Despacho no:

 

GPDRR/162/2010

                       

 

 

Processo nº:

 

REC 09/00352329

 

 

 

Interessados:

 

Município de Anchieta

 

 

 

Assunto:

 

Recurso de reexame intempestivo acolhido por despacho imotivado de conselheiro. Ilegalidade do despacho. Ilegalidade do acolhimento do recurso. Ilegalidade na omissão de informações relevantes para a atuação na esfera penal do MPSC. Arquivamento do recurso e comunicação dos fatos omitidos ao MPSC.

           

Manifestei-me nestes autos nos termos do Parecer de fls. 39-40.

Qual não foi minha surpresa ao ver, pelos motivos que vi, ou em razão da falta deles (!) retornar o presente recurso...

O despacho à fl. 41 determinou “a remessa dos presentes autos à Consultoria-Geral para que proceda ao exame do mérito recursal”.

Isto porque se considerou, imotivadamente, ser adequado “neste caso, contar o prazo a partir da citada data, para evitar prejuízo ao Recorrente”.

Certamente, passou despercebido aos costumeiros diligentes olhos da assessoria do E. Conselheiro o referido despacho.

A Lei Complementar nº 202/2000, ela mesma, a nossa Lei Orgânica, objeto de nosso manejo diário, estabelece, e não faculta, que o prazo recursal seja contado da publicação da decisão no Diário Oficial:

Art. 80. O Recurso de Reexame, com efeito suspensivo, poderá ser interposto uma só vez por escrito, pelo responsável, interessado, ou pelo Ministério Público junto ao Tribunal, dentro do prazo de trinta dias contados a partir da publicação da decisão no Diário Oficial do Estado.

 

Sendo previsão legal, não será um despacho que poderá disciplinar de outra forma. Peço perdão pela obviedade, mas apenas outra Lei, portanto, poderia modificar essa regra.

Na tentativa de “evitar” prejuízo ao Gestor duplamente descuidado, que pagou sem observar a estrita ordem cronológica das exigibilidades, conduta tipificada como crime inclusive, e que deixou de observar o prazo para sua insurgência recursal, culminou-se por promover prejuízos gerais a toda sociedade catarinense, que deverá aguardar mais um pouco para ver sancionado o descumprimento de uma Lei federal (art. 5º da Lei 8.666/93) em território catarinense.

Mas a sociedade como todo também foi prejudicada ao ver ocupados, indevidamente, importantes órgãos da estrutura administrativa catarinense, o Tribunal de Contas e seu Ministério Público especial, ambos ricamente “alimentados” com recursos do contribuinte catarinense, discutindo regra mais do que clara, que a sociedade também pagou para obter na forma de Lei.

Esta sociedade quer, por certo, que as regras aprovadas pelos seus representantes na Augusta Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina, órgão que teve a honra de receber, por muitos anos, o Ilustre Conselheiro Relator, sejam realmente aplicadas...

A sociedade catarinense também foi prejudicada ao ver diminuídos, mesmo que momentaneamente, importantes princípios da condução da vida pública, entre eles o da isonomia e o  da impessoalidade. Afinal que razão haveria para tratar com maior deferência o Gestor público de Anchieta, quando todos os outros não recebem desta Corte (porque não podem mesmo receber...) o especial (e ilegal) tratamento dispensado ao Prefeito de Anchieta.

A douta Consultoria-Geral da Corte possui atribuições importantíssimas no exame de recursos e da elaboração das respostas às consultas formuladas à Corte. Estas atribuições e o grande esmero com que se debruçam sobre elas os técnicos que lá oficiam, fazem com que esteja sempre às voltas com um grande volume de processos, que não necessita ser ampliado com tramitações estranhas como esta que se evidencia nestes autos.

 

Resta lamentar ainda a falta de cuidado revelada pelo Voto nº GC-OGS/2009/183, que conduziu a discussão na Sessão de 04/05/2009, e que afirmou, por duas vezes, que o Ministério Público de Contas “manifestou-se no mesmo sentido do corpo técnico”. Este órgão ministerial expressamente pediu, além do acolhimento das conclusões da instrução técnica:

“2) com fundamento no art. 59, XI da Constituição Estadual; nos arts. 1º, XIV e 65, § 5º da Lei Complementar nº 202/2000; no art. 7º da Lei Federal nº 7.347/85; nos arts. 14 c/c 22 da Lei Federal nº 8.429/92; no art. 35, I c/c 49, II da LOMAN, no art. 43, VIII da Lei Federal nº 8.625/93; no art. 24, § 2º c/c art. 40 do Decreto-Lei n° 3.689/41 e no art. 102 da Lei 8.666/93, pela imediata comunicação ao Ministério Público Estadual, para fins de subsidiar eventuais medidas em razão da possível tipificação de ato de improbidade administrativa, capitulado nos arts. 10, XI e 11, I da Lei 8.429/92, e do crime previsto no art. 92 da Lei 8.666/93.”

 

O pedido não foi sequer citado, quanto mais analisado.

Tal conduta, além representar lamentável mitigação dos deveres os deveres de lealdade processual, compromete o dever de cuidado e de cooperação que, obrigatoriamente, deve nortear a atuação dos agentes públicos sobre os quais pesa o compromisso de promover o bom funcionamento do Estado. Estes deveres, no caso em tela, deixaram de ser observados pelo Conselheiro relator da DEN 07/00417338, já que havia regra expressa da Lei federal nº 8.666/93 impondo a comunicação ao Ministério Público: 

 

Art. 102.  Quando em autos ou documentos de que conhecerem, os magistrados, os membros dos Tribunais ou Conselhos de Contas ou os titulares dos órgãos integrantes do sistema de controle interno de qualquer dos Poderes verificarem a existência dos crimes definidos nesta Lei, remeterão ao Ministério Público as cópias e os documentos necessários ao oferecimento da denúncia.

 

Ao tomar conhecimento de condutas que representem indícios de crime o Tribunal de Contas não pode esconder tais fatos do órgão que possui a prerrogativa de atuar em face delas (CF, art. 129).

 

Ante o exposto, opina o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar no 202/2000:

1) reitero integralmente os termos do Parecer nº 3.633/2009 e o pedido feito na conclusão do Parecer nº 1.586/2009, ilegalmente desconsiderado pela Corte, de:

2) com fundamento no art. 59, XI da Constituição Estadual; nos arts. 1º, XIV e 65, § 5º da Lei Complementar nº 202/2000; no art. 7º da Lei Federal nº 7.347/85; nos arts. 14 c/c 22 da Lei Federal nº 8.429/92; no art. 35, I c/c 49, II da LOMAN, no art. 43, VIII da Lei Federal nº 8.625/93; no art. 24, § 2º c/c art. 40 do Decreto-Lei n° 3.689/41 e no art. 102 da Lei 8.666/93, pela imediata comunicação ao Ministério Público Estadual, para fins de subsidiar eventuais medidas em razão da possível tipificação de ato de improbidade administrativa, capitulado nos arts. 10, XI e 11, I da Lei 8.429/92, e do crime previsto no art. 92 da Lei 8.666/93..

3) pela comunicação da decisão exarada pela Corte às partes interessadas.

Florianópolis, 15 de dezembro de 2010.

 

Diogo Roberto Ringenberg

Procurador do Ministério

Público de Contas