recebem subvenção.

Mesmo com as incorreções flagradas no Relatório de auditoria, observa-se que a prestação de contas foi efetivamente apresentada. Merece referência, mesmo que de forma atabalhoada, a intenção de retificar a prestação de contas, demonstrando a vontade do agente público em elidir qualquer irregularidade.

Desta forma, importante frisar que a possibilidade – não obrigatoriedade – de aplicar multa decorre de que, se houver débito, exceto por uma hipótese peculiar, as contas terão de ser julgadas irregulares.

Ou seja, o fato de existir débito é determinante para a reprovação das contas. Entretanto, não basta a sua constatação para que o responsável pelas contas seja apenado.

Exige-se a avaliação da sua conduta, pois o objeto da pena são os atos praticados pelo agente, não a existência do fato débito. Portanto, ainda que não transpareça claramente, há dois momentos distintos.

Um refere-se à constatação do prejuízo, outro à aferição da conduta que levou a ele. Ainda que não seja muito comum, é admissível que comportamento pautado na boa-fé e não condenado pelo ordenamento jurídico acarrete dano aos cofres públicos. Conforme já afirmado, o prejuízo causado não pode ser ignorado, mas sua cobrança tem natureza de responsabilização civil. Não é sanção.

Desse modo, ainda que se possa criticar a impropriedade do procedimento, não se vislumbra dano ao Erário capaz de justificar a imposição de multa.

3. CONCLUSÃO

Ante o exposto, esta Procuradoria junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar no 202/2000, manifesta-se nos seguintes termos:

 

a) Julgar regulares, com ressalva, as contas de recursos transferidos, prestadas pelo Senhor Anderlei José Antonelli, referente à Nota de Empenho nº 31.256/2006, na forma do art. 18, inciso II da Lei Complementar nº 202/2000 e recomendando que se previna a ocorrência de outras incorreções semelhantes em transferências futuras;

 

e)    Acompanhar, nos demais quesitos, a instrução da Diretoria de Controle da Administração Estadual.

Florianópolis, em 16 de junho de 2010.

                                                    

                        

MÁRCIO DE SOUSA ROSA

Procurador Geral Adjunto do Ministério Público

Junto ao Tribunal de Contas

af